O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 1 – Arco 6

Capítulo 48: Anjo da Gravidade

Pela manhã, Raizel e Petra estavam lado a lado observando o Círculo de Transporte Espiritual, gravado no chão cinza da floresta solitária.

Os traços do círculo foram desenhados com o uso de uma tinta dourada que brilhava sutilmente acompanhada de algumas runas e um alto teor de energia divina.

A garota deu um passo adiante, quando uma leve lufada de ar acariciou os seus cabelos e causou o farfalhar das folhas esmaecidas, quase sem vida.

Petra hesitou por um instante. Logo ela seria enviada para a fronteira entre o plano físico e o espiritual. Lá entraria em contato com um anjo relativo à sua Habilidade Inata.

Diferente da garota, Raizel expressava uma confiança quase inabalável. Isso era tudo o que ele podia fazer no momento, além de esperar a sua parceira retornar.

— Eu vou obter a minha Veste Divina… — sussurrou, para que apenas ela pudesse ouvir — se o anjo me considerar digna.

Essa era a etapa final do seu treinamento e, por conceder acesso a uma das duas energias primordiais, também era a que mais renderia retorno em termos de evolução.

No entanto, o sucesso não dependia apenas da garota, o que realmente importava eram os critérios que o anjo iria usar para avaliá-la, critérios que tendem a ser pessoais.

Raizel deu alguns passos à frente e parou na borda do Círculo de Transporte Espiritual — a garota já estava no centro. Colocou os braços para trás, firmou a base dos pés  e com o queixo erguido, proclamou:

— Eu não creio que exista, no Reino Divino, alguém tão cego a ponto de deixar o seu potencial passar despercebido. Além disso… — Esboçou um sorriso e olhar sinceros. — Você é a pessoa mais gentil que eu conheço.

Huh? — Pôs-se de costas para o rapaz.Era difícil esconder a satisfação ao ouvi-lo pronunciar tais palavras. —  É a sua cara dizer algo do tipo num momento assim.

Quando o círculo emanou um forte brilho, e o seu corpo começou a ser transportado para a fronteira entre o plano físico e o espiritual, a garota voltou novamente o seu olhar para o seu parceiro.

— Eu estarei aguardando pelo seu retorno, senhorita.

— Obrigada… Rai.

A garota desapareceu junto a qualquer indício do Círculo de Transporte Espiritual. Era como se Petra nunca tivesse estado ali.

— Hoje também é o dia em que eu terei que cumprir essa missão. — Tirou um papel do seu anel de ressonância e conferiu o conteúdo, mais precisamente, as coordenadas.

A última vez em que teve que olhar para esse papel foi quando o diretor Nosferatu lhe enviou a declaração com a permissão para adentrar o Continente Sombrio de Erebus.

Agora, a hora de pagar a sua punição por ter negligenciado o portal irregular de Oprantis havia chegado.

Guardou o papel da missão e tirou um sobretudo preto, vestindo-o sem demora. Contudo, enquanto abotoava a vestimenta, algo lhe chamou a atenção — o cheiro.

— Rosas? — O sobretudo que emprestou para a sua parceira na noite anterior exalava um cheiro suave e doce que normalmente não estaria ali. — É, gostei.

O rapaz materializou algumas espadas ao redor da sua cintura e outras atrás das duas costas e disparou voando em direção ao centro do continente.

Petra se viu em meio a um vasto horizonte azul. Uma fumaça branca, do que poderiam ser nuvens, espalhava-se pelo ambiente e transmitiam um ar de calmaria. Além de alguns pontos brancos e azuis que brilhavam como estrelas.

— Que lindo — disse, ao passo que tentava tocar uma das estrelas. Todavia, o pontinho apenas se desfez num brilho tenaz e ecoou um "plim!" que se prolongou e se esvaiu no vazio.

— De fato, é uma bela vista. — Uma voz feminina soou do céu, de onde uma luz branca emergiu tão intensa quanto o próprio sol. — Então foi você quem me chamou, mocinha?

Conforme a luz desaparecia, a silhueta do que se assemelhava a uma bela mulher começava a tomar forma.

Os seus cabelos e pele eram brancos como a neve, e os seus olhos carregavam um azul tão límpido que causaria dúvida se o que se conhece por azul é de fato a cor verdadeira.

As duas asas, que ornamentavam as suas costas, eram como as que Raizel havia lhe mostrado, porém irradiavam um branco puro — um verdadeiro anjo.

Petra ficou paralisada ao presenciar o ser diante de si. Queria dizer algo, mas as palavras insistiram em continuar na sua boca.

Vendo que a garota congelou, o anjo deu continuidade ao pronunciar: — Eu sou da ordem dos regentes da gravidade, uma Virtude. Meu nome é Auriel.

Pelo que Raizel havia lhe orientado, o anjo a se apresentar para ela deveria ser da casta da Virtude, assim como no caso de Trevor e Sophie.

Já Klaus e Eirin obtiveram as suas Vestes Divinas de um anjo da casta da Potência, os regentes dos elementos da natureza e dos seus derivados.

Enfim, organizando os pensamentos e lembrando-se do porquê de estar ali, a garota falou: — A-Ah, sim! — Petra retomou a sua postura e pôs-se a fazer uma reverência. — Eu sou Petra Lavour. É uma honra conhecer…

Quando a garota segurou as pontas da saia e estava para realizar o movimento de reverência, um dedo sutil tocou o seu queixo e ergueu o seu rosto novamente.

Deveria existir uma distância considerável entre elas, distância essa que desapareceu num piscar de olhos.

"Tão rápida!" Apenas se via capaz de observar os olhos imponentes de Auriel.

— Está tudo bem, mocinha. Não precisa de tanta formalidade. — O anjo soltou o seu queixo e prosseguiu: — Pronta para iniciar o seu ritual como tenjin?

— "Tenjin"? — A raça do continente de Vagrant, aquela que possuía o relacionamento mais próximo com os anjos. — Na verdade, eu vim por causa de uma Veste Divina.

Huh? Nesse caso… — Aproximou-se mais do rosto da mocinha e a examinou bem, desde os pés até a cabeça. — Nefilim…

De repente as feições de Auriel se fecharam. Só havia um nefilim que deveria estar sem um duo. No entanto, ela nunca imaginou que aquele garoto fosse se aproximar tanto de alguém algum dia.

— Mocinha — disse, com a sua voz perdendo o tom carismático de antes — por acaso, você fez um pacto com aquele cara?

— "Aquele… cara"? — Petra podia sentir o desprezo na voz do anjo ao se referir a Raizel.

Raizel caminhava sozinho em meio a uma acrópole. Cada construção estava tão desgastada que poderia evaporar ao receber um simples toque e se tornar uma com a névoa carmesim do ambiente.

Faltavam-lhes as portas e as janelas. Os brinquedos, que antes faziam parte de um parque, estavam sujos e quebrados. As árvores do lugar estavam todas ressecadas e mortas.

As roupas do garoto estariam encharcadas de vermelho, se o sangue das criaturas não estivesse evaporando e se tornando fumaça junto aos seus corpos.

O seu sobretudo estava rasgado e alguns ferimentos espalhados pelo seu braço, peito e rosto ainda se fechavam.

Por sinal, a névoa carmesim ficava mais densa conforme se aproximava do centro do continente, tornando mais difícil respirar e visualizar algo que estivesse à distância.

— Se as coordenadas estiverem corretas, deve ser por aqui. — Abaixou-se e colocou um joelho e uma mão no chão. Estava na hora de cavar até o seu objetivo, no entanto… — Hã?

A névoa podia ocultar o ser, mas os seus ouvidos escutavam o ranger dos ossos, e o seu corpo sentia aquela energia sinistra, algo mórbido, algo que lhe causava ânsia.

Da fumaça carmesim, um alto esqueleto deu as caras. O seu corpo, ou melhor, os seus ossos, estavam revestidos por uma armadura negra e um manto vermelho-escuro que, de tão desgastado, parecia um pano de chão.

Como a criatura não possuía cabelo, ornamentava sua cabeça com uma majestosa coroa de prata, a única coisa digna de elogios na sua aparência, além do cajado de ossos que carregava.

O monstro parou a uma certa distância de Raizel e começou a encará-lo em silêncio.

— Archlich. — Olhou dentro das órbitas do crânio da criatura, dois buracos negros que levavam a um vazio sem fim.

Isso era ruim. Tinha que esbarrar logo com o detentor da maior patente entre os monstros ligados à necromancia? Matá-lo era mais do que desafiador, uma vez que, tecnicamente, ele já estava morto.

Considerando a sua capacidade de controlar os mortos, seja de forma direta, a partir da sua energia, ou indiretamente, através de vírus, o Archlich era capaz de causar um verdadeiro apocalipse zumbi em todo o planeta.

Assim, sendo digno da sua classificação como Rank S Classe Apocalypsis.

— Morra de uma vez.

Raizel se ergueu lentamente ao mesmo tempo em que várias espadas surgiram ao redor do morto-vivo e foram disparadas em alta velocidade contra ele.

Mesmo aquela criatura não sairia intacta após receber as explosões de tantas armas. No entanto, as armas nem chegaram a tocar na criatura.

Todas colidiram contra uma barreira invisível, que surgiu ao redor do monstro tão rápido quanto Raizel atacou.

A criatura escorregou as falanges dos seus dedos pelo interior da barreira, como se quisesse tocar nas armas que a pouco tentaram aniquilar o que restava do seu corpo. Então moveu o seu maxilar pela primeira vez.

— Quanta energia em uma única arma. — Sua voz soou seca, como se o ar estivesse ressoando através dos ossos. — E tu possuis tantas.

— Um monstro que fala a língua humana. — Raizel afiou o seu olhar, agora, com uma marca semelhante a uma tatuagem tribal na sua face esquerda. — Você…

— Absorver as habilidades linguísticas de alguém após matá-lo é demasiado simples — Vagloriou-se, segurando o cajado de ossos com as duas mãos em frente ao corpo, apoiando-o no chão.

Raizel sabia muito bem disso, embora não se orgulhasse nem um pouco por possuir tal experiência. Se havia um tipo de energia que ele odiava nesse mundo, esse era o Nether.

— A habilidade de um carniceiro. — Estendeu uma mão para receber a Espada do Princípio.

— Jamais se deve maldizer o conhecimento, meu jovem. — Ao usar sua Visão de Vitalidade e constatar a real idade do garoto, o Archlich quase sorriu. — Não. Tu já vivestes muito. Tenho certeza de que me renderás bastante conhecimento e memórias únicas.

Oh! Acha que pode absorver as minhas memórias? — Com um movimento limpo, apontou sua espada para o inimigo enquanto seus olhos ardiam em brasa. — Então tente… pegar.


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