O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 1 – Arco 5

Capítulo 41: Fora da Toca

— Vai ficar tudo bem mesmo? — perguntou a garotinha enquanto o seu cabelo esvoaçava pelo vento. — Isso é perigoso, Samantha.

Logo acima, a pequena Samantha escalava uma estrutura de metal gelado rumo às estrelas de um céu noturno.

— Vamos, Ágata! A vista daqui de cima é incrível. — Era fácil falar, mas escalar uma torre daquele tamanho pela primeira vez estava longe de ser fácil. — Eu já vim aqui várias vezes.

Era inegável que a vista dali era cativante à noite. Elas nem haviam chegado ao topo e já era possível observar as luzes das casas ao longe. Eram como pequenos vagalumes coloridos.

Ágata evitava olhar para baixo e se agarrava com todas as forças às barras de ferro da escada da torre, diferente da sua amiga que subia sem hesitação.

Samantha alcançou o topo. Agora ela podia desfrutar da sua recompensa: aquela vista deslumbrante, aquele horizonte ornamentado de luzes vibrantes.

— Que maravilha, Ágata!

A sua amiga estava ofegante e com os dedos quase congelados nas barras frias, mas já estava alcançando a linha de chegada.

Estava…

Um dos seus pés escorregou, e o medo de cair preencheu a sua mente. Ela tentou se manter firme, mas foi em vão. Seus dedos estavam tão gelados que lhe faltava forças.

Com um gritinho, só lhe restava ver a imagem da sua amiga acima se distanciando cada vez mais, enquanto um frio tomava a sua barriga, como se um vazio se formasse nela.

Apenas o som do ar passando pelos seus ouvidos e os gritos da sua amiga preenchiam a mente de Ágata até que seu corpo colidisse contra o chão, e tudo… se apagasse.

— Á-Ága… — Ela queria chamar pela sua amiga, mas não conseguia controlar suas mãos, tão pouco sua voz ou lágrimas que escorriam sem parar.

O intervalo que os dois tiveram para discutir e motivar os seus companheiros logo chegou ao fim.

A serpente de fogo veio rastejando por cima das casas e foi apenas questão de tempo até que a sua baforada ardente cremasse tudo.

Samantha e Enzo saltaram para longe e escaparam do ataque, mas não do calor. O monstro mal retornou e eles já podiam sentir o suor descendo.

— Fique aqui e recupere um pouco de energia! — ordenou Enzo, preparando-se para ir contra o monstro.

A garota queria abrir a boca para contra-argumentar, mas era irrefutável que, naquele momento, ela não era mais do que um falso apoio moral.

Além disso, ainda estava nervosa por causa da garota que morreu pelas garras do Capelobo. Seu parceiro jamais deixaria ela lutar assim.

O rapaz jogou a sua lança elétrica com tudo, mas independente de quantos buracos fizesse naquele corpo de fogo, ele sempre se recuperava apenas gerando mais chamas.

Era preciso dizimá-lo de uma vez.

Prolongar o confronto era uma ideia ruim. O suor em seu corpo apenas anunciava o desgaste físico, e o seu rendimento estava caindo a cada investida do Boitatá.

"Eu queria evitar um golpe devastador, mas este lugar tá só o caco mesmo."

O rapaz saltou para o alto e, ao fundir uma Gema Espectral à sua lança, as nuvens acima se escureceram e trovejaram.

Jogando a sua arma no meio das nuvens, ela retornou carregada de raios azuis que despencaram com tudo em cima do monstro.

— Fulgor Incandescente!

Um clarão estrondoso precedeu a extinção das construções próximas, deixando apenas  uma gigantesca cratera com a lança cravada no centro ainda soltando faíscas.

— Você pirou?! — Samantha estava um pouco abaixo, envolvida por um escudo de energia. — Quer me matar também?!

— Foi mal. Acho que exagerei um pouco. — Observava a moça, ao passo que a arma retornava para a sua mão. Era bom vê-la um pouco mais eufórica. — Embora os seus ataques sejam mais perigosos.

Heim? — Que tipo de visão ele tinha dela, afinal? — Humph!

Do alto, Enzo podia enxergar o panorama geral do campo de batalha. Quase todos os monstros de Rank S haviam sumido, tragados pelos Espaços Dimensionais dos seus companheiros.

Agora os duos de Rank A estavam tendo lutas mais equilibradas, no entanto, eles ainda possuíam a desvantagem numérica. Se os Rank S demorassem a voltar, a situação logo sairia de controle outra vez.

De repente, um som agourento, como o de um tecido rasgando, chamou a sua atenção. Do portal, no centro da cidade, várias corujas brancas saíram provocando aquele ruído medonho.

Rasga-Mortalha, a coruja branca que anunciava o prelúdio da carnificina e da morte, e havia muitas delas.

— Enfim vai dar as caras?

Várias árvores e raízes transbordaram do portal acertando algumas das corujas no processo. O que saía começou a se contorcer e tomar a forma de um touro gigante.

Durante todo o tempo em que os dois estiveram dentro do portal, eles estiveram cercados por ele e não perceberam. O monstro campeão do pique-esconde do portal de Viena…

— Era a própria floresta? — Enzo observava atento a criatura que rugia para o alto enquanto uma energia verde se condensava no meio dos seus chifres.

Alguns minutos antes, Andrew enfrentava o Saci, mas acertá-lo estava mostrando-se mais desafiador do que o esperado.

A criatura pulava, girava, se aproximava, dava um soco, se afastava e o pior, não parava de rir. Aquele desgraçado se divertia ao irritá-lo.

"Acalme-se, Andrew." O rapaz mantinha os olhos bem abertos e respirava fundo para não se descontrolar e cair na provocação da criatura. "Mantenha-se focado".

Valentina também estava tendo dificuldade em lidar com a Perna Cabeluda. Um alvo relativamente pequeno e que ficava em constante movimento.

A garota lançou a sua espada girando como um disco atrás da perna que pulava loucamente para desviar da arma que a perseguia.

A moça partiu para cima com a intenção de encurralar a criatura, mas ela se pôs propositalmente em frente à garota para que ela fosse cortada pela sua própria arma.

Ainda que a espada viesse em alta velocidade, Valentina conseguiu segurá-la pelo cabo e desferiu um golpe contra a Perna Cabeluda, um corte fino de ar que cortaria concreto como se fosse papel.

Mas a perna era astuta, devia ter um cérebro em algum lugar, ela pulou em meia-lua e golpeou a cabeça da garota com o calcanhar.

Argh! — A visão de Valentina quase se apagou.

— Muita atenção nos padrões do seu adversário! — Eirin repreendeu a sua pupila. — Por mais inteligente que um monstro seja, ela ainda é um monstro.

— O que quer dizer? — indagou Valentina.

Todos, até mesmo os duos de Rank S, possuíam hábitos de batalha. No caso dos monstros, principalmente os mais fracos, havia um padrão de ação que era mais fácil de identificar.

"Eu já achei o seu padrão, perna nojenta!" Pelo que Valentina percebeu, aquela perna sempre buscava chutar a sua bunda.

Aquela desgraçada não desperdiçaria uma oportunidade como essa, onde a sua oponente estava atordoada pelo impacto na cabeça.

A garota girou a arma na sua mão, a apontando para a sua própria direção, então girou e cravou a espada na Perna Cabeluda que surgiu atrás dela.

— Te peguei! Hehe! — Uma tempestade de lâminas de ar percorreram a espada, e a perna começou a ser fatiada, pedaços de carne podre que voaram para todos os lados. — Espiral de Sylph!

Ao puxar a espada e o monstro juntos, a tempestade de lâminas se intensificou até dizimar completamente a criatura.

Nem os ossos sobraram.

— Isso dói mesmo. — Valentina passou uma mão na cabeça, onde a criatura a acertou. Um calombo do tamanho de um tomate havia se formado na sua nuca. — Precisa de ajuda?

 Mais ao longe, seu parceiro ainda enfrentava o Saci que virava redemoinho e saltava sem parar.

— Eu me viro! — Ele já estava cansado do joguinho daquele monstro. A sua parceira já havia feito a parte dela, estava na hora de fazer a dele também. — Cabeça do Dragão de Fogo!

Jogou a sua arma com tudo, e a cabeça de um dragão se formou na ponta. Ainda estava mais fraca e mais lenta do que a de Klaus, mas era suficiente para destruir algumas casas no processo.

Infelizmente, o seu adversário foi mais rápido, desviou do ataque e, se aproximando, tirou o cachimbo da boca e soprou uma nuvem de fumaça na cara dele.

Por instinto, o garoto levou uma mão ao nariz, mas agora ele estava perdido no meio de tanta fumaça, e não demorou para que um soco acertasse o seu rosto.

Depois uma cotovelada nas costas, outro soco no rosto de novo, um chute na perna… Estava acontecendo como o seu mestre havia ensinado.

— Pupilo, pupilo — disse Klaus. — O que diferencia um monstro de Rank A para um de Rank S?

— Poder destrutivo, resistência, velocidade e cognição. Os de rank mais alto são superiores em basicamente tudo.

Hmmm! — Klaus colocou as mãos no bolso e encarou o teto da Arena de Treinamento. Andrew, por outro lado, segurava a sua lança e encarava o silêncio do seu mestre. — Pois é! É uma resposta bem teórica.

Claro que seria teórica. Membros de ranks mais baixos normalmente não são postos para enfrentar monstros tão perigosos.

Grande parte do conhecimento que eles têm acerca desses monstros advém das aulas na Academia de Batalha ou quando acabam por esbarrar com algum no campo de batalha.

Para encontrar um monstro de alto nível fora de um portal, seria necessário ir a algum lugar inóspito como o Continente Sombrio de Erebus, o que só um louco pensaria em fazer.

— De um ponto de vista mais específico, monstros de Rank A são desequilibrados.

Hã?

Em termos de força e agilidade, um monstro de Rank S teria esses dois atributos bem elevados, já um de Rank A teria um atributo um elevado e o outro seria mais fraco.

— Então o forte é lento, e o ágil é fraco?

— Por aí. O que importa é saber qual atributo explorar.

Andrew juntou um punho fechado e o outro aberto em frente ao seu peito e fez uma reverência para o Cavalheiro das Chamas.

— Guardarei as suas palavras, mestre!

Mais um soco na cabeça e um chute na costela. Andrew protegia o seu rosto com os braços, apenas recebendo os ataques da criatura que se empolgava a cada golpe.

"Rápido, porém fraco."

Com o tempo, os movimentos do Saci ficaram mais desleixados e previsíveis. O rapaz não simbolizava desafio algum em meio àquela cortina de fumaça.

"Como eu joguei a minha arma fora, você tá abusando, heim?" Mais um soco vinha em direção ao seu rosto, quando ele o segurou com a mão direita. — Te peguei!

Hih? — A criatura puxou seu braço de volta, mas o garoto não iria soltá-lo depois de todo o trabalho que teve.

O monstro desferiu um soco na boca do garoto com a mão que estava livre, e Andrew sentiu o gosto de sangue no seu paladar, mas pouco importava, agora ele estava com a chave da vitória em suas mãos.

— Queime!

Um círculo de fogo se formou ao redor dos dois, e as chamas começaram a girar, subindo em forma de um tornado. Até que apenas o rapaz sobrasse de pé.

— Boa! — Valentina ovacionou o seu parceiro e foi correndo até ele, saltando em seus braços braços envolvendo. — Foi um sucesso!

Por estar com seu rosto colado no peito dele, ela não percebeu as bochechas do rapaz ficando vermelhas.

— Va-Valen… — Ele pensou em fechar o abraço, os seus braços até se moveram em direção à cintura dela, mas quando reparou que alguém os observava, ele desistiu. — Valeu, você também se saiu muito bem.

"Eu nunca ouvi falar desses dois", pensou a espadachim que os observava "Em que posição eles estão no Rank A?"

Então o som de tecido se rasgando tomou conta do lugar, e algumas Rasga-Mortalhas passaram sobrevoando o céu. Até que o seu chiado foi coberto por um zoom incessante.

— Mas o quê…?

Logo um raio de energia verde passou destruindo e queimando o local em que eles estavam, não… na verdade, destruiu a cidade inteira.


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