O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 1 – Arco 4

Capítulo 38: Horizonte de Eventos

Espreitando entre as árvores, os temíveis Wendigos procuravam atentamente pelas figuras de Raizel e Petra.

Nesse ponto, já não era mais como se estivessem emboscando uma simples presa, e sim, disputando território contra outro predador.

 — Essas criaturas são bem persistentes. — Petra já estava para materializar a sua espada e entrar em posição de batalha.

Os seus movimentos demonstravam sutileza e precisão, e a espada encaixava tão bem em sua mão que já havia se tornado uma extensão do seu próprio corpo.

— Poupe esforços. — Raizel estendeu a mão direita para receber a katana negra com marcas vermelhas. — Manifeste-se, Espada do Princípio: Gênesis!

A lâmina começou a vibrar pela quantidade incomum de energia imbuída nela, o suficiente para fazer qualquer outra espada do nefilim se quebrar em pedaços.

Ao sentirem que algo perigoso estava por vir, os Wendigos partiram para cima do rapaz, visando interromper o seu ataque.

— Quarto Ato: — Raizel pegou a espada pela ponta do cabo e a soltou. — Dissonância.

Ao colidir contra o  chão, a espada desferiu vários cortes de energia que cortaram cabeças, braços e pernas dos seus adversários antes que os mesmos pudessem alcançá-lo.

Em um instante, tudo o que restou foi apenas os corpos das dezenas de monstros caídos ao chão  retornando ao seu estado natural de névoa.

— Agora nós podemos criar o seu Espaço Dimensional sem interferências. — O nefilim ergueu um braço e, ao estalar os dedos, uma barreira de energia esférica cobriu os dois. — Você memorizou todo o processo e a imagem do Círculo Dimensional, não foi?

“Ele tem ficado cada vez mais rigoroso. Só me deixou ver o procedimento uma vez e já quer eu execute?"

Petra observou a Espada do Princípio se desmaterializando. Então puxou um pincel do seu anel de ressonância, pronta para dar início ao trabalho.

— Acredito que decorei tudo.

— Que pupila empenhada. Outra pessoa reclamaria por ter que realizar esse processo todo tendo visto o procedimento apenas uma vez.

Ao que o rapaz esboçou um pequeno sorriso, enquanto a observava de canto de olho, a garota congelou por um instante.

— Be-Bem, eu só preciso desenhar o círculo por enquanto, né? — disse, ao passo que já iniciava o desenho.

— Eu reconheço que te pedir para criar um espaço dimensional nessas condições é desafiador. — Colocando as mãos atrás das costas, o rapaz propôs algo enquanto a observava. — Então eu te recompensarei se obtiver sucesso.

Petra ficou pensativa por um momento. Os dois estavam sozinhos naquela ilha já há um bom tempo, então o que ela poderia pedir ali? Será que dava para pedir algo depois que eles saíssem de lá?

— Por outro lado — falou com um tom de voz mais sombrio e com os olhos brilhando em vermelho — se você falhar, sinto que terei que te punir.

Huh? — Sua mão perdeu o apoio e deslizou mais do que devia, fazendo-a errar o desenho. — Me punir?

Por isso seu parceiro escolheu um desafio tão difícil? No fim, ele sempre quis obter a vitória? Mas, se era esse o caso, como ele pretendia puni-la?

Uma vez Valentina lhe disse que todos os homens, até o mais gentil deles, reprimiam desejos profanos dentro dos seus corações e só esperavam o momento certo para dar o bote.

"Lobos devoradores", assim ela os chamava. Os olhos de Petra se voltaram involuntariamente para seu parceiro. Seria ele um...?

"Não, não." Balançando a cabeça para os lados, a garota limpou sua mente dos inúmeros pensamentos que rondavam por ali. Valentina só devia estar brincando com ela. "O que é que eu tô pensando numa hora dessas?"

Após quase meia hora de trabalho árduo, o grande círculo estava pronto. No seu interior, a garota desenhou três estrelas. A estrela maior possuía doze pontas; a média, nove; e a menor, seis.

Para finalizar, extensos escritos em língua arcaica adornavam as bordas do círculo e de cada uma das estrelas.

Ufa! — A garota se sentou no chão, observando o seu trabalho, cansada, mas com brilho nos olhos. — O que achou?

Fosse em estética ou precisão, aquele desenho estava tão perfeito que receberia elogios até mesmo do próprio Designer Polivalente, Trevor.

— É, parece que as minhas chances de vitória são menores do que eu imaginava — disse, levando uma até a cabeça.

Hehe! — Se a dúvida preenchia o coração de Raizel, a confiança se apoderava do de Petra. — Hmm! O que será que eu deveria pedir quando ganhar?

Ela já podia sentir o doce sabor da vitória.

Colocando suas mãos no chão e infundindo energia no Círculo Dimensional, os símbolos brilharam em um tom fraco de prata.

No entanto, voltaram a se apagar antes que qualquer alteração fosse realizada no espaço à sua volta.

A jovem retornou a infundir energia outras vezes, mas o mesmo resultado continuava a se repetir inúmeras e inúmeras vezes.

— Será que eu escrevi alguma dessas palavras antigas da forma errada?

— Está tudo certo. — Como a maior parte das pessoas não possuem afinidade com a Manipulação Espacial, elas geralmente têm dificuldade na hora de criar um Espaço Dimensional. — Geralmente leva alguns dias, eu diria.

"Dias?" A garota observou fixamente os traços no chão enquanto mordia os lábios. Nesse ritmo, era a derrota que a aguardava.

Ao menos, dessa forma, ela descobriria como Raizel pretendia puni-la. Não, isso não vinha ao caso. Ela queria ganhar. Ela tinha que ganhar.

Respirando fundo e soltando tanta energia quanto podia naquela tentativa, a garota fechou os olhos e sentiu um frio tomando a sua mente.

Até parecia que a sua pressão estava abaixando, e ela desmaiaria a qualquer momento. Quando abriu os olhos, ela se viu em meio a um espaço vazio.

Algo semelhante a paredes negras com linhas verdes circundavam o local, formando uma espécie de malha quadriculada. Isso era tudo o que se destacava ali.

— Esse é... o meu Espaço Dimensional?

O rapaz, por sua vez, observava o lugar ao redor como se não acreditasse no que via: um espaço vazio, puro em sua essência.

"Como isso é possível?" Uma das poucas pessoas que abriram caminho para um ramo do espaço em apenas um dia foi ele próprio. "Será influência da sua Chave de Goétia?"

Essa era uma hipótese plausível, contudo ele não sentiu nenhum indício de energia divina ou demoníaca vazando da alma dela.

"Bem, que seja." Retornar à sua expressão original, ele continuou: — Pegue as esferas que absorveram a sua energia no último mês de treinamento nas montanhas Belluno.

Uhum! — A garota se apressou em retirar dez esferas prateadas do seu anel de ressonância.

Na época, os orbes esféricsos eram negros como basalto, mas agora eles refletiam um prateado puro.

A ideia inicial consistia em forçar a alma da garota a produzir mais energia, ao exaurir cada gota de poder que ela tinha. Mas havia um segundo propósito para a energia armazenada ali.

— Use uma para inserir a sua assinatura espiritual.

Caso, isso não fosse feito, ela nunca mais seria capaz de encontrar esse lugar em meio à vastidão do espaço infinito. Além de que o marcava como sua propriedade.

Petra pegou uma das esferas e a quebrou, fazendo a energia acumulada se espalhar pelo lugar e as linhas verdes mudarem para um tom de prata.

— Eu posso vir para cá quando quiser?

— Desde que tenha energia suficiente para cruzar o Caminho, sim.

O Caminho, assim era conhecido o canal que ligava o Espaço Dimensional ao lugar onde o indivíduo estava.

Esse Caminho era algo semelhante ao galho de uma árvore, dessa forma, o tronco era onde o indivíduo se encontrava e a ponta do galho era o Espaço Dimensional.

A única coisa que faltava para completar a assinatura era um nome. Por mais simples que essa etapa parecesse, ela era bem delicada, pois alterar as configurações era ainda mais difícil do que a própria criação.

— O que você acha de "Espaço Gravitacional"?

Hã? — Raizel quase torceu o pescoço ao olhar para a garota. Antes ela nomeou a Bellatrix tão bem, que ele ficou surpreso ao ouvir um nome tão bobo. — Hahahaha!

— Eu sei que não foi um nome muito bom — disse, fazendo beicinho e virando o rosto — mas precisa rir tanto?

— Fo-Foi mal. Hahaha! — O rapaz se esforçou para voltar à sua postura séria, mas a vontade de rir ainda residia lá no fundo do seu ser. — Me fale mais sobre a lei que você pensou, e eu te ajudo com o nome.

O garoto escutou com atenção cada detalhe da explicação da sua companheira. Aquela era de fato uma ideia bem interessante, porém um tanto quanto ousada.

Além disso, ela carregava uma mensagem subliminar que o próprio Raizel não poderia ignorar.

— Essa lei parece uma contramedida pra mim.

Eh! Bem… — Como ela poderia dizer isso de uma forma mais suave? — Se eu for capaz de vencer o mais forte, eu posso vencer qualquer um, certo?

— Errado. — Cada pessoa possuía os seus próprios pontos fracos oriundos da sua Classe de Batalha, Habilidade Inata ou hábitos. — Cada um é cada um.

Um bom Espaço Dimensional era aquele que poderia lidar com qualquer tipo de oponente. No fim, versatilidade contava mais do que poder ofensivo.

Tanto que Raizel criou o Reino das Espadas com um princípio de reação, algo que colocasse o inimigo contra a parede, provocando hesitação e medo psicológico.

Ao saber que poderia perder um braço ou uma perna toda vez que fosse atacar, colocava o inimigo numa situação de animal encurralado.

— De qualquer forma, eu gostei da sua ideia.

Hã? Sério?

— Com algumas pequenas alterações, ele pode ser usado contra qualquer pessoa.

— Obrigada. — Petra baixou seu rosto e juntou as mãos, aliviada.

Por um momento, o pensamento de que seu parceiro ficasse chateado com a ideia dela assombrou a sua mente. Era muito bom saber que ele gostou.

— Quando você estiver experiente com ele, eu quero que teste contra mim, ok? — disse, enquanto colocava a mão na cabeça dela e bagunçava seus cabelos. “Oh! Não vai reclamar dessa vez?”

— Você pensou em algum nome?

— Que tal "Horizonte de Eventos"?

Também conhecido como o ponto de não-retorno, o horizonte de eventos marcava o limite máximo ao redor de um buraco negro, onde qualquer coisa que o ultrapassasse não poderia mais fugir das suas garras impiedosas.

Esse era o destino reservado para aqueles que tivessem o infeliz destino de cair dentro daquele Espaço Dimensional.

— Eu gostei — disse, ao passo que registrava o nome.

Os dois passaram mais algumas horas lá dentro até que Petra terminasse a configuração de forma, tamanho e lei.

A garota usou mais três das esferas de energia que tinha guardado para aumentar o tamanho e definir a forma, já as outras seis, ela usou para escrever a sua lei de funcionamento.

Ainda tinha muito a ser feito até que o Horizonte de Eventos estivesse em condições de ser usado para combate, mas já era uma grande conquista.

Quando retornaram para a ilha em Erebus, Petra sentia que havia dado mais um passo rumo ao Rank S.

— Agora a gente vai caçar alguns mons...? — Os joelhos da garota fraquejaram, e uma sensação amarga veio do fundo do seu estômago em direção à sua garganta, fazendo-a levar a mão à boca.

Antes que caísse de joelhos, Raizel a tomou em seus braços, deixando seus olhos próximos aos dela.

Petra poderia continuar nos braços dele observando aqueles olhos escarlates, ela não reclamaria. Mas isso era algo que duraria apenas por alguns instantes, instantes que ela guardaria em sua memória.

— É melhor descansarmos um pouco. — O rapaz começou a caminhar para a caverna, carregando-a nos braços. — Mesmo que tenha guardado aquelas esferas de energia, forçar a passagem pelo espaço exige uma quantidade insana de poder, senhorita.

Descansando seu rosto sobre o peito dele, a garota pensou: “É tão bom quando você me chama de senhorita, sabe?"

— Então, o que você vai querer como recompensa pela vitória de hoje?

Sim, ele tinha proposto um desafio antes de começarem o procedimento. Todo o trabalho exigiu tanto da sua mente que ela quase se esqueceu disso.

Hmm! Eu ainda não pensei em nada. Mas o que você queria?

Era evidente que Raizel tinha proposto aquilo já com um objetivo bem definido: punir ela.

— Nada de mais — disse, ao que sorria de forma duvidosa para a moça. — Um chupão no pescoço, já tava de bom tamanho.

Huh? — A garota engoliu em seco. Então Valentina estava certa, e ele era um "lobo devorador" mesmo? — Po-Por quê?

— Sinto que se eu marcar você, ninguém vai ter coragem de te roubar de mim.

Marcar? Os anéis de ressonância e os pingentes do sol e da lua que eles compartilhavam já não eram suficientes para isso? Ele ainda queria algo a mais?

Enfiando seu rosto no peito dele, a moça tentou esconder o semblante avermelhado. Delicado, ele tinha que aprender a ser mais delicado nessas horas... ou não.


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