Volume 1 – Arco 4
Capítulo 35: Quimeras-Escorpião
Raizel e Petra andavam atentos por entre as mórbidas e frias árvores da ilha. Todo o cuidado era pouco, uma vez que algumas das árvores haviam se tornado venenosas. Até as folhas tinham enrijecido a ponto de serem tão afiadas quanto bisturis.
— É difícil acreditar que esse lugar algum dia foi habitado por humanos — disse a garota, vendo os restos de algumas construções à frente.
Petra se aproximou de uma das construções e encostou a sua mão naqueles tijolos carcomidos pelo tempo.
— Algum dia os humanos vão recuperar esse lugar? — perguntou, sentindo-se um pouco mal — Esse lugar vai voltar ao normal?
No entanto, a resposta que recebeu estava longe de ser uma das mais otimistas.
— Após tanto tempo, talvez esse já seja o estado "normal".
A garota abaixou um pouco o rosto, mordendo levemente os lábios, em frustração.
As ruínas daquele lugar guardavam os traços da memória de todas as pessoas, de todas as famílias, que ali moraram e dos seus momentos de felicidade.
— Um dia, nós vamos conseguir. — Era difícil aceitar que tudo foi perdido ou devorado por aqueles monstros. — Eu tenho certeza.
Quando voltou a levantar sua cabeça, Raizel estava na sua frente, pronto para lhe dar um peteleco na testa.
Por pouco, a garota conseguiu desviar, fazendo-o acertar o vento.
— Sério! Por que eu inventei de melhorar os seus reflexos?
— Arrependido? — disse com um sorrisinho modesto e inclinando a cabeça para o lado — Eu pensei que era o que você queria.
— Sim — concordou de forma duvidosa. — Mas eu também gosto de provocar você.
— Huh? — indagou, confusa.
— Como eu posso dizer? — Refletiu por um instante, buscando a resposta lá no fundo. — É, de alguma forma, bem satisfatório.
Petra podia sentir o rosto esquentando, mesmo naquele ambiente gelado. Aquele cara sabia como ser assertivo.
Respirando fundo, a moça levou uma mão ao peito esquerdo e proferiu:
— Pois saiba que eu vou continuar a ficar forte. — Então completou com confiança: — E vou ajudar na recuperação deste continente.
— Oh! — disse, ao colocar as mãos nas costas e se virar rumo à mata. — Então é bom que esteja preparada para o teste logo à frente.
Os dois montaram acampamento próximo ao território dos Wendigos, no alto das montanhas. Contudo, próximo à planície leste, estava o objetivo de hoje: as Quimeras-Escorpião.
Criaturas que possuíam as características predominantes de um escorpião, mas com três chifres de bois na cabeça, dentes de leão e patas de cavalo.
Chegando no alto de um penhasco, os dois podiam observar as criaturas medonhas cobrindo todo o território abaixo.
— A gente vai usar o mesmo plano de antes?
— Nunca subestime a inteligência de um monstro de Rank S — alertou o rapaz. — Eles já estão preparados para isso.
Então puxou a garota pela cintura e, com um pequeno giro, a deixou de costas para o penhasco.
— Ra-Rai? — gaguejou, ao passo que ele a inclinava para trás.
— Vai na fé. — E soltou a garota lá de cima.
Em queda livre, Petra se esforçou para segurar um grito. Chamar a atenção daqueles bichos, naquela situação, seria um problema.
Antes que a garota chegasse ao chão, os monstros que estavam mais próximos a perceberam.
Sem demora, as Quimeras-Escorpião avançaram em sua direção para cravarem os ferrões venenosos nela.
Todavia, um Círculo de Propulsão prateado surgiu aos seus pés, mudando a trajetória da garota para cima que, com o auxílio de mais um círculo, disparou e cortou a cauda de uma das criaturas.
Um dos monstros, que estava próxima à garota, rapidamente se apoiou nas suas patas traseiras e levantou o seu tronco para pisoteá-la com as patas da frente.
Contudo, o seu corpo ficou preso em pleno ar, ao que Petra criou um Centro Gravitacional para prender o seu corpo e, em uma bela sequência de golpes, cortou barriga, cauda e cabeça da criatura.
As outras Quimeras-escorpião não demoraram e logo partiram para cima dela batendo os seus dentes raivosamente. Era como ouvir várias pedras batendo umas contra as outras.
No entanto, a garota zerou a gravidade sobre seus corpos, fazendo as criaturas se debaterem de forma desengonçada enquanto flutuavam no ar.
— Hahaha! — Raizel ria enquanto observava a cena patética das quimeras. — Colocar monstros da Classe Destruição numa situação tão ridícula. Que garota cruel.
Já os monstros estavam furiosos e cuspiram um veneno roxo contra Petra. Ser atingido por aquele líquido ácido, seria suficiente para derreter alguém até os ossos.
Então a garota usou a Bellatrix para absorver toda a substância, e a espada emitiu um gracioso brilho azul das suas marcas.
— Agradeço pelo combustível. — Com um corte horizontal, toda a energia foi liberada pela Bellatrix, cortando as pernas de alguns dos monstros que ficaram debatendo-se no chão.
Assim, ela usou uma sequência de Círculos de Propulsão e conseguiu cortar as cabeças das criaturas caídas.
Para se defender das outras Quimeras-escorpião, a moça criou um Escudo de Repulsão, ao passo que respirou fundo e pegou um pouco de ar.
— Uff! Agora! — Rapidamente paralisou os monstros e os decapitou em questão de segundos.
Com todos mortos e se transformando em névoa, Raizel pulou do penhasco e se aproximou da garota que havia cravado a espada no chão e estava inclinada para a frente, com as mãos no joelho.
"No fim, eu nem precisei intervir", pensou, ao passo que um arsenal inteiro, criado acima das nuvens, se desfazia.
O garoto criou uma toalha branca e jogou em cima da cabeça da garota, que estava ofegante e suando.
— Você se saiu bem, senhorita.
— Obrigada. — Por alguma razão, a garota estava com a cara fechada e respondeu sem direito para ele.
"Está magoada comigo?", pensou o nefilim.
Encerradas as coisas por ali, os dois se puseram a caminhar. Mas, mesmo no caminho para o próximo inimigo, Petra ainda continuava com as expressões fechadas
— É melhor desabafar, senhorita — sugeriu o rapaz.
— Você me jogou — disse, em um tom quase inaudível.
— Por gentileza, poderia repetir?
— Você me jogou lá de cima! — reclamou a garota. — Me jogou no meio de um monte de monstros bizarros, sozinha!
— Eu jamais deixaria algo ruim te acontecer, você sabe disso. — As palavras de Raizel silenciaram a garota de imediato. Ele sempre tinha as respostas certas para ela. — O dia em que eu não puder te proteger, será o dia em que terei morrido.
Ouvir isso fazia o coração dela bater mais forte e a deixava um pouco envergonhada, mas, ainda assim, era tão agradável quando ele falava.
"Ele sempre faz meu coração bater tão forte", pensou, sem conseguir olhar para Raizel.
Vendo que a garota ficou em silêncio, e aquela assunto estava encerrado, o rapaz indagou:
— Então, quando você copiou os meus Círculos de Propulsão?
— Eh, bem… — Petra olhou de canto para o rapaz. — Eu achei que combinava bem com o meu estilo de luta. Mas eu só consigo usar alguns em sequência, já você, usa quase que sem parar.
— Ótimo! Só esteja satisfeita quando conseguir usar mais de cem seguidos.
— Ce-Cem?!
— Claro — disse, com um sorriso sádico. Ele já podia pensar em várias formas interessantes de praticar isso com ela.
Na Academia de Batalha Ziz, Valentina se deparou com Eirin observando o famoso Mural de Missões Externas.
Os membros da Academia normalmente costumavam ir para aquele lugar procurar por missões extras, ou seja, dinheiro extra. Então era inusitado ver Eirin ali.
Além disso, Valentina só costumava ir lá pegar missões simples, ela nunca prestou muita atenção no mural em que sua mestra observava, o que continha as missões de alto risco.
— Oi, mestra, tudo bem?
— Ah, Valentina! — Só então, Eirin percebeu a garota ao seu lado. — Você por aqui?
"Acho que quem deveria perguntar isso sou eu", pensou, esboçando um sorriso bobo. — Você está com um pouco mais de tempo livre agora que a frequência dos portais irregulares diminuiu?
Após Trevor e Sophie terem enfrentado Luxúria e capturado alguns prisioneiros, repentinamente a incidência de portais vermelhos caiu um pouco.
— Que nada! Eu tô sem dinheiro mesmo — respondeu sem hesitação, deixando Valentina surpresa. — Como o salário de um Rank S pode acabar tão rápido?!
— Hehe! — Valentina só conseguia esboçar um sorriso sem graça diante daquela cena. "É o que eu gostaria de saber".
— O pior é que o Trevor e a Sophie não querem me emprestar dinheiro, dizendo que eu tenho que gerenciar melhor os meus gastos.
"Talvez eles estejam certos."
— E o Raizel nunca me emprestou dinheiro. Pão duro! Mão de vaca! — reclamou com as mãos fechadas. — Que grandes amigos eu tenho.
— Bem, que missão você vai pegar? — perguntou Valentina, tentando mudar o rumo da conversa.
— Eu estou pensando nessa daqui. — Eirin pegou um dos papéis do mural e entregou para a garota que, de imediato, arregalou os olhos.
O documento falava sobre um serial killer que estava sequestrando garotas da cidade de Sargus.
O indivíduo usava uma Habilidade Inata desconhecida, o que tornava difícil rastreá-lo. Além disso, ele tinha como alvo apenas moças muito bonitas.
— Me-Mestra, isso não é meio perigoso pra você? — perguntou, com insegurança.
— Eu sou uma boa isca, você não acha? — indagou, ao que realizava um giro gracioso para exibir a beleza que, francamente, não lhe faltava. — Qualquer coisa, o meu cavalheiro vai estar lá pra me proteger.
Todavia, quando sua pupila se retirou, a confiança de Eirin gradativamente começou a diminuir.
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