Volume 1 – Arco 2
Capítulo 14: Pesadelo Eterno
Para eliminar o ser que estava logo abaixo, o grupo precisava interagir com a alma dele e destruí-la sem deixar o menor rastro de sua existência, caso contrário o infeliz insistiria em sempre voltar à vida.
Klaus e Eirin foram os primeiros a avançar contra a criatura, aproveitando que ela havia se acalmado um pouco após aquele berro desafinado de tão horrível.
Os dois se aproximaram, um de cada lado, e fincaram suas armas na carne do Pseudoleviatã, infligindo uma explosão de chamas e gelo, ou era o que desejavam.
Os ataques da dupla foram incapazes de ultrapassar o revestimento em forma de armadura do corpo do monstro; parecia ainda mais rígido e duro do que antes.
As chamas e o gelo se dissiparam, forçando Klaus e Eirin a se afastarem antes que o oponente tivesse alguma oportunidade de os contra-atacar.
No entanto, a aberração continuou olhando para cima, na direção daquele que havia pulverizado o seu corpo anterior, apenas o observando ao lado de Trevor e Sophie.
Toda a proteção que revestia aquele corpo imenso havia se condensado para proteger um corpo menor, aumentando a densidade, nem uma estrela o mataria.
A criatura abriu sua mandíbula, revelando um conjunto de dentes extremamente afiados e uma língua bifurcada como a de uma serpente traiçoeira.
Nada mais do que um grunhido incompreensível saiu da boca criatura, que voltou a sua atenção para os dois que estavam mais próximos, especialmente para a lança se Klaus.
Estendeu um braço na direção do lanceiro. A carne do seu próprio corpo escorreu como lama até a palma da sua mão, onde tomou a forma de um bastão negro. A ponta se dividiu em três, dando origem a um tridente de carne endurecida.
Impulsionando-se para a frente, o choque entre o seu tridente e a lança do garoto estava premeditado pelo destino.
As ondas de impacto quase separaram as chamas da haste da arma de Klaus. Por um momento, o nefilim realmente pensou que elas poderiam ser apagadas, as chamas divinas.
"Como pode ter tanta força?!" O corpo do rapaz foi pressionado para baixo, abrindo uma cratera no chão, enquanto fragmentos do solo saltavam para cima. “Ele mal acabou de retornar, porra!”
Eirin se esgueirou pelas costas da criatura, mas antes que ela pudesse fazer algo, o Pseudoleviatã mudou a base dos seus pés e se virou contra ela.
O boss lançou o garoto para o lado e, logo em seguida, o seu tridente já estava para acertar as costelas da moça.
Eirin teve que mudar a trajetória da sua espada para conseguir defender o golpe abrupto, ainda assim, foi arremessada para longe.
Em um piscar de olhos, o seu inimigo já estava diante dela e pronto para realizar o próximo movimento, visando o peito dela.
Mais acima, os outros três observavam o desenrolar da luta com atenção, com foco especial para a evolução da aberração.
— Mas o que aconteceu aqui? — indagou-se Trevor. — Mais rápido, mais ágil, mais forte, mais resistente. Ainda é a mesma criatura de antes?
— É como se a morte tivesse desencadeado a evolução. — Sophie estava com uma mão no queixo, reflexiva. Imaginava todas as alternativas possíveis. — Tipo a recuperação dos músculos após um exercício.
— Então, explodir ele de novo só causaria mais problemas? — comentou Raizel, enquanto puxava a luva da sua mão direita, pressionando-a contra o pulso. — É, parece que vamos ter que pegar um pouco mais pesado dessa vez.
Os pés do Pseudoleviatã congelaram durante a sua investida. Tentar se soltar do gelo em zero absoluto foi em vão. O mesmo se repetiu em seus pulsos, dessa vez com algemas e correntes que iam até o chão.
Klaus aproveitou a chance e se preparou, mais uma vez, para fincar sua lança em chamas na criatura; todavia, o boss abriu sua boca; não para facilitar o objetivo do rapaz, mas para liberar um Rugido Elétrico.
Determinado, Klaus se manteve firme ao chão e cortou o ataque, dividindo-o em dois, os quais passaram chiando pelas suas laterais.
Ao redor, restava apenas um terreno devastado. Faíscas de eletricidade estralavam no chão, fazendo os pelos dos braços do rapaz se eriçarem.
Então o solo assumiu um aspecto de lama flácida, e o corpo do nefilim afundou bem rápido.
— Manipulação de…? — Um punho de pedra surgiu e o acertou bem no queixo. — Argh! Chifrudo!
Uma explosão de labaredas precedeu a explosão do solo ao redor. Enfim livre, Klaus se impulsionou com as chamas ardentes e deu a volta até às costas do monstro, que se safou por uma fenda dimensional.
— Tsc!
Foi quando, para o desespero de Klaus, sua ressonância com Eirin bateu forte em seu peito.
Perigo!
O monstro havia ignorado ele e atacado a moça pelas costas. Sangue escorria pela barriga dela, junto das pontas do tridente.
Ignorando qualquer risco, o nefilim avançou imediatamente, mas a criatura se esgueirou pelas dimensões de novo.
— Esse puto...!
Um braço saiu de uma fenda dimensional, tomado por faíscas elétricas crepitantes, bem atrás do pescoço do rapaz, jogando-o contra o chão, com o pescoço eletrocutado.
Não havia dúvidas, aquela criatura estava lutando de forma estratégica. Mais do que fisicamente, também evoluiu o intelecto.
— Ma-Ma-Ma… — O monstro gaguejou enquanto se preparava para fincar seu tridente no pescoço do garoto.
Paralisado pela eletricidade incômoda que percorria a sua nuca, Klaus estava incapaz de se proteger. Tão vulnerável quanto uma ovelha ferida que contemplava as presas do lobo maligno.
Do nada, correntes douradas surgiram para segurar os braços e as pernas do monstro, obrigando-o a se jogar de qualquer jeito para trás.
Os seus instintos gritavam que deveria evitar aquelas amarras por tudo que havia de mais sombrio. Com isso em mente, distanciou-se. Foi inútil. Logo Raizel foi teletransportado bem nas suas costas.
A Espada do Princípio carregava um brilho intenso e concentrado no fio da lâmina.
— Terceiro ato… — Uma linha vermelha, mais rápida que um piscar de olhos e tão fina quanto um fio de cabelo, seguiu o movimento da espada. — Presto!
Infelizmente, a armadura do monstro se mostrou mais eficiente do que a técnica de Raizel, ficando apenas com um corte superficial.
O espaço logo atrás do boss, por sua vez, não podia se gabar do mesmo. O tecido do espaço foi dividido, abrindo lugar para um vazio de nada absoluto.
A criatura passou os dedos pela linha em seu peito e, orgulhosa de si, sorriu; ela era mais difícil de cortar do que o próprio espaço.
Quando o Pseudoleviatã voltou a olhar para o seu inimigo, um pilar negro o atingiu no rosto e o jogou para dentro da fenda dimensional do corte.
— Dormindo em serviço, bichão? — debochou o nefilim.
Trevor se encarregou de fechar o estrago causado pelo seu companheiro. Mas todos sabiam que era apenas questão de tempo até que a aberração retornasse.
— Foquem nos braços e pernas — disse Raizel, dirigindo-se para os dois que estavam perto dele.
Seus corpos emanavam um brilho em verde-claro: Sophie se encarregou de curar seus ferimentos retornando o tempo deles.
— É fácil falar — praguejou Klaus.
— Que cara é essa? Alegrem-se.
— Pelo quê?!
— Hoje é o dia em que nós mataremos… — Então a criatura abriu uma nova passagem pelo espaço nas suas costas; Raizel girou seu corpo e rebateu o tridente com ímpeto. — Um ser imortal!
Nesse momento, o Pseudoleviatã foi envolvido pelo brilho verde da técnica de Sophie e distraiu-se por alguns milésimos de segundos.
Tempo suficiente.
— Legato! — A broca espiral atingiu a parte de trás do joelho da criatura fazendo-a perder o equilíbrio.
Foi a vez de Trevor entrar em cena, surgindo na frente do monstro. Em pleno ar, realizou um corte com a sua espada, que foi facilmente defendido pelo tridente.
Contudo, por ter perdido o equilíbrio, a criatura foi jogada bruscamente contra o chão, e incontáveis cortes surgiram de todas as direções, bombardeando-a sem dar qualquer chance de defesa.
— Corte Multidimensional. — Ao multiplicar sua técnica através das dimensões, Trevor atacou o adversário com vários cortes de mesma potência, realizando um único movimento.
Uma vez caído por causa da combinação das técnicas, uma corrente conseguiu prender uma das pernas do boss; logo ele tentou se soltar, mas estava longe de ser uma tarefa fácil.
As Cadeias de Abaddon foram forjadas no Reino Divino; um armamento produzido por Abaddon, antes de se tornar um anjo caído, para enfrentar os demônios.
Aquelas correntes possuíam a propriedade de se tornarem mais resistentes ao absorverem a energia demoníaca.
Quanto mais poder demoníaco absorviam, mais perdiam o seu aspecto dourado e adquiriam uma coloração escura.
Normalmente, seriam pouco efetivas contra o Leviatã verdadeiro, pois foi criado a partir da Escuridão Primordial.
Contudo, contra um farsante, a coisa era diferente. Em pouco tempo, o restante das correntes conseguiram prender os demais membros da criatura.
Eirin, que tinha acabado de ser curada por Sophie, realizou a sua contribuição. O gelo em zero absoluto percorreu as correntes que prendiam os membros do monstro. Por baixo daquele revestimento, seu corpo começou a congelar.
Raizel estendeu o braço para um arco negro com entalhes vermelhos que acabara de se materializar. Olhou para Sophie, que estava esforçando-se para manter o efeito da sua técnica e, por consequência, estava impossibilitada de usar o seu arco.
Se era o caso, então Raizel faria o disparo da flecha no lugar da amiga.
— Aguilhão dos Céus! — A flecha disparada carregava uma quantidade de energia divina descomunal. Em resposta, Klaus também lançou a Chama da Glória.
Uma explosão devastadora e ardente tomou conta do lugar, crepitando de faíscas, ao menos, até Trevor moldar o espaço para concentrar todo o caos nos braços e pernas do monstro.
Quatro furações giraram freneticamente nos membros da criatura. Ela se contorcia tentando se soltar das suas amarras.
Tentativa falha.
Mesmo com tudo aquilo, a sua armadura continuava intacta. Pelo menos, até que o brilho verde da técnica de Sophie desapareceu do seu corpo.
Em instantes, braços e pernas se despedaçaram. Apenas o tronco e a cabeça restaram pairando em pleno ar.
Retenção Temporal.
Diferente da Paralisia Temporal, que congelava algo no tempo, a Retenção congelava o dano do corpo do indivíduo. Enquanto a técnica estivesse ativa, o alvo não sofreria dano. Todavia, quando a técnica era desfeita, todo o dano acumulado seria desencadeado de uma vez só.
Considerando o efeito do choque térmico causado pelo zero absoluto e pelo calor de uma chama divina, até mesmo aquele corpo absurdo de resistente teve que ceder.
— Manifeste-se! — Raizel impulsionou-se até o monstro, usando um Círculo de Propulsão. A Espada do Princípio foi desfeita, cedendo o seu lugar para…
Cercado, quebrado e prestes a ser derrotado, o Pseudoleviatã, em um ato de puro desespero, conseguiu organizar as suas primeiras palavras.
Um som rouco e grave foi pronunciado: — Pe-Pesadelo… Eterno!
A um triz de finalizarem tudo, os cinco adversários foram atingidos por uma devastadora onda de choque que abalou o ambiente e os empurrou para trás.
Sem que percebessem, seus músculos relaxaram, suas respirações caíram e, o pior de tudo, suas consciências… se foram.