Volume 1

Capítulo 9: O Plano

— Esse cara não vai falar. Devíamos ter planejado mais — disse Mármore, coçando a nuca.

Loreley continuava sentada de maneira completamente preguiçosa, pensando muito em alguma forma de arrancar informações de Strings.

— Eu disse. Prefiro morrer do que falar algo pra vocês, lixos! — gritou, e cuspiu no sapato de Mármore.

— Será mesmo?

Valentim voltou, tinha um livro empoeirado em mãos. Loreley imediatamente notou algo incomum. Estava calmo demais, e com o sorriso de sempre.

— Não está pensando em nada errado, não é, Faísca?

— Sr. Strings — aproximou-se Valentim —, é um prazer revê-lo. Percebi que meus parceiros não tiveram muito sucesso. Por isso, fui buscar nossa carta na manga.

Loreley comprimiu os olhos em desconfiança. Mármore nem chegou a escutar, já que estava engraxando loucamente o seu sapato.

Valentim abriu espaço. De trás dele, saiu Louise, idêntica à apresentação de mais cedo, tirando que parecia um pouco mais baixa. Estava amordaçada e com os pulsos amarrados com uma corda velha.

— Louise?! Ah, não! Soltem-na, agora! Como vocês... — Strings pensou por um momento. — Você a capturou no meio da apresentação?!

Loreley rapidamente ajeitou a postura e estava prestes a gritar com Valentim, porém o ruivo lançou um olhar fixo a ela, que a fez pensar duas vezes.

— Loreley, pode colocar o livro no lugar certo? Ele caiu junto com as outras tralhas lá trás, na área dos metais.

— Tá, é claro... — Ela pegou o livro e virou-se para cumprir o pedido.

Enquanto se encaminhava para a prateleira dos livros, espiou a capa, confirmando sua desconfiança. No título do livro constava:

Não é ela de verdade. Confie em mim.

Pôs o livro na prateleira e sentou-se desleixada novamente, em silêncio.

— Então, vou começar a perguntar, tudo bem? — Valentim puxou a falsa Louise para perto, que veio em pequenos grunhidos. E enfim, ordenou olhando para Strings: — Kathari Alitheia.

O símbolo foi lentamente voando até o homem, e sumiu quando tocou seu peito. Mármore, que terminara de engraxar sua bota, estava imóvel observando a situação.

— Em que parte da Torre está o medalhão? — questionou Valentim.

— E o Necronomicon — jogou Loreley.

Strings suava muito. E estava rosado de tão forte que seu coração batia. No fim, se recusou a responder.

Valentim apanhou um CD velho na estante e o partiu em dois. Jogou uma das partes no chão e apontou a ponta afiada do outro para a nuca da falsa Louise.

— Certo! Não a machuque! Está bem! — gritou Strings, e fez uma pausa ofegante. — Ambos são itens de poder nível cinco, e costumavam ficar no nível mais baixo da Torre.

— Costumavam? — disse Valentim.

— É! Não sei onde está agora. Ainda pode estar lá... é que... uma mudança de local vai ser feita.

“Depois de tanta comoção, o Governo decidiu transferi-los para um lugar mais seguro. Os dez itens que lá estão serão escoltados pela tropa de proteção e segurança, ou seja, você, Loreley!”

Ela arregalou os olhos em espanto. O galpão ficou em um fino silêncio por alguns segundos.

— Quando isso foi decidido? — perguntou Mármore.

— Hoje, numa reunião de emergência.

— E quando será feita a escolta?

— Nesse sábado, daqui dois dias.

— Não precisamos fazer mais perguntas — Valentim soltou a outra parte do CD e se aproximou de Strings, fazendo um símbolo demorado. — Kathari Mnimi.

O símbolo adentrou a cabeça do homem, que imediatamente apagou. Ficou imóvel no chão.

— As memórias dessa noite estão sendo excluídas. Ele vai ficar nesse estado vegetativo por alguns minutos.

Loreley levantou, pôs a mão na cintura e bufou.

— Se importa de explicar quem diabos é essa pessoa? — apontou para a Louise.

Valentim foi até a falsa Louise e livrou seus pulsos. No momento que retirou a fita que a impossibilitava de falar, ela começou.

— Você ia enfiar esse CD na minha nuca mesmo, não ia? Não hesitou um momento sequer, deplorável.

— Esta é Juliette, filha do meu parceiro — disse ele, enquanto desenhava um símbolo que fez os cabelos dela voltarem a serem louros e reaparecer o vestido muito branco, assim como salto alto.

— É um prazer, Loreley. Ouvi falar muito de você. Não, na verdade, minha mãe ouviu. O pessoal do Governo vivia falando que você é brilhante e blá blá blá.

— Ah, que isso! O prazer é todo meu. E como a sua mãe ficou sabendo de mim?

— Ela é um dúplice, Loreley. Herdou as memórias da mãe.

— Um dúplice?! — gritaram Mármore e Loreley.

Juliette tinha uma feição preguiçosa, decidiu sentar-se na cadeira em que Loreley estava segundos atrás, caminhando enquanto o silêncio do espanto tomava conta do galpão. Enfim, puxou o vestido para baixo e jogou-se na cadeira.

— É. Um dúplice. Não se preocupem, ela não vai ser um incômodo. A mãe dela deve ter feito algo realmente ruim pra ter a filha amaldiçoada. Um roubo que nem o que estamos planejando deve ser um só um passatempo divertido para ela.

— Se você é realmente um dúplice, queridinha, você pode... 

— Me separar em duas? — Juliette fez seu segundo corpo surgir à frente dela, levantada.

— Vai, vamos um pedra-papel-tesoura! — disse a Juliette da frente, enquanto a de trás tampava os olhos com as mãos.

Estranhamente animada com a ideia, Loreley aceitou, e ganhou de Juliette colocando pedra.

— Perdi. E ainda dizem que tesoura sempre vence... — disse a Juliette de trás, tirando a mão dos olhos.

— Então ela realmente compartilha tudo... — Mármore se aproximou. — Certo, mas o que diabos ela está fazendo aqui, Valentim?

— Ela quase foi sequestrada hoje. Ficaram sabendo do atentado no teatro? Quase a levaram. Aí o pai dela me fez passar uma noite com ela. E ela acabou me chantageou para levá-la até aqui, só que a deixei trancada no carro. Eu deveria ter usado um símbolo mais poderoso, não achei que conseguiria sair.

— Recebemos uma queixa sobre o sequestro — disse Loreley. — Um homem meio maluco ficou falando as coisas rápido demais, foi difícil fazer o relatório.

— Com certeza foi o papai...

— Aliás, você vai ter que ir com ele amanhã contar o que aconteceu lá no teatro. Se nos encontrarmos, eu te dou um oi.

— Você não tem juízo mesmo, Loreley. Vocês não se conhecem, esqueçam o que aconteceu aqui — comentou duramente Valentim. — Enfim, não temos tempo de arranjar informações sobre a torre, vamos ter que roubar o Medalhão no dia que forem transportar.

— E o Necronomicon — repetiu Loreley. — Se vai ser a minha área que vai transportar, temos uma grande vantagem.

Valentim e Mámore puxaram uma cadeira para cada, e Loreley expulsou Juliette da cadeira em que estava. Sem escolha, as dúplices deitaram no chão gelado de barriga para cima. Os três amigos de infância discutiram muito, a ponto de fazer Juliette parar de prestar atenção e contar quantas prateleiras tinham ali. De tanto tempo que passou, também contou os livros empoeirados, brincou de pega-pega com sua cópia e chegou a cochilar brevemente.

— Então é isso — concluiu Valentim. — Repitam o plano mentalmente enquanto estiverem em casa, qualquer erro resulta na nossa falha.

— Você tem que relaxar, cara. Devia brincar de pega-pega com a Juliette um pouco. — disse Loreley, e depois gargalhou da própria piada.

— Bom, não temos muito com o que trabalhar, já que os detalhes do transporte nós saberemos amanhã. Eu te dou um toque caso tenhamos que mudar algo — disse Mármore.

— Enfim, terminamos por aqui. — Valentim levantou-se. — Mármore, conto contigo para deixar o Strings em um local que não levante suspeitas. Vocês duas vêm comigo.

O ruivo apanhou as duas Juliettes pelos braços e começou a arrastá-las para a saída.

— Sai! Me solta! MEU BRAÇO! — Juliette esperneou loucamente, sem sucesso.

— Beleza, Valentim. Vejo você depois.

O detetive, ainda arrastando as duas, deixou o galpão.



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