Escolhido Brasileira

Autor(a): Bárion Mey


Volume 1

Capítulo 10

Arlo

A manhã está agitada. Os soldados correm de um lado para o outro desmontando as tendas e ajudando os feridos. O sol está nascendo, o ar desta manhã está úmido, e as nuvens se acalmam. Por outro lado, sinto uma energia negativa vindo de alguém. O garoto está parado ali já faz uns cinco minutos, será que ele está bem?

Claro que não, o velho o ajudou independente da situação. Isso deve estar sendo difícil pra ele. Agnes se aproxima dele por trás, parece que ela sugou um pouco da negatividade, está tão triste quanto ele. Consigo escutá-los daqui.

— Sinto muito, sabe…, por seu amigo — fala, apertando forte um dos braços.

— Não se importe muito com isso. — Ele desvia o olhar para baixo, cerrando os punhos. — Só… estou triste que não consegui retribuir um favor.

Ela não fala mais nada, apenas fica ao seu lado. Observo distante me lembrando da primeira vez que vi o velho Fly e o que fez por esse garoto. Três soldados se aproximam, levantam seu corpo e o colocam em uma cova. Quatro pessoas morreram somente nessas noites, não sei dizer se o restante conseguirá aguentar até Dream. Um dia e meio de viagem, hein?!

— Garoto. — Me aproximo devagar. — Posso ter uma conversa com você? — Encaro Agnes. — A sós.

Ele concorda balançando o rosto. Agnes sai do seu lado e caminha até os soldados para ajudar a pegar água em um riacho próximo. Vou até uma parte da floresta, sem olhar para trás, seguindo reto, passando por uma entrada de arbustos vermelhos até chegar em um local isolado.

Essa sensação inquietante não some. Parece que estou sendo analisado a cada passo que dou. Quero olhar para trás…, mas que sentimento estranho é esse? É como ter um animal selvagem analisando cada movimento seu, decidindo a hora de atacar. Haah…, acalme-se, Arlo, ele é apenas uma criança.

— Vou tentar ser claro. — Viro de frente para ele. — Quem… exatamente é você? — Para por um instante, me olhando confuso. Parece estar se fazendo a mesma pergunta. — Você não é uma criança comum. Não importa como eu pense, é impossível chegar em uma conclusão de como você pode ser tão calmo em situações extremas. Sem dizer sua enorme sorte de estar vivo depois de tudo o que passou. — Hesito por uns segundos, me lamentando. — Raios, não importa como eu pense que isso é impossível, mas…, me diga…, você é uma criança despertada?

Minha voz engrossa por um momento e, sem querer, deixo escapar um pouco de mana. Estou sendo cauteloso com uma mera criança? O que estou pensando, por Dream. Ele me encara de volta, até parece estar analisando uma resposta.

— Não minta para mim.

— Olha… Mesmo que diga isso… — Luke respira fundo, se acalmando. — Não tenho garantias se posso confiar em você!

Estou surpreso. Essa criança não tem ideia de com quem está falando. Sim, deve ser isso, é apenas uma criança ainda…, mas…

— Não vou cair nesse joguinho.

— E também ouvi dizer que crianças só despertam aos nove anos… e que ninguém nunca ouviu falar de uma criança com cinco anos despertar.

Cinco anos? Isso é ainda mais improvável. Como diachos sobreviveu a tudo aquilo com essa idade? Deveria ter sido o primeiro a morrer… algo não bate.

— Senhor general, sou apenas um garoto que teve o azar de nascer nas partes mais profundas de Dream. Um lugar onde nem mesmo os cavaleiros querem ir, nos subúrbios de Hynder, é de lá que sou. Da parte mais suja daquela periferia. Ainda acha que sou especial?

Estou mesmo enganado? Realmente não consigo sentir nenhuma partícula de mana vindo dele, nem mesmo enxergo seu núcleo, isso deve ser um engano. Onde estou com a cabeça…

— Você pode estar certo…

Luke

Que merda foi essa?! O que dá em um cara de fazer uma pergunta dessas para uma criança? Duvido que alguma responderia algo concreto em uma situação dessas. Saio da floresta e me deparo com Agnes me esperando escorada em uma árvore.

— Ei… O que meu mestre queria com você?

— Não foi nada, apenas queria dizer palavras de conforto para me acalmar.

Tenho certeza de que essa mentira não a pegou, mas não tenho o porquê contar pra ela. Pensei que continuaria insistindo, mas ficou por isso mesmo. Ela apenas sorri, dizendo que sente muito novamente.

Apesar do seu jeito enérgico e irritante de ficar grudada em mim o tempo inteiro, posso dizer que estou sentindo um pouco de afeto. Ela nem me conhece, mas tentou me confortar e cuidou de mim como se eu fosse um irmão. Céus, você realmente parece uma irmãzona.

— Posso fazer uma pergunta?

Ela me olha preocupada.

— Pode, eu acho.

— Generais… o quão forte eles são?

— Bem… — Ela pensa por alguns segundos. — Tão fortes que chegam a ser assustadores…

Observo Arlo andando ereto e sempre olhando para frente, sem abaixar a cabeça. Quem será que venceria: as três lanças de Yuhai ou os generais de Dream?

— Meu mestre é o quarto general de Dream, ele por si só já é um monstro e tanto.

— Como se faz para obter esse título?

— Bem…

— Você tem que ser o mais forte — responde Arlo. — Se torne o mais forte e desafie um de nós.

Agnes fica meio sem jeito, percebo pelo seu sorriso. Ser o mais forte, hein?! Posso fazer isso. Preciso me tornar mais poderoso do que na minha vida passada, só assim não dependerei da força de ninguém para vencer um inimigo forte.

— E quem seria o general mais forte?

— Para que uma criança… — Arlo hesita, parando no meio do caminho, enquanto os soldados e o restante dos feridos passam por ele, soltando uma respiração pesada. — O general mais forte é Balduin, uma pessoa além da compreensão humana.

Um sorriso me escapa.

— Então… tenho que superar esse tal de Balduin para ser o mais forte? Interessante — murmuro para mim mesmo, porém alguns soldados escutam.

— Que gracinha! — diz um dos soldados rindo.

Ele é um jovem de aproximadamente dezenove anos, cabelos curtos e amarelados, olhos castanhos e uma pele lisa, meio bronzeado. Tenho certeza de que minha declaração parece mais com uma piada de bom gosto, mas… analiso cada soldado em volta. Esse soldadinho dá um passo para trás ao ver minha expressão sombria. Arlo ainda continua me observando, dessa vez com um sorriso no rosto.

Agora, como posso ser mais forte que esses caras? Se algo acontecer, eles realmente vão ser de alguma ajuda?

Já faz algumas horas que começamos a nos mover. Os soldados estão cansados, e os feridos… escuto um baque no chão. Olho para trás e duas pessoas estão caídas.

— Ajudem aqui! — grita um mago.

Agnes segura minha mão e novamente me dá outro sorriso triste. Sei o que está pensando. Em condições normais, não era nem para eu estar vivo. O mago abre mais duas covas, enterrando os homens que morreram.

Após um dia e meio de viagem, avisto a estrada, acima da colina. Seu final é coberto por duas árvores grossas entrelaçadas, dando espaço apenas para a passagem de pessoas ou carroças. Suas folhas são verdes, acompanhadas por lindas flores roxas.

— Finalmente chegamos na entrada MovRoumpínia — fala Agnes. Ela parece ter certeza de que sei do que está falando e me olha esperando algum tipo de reação.

— O que tem essa entrada? — Minha pergunta a deixa surpresa. — O que foi? Não recebemos a mesma educação.

— Chocada com sua sinceridade… — Agnes suspira. — Pois bem, darei uma aulinha especial, já que sou sua irmãzona. — Aponta o dedo para as duas árvores. — A entrada MovRoumpínia é a representação de que você está no território de Dream. Elas não necessariamente ficam cruzadas como estão estas. — Coloca um braço por cima do meu ombro, enaltecendo seu sorriso. — As árvores MovRoumpínia só nascem no território de Dream, então podem estar em qualquer lugar daqui.

— Entendi…

— Entendeu mesmo? — questiona meu raciocínio. — Se quiser, explico de novo.

— Quem pensa que sou? — resmungo dando saltos para ficar na mesma altura que seus olhos.

Quando chegamos no topo da colina, a luz do sol dourado daquela tarde cega meus olhos e começa a se pôr atrás de uma grande muralha. Ela rodeia quase toda a extensão em volta das cidades urbanas. Hum? Está incompleta. Vejo pequenos pontos pretos no topo da barreira, julgo serem construtores. Já sei porque não deu para vê-la nas periferias.

E de fato, é como Agnes disse. As árvores MovRoumpínia nascem em locais aleatórios de Dream. Dois guardas protegem o final da ponte, que passa por cima de um rio e interliga até a entrada do império de Dream.

Ela é feita de pisos quadriculados e, antes de chegar no meio, é possível ver os mesmos pisos formarem um leão em pé, com uma enorme juba e dentes gigantes rugindo. Quem fez isso teve uma ótima ideia.

Os dois vigias dão um passo à frente, ambos segurando os cabos de suas espadas. Os soldados que vieram comigo não possuem nenhum brasão, até entendo o porquê dessa comoção.

— Parem! — fala um deles. Ele se aproxima mais de nós. — Quem são vocês… — O guarda é mais baixo que o general. Ele olha para cima, tremendo-se pelo olhar peculiar de Arlo. — Senhor Arlo… Eu… Eu não, não imaginava que viria tão rápido.

O general permanece quieto, apenas o encara por alguns segundos.

— Peçam para abrir o portão da ala Sul.

— Si-sim, claro, claro que sim.

Com um gesto simples, o enorme portão de madeira começa a se mexer, suas duas partes abrem para lados opostos. Continuamos a nos mover, e Agnes permanece segurando minha mão desde a saída do acampamento bárbaro, há um dia e meio. Passando pelo portão, percebo os olhares e mantenho a cabeça baixa, andando em linha reta pelas barracas de frutas, armas e roupas.

Sei que é bem provável me mandarem para um lar de crianças sem teto, até que eu alcance a maior idade e consiga me manter sozinho. Sem família, sem um lugar para onde ir. Não tive nem sinal da Lúcia nesses tempos. Será que ela está viva, ou… Haah, só de pensar me dá tremedeiras.

— Ei. — Agnes se ajoelha na minha frente, fazendo uma cara patética de típica despedida, em que nunca mais nos veremos novamente. — Tem algum lugar para ir? — Arlo me observa intrigado.

Permaneço quieto, olhando seus olhos roxos profundamente. Claro, um abrigo não é uma má ideia, poderei fazer o que quiser sem restrições. Sem ninguém para me preocupar, poder fazer minhas loucuras em paz…

— Por acaso você não teria nenhum parente próximo no Império? — pergunta Arlo. — Posso levá-lo até lá. Com certeza seria melhor que um abrigo.

— Acredite, não há ninguém.

Por um momento parece demonstrar um sentimento de empatia. Não preciso disso, vivi cinco anos apenas com Lúcia ao meu lado. Tenho certeza de que, se houvesse outro parente de sangue, não viveríamos naquela situação medíocre.

— Se quiser, você pode vir comigo… Claro, se quiser. — O olhar firme e cheio de brilho de Agnes desaparece aos poucos, sendo consumido por uma vontade de querer chorar. — Minha casa é bem grande, e tenho certeza de que meu pai deixaria.

O quê? Ela está mesmo me fazendo uma oferta dessa?

— Não precisa, estou bem.

— Não. — Ela aperta meus ombros. — Quero que venha comigo. — Levanta-se, segurando minha mão. — Será muito melhor que um abrigo.

— Eu…

— Mais nenhum piu. Você vem comigo.

— Tem certeza disso, Agnes? Você nem conhece este garoto — Arlo comenta.

— Sim, não posso simplesmente deixá-lo nessa situação. Meu pai com certeza irá concordar.

Arlo apenas desiste, assim como eu. Pelo visto, quando essa garota coloca algo na cabeça, é difícil fazê-la mudar de opinião. O general fica quieto e segue em frente, gesticulando com a mão para que os soldados o acompanhem.

— Agnes, vá direto para casa.

— Sim, mestre.

 


 

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