O Druida Lendário Brasileira

Autor(a): Raphael Fiamoncini


Volume 1

Capítulo 46: Um Plano Muito Arriscado

No alto do Platô Cerimonial, uma luta era travada em meio à chuva trazida pelas nuvens negras de uma tarde escura e relampejante.

Os mais de sessenta ursos do santuário estavam reunidos em torno da grande arena localizada no ponto mais alto do refúgio.

Hardgart estava acuado em um canto dessa arena, gemendo de dor, com a pata frontal direita dilacerada e o resto do corpo coberto em sangue. E graças a chuva, o líquido vermelho escorria por seus pelos até escoar para a poça de seu próprio sangue.

Um relâmpago cruzou os céus, pulverizando uma árvore próxima. O estalo do trovão apavorou a todos com sua força, e o mais assustado, o pequeno urso pardo manco de uma perna, chorava copiosamente, soluçando e berrando pela piedade do grande urso de ferro que agredia seu pai.

O que começou com uma luta, virou um massacre.

Os pardos estavam incrédulos, desesperançosos e em negação à realidade diante de seus olhos. Do outro lado da arena estavam os reis do santuário, os poderosos ursos negros com suas patas de ferro, corpos avantajados, olhos vermelhos e expressões maquiavélicas.

E entre os dois grupos, Ragnar via àquilo tudo sem fazer nada. As gotas da chuva caiam em seu corpo inerte. Sua mente fora dominada pelo medo e pela dor do pequeno urso manco.

Em um estalar de dedos a chuva parou e o sol encontrou caminho entre as nuvens negras.

Hardgart se levantou nas duas patas traseiras, desafiando o grande urso de ferro para o tudo ou nada. Ragnar foi tomada pela esperança, mas o grande urso pardo tomou todos os golpes sem revidar, na esperança que Torvell percebesse estar fazendo a coisa errada.

O grande urso de ferro se ergueu, ficando a poucos centímetros de Hardgart. E com os dois próximos um do outro, se encarando, Ragnar viu em primeira mão um comparativo da grandiosidade de um urso de ferro.

Torvell não parecia comovido com a parcimônia de Hardgart, pelo contrário, uma expressão sádica se formou em seus olhos vermelhos.

Então ergueu a pata direita. Os raios de sol voltaram a ser abafados pelas nuvens negras. Um raio forte e amedrontador cruzou os céus atrás de Torvell, que canalizou todo seu ódio e crueldade em uma patada desferida com toda sua força.

As camadas de ferro da pata refletiram a luz do relâmpago.

Foi tudo muito rápido. A pata de Torvell estava embebida em sangue, carne e uma porção de restos mortais. Hardgart foi ao chão. Mikken mancou para perto do pai, e a visão do urso com a face arrancada o fez gritar o lamento mais estridente, triste e apavorante que o jogador por trás de Ragnar já testemunhou em seus 26 anos de vida.

Daniel acordou em um sobressalto

— Que merda foi essa? — falou para sim mesmo em meio a escuridão do quarto.

Estava quente demais. Ele se revirou na cama e afastou o lençol fino e úmido para o lado, mas não foi o bastante para aliviar o desconforto. Sua respiração pesava. Tanto o rosto quanto os braços e o torso descoberto estavam empapados em suor.

Ele se levantou, foi até a janela do quatro e abriu-a com um puxão. Uma rajada de ar adentrou no cômodo e refrescou o corpo quente e suado de Daniel, que logo fora acometido pelo fedor pujante de sua transpiração.

Sentiu sede, então se dirigiu à cozinho do apartamento sem ligar uma luz sequer. Abriu a geladeira, saciou a sede com fartas goladas de sua garrafa d’água e decidiu voltar para o quarto. Porém, ao passar pela sala, a visão da lua transparecendo no vidro da sacana o fez mudar de ideia.

Ele foi até lá, abriu a porta de correr e caminhou descalço sobre o piso gelado do lado de fora.

— O que foi aquilo? — questionou a lua a respeito daquele estranho pesadelo.

Seus olhos lacrimejaram, mas não ele sabia direito o porquê. Aquele pesadelo terrível não saia da cabeça. Mikken chorando pela morte do pai, uma cena que o tocou profundamente. Uma lembrança marcada à ferro em seu consciente: o berro de dor daquele pequeno urso manco que acabara de ficar órfão.

— É só um jogo, tudo não passa de um jogo — repetiu para si mesmo.

A imagem de Hardgart ferido, ensanguentado, mas resiliente à crueldade de Torvell, voltou para atormentá-lo.

Está tudo bem. Foi apenas um sonho, vai dar tudo certo…

Seus pensamentos positivos foram despedaçados pela realidade. No fundo sabia que eram baixas as chances de Hardgart ter êxito em seu plano de combater Torvell sem violência no duelo até a morte. Era um plano louco, arriscado, porém nobre e que poderia torná-lo um mártir para a revolta que seguiria a sua morte.

Mas isso faria do pesadelo uma realidade.

Um estrondo pegou Daniel de surpresa, era o reverberar de um trovão. Ao longe, um relâmpago precedeu outro trovão. A descarga elétrica estalou no céu. Daniel se lembrou do antigo ritual de Bjorn, o ritual que derreteu o ferro que hoje adorna as patas dos ursos negros do santuário.

O ritual… A chave para o fim do conflito poderia estar no ritual. E quando o terceiro relâmpago cruzou o céu de Florianópolis, Daniel teve uma ideia arriscada, mas que poderia resolver todos os problemas do Refúgio dos Ursos de Ferro.


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