Volume 1
Capítulo 9: O Fundador ②
Fiquei em choque com o que escutei. Finral me disse que realmente essa história já havia sido esquecida ao redor do mundo e que apenas os elfos a passaram entre seus líderes ao longo do tempo. Porém, ele mesmo não sabia se de fato foi isso que ocorreu, pois muitas informações deveriam ter se perdido com o tempo. Até as raças dos sete campeões eram um mistério.
Ele também me contou que, frequentemente, catástrofes ocorriam ao redor do mundo, uma espécie de fúria da natureza, e o que afastava isso era a presença dos artefatos. Somente os elfos sabiam dessa informação.
Algum tempo atrás, os elfos reuniram representantes de todos os bosques para propor que compartilhassem essa informação com o mundo. Argumentaram que era necessário encontrar a localização dos outros artefatos para restaurar a ordem e que seria egoísmo privar outras raças desse conhecimento, deixando-as sofrer as consequências.
A resposta foi negativa; era arriscado demais. Compartilhar essa informação poderia levar raças desprovidas dos artefatos a declarar guerra contra aquelas que os possuem, como já ocorrera no passado.
Perguntei como evitavam que as catástrofes atingissem os outros elfos, e a resposta foi que, a cada três semanas, o artefato era levado para um dos bosques, criando um ciclo que impedia a ocorrência de fenômenos em suas terras. Inclusive, a fênix na entrada era responsável pelo transporte e segurança do artefato.
Isso me lembrou do dia em que minha família morreu: quando criança, um forte tremor atingiu minha vila, seguido por uma grande onda vinda do mar, na qual meu irmão se sacrificou para me salvar.
Não queria culpar os elfos por não compartilharem esse conhecimento, mas aquilo me irritou profundamente. Então, o questionei sobre o poder que o artefato possuía, e nem ele entendia a complexidade daquilo.
Finral planejava usar aquele poder de alguma forma para salvar sua filha, e eu disse que o ajudaria. Mas, antes de deixarmos o local, senti algo estranho — uma energia mágica diferente. Ainda assim, resolvi ignorá-la no momento.
Dois dias se passaram, e percebi que Finral passava muito tempo trancado sozinho. Decidi procurá-lo para conversarmos sobre os preparativos do casamento, que já estava bem próximo.
Quando alcancei a porta, escutei o som de algo quebrando e senti novamente aquela energia estranha. Gritei, mas ninguém respondeu. Então, arrombei a porta e encontrei Finral desmaiado, com o artefato em sua mão, levemente trincado.
Ao me aproximar dele, uma energia obscura tomou conta de seu corpo, com raios negros emanando ao redor. Mesmo assim, tentei avançar, mas fui atingido e lançado para longe, me ferindo. Saí gritando por ajuda, até que Linna apareceu acompanhada de alguns soldados.
Ao entrarmos, a energia estava dissipada e Finral se levantava devagar. Ele disse que estava bem e agradeceu por minha ajuda, mas havia algo estranho em seu jeito de agir, como se escondesse algo. Decidi deixar aquilo de lado e, nos dias seguintes, mergulhei na companhia da minha amada, aproveitando cada momento ao seu lado.
Finalmente, o dia do casamento chegou. No entanto, Finral estava inquieto, e a tradição não me permitia ver a noiva até o momento no altar. Sendo assim — preocupado com meu sogro — decidi procurá-lo.
Quando me recebeu, parecia bem, mas ao olhar em seus olhos, percebi algo estranho — estavam começando a escurecer. Um arrepio percorreu minha espinha, e, assustado, perguntei o que estava acontecendo. Ele tentou me tranquilizar, dizendo que conseguiu controlar a energia do artefato e que agora poderia realizar o sonho de ver sua filha se casar, finalmente livre daquela doença.
Percebi que ele já estava delirando, seus olhos distorcidos pela obsessão com o poder do artefato. Aqueles experimentos não deveriam ter sido feitos. Era uma força que não compreendíamos, uma magia que não podia ser controlada. O poder que agora o consumia não o fazia bem, e, com certeza, não faria bem para Aurora.
Linna entrou repentinamente e se assustou. Finral se enfureceu e me atacou, jogando-me contra o chão. Disse que foi um erro me deixar ficar com sua filha e que era melhor eliminar a ameaça para que não o impedisse.
Ele conjurou uma estrondosa magia, suas mãos estavam imbuídas com uma espécie de relâmpago negro. Sem hesitar, me atacou com toda sua força. Mas, antes que me atingisse, sua esposa entrou na frente e tomou o golpe em meu lugar. Em suas últimas palavras, pediu para que salvasse sua filha.
Finral se abalou com o que havia feito, correndo para segurar sua amada em seus braços — já sem vida — deixando o artefato cair no chão.
Em um pensamento egoísta e desesperado, peguei o artefato e corri até Aurora.
Ao entrar em sua tenda, a vi com seu lindo vestido de noiva. Uma de suas amigas me repreendeu, dizendo que não poderia vê-la antes da hora.
Eu a ignorei, peguei Aurora pelo braço e comecei a correr. Ela me pedia para explicar o que estava acontecendo, e tudo o que respondi era para que confiasse em mim.
Quando nos aproximamos da saída, os soldados tentaram barrar nosso caminho, buscando entender o que estava acontecendo. No entanto, um estrondo forte, vindo do coração do bosque, os distraiu.
Finral estava em total fúria, e sua magia negra, uma força caótica e destrutiva, se espalhava pelo ar, subindo até os céus como uma nuvem de sombras.
Aproveitando a distração, corri até a fênix, rogando para que me ajudasse a tirar Aurora dali. Ela hesitou por um momento, mas indicou para montarmos nela, nos levando rumo à minha vila. Aurora estava assustada e já começava a chorar, porém entendia o perigo iminente.
Ao chegarmos, a fênix ficou na porta para proteger o artefato de qualquer ameaça. O céu já estava escuro e uma leve chuva se iniciava.
Corri até o centro, para um túnel próximo a árvore ancestral. Lá era um local repleto de runas e por isso possuía forte energia mágica. Enquanto isso, intensos barulhos em meio à floresta se aproximavam. Era Finral com toda a sua fúria.
As pessoas da vila começaram a perceber a frente de destruição que crescia rapidamente. Eu sabia que não poderia detê-lo. Então, peguei o artefato em minhas mãos e olhei para Aurora, que já estava fraca por ter corrido tanto. Pedi para que confiasse em mim e me ajudasse a imbuir o artefato com sua magia, que era pura e poderosa, pois combinava os quatro elementos.
Minha especialidade sempre foi encantar, e naquele momento, fui um canal entre Aurora e o artefato. Concentrei toda minha energia, deixando a magia fluir através de mim, aplicando-a com precisão.
Fechei os olhos e imaginei a história que Finral me contou — a árvore sagrada, as energias e a proteção que existia. Cada feixe de luz que atravessava minhas mãos parecia fundir-se com o artefato e as runas ao redor, como se o próprio tempo se dobrasse para nos ajudar.
Logo, o artefato reagiu. Uma luz intensa e radiante surgiu de seu interior, iluminando todo o túnel, partindo rumo ao céu e quebrando a escuridão ao redor. Quando a luz se dissipou, corremos para fora, mas para nossa surpresa, nada mudou.
Meu coração gelou ao perceber a proximidade da ameaça — Finral estava a poucos metros da vila. Ele já não era mais o homem que conhecíamos, mas uma criatura monstruosa, tomada por uma energia maligna e descontrolada. O que antes era um homem, agora era um pesadelo ambulante, consumido por um poder além da compreensão.
Já sem esperanças, abracei Aurora e desejei que pudéssemos viver mais tempo juntos, que pudesse ver seus lindos olhos por muitos anos, ter filhos, uma família.
A fênix avançou contra o inimigo, mas foi rapidamente derrotada pelo imenso poder daquela criatura obscura. Inesperadamente, ela renasceu, flamejante, com chamas que consumiam os olhos de quem observava.
Com um bater de asas lançou-o para longe e voou rumo aos céus, desaparecendo em um intenso rastro de fogo. Logo, a chuva parou de nos tocar, e Finral apareceu novamente. No entanto, seus ataques eram parados por um campo de força invisível.
Aurora — com seus olhos cheios de lágrimas — caminhou até a margem e colocou sua mão na barreira, olhando para seu pai que atacava descontroladamente. Elderglen agora era protegida por uma espécie de domo mágico, nada poderia entrar, mas infelizmente nada poderia sair.
Em um ato de desespero, movido pelo meu próprio egoísmo, condenei os habitantes da vila a viverem presos para sempre.
Antes dos tempos de paz, os habitantes tentaram me julgar, me obrigando a desfazer o domo. Porém, mesmo que quisesse, era impossível, pois no momento que o criei, o artefato quebrou-se ao meio.
Após um período, o domo começou a sofrer constantes ataques, de diversas raças, provavelmente movidos pelo medo de sofrerem a fúria da natureza. Imagino que houve a interferência de Finral, que era o único detentor de tais informações.
Com o tempo, as pessoas de Elderglen foram esquecendo do ocorrido, percebendo que o domo nos protegeria dos seres de fora e de possíveis catástrofes.
Começaram também a cultuar a fênix como um símbolo de paz e proteção. Um rei foi escolhido, a pequena vila foi se tornando um reino, e começaram a me tratar com respeito e consideração.
Anos depois, decidiram homenagear Aurora, minha linda esposa, a única elfa dentre os humanos, colocando seu nome no reino. Vivemos juntos por muitos anos, até que sua doença a levou. Tivemos uma linda família. Nossos filhos carregavam alguns traços dos elfos, mas meus netos já se pareciam totalmente humanos.
Os descendentes do rei queriam os holofotes só para si, e proibiram que a verdade fosse espalhada. Mandaram eliminar todos os que tivessem traços de elfos, temendo que vivessem por muitos anos. Deste modo, fizeram a história sumir, e tenho certeza que não será nem mesmo um mito daqui algum tempo.
Enquanto escrevo, já estou com pouco mais de um século de vida, e chegou a hora de descansar. Consegui proteger e esconder minha descendência.
Não tenho mais lugar aqui, minha cultura já mudou, a energia do domo interferiu até mesmo na estrutura de poder das pessoas. Vi meus filhos serem assassinados por um rei cruel, me afastei dos meus netos para não condená-los, e minha amada já se foi há muito tempo.
Vou me esconder em um túnel secreto no castelo do rei, fechado por uma entrada mágica. Ninguém saberá do meu destino. Quanto ao artefato, uma metade está comigo, a outra está sob cuidado da minha linhagem que restou. Creio que seja o mais seguro para não cair tão facilmente em mãos erradas.
Nos últimos anos descobri algo, talvez haja um jeito de desfazer o domo, juntando as duas partes do artefato e alimentando-o com a mais pura magia. Deixo essas informações, pois não quero tirar a liberdade de mais ninguém. Para mim, a liberdade era viver com minha amada. Descubra a sua e decida seu futuro.
— E... Fim. Hahah... Incrível não é? O que é isso? Qual o motivo desse choque todo? Temos a chance de buscar nossas liberdades, alegrem-se! — Edgar completou.
— E como isso tem ligação com minha esposa? — Gideon perguntou.
— Sabe a descendência de Thalios e Aurora?
Todos ficaram sem reação.
— Do que você está falando? — Art disse.
— Não se faça de bobo, garoto. Depois de ler a história do fundador, me esforcei muito tempo para descobrir quem eram os descendentes. Não foi uma tarefa fácil, mas cheguei até algumas pistas... E elas me levaram até Marian.
— Minha mãe, é...
— Sim, Art. Sua mãe é descendente de Aurora. Isso faz de você o último descendente do fundador e da elfa.
O silêncio dentro da sala era perturbador.
— Ah... Sabem a doença que Marian tinha? Infelizmente ela herdou a doença de sua ancestral. Uma doença rara que não se acha cura...Mas... Ela deveria ter vivido um pouco mais.
— O que? — Gideon exclamou, completamente confuso.
— Quando descobri quem ela era, pedi para que me dissesse onde estava a outra metade do artefato... Mas ela se fez de desentendida... Então... Me aproveitei do seu estado de saúde e utilizei de um artifício para que ela pudesse contar a verdade... Um veneno, criado a partir de experimentos com a metade do artefato que estava em minhas mãos... Esse veneno a deixava em um estado mental mais fácil de retirar a verdade... Ela já estava condenada mesmo, eu só acelerei o processo.
— SEU VERMEEEE! — Gideon enlouqueceu, tentando de todas as maneiras se soltar das algemas.
Art e Diana entraram em um estado de paralisia, como se suas mentes estivessem em outro lugar. Lágrimas escorriam pelo rosto de Lisa, que sentia a dor de seus amigos. Todos os outros estavam em um estado semelhante — imóveis — tentando processar tantas revelações e a tamanha frieza que o capitão expressava.
— Bem... Mas ela era forte, e não me contou. Ela não sabia sobre muitas coisas, apenas recebeu de sua mãe a missão de continuar guardando o artefato... Só consegui tirar informações que eu já sabia...Hahaha... Se acalmem! Não fui eu quem deu esse veneno para Marian... Foi você, Gideon.
Gideon parou de se debater, claramente abalado, com os olhos arregalados.
— Como esperei para ver essa carinha, haha... Isso mesmo, Gideon! Foi você que envenenou ela para mim. O remédio que lhe dei... O remédio que você levava todos os dias para sua querida esposa... Ele parecia ajudar a aliviar os sintomas, mas no fundo só tinha uma função, fazê-la dizer a verdade... Ahh!!!... O maior mago do reino não consegue nem mesmo salvar aqueles que ama... Não fique assim... Isso me entristece...
Um momento de silêncio iniciou-se. Edgar respirou fundo, já cansado da situação.
— Tudo bem, tudo bem... Chega disso... Vamos seguir logo com o plano. Já brinquei demais com eles... Levem o garoto para sala. — ele ordenou para os encapuzados, caminhando para a sala em que a metade do artefato estava.
Os encapuzados desamarraram Art — que nem mesmo se movia conscientemente — e o acompanharam até Edgar.
Gideon se sentia totalmente incapacitado, mordendo seus lábios até sangrarem. Seus olhos já estavam avermelhados com a ira que crescia em seu corpo, além da infinita dor de saber que foi usado para ferir sua amada.
Ei, Shosckk aqui!
Meu sincero agradecimento por apoiar O Domo de Aurora: Os Sete Artefatos, torço para que goste e acompanhe a história!
*Eu mesmo faço os esboços das imagens, depois finalizo com IA. Te convido a dar uma olhada no canal do youtube, onde até mesmo já postei uma incrível trilha sonora para a obra Youtube Shosckk (E vem mais coisas por ai!).
*Caso queira fazer alguma doação para ajudar a obra: PIX - [email protected]
Te vejo nos próximos capítulos!