Volume 1

Capítulo 8: O Bom Garoto

Todos estavam em choque, sem acreditar no que presenciavam.

— Hahahaha... Não sabem o quanto esperei por isso... Uff!!! Que alívio! Não preciso mais agir como um idiota certinho. — Edgar disse, com um sorriso maléfico estampado em seu rosto, sua voz ecoava em meio ao silêncio. — Prendam todos eles na sala com Gideon.

Lucian e alguns encapuzados se aproximaram. Harold preparou seu cajado e Arik se colocou em posição de batalha.

— Não vamos desistir sem lutar… — Eles viram seu ímpeto ir embora ao olharem para Art, que estava cabisbaixo, sem reação.

Então, todos foram presos sem resistir, com suas mãos e pernas amarradas por algemas encantadas — resistentes à magia — que estavam profundamente conectadas ao chão e à parede. Tais algemas eram resultado dos vários experimentos de Edgar.

— O que faremos com as armas deles? — Lucian perguntou.

— Apenas deixe-as jogadas em qualquer canto. Não há nada mais que possam fazer agora. — Edgar respondeu, sério e confiante.

— Espera! Solte isso. — Diana disse, se debatendo, enquanto um encapuzado retirava a bolsa de sua cintura e a jogava junto ao seu arco e aljava, amontoados com outras armas em um canto distante da sala. — Você é um monstro... Como pôde… — Diana gritou para Edgar, porém foi interrompida por um soco em seu rosto, vindo de um dos encapuzados.

Art imediatamente levantou sua cabeça, com seus olhos repletos de ódio.

— Vai se arrepender amargamente pelo que está fazendo, Edgar.

— Eu? Hahahaah... Olha, meu filho... Olhe bem para meu rosto e veja a face de alguém que não teme nada. — ele respondeu, se aproximando do jovem striker.

— Capitão, em alguns minutos tudo estará pronto. — um encapuzado cortou o momento.

Edgar apenas olhou de lado e acenou com a cabeça, continuando sua fala.

— Em alguns minutos você verá a verdadeira liberdade, meu jovem.

— Qual a razão para tudo isso? — Gideon disse, com a voz fraca, retomando sua consciência.

— Ah... Vejo que todos estão acordando... Já era hora, não é mesmo? — Edgar respondeu, em tom de deboche. — Razão para tudo isso? Bem, acho que não há problema em contar a bela história de um garoto de bom coração…

    Há quase 40 anos, Aurora era bem diferente. Esse garoto, no auge de seus 12 anos, vivia seguindo seu pai, Jonathan, um comerciante respeitado que não media esforços para ajudar as pessoas, não importava quem fosse. 

    Essa pequena criança cresceu sem a presença de sua mãe — que infelizmente sofreu um acidente anos antes — via em seu pai a representação do que um homem deveria ser, e sonhava em ser como ele. 

    Até parece uma história comum, não é mesmo? Um comerciante rico e seu filhinho bondoso. Mas nunca foi sobre eles, e sim sobre os outros. 

    O garoto via todos os dias as mais diferentes pessoas do reino pedirem ajuda a seu pai, seja para ter o que comer, ou seja para ter onde dormir. Jonathan sempre ajudava. 

    Um dia, ele estava ocupado em uma reunião com alguns fazendeiros, e o bom garoto ficou cuidando da loja. Logo, chegou uma moça que sempre pedia ajuda para comprar comida para seu irmão, e ele viu a chance de ser um pouco como seu pai. Então, pegou duas moedas de prata e entregou para a bela dama. 

    — O que? Somente duas moedas? Seu pai sempre dá 4 moedas, como vou pagar minhas roup... Dar de comer ao meu irmão? Me dê mais… — ela respondeu com a cara fechada.

    Foi isso mesmo o que ela disse. O garoto não acreditou no que havia escutado e apenas respondeu com calma.

    — Duas moedas são o suficiente para duas boas refeições, para você, e para suas roupas. 

    A bela dama perdeu todo o seu brilho e fugiu da loja. 

    Semana após semana, o garoto percebia mais da sujeira dentro das pessoas, e questionava o real sentido de se ter um bom coração. 

    Aquela bela dama voltou outro dia, o olhando com desprezo, mas continuou o teatro para com seu pai. E ele — como sempre — deu as 4 moedas com um sorriso no rosto. 

    Após a moça sair, Jonathan — muito atencioso — olhou para o menino.

    — O que foi meu filho? Você está estranho há dias.

    — Talvez esteja mesmo... Pai, essa vida que o senhor leva não é cansativa? Trabalhando para ajudar as pessoas... Você não vê que muitas delas mentem para aproveitar da sua bondade?

    — É claro que vejo, meu filho. Sei que as pessoas em sua maioria são más, mas também existe bondade nesse mundo. Venha comigo! Vamos fechar a loja. Vou te levar para ver algo.

    Eles saíram da loja e caminharam até as fazendas do reino. Chegando lá, se aproximaram de uma simples casa de madeira. 

    Jonathan bateu na porta e uma senhora a abriu.

    — Olá, senhora Olga! Como está?

    — Que grata visita! Entrem. —  ela respondeu, com um enorme sorriso no rosto.

    O garoto não entendia o que seu pai queria mostrar, mas logo percebeu que ele se sentia feliz ali, tomando um chá e conversando com aquela senhora sobre as simples coisas da vida.

    O sol já estava se pondo, e após se despedirem, foram embora caminhando lentamente.

    — O que o senhor queria me mostrar? Só uma senhora camponesa? — o garoto disse, olhando para o contente rosto de seu pai.

    — Você não percebeu?

    — Percebi o que?

    — Ela não enxerga, meu filho.

    — O que? E como ela fez o chá? E... Como ela sabia quem éramos?

    — Não são necessários olhos para fazer tudo nesta vida, meu filho. Ela é uma senhora muito esperta e forte.

    — Mas o que queria me ensinar com isso?

    — Um dia você entenderá.

    — Não! Me explique agora. Tem tanta coisa que não entendo. O senhor vive essa vida se importando com todos, mas se esquecendo de si mesmo. O senhor não tem sonhos? Não quer se sentir livre? Não tem curiosidade nenhuma sobre esse domo? Não vê o quanto as pessoas são egoístas? Não... Sente falta da mamãe?

    A expressão de Jonathan ficou séria.

    — É claro que sinto falta da sua mãe. É claro que gostaria de saber o que é esse domo. É claro que vejo o quanto as pessoas são egoístas. Mas... Se eu for como elas... O que vou mudar nesse mundo? Nós podemos fazer a diferença hoje, no mínimo que seja, e talvez um dia mudemos o mundo. 

       Sua mãe era maravilhosa, e me deu o maior tesouro da minha vida: você. Minha única missão é te ensinar os verdadeiros valores... te dar amor... estar presente... E, meu filho, eu sou livre. Mesmo preso neste domo, eu sou livre. Mesmo sem usar meu dinheiro para ter poder, eu sou livre. Sou livre porque posso visitar essa senhora e lhe fazer companhia. Sou livre porque posso te abraçar agora e dizer que te amo. — ele abraçou o menino repentinamente, com força, envolvendo-o em um caloroso aconchego.

    O garoto — que antes estava irritado — agora apenas chorava alto.

    — Me desculpa, pai!

    — Não há o que se desculpar… —  a fala de Jonathan foi interrompida por gritos.

    — Acho que esses gritos... são na casa dela. Fique aqui!

    Jonathan correu em direção à casa da senhora, e o garoto timidamente caminhou o seguindo, contrariando a ordem clara para ficar ali. 

    Ao se aproximar, ele pôde escutar a senhora gritando para dois soldados do reino.

    — Não! Por favor! São minha única fonte de renda.

    — A senhora precisa pagar estes impostos. Não adianta chorar. —  disse um dos soldados, enquanto o outro retirava os porcos que ela criava.

    O pai do garoto estava lá, falando sem parar.

    — Eu pago os impostos dela. Por favor! Não façam isso, eu posso pagar tranquilamente, olha… — ele parou, retirando um pequeno saco de dinheiro de um dos bolsos. — Aqui! Veja! Tem mais do que suficiente.

    — Vejo que é o famoso Jonathan... O idiota que quer ajudar a todos… — um dos soldados desdenhou.

    — Por favor! Aceite! — Jonathan se aproximou, levantando suas mãos para entregar o dinheiro.

    Clinc! 

    O soldado deu um tapa no saco de moedas, arremessando-o para o meio da lama do chiqueiro.

    Jonathan não desistiu e entrou na lama para pegá-lo. O soldado o chutou pelas costas, o fazendo se lambuzar na sujeira. 

    O menino se desesperou e se aproximou gritando por seu pai, mas não entrou na lama, apenas observou assustado.

    — Esse é seu pai, garoto? Sinto muito por você... Faz bem em não ajudá-lo —  o soldado foi interrompido por Jonathan, que rastejando, segurou em uma de suas pernas. — Por favor! Aceite o dinheiro… —  sua voz já estava fraca.

    — Mas o que é isso? Como ousa? Minha armadura está cheia de lama agora. — ele se enfureceu, se aproximando devagar. — Tudo bem! Me dê o dinheiro.

    O bom homem abriu um sorriso, e em meio a sujeira que se encontrava, recolheu as moedas e estendeu suas mãos novamente. O pequeno se alegrou com seu pai, e sua expressão demonstrava esperança. 

    O soldado se agachou, estendeu uma mão para pegar o dinheiro, e com a outra apunhalou Jonathan com sua espada. 

    O garoto entrou em estado de choque, seus olhos estavam arregalados.

    — Muito bem. Pode ficar com isso, senhora. — o soldado disse, jogando o dinheiro no chão e indo embora.

    O outro soldado largou os porcos, que fugiram rumo à floresta.

    Haviam algumas pessoas ao redor, que saíram de suas casas por conta do barulho, mas que logo se esconderam com medo.

   — Obrigada Jonathan! Você conseguiu! —  a senhora dizia, claramente sem entender a situação. 

    O menino — vendo as pessoas se esconderem — apenas encarou seu pai caído em meio a lama. Seus olhos — antes cheios de esperança — foram tomados pelo mais puro ódio.

    — Ei! Jovem! Ajude seu pai a se levantar e me deixe fazer um jantar em agradecimento. — ela continuava.

    O bom garoto apenas a deixou falando sozinha, e saiu.

Todos ali escutaram atentamente, assustados com a história que Edgar contou.

— O que... Então você… — Gideon disse.

— Sim. Eu sou o garoto. E desde aquele dia não existe mais nada de bom. Naquele momento, prometi a mim mesmo que nunca iria me rastejar na lama como meu pai. Me prometi que buscaria a verdadeira liberdade, mesmo não sabendo exatamente o que era. Mas agora eu sei.

— Seu pai morreu quando você era mais velho e estava na Aurora Force. Como? — Gideon questionou.

— Não. Quem morreu naquela época foi um comerciante que se dizia amigo próximo do meu pai. Ele tomou posse de seus negócios, afirmando que me criaria em honra ao legado de seu 'melhor amigo', que se foi de forma tão trágica. Assim, ele se tornou meu novo pai. Ele até tentou fazer o melhor... mas eu simplesmente não me importava.

    O que importa é que meses depois da morte do meu verdadeiro pai, o único homem bom que conheci, aqueles dois soldados foram encontrados mortos, da maneira mais cruel possível. Até hoje me lembro dos pedidos de misericórdia... Ahhh!!! Coitadinhos!!!

— Você é louco, Edgar. — Diana disse.

— Sim. Eu sou. Sou louco pela liberdade. E me acharão mais louco ainda quando escutarem o que tenho a dizer. — ele respondeu, com um sorriso sádico em seu rosto. — Hoje é o último dia deste reino como vocês o conhecem.

O ambiente foi inteiramente tomado pelos olhares de surpresa. 

— O que pretende fazer? — Art perguntou.

A conversa foi interrompida por um encapuzado.

— Está tudo pronto.

— Ah... Que maravilha! Mas antes, só me deixe terminar aqui. Estou gostando disso. O olhar de desespero deles está impagável. Além de que preciso contar uma notícia triste para essa família.

O encapuzado acenou com a cabeça e se retirou. 

Então, Edgar continuou:

— Gideon, quando nos conhecemos na Aurora Force, eu ainda não sabia qual era a liberdade que buscava. Tudo o que me movia era a vontade de destruir toda essa estrutura suja. A única maneira de fazer isso era me tornar alguém em que todos confiassem. Naquela época, a Aurora Force não era respeitada como hoje. Por isso, treinei até meus ossos doerem, entrei para a Guarda Real, e fui conquistando meus objetivos.  

    Essa foi a decisão mais certeira que tomei em toda a minha vida... Pois, em um belo dia, durante uma missão para capturar alguns ladrões, encontrei Lucian. Ele era apenas um garotinho, vivendo de furtos, mas usava sua incrível magia para nunca ser pego. Eu o capturei, mas vi um grande potencial naquela criança. Decidi encobri-lo e o criei como se fosse meu próprio filho.

— Como um filho? — Harold perguntou incrédulo.

— Qual o problema? Eu o criei bem. Afinal, se eu não mudasse a estrutura da Aurora Force, ele já seria um vice-capitão. Mas a mudança foi necessária para que as pessoas entendessem que apenas um capitão de pulso firme é necessário para coordenar tudo. Isso trouxe o respeito que precisávamos... Além disso, ele não está chateado em ser meu braço direito. Não é mesmo? — Edgar disse, direcionando seu olhar para Lucian.

— Nada disso me importa. — ele respondeu pontualmente, continuando em sua postura séria.

— Haha... Dia após dia eu o treinei para que se tornasse um mago habilidoso, que pudesse escolher seu próprio destino. O mais engraçado, é que não sabia o quão importante ele se tornaria para os meus objetivos. 

    Pouco tempo depois, durante um evento no castelo, eu fiquei responsável pela segurança, e enquanto fazia a ronda na parte inferior, nos depósitos do castelo, me deparei com um quadro da família real, uma pintura de todos juntos, felizes. Aquilo me irritou profundamente, e para não destruir aquele quadro, respirei fundo e me encostei em uma parede próxima. 

    O contato da minha armadura com aquela parede fez um barulho diferente, parecia ter algo por trás. Então, percebi que se tratava de uma porta. Tentei de todas as formas abri-la, mas não obtive sucesso, pois claramente era protegida por magia. 

    Fui embora intrigado, pensando em possibilidades para atravessar aquela barreira. E para minha surpresa, o destino me reservou um tesouro. 

    Quando cheguei em casa, Lucian não me escutou entrando, e o flagrei guardando itens que ele havia roubado. Nem mesmo pensei em repreendê-lo, pois o vi utilizando um cofre debaixo do tapete, e o abrindo com uma chave mágica, resultado da junção dos quatro elementos. Eu não acreditava que o garoto poderia ser tamanho prodígio, um gênio entre nós. 

    No outro dia, o levei escondido para o castelo e pedi para que fizesse a chave mágica. Para minha surpresa, a parede reagiu à chave, e o resto vocês já sabem. Acabei voltando para a Aurora Force como capitão e segui com meus planos... O que não fazem ideia, é o que havia aqui dentro. 

    Dentro daquela sala com aquela luz... Encontrei o segredo de Aurora. A origem do domo... A liberdade sorriu para mim, e eu... Sorri de volta.

— Seu canalha! Esteve nos enganando todos esses anos. — Gideon gritou.

— Já está nervoso? Ainda nem cheguei na parte que envolve a Marian...

Esta frase deixou todos sem reação. Art e Diana nem mesmo se moviam. 

Gideon se enfureceu — debatendo-se contra as correntes — tentando de todas as maneiras avançar contra Edgar. Suas mãos começaram a sangrar, pressionadas contra as algemas. 

— Não ouse dizer o nome dela.

Ei, Shosckk aqui!

Meu sincero agradecimento por apoiar O Domo de Aurora: Os Sete Artefatos, torço para que goste e acompanhe a história!

*Eu mesmo faço os esboços das imagens, depois finalizo com IA. Te convido a dar uma olhada no canal do youtube, onde até mesmo já postei uma incrível trilha sonora para a obra Youtube Shosckk (E vem mais coisas por ai!). 

*Caso queira fazer alguma doação para ajudar a obra: PIX - [email protected]

Te vejo nos próximos capítulos!



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