O Condenado Brasileira

Autor(a): Guilherme F. C.


volume 1

Capítulo 29: Partida

Tércio seguiu Enri até uma parte da escola que era desconhecida por ele. E embora estivesse indo logo atrás, Arthur continuava sonolento, mesmo depois do chute furioso que recebeu.

O garoto cujos olhos ainda eram inocentes para o visual da academia, estava olhando tudo ao seu redor com extrema curiosidade enquanto contornava um jardim verdejante. Eles estavam seguindo por um caminho largo feito de pedras que era ladeado por um comprido tapete de grama.

Depois de uma caminhada que não levou muito tempo, Tércio e os outros chegaram a uma área que possuía dois enormes estábulos, um em frente ao outro. O cheiro dos animais quadrúpedes que buscam sua liberdade ao galopar pôde ser sentido assim que se aproximaram da área. Tratava-se de um odor característico e marcante, capaz de provocar repulsa em pessoas desacostumadas.

Tércio espiou os estábulos com o canto dos olhos  conforme continuava andando em frente e reparou que ele estava quase vazio. No entanto, era possível ouvir relinchos a distância, ficando ainda mais forte à medida que se aproximavam.

Após passar pelos estábulos, Tércio se surpreendeu ao se deparar com um pequeno exército de cavaleiros e cavaleiras.

Estacionados em uma planície havia mais de cem homens e mulheres trajando armaduras. Alguns usavam elmos para proteger a cabeça, enquanto outros preferiam se ver livres do peso extra, mesmo que isso pudesse aumentar o perigo no qual se colocavam. No entanto, todos possuíam uma coisa em comum: em suas cinturas existiam espadas pesadas, prontas para serem sacadas no menor sinal de perigo.

Além dos cavaleiros existiam também carruagens estacionadas ao longo do pátio aberto; vinte, para ser exato. Algumas delas eram tão luxuosas quanto as que Eliza usava, outras possuíam apenas um pedaço de pano cobrindo-as, no entanto.

Porém o que mais chamou a atenção de Tércio foram as pessoas que estavam usando roupas iguais às suas. Aqueles eram membros da Equipe de Subjugação. Não havia muitos deles, talvez vinte ou menos.

Quando os cavaleiros viram Arthur e Enri chegarem, alguns deles começaram a reclamar ― parecia que todos estavam bravos com o atraso causado pelo rapaz.

― Era melhor ter largado esse moleque aí, Hunf! ― Um homem bufou com rispidez. ― Um dia eu dou uma surra nele.

― Vai tentar de novo? ― zombou o atrevido que entreouviu a acusação.

― Não fique se achando, seu vagabundo imprestável! ― rosnou outro sujeito à distância. E em troca, recebeu um aceno descontraído.

Por mais que os cavaleiros estivessem reclamando, não parecia que estavam bravos ou coisa do tipo. As reclamações soavam mais como uma provocação entre companheiros.

Ao que parece, Arthur é muito querido entre eles.

― Nossa equipe está por aqui. ― disse Enri a Tércio.

Eles estavam passando pelos grupos de cavaleiros enquanto Arthur brincava com alguns deles, falando mentiras e contando piadas, quando de repente uma voz arrogante ecoou:

― Se não tem a decência de aparecer na hora, pelo menos tenha a coragem de renunciar de sua posição.

Nesse momento, os homens e mulheres que estavam em festa, preparando o clima alegre para a longa jornada, pararam de falar.

Arthur olhou para a direção da voz com um olhar afiado e Tércio seguiu sua linha de visão.

Sentado em uma das carruagens luxuosas se encontrava um garoto de boa aparência e que estava usando o uniforme da Equipe de Subjugação. Seu cabelo, muito bem aparado e colado na cabeça por algum tipo de gel, era composto por fios dourados que reluziam um brilho estético marcante. Seu rosto possuía um aspecto quadrado devido ao osso molar de pouco destaque e a mandíbula larga.

― Não abuse muito de seus benefícios, antes que alguém decida lhe ensinar uma valiosa lição ― avisou o garoto na carruagem com uma voz ameaçadora.

Arthur retribuiu o olhar frio que recebeu e após um segundo de silêncio, abriu um sorriso desdenhoso e falou:

Oh, Alec! Está bonitinho como sempre. Esse cabelo lambido combina com os seus olhos de cabra. Faz assim para mim ver uma coisa: Bééé!

― Seu plebeu imundo! ― Alec se contorceu de raiva à medida que seu rosto adquiria um tom ruborizado. E embora estivesse preparado para agir contra seu inimigo desdenhoso, ele foi parado pela voz ríspida de Enri.

― Arthur! ― ralhou o cavaleiro. ― Você não deveria falar assim com um nobre. O errado é você por ter se atrasado. Peça desculpas imedia...

― Tá, tá, tá. Eu sei. ― Porém, o rapaz das facas não se importou com a branca e saiu andando.

Antes de seguir o companheiro, Tércio olhou uma última vez para Alec furioso sentado na entrada da carruagem. Mas, no final, não deu muita atenção para a expressão azeda do estranho.

Arthur continuou andando e conversando com alguns cavaleiros como se nada tivesse acontecido, até que ele se virou para o novo membro de seu grupo e disse:

― Esta é a equipe que vai nos acompanhar durante a viagem.

O time indicado era composto por trinta cavaleiros comuns. E junto a eles havia três carruagens luxuosas atreladas a cavalos robustos e de postura elegante. E além dessas, existia também um veículo simples carregada com suprimentos para a viagem.

Tércio olhou para o grupo de cavaleiros e achou um exagero. Era mesmo necessário tantas pessoas? A floresta era considerada um lugar inseguro, mas ainda existiam muitas pessoas que transitavam por ela.

― A gente precisa ir? ― questionou Tércio. ― Olha só esse “exercito”.

― É um grande número de pessoas, mas a maioria não se comparam aos membros da Equipe de Subjugação em questão de força ― disse Arthur, mantendo a voz baixa para não ser escutado.

― Como assim? ― Tércio não conseguia ver como aquelas pessoas trajadas com armaduras e espadas poderiam ser mais fracos do que garotos de quatorze a dezoito anos.

― A maioria desses homens e mulheres teve treinamentos superficiais. O melhor que sabem fazer é balançar uma espada. Por outro lado, nós, alunos da academia, praticamos Artes Marciais. E têm até mesmo aqueles que usam Encantamentos Mágicos. Nossas forças são muito superiores se compradas a eles. É por isso que devemos ir juntos, pois se aparecer um inimigo poderoso, é nosso dever eliminá-lo. Além do mais, como alunos, é nosso dever representar a academia.

Arthur aparentava estar bem acordado agora. Pelo visto, o garoto que o provocou há pouco conseguiu fazê-lo abrir os olhos.

― A academia ensina Artes Marciais? ― perguntou Tércio em choque.

― Sim. Todos os alunos aprendem Artes Marciais ― informou Arthur, usando de um tom casual como se isso fosse algo normal. ― Do contrário, como você acha que os plebeus como nós teriam forças o suficiente para entrar na Equipe de Subjugação.

Tércio não tinha parado para pensar sobre isso. O que Arthur disse fazia todo o sentido. Pelo o que havia entendido até então, a Equipe de Subjugação era uma força criada para combater os monstros. Assim sendo, somente alguém forte poderia fazer parte desse grupo. No entanto, plebeus como Arthur e ele, não podem praticar Encantamentos Mágicos. Logo, o único modo de lutar contra monstros poderosos seria praticando Artes Marciais ou então possuindo uma magia individual.

O novato estava pensando sobre toda a situação quando um rosto familiar apareceu.

― Bom dia! ― Em meio à multidão, surgiu um homem vestindo roupas simples como a de um camponês. Seu corpo era musculoso e o cabelo avermelhado. Em sua cintura pendia uma espada com uma bainha vermelha e cabo preto. Aquele era Kacio, o protetor fiel de Eliza e vice-diretor de Elefthería.

― O que você está fazendo aqui? ― disse Tércio um pouco surpreso. Fazia alguns dias que ele não via o Cavaleiro de Palavras Encantadas.

Apesar dos dois terem quase brigado na Hospedagem do Descanso, o ex-prisioneiro não desgostava do poderoso homem de cabelo curto.

― Eu sou o vice-diretor e, como tal, devo comparecer nesse tipo de evento. – respondeu Kacio.

― Aposto que você não tinha nada melhor pra fazer, não é? ― disse Tércio de forma desconfiada.

― Moleque... Você continua tão desrespeitoso como sempre ― grunhiu com um meio sorriso.

― Vice-diretor! ― saudou Enri ao mesmo tempo em que abaixava a cabeça de forma respeitosa.

― Comandante Enri. ― Kacio retribuiu o cumprimento de forma respeitosa. – Como estão os preparativos para a viagem?

― Está tudo em ordem! Estamos preparados para partir a qualquer momento. ―

― Isso é bom ― dizendo isso, Kacio deu um passo à frente e pigarreou alto. ― Huhum!

Neste momento, todos que estavam presentes voltaram sua atenção para o barulho que se destacou entre o burburinho matinal.

― Acredito que todos vocês já estão cientes de seus destinos e das pessoas que estão responsáveis por trazer em segurança. A Floresta Meia Lua tem se tornado um lugar perigoso e traiçoeiro, é por isso que vocês viajarão juntos durante a ida, para que assim evitem baixas desnecessárias. Durante a primeira parte do trajeto, Arthur e o comandante Enri serão os líderes. Até que se separem, vocês deverão obedecer às ordens deles. ― anunciou o vice-diretor com uma voz alta que reboou por todo o pátio. ― Agora que todos os preparativos estão prontos, vocês devem partir. E fiquem em segurança.

Assim que Kacio terminou de falar, os cavaleiros começaram a se mover. Alguns montaram em seus cavalos, que estavam presos em um poste de madeira, e outros entraram nas carruagens. Todos pareciam muito animados e prontos para partir.

― Nós vamos ali ― informou Arthur, apontando para um veículo.

O líder da expedição não perdeu tempo e foi logo subindo na carruagem. Tércio já estava para segui-lo, mas foi parado por Kacio:

― A Srta. Eliza não pôde vir se despedir, mas ela me pediu para lhe dizer para tomar cuidado.

― Tomarei! ― garantiu Tércio. Depois se virou e se juntou a Arthur.

Quando todos estavam prontos para partir, Enri, que estava montado em um cavalo marrom puro, disse com uma voz clara:

― Vamos indo!

E com isso ele tomou a frente da tropa e, junto ao seu cavalo, marcharam com uma formação precisa que parecia ter sido treinada antes.

A formação estava montada da seguinte forma: Enri liderava junto a dez cavaleiros. Atrás deles, achavam-se três carruagens, com uma delas sendo a de Tércio e Arthur. Ao lado das carruagens dos flancos havia uma fila formada por cinco cavaleiros. E os outros membros da equipe de Enri seguiam protegendo a retaguarda.

Essa era a formação que os trinta que iriam seguir Arthur e Tércio durante a viagem estavam usando.

Os demais homens e mulheres seguiam atrás, junto às suas respectivas equipes, usando suas próprias formas de se organizarem.

Kacio ficou para trás, assistindo a tropa de cavaleiros se afastarem.

― Melhor eu começar os preparativos para o Teste de Força. ― murmurou ele antes de dar as costas e voltar para a escola.

A tropa expedicionária estava agora avançando por uma larga estrada de terra que apesar de faltar um pavimento adequado, não possuía buracos ou desnivelamentos.

Nesse meio tempo, Tércio queria ficar na janela, espiando a paisagem, mas estava tendo a vista bloqueada por um cavaleiro que não se distanciava um centímetro sequer.

Sem muito para fazer, ele se virou e começou a conversar com Arthur, que se encontrava sentado no assento da frente e ao lado da outra janela.

― Você disse que eles são fracos, mas não parece. Quero dizer: eles são organizados demais ― observou o garoto do cabelo desigual em tom rabugento, apontando para o lado de fora. ― Sem falar naquele Enri. Ele me parece bem forte.

― Eles têm que ser organizados. Afinal, são treinados para isso. Mas não significa que são fortes. ― Arthur também estava bastante interessado no que acontecia do lado de fora. ― Além do mais, não se pode comparar Enri com o resto do grupo. Já que ele é um dos Cavaleiros Reais a serviço do Duque Griffon.

― Então aquele cara é um Cavaleiro Real? ― disse Tércio um tanto impressionado. ― Foram esses malditos que me pegaram ― resmungou. ― A propósito, pra quê tanta gente? É meio exagero, não acha?

― Nem tanto. Esse ano haverá muitos alunos novos ― falou Arthur, parecendo um pouco empolgado. ― E as equipes precisarão se dividir em muitas partes por causa disso.

― Quantos alunos nós iremos buscar? ― Tércio quis saber um pouco mais.

― Quatro!

― Só isso? E mesmo assim vamos precisar de tanta gente? Ou o nosso grupo também vai se dividir?

― Bem... digamos que esses quatro são pessoas especiais. E por isso vamos precisar de tanta gente.

As palavras misteriosas de Arthur fizeram Tércio começar a refletir. Ele não era estúpido, por isso logo entendeu que essas quatro pessoas deveriam ser no mínimo de famílias nobres. De outra forma, não seria enviada uma equipe tão grande, liderada por um Cavaleiro Real.

― Mas isso é inesperado. Eu achei que você fosse do tipo calado. Pensei que essa seria uma viagem bem silenciosa ― disse Arthur de forma brincalhona enquanto sorria para o companheiro.

― Nem tanto assim! ― Tércio deu de ombros.

E de fato, o jovem grosseiro acordou inspirado e com a boca aberta, pois continuou fazendo perguntas. Em sua maioria era a respeito da Equipe de Subjugação. Desejava saber um pouco mais sobre o trabalho que realizaria.

Tércio estava entretido em sua conversa com Arthur quando a velocidade da carruagem diminuiu, até que, por fim, parou por completo.

Ele estava intrigado com a parada repentina e por isso colocou o corpo para fora da janela e espiou o motivo.

― Parece que chegamos ― murmurou Arthur.

 


Capítulo patrocinado por César

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