O Apocalipse de Yohane Brasileira

Autor(a): Henrique Ferreira


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 24: Um último Natal

Após alguns minutos, pararam em frente à Igreja e entraram no canteiro de obras. No momento que pisaram ali, todos os trabalhadores ficaram paralisados e Yohane balançou a cabeça com um sorriso de desistência no rosto.

— O que pretende fazer agora, Nicolau?

— Agora eu tenho que me preparar para a entrega dos presentes nessa noite. Vai ser cansativo, graças aos acontecimentos de hoje, mas valeu a pena. Foi divertido conversar com você outra vez, Yohane.

Ela sorriu, corada.

— Que isso, estou feliz que tudo deu certo no final. Aliás, como vão ficar os meus colegas da Academia? Vão esquecer do que houve mais cedo?

— Para evitar problemas para nós dois, sim.

— E eu? Vai me fazer esquecer, também?

— Eu... considerei a ideia, mas acho que posso abrir uma exceção para você. Você já está se tornando adulta, possivelmente esse será o último Natal que seu nome aparecerá na minha lista, então... como um último presente, para nós dois, vou deixar que se lembre do dia de hoje.

Os olhos de Jô brilharam como nunca. A felicidade que aquela garota sentiu era inexplicável e, por um momento, ela voltou a ser apenas uma menininha de oito anos. Abraçou Nicolau sem pensar duas vezes.

— Obrigada. Muito Obrigada!

— De nada, garota. Espero que aproveite o Natal de hoje com quem você ama.

Então eles se separaram e Nicolau acenou em despedida, desaparecendo em uma poeira dourada, que foi levada com o vento gelado do inverno.

E assim, Yohane voltou para o subsolo da Igreja, satisfeita com sua curta, mas alegre aventura com o Papai Noel. Ao entrar na Academia, todos estavam em suas atividades corriqueiras, treinando ou conversando. A ruiva sorriu ao ver tudo aquilo.

— Pride! Onde você se meteu?! Tá tentando fugir do treinamento, é? — gritou Maeve, saindo do escritório.

“Eita, ela realmente não lembra de nada.” Pensou.

— Ah, foi mal. Eu só fui tomar um ar lá fora. — Mentiu, coçando a nuca.

— Hm... — Soltou um longo suspiro. — Não se engane, pirralha. Até as sete da noite, você pertence àquele ringue..., mas acho que é bom nós fazermos uma pausa pra um cafézinho.

— Não, tá tudo bem. Quero continuar treinando, porque hoje eu vou te vencer.

Maeve ergueu a sobrancelha e sorriu, surpresa com a coragem da garota.

— Certo, então, Pride. Vamos ver.

E elas voltaram ao ringue. Yohane pegou sua lança de treino e uma maça estrela apareceu nas mãos de Watson, e logo começaram a batalhar. A ruiva estava animada e confiante, após o seu passeio com Nicolau, a vida pareceu mais leve, mais fácil de se lidar.

Maeve estava na ofensiva, atacando com tudo que tinha, como sempre. Mas Pride, diferente de mais cedo, estava contra-atacando com maestria. Existia tanta habilidade em seus contra-ataques que, após cerca de quinze minutos, vários outros caçadores ali pararam seus treinos para observar a batalha das duas.

— É impressão minha ou a Maeve tá tendo dificuldade pra acompanhar a Yohane? — comentou uma garota morena.

Mas ela estava certa. A treinadora Watson, mesmo com toda a sua habilidade e experiência, estava suando para acompanhar os ataques de Jô. Sua lança era rápida, afiada e perigosa, e chegou um momento em que o jogo virou, e Maeve teve que entrar na defensiva. A velocidade de Yohane era absurda; seus golpes, brutais.

— Uau! Onde você tava escondendo tudo isso, Pride? — disse a treinadora, esquivando de uma estocada e enrolando a corrente de sua maça no cabo da lança, assim como fizera de manhã. — Ah, mas infelizmente, ainda comete os mesmos erros.

— Ah, não, Watson... — Em um passo rápido, Yohane usou o cabo da lança para acertar o rosto de Maeve em cheio, a desnorteando. — A única que cometeu um erro aqui foi você.

Com essa distração, a ruiva conseguiu se aproximar o suficiente para pegar o antebraço da oponente, passá-lo por cima de seu ombro e a jogar no chão com força, apontando a ponta da lança para seu pescoço no processo.

Maeve encarou a jovem com um sorriso orgulhoso no rosto e deu três tapas no chão, exclamando sua derrota. Pride estendeu a mão e ajudou sua amiga a levantar. A Academia virou um estádio de futebol quando a plateia vibrou com a vitória da novata.

— Parabéns, Pride. Ninguém me vence no mano-a-mano desde que o Adam virou caçador. E, mesmo assim, ele demorou um ano pra conseguir. Estou orgulhosa de você.

Os olhos da garota brilharam e ela pulou no pescoço da amiga em um caloroso abraço. Todos ao redor gritavam e aplaudiam a garota, e logo fizeram fila para poder lutar com ela também. Eles estavam ansiosos e curiosos para experimentar na prática as habilidades da novata que derrotou a líder deles.

E isso se seguiu durante o restante da tarde, com Yohane lutando com quase todos os caçadores presentes naquele recinto, e derrotando todos.

Então chegou o início da noite, todos começaram a se despedir e ir embora, pois o Natal se aproximava. Yohane convidou Maeve para passar a ceia em sua casa, e como a brasileira morava sozinha, não tinha motivos para recusar. As duas tomaram um rápido banho nos chuveiros da Academia e saíram da Igreja de Santa Mônica, voltando ao Upper West Side.

Ao subirem as escadas, entraram no apartamento e encontraram mais pessoas do que a ruiva estava acostumada a ver ali dentro. Além de Emília e Abigail, Aisha, Adam e até Marko estavam ali. As recém-chegadas cumprimentaram todos e puderam sentir o cheiro delicioso na cozinha.

— Maeve! — disse Adam. — Não esperava te ver aqui, veio esfregar na cara da família da ruiva que ela não consegue te vencer?

— Pois você vai morder sua língua, seu metido! — respondeu Jô, colocando o dedo indicador no peito de Adam, com um sorriso confiante no rosto. — Hoje eu a derrotei, e todos do dojô quiseram lutar comigo.

— Nem. Fodendo. — Adam estava chocado.

— Olha a boca, Adam! — gritou Emília, da cozinha.

— Acredite se quiser — disse Maeve, com a mão na cintura. — Ela foi incrível hoje. Mas não deixe subir à cabeça, Pride.

— A irmã Jô vence qualquer pessoa! Ela é a mais forte de todos! Depois do Hank. O Hank é o mais forte de todos! — disse Abigail, segurando um ganso com um lacinho de cetim azul no pescoço.

— Honk! — gritou o ganso.

— Sério, quem deu um ganso pra sua irmã, Yohane? — perguntou Marko, segurando uma taça de vinho.

— Eu me faço essa mesma pergunta há seis meses... Ah, aliás! — A ruiva cerrou o punho e deu um forte soco no ombro de seu ex-professor, fazendo algumas gotas de vinho caírem na cerâmica.

— Ah! Por que fez isso?!

— Por ter contado toda minha história acadêmica para o Adam! Até hoje eu fico ouvindo piadinhas sobre isso!

Todos deram uma risadinha discreta e o rosto de Yohane ficou completamente vermelho.

— Ah, filha, desculpe — Emília saiu da cozinha segurando uma bandeja com um farto peru assado. — Mas você tem que admitir que é engraçado. E eu ainda não sei como você não foi expulsa do colégio mesmo com todas as vezes que fui chamada pra diretoria.

— Esse é um dos maiores mistérios de White Horse: Yohane Pride, a valentona mais bem sucedida do Oeste. — Marko disse, como um narrador.

Todos deram risada e a ruiva se encolheu, cruzando os braços. Mas logo se rendeu a brincadeira e começou a rir com todos. A confraternização continuou por horas. Marko e Emília conversavam na cozinha; Aisha e Abigail brincavam na sala; Maeve, Yohane e Adam trocavam insultos na mesa de jantar.

Até que o tão aguardado momento chegou. Já era quase meia noite, todos sentaram à mesa e, assim que o relógio virou, um grande e farto brinde foi feito. As taças e copos se chocaram levemente, fazendo um som agradável, e todos exclamaram para o céu.

— Feliz Natal!

Toda a Manhattan celebrava. Adultos bebiam e conversavam, e crianças abriam seus presentes com ansiedade, enquanto um bom velhinho sobrevoava os céus desejando entregar uma parcela da beleza do mundo para aqueles que eram bondosos. Mas não só isso. Esse mesmo bom velhinho percebera, com a ajuda de uma ruiva “esquisita”, que aqueles que sabiam de sua existência, também podia merecer um presente.

“Não apenas um presente, mas um pedido de desculpas por todos os anos em que você me esperou acordada, Wanda Petrov. Espero que possa desculpar esse bom velhinho, e que você tenha um maravilhoso Natal.”

Foram essas as palavras que Wanda Petrov leu na etiqueta de uma caixa de presente que apareceu de repente em sua porta. Lágrimas de emoção molharam seus olhos, e ela abriu o presente com cuidado, se alegrando como nunca ao ver seu conteúdo.

— Espero que, nessa noite, todos vocês olhem além da maldade do mundo e percebam que também existe muita beleza nele. E nas pessoas que vivem nele.

Nicolau murmurou com um sorriso no rosto, enquanto guiava suas renas através dos céus da Terra.

 



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