O Apocalipse de Yohane Brasileira

Autor(a): Henrique Ferreira


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 15: Aquela Maldita Noite

― Sabe, Violet. Você deveria ter trago sua força tarefa como eu disse para fazer. — A jovem de cabelo acobreados e olhos verdes disse enquanto caminhava pela grama alta, com a detetive logo atrás.

— Isso é extraoficial. Até onde meu superior sabe, eu estou na casa da minha mãe — Violet olhava para todos os lados com a lanterna, aguardando o pior.

— Complicado seu marido também ser seu chefe, né? Estamos chegando.

Levantando suas lanternas, Carol e Violet viram um armazém abandonado. Estava cheio de folhagens e musgo nas paredes. Fazia muito tempo que alguém ia naquele lugar. Ou talvez aquela aparência fosse proposital, para afastar as pessoas.

— Que lugar bizarro. É aqui mesmo?

— Sim, eu nunca esqueceria o lugar onde meus traumas nasceram. Quanta munição você tem, aliás?

Violet conferiu sua pochete de munição e o pente da arma.

— Quinze balas na pistola e mais um pente na bolsa. Minha faca também está aqui.

— Esperava que trouxesse ao menos um rifle, já que decidiu vir sozinha. Mas vamos torcer pra isso ser o suficiente.

— Calma, por que está preocupada? Carolyn, o que nós vamos encontrar lá dentro?

A jovem olhou para Parker com uma expressão calma e sorriu.

— O lado sombrio desse mundo.

Carol seguiu para a entrada, deixando a loira ansiosa. Estava preparada para o pior mas, infelizmente, isso não seria o suficiente.

Na porta da frente, se depararam com uma corrente presa por cadeado, trancando a passagem. Violet apontou a arma, era simples abri-lo com um tiro, mas a estudante a impediu.

— Economize suas balas. Tem um pé de cabra por aqui.

— Como você sabe?

— Quando fugi desse lugar há dois anos, voltei e deixei algumas coisas uteis escondidas, imaginando que eu poderia ter que voltar. Quem diria que eu estaria certa.

Carol começou a procurar na terra e atrás das árvores com a lanterna. Depois de alguns minutos sujando as mãos, encontrou um pé de cabra, um facão e um isqueiro.

— Aqui, abre a porta. — Pegou a lâmina e guardou o isqueiro.

Violet, com o pé de cabra, forçou a entrada, quebrando a corrente. Entrando no local, se depararam com um hall totalmente escuro. Iluminando com as lanternas, puderam ver as paredes e pisos brancos com manchas escuras de sangue, junto de moveis espalhados e teias enormes de aranha nos cantos, que fizeram a loira se arrepiar.

Carol seguiu e entrou em uma porta à esquerda. Após alguns segundos, as luzes se ascenderam e todo o local se iluminou. Ficava claro que aquilo era uma instituição médica pela aparência fria. Mas todo o sangue espalhado dava um ar aterrorizante ao local. Indo em frente, pararam no elevador. White hesitou por um momento, questionando a detetive.

— Essa é sua última chance de desistir, Violet. A partir daqui, não posso assegurar nada. Muito menos que encontrará Emma viva lá embaixo. Quer mesmo continuar?

— Ela é minha filha, Carolyn. E é só uma criança. Não importa o que tenha lá embaixo, eu tenho que descobrir o que aconteceu com ela.

— Certo... Mas lembre-se, no final de tudo isso, tenho um pedido para te fazer.

A jovem chamou o elevador e as duas entraram. Dentro da cabine, apertou o botão para descerem ao primeiro andar subterrâneo. A música do elevador ainda funcionava, era calma. Mas isso apenas deixava o clima ainda mais tenso.

Após alguns minutos, as portas se abriram, liberando a passagem para o primeiro andar. Violet não acreditou no que viu descendo as escadas. Aquilo era uma prisão. Estava imunda, enferrujada e fedida. Sangue e entranhas por todos os lados.

— A partir daqui, teremos que descer pelas escadas. Emma deve estar no último andar. Ou o que tiver sobrado dela.

Carol não tinha empatia em suas frases. Ela falava de modo curto e grosso, fazendo o coração de Parker apertar. Porém, tinha um motivo para toda essa frieza. Ela não queria estar ali, aquele era o local onde todos os seus pesadelos nasceram. O motivo de todos os assassinatos em White Horse naquele ano foi criado ali.

Elas verificaram a sala de comando ao lado do elevador, mas estava trancada. Aquilo era ruim.

— Merda — murmurou Carolyn.

— O que houve?

— A porta das escadas tem trancas eletrônicas. O único jeito de entrar é com um cartão de acesso ou liberando por aquela sala. Vamos ter que achar um cartão ou a chave daqui, o que aparecer primeiro.

— Certo... E por onde começamos?

A jovem mordeu o lábio, pensando. Enfim, pareceu lembrar de algo.

— Se bem me lembro, o refeitório ficava em outra ala, após as celas. Se dermos sorte, os cadáveres dos funcionários ainda devem estar lá, e podemos achar alguma coisa.

— Carolyn... O que houve nesse lugar?

— Acredite, Parker. Não vai demorar até você ver com os próprios olhos.

Elas desceram as escadas e passaram pelas celas, indo em direção a saída da ala carcerária. Violet observou através das grades trancadas, havia algumas silhuetas imóveis ali, mas que claramente estavam vivas. Por outro lado, as poucas celas abertas eram difíceis de se ver. Algumas só tinham esqueletos estranhos, mas outras possuíam pessoas mortas recentemente. Queimadas, decapitadas, com membros cortados ou até mesmo com as entranhas descendo do corpo, em estado de putrefação. Algumas celas não possuíam nada além muito sangue espalhado, como se um corpo tivesse sido explodido ali dentro.

Elas continuaram em frente e encontraram o portão da saída, estava aberto. Isso deixou Carol desconfortável.

— Melhor preparar sua arma, detetive — disse, e também ergueu seu facão. — Todo esse sangue fresco indica que não estamos sozinhas.

Violet estava ansiosa. Já não bastasse todas as aranhas e outros insetos andando pelas paredes, ela ainda tinha que lidar com o inesperado. A falta de informação, sem saber o que esperar em seguida, a deixava insegura, fazendo-a se sentir impotente.

— Como você sabe que a Emma está no terceiro andar? — perguntou, observando as portas escancaradas das salas.

— Por que foi pra lá que eu fui. O terceiro andar é restrito aos membros da Seita, e era pra lá que eles levavam as crianças para servirem de cobaia aos experimentos malucos do meu pai.

— Reiner? Era ele que comandava esse lugar?

— Não, ele era apenas o cientista chefe. Quem comandava esse lugar é outra coisa... Espera.

Carol ouviu um barulho, como de uma panela caindo no chão. O som correu pelos corredores, fazendo a espinha da detetive gelar. Elas seguiram com cautela em direção ao barulho.

Alguns metros à frente, encontraram uma sala de descanso, com algumas maquinas de comida e uma pequena cozinha americana com fogão, micro-ondas e geladeira.

As paredes e piso eram iguais aos do andar superior, e igualmente sujas de sangue e miolos. Mas ali havia também alguns corpos putrefatos de cientistas. Mortos com feridas gravíssimas, que lembrava o que tinha visto nas celas anteriores.

— Mas que merda... Como ninguém nunca soube desse lugar?

A jovem de olhos verdes deu uma risada sarcástica, indo conferir a cozinha.

— Como se as Empresas White fossem deixar o mundo descobrir sobre o pequeno playground desumano deles. Não, é claro que não. Encobriram tudo e disseram que as instalações foram fechadas por risco de desabamento.

— Mas... Você sabia de tudo isso, não é? Por que não procurou as autoridades quando fugiu?

— Uma adolescente de dezesseis anos dizendo que existe uma casa cheia de monstros ali perto. Sim, Violet, todos acreditariam e viriam ajudar. Quando eu sai desse bueiro eu só queria esquecer e ter uma vida normal. Mas... bem, você viu o que houve na escola quando tentei...

Violet ficou sem palavras, não sabia o que dizer para a garota. Porém, algo lhe incomodou na frase de Carol.

— Espera, o que você quer dizer com monstros... Carolyn, cuidado!

A jovem se virou e caiu no chão com o susto. Seus olhos se arregalaram e seu corpo estremeceu. Traumas do passado sendo revividos em sua mente. À sua frente, uma pessoa se levantara.

Seu corpo era cheio de pelos e seus dentes eram como os de um animal. Suas orelhas eram pontudas e sua expressão retorcida, como a de um cachorro enfurecido. As garras também eram afiadas, e batiam com as feridas dos cadáveres ao lado.

— Parado! Coloque as mãos para cima, você está preso!

Mas mesmo com o anuncio de Violet, que apontava sua arma para o homem, ele não parou de andar em sua direção.

— Eu disse: mãos para cima!

Ele não parou, forçando Violet a puxar o gatilho contra seu peito. O homem cambaleou, mas não caiu. Quando recuperou o equilíbrio, pareceu muito irritado. Se pôs de quatro e começou a correr ao redor da detetive, que tentava uma mira limpa, sem sucesso. E, antes que pudesse perceber, o inimigo pulou sobre ela, tentando abocanhar seu pescoço. Mas Parker puxou sua faca rapidamente e enfiou em seu maxilar, fazendo ele chorar como um animal em dor.

— Atira nessa merda, porra! — gritou Carolyn, aterrorizada.

Violet puxou o gatilho uma, duas, três... catorze vezes, até a pistola parar de disparar por falta de munição. O homem caiu morto, cheio de furos no peito, rosto e crânio. Uma poça de sangue escuro se formou sob ele.

A detetive gritou em alívio e caiu no chão, sentindo as pernas fraquejarem. A jovem caucasiana se levantou e respirou fundo, se acalmando. Ajudou a loira a se levantar.

— Mas que caralho! O que foi isso?! — Violet estava apavorada, seu coração ameaçava pular pela garganta de tão acelerado.

— Você realmente deu voz de prisão para um lobisomem?! Você poderia ter morrido ali mesmo! Que merda!

— Espera, o que?! Como assim, lobisomem?!

— Exatamente o que ouviu, você acabou de matar um lobisomem. Eles são reais, assim como toda desgraça de lenda que você conseguir imaginar! — A garota respirou fundo, tentando se acalmar. — Escuta, detetive, da próxima vez que você ver qualquer coisa nesse prédio que não seja a sua filha, atire na cabeça sem pensar duas vezes. Nada nesse lugar é humano. Mate sem misericórdia.

Violet olhou com a expressão mais confusa que podia para Carol e passou a mão no rosto, tentando se acalmar.

— Tá certo... — Pegou um novo pente e recarregou sua arma. — Você podia ter me dito antes, eu teria economizado muita munição aqui.

— E você teria acreditado em mim? Mas esse lobo era resistente, normalmente três tiros no peito teriam derrubado ele...

Carol olhou ao redor e viu uma caderneta próxima do corpo de um cientista. Havia uma mensagem escrita nela. A jovem começou a ler em voz alta.

— “Quando me convidaram para trabalhar em um laboratório das Empresas White, eu não hesitei em aceitar. Quer dizer, se um empresa multimilionária quer você na equipe deles, você não pode recusar. E era a chance da minha família de viver bem, com conforto. Nos mudamos para White Valley na semana seguinte. Mas quando desci as instalações e vi qual seria meu trabalho, o arrependimento tomou meu corpo quase que imediatamente. Descobri que os monstros das histórias existiam, e minha função era auxiliar outros cientistas a fazer experimentos neles, deixá-los mais fortes, resistentes. Eu não queria mais fazer parte daquilo, mas fiquei quieto. E ainda bem que fiquei. Um colega meu resolveu abrir o bico, e o Sr. White não pensou duas vezes antes de jogá-lo na cela de dois lobisomens. Ele foi dilacerado na hora. Não havia retorno, eu tinha que continuar aqui e de boca fechada, ou tenho certeza que eles farão minha família pagar, e depois me matariam também. Me perdoe Betty, meu amor, por mentir pra você. O que eu faço aqui é desumano, mas é o preço pela sua segurança e da Patrícia, nossa pequena. Sinto muito por tudo isso.” — Carol suspirou e deixou a caderneta onde estava.

— Meu Deus... — Violet estava atônita com a carta do morto.

— Era isso que eles faziam. Pegavam cientistas honestos e os ameaçavam para continuar aqui. Escrotos de merda... Vamos, ainda temos dois andares para descer, e as coisas só vão piorar a partir daqui.

Carol revistou os cientistas mortos em busca de um cartão ou uma chave, mas não encontrou nada. Em silêncio, elas seguiram o corredor e olharam em cada uma das salas por onde passaram, mas não encontraram nada além de corpos dilacerados de outros cientistas.

No final do corredor, havia uma última porta, essa era eletrônica, e abria com a proximidade. Quando entraram, encontraram alguns armários abertos e vazios e um corpo de um segurança, armado com um fuzil de assalto.

— Por favor, esteja aqui...

Carol revistou cada bolso do uniforme do defunto e, quando achou que não havia mais esperanças, a jovem encontrou um granada de luz e uma chave com um marcação escrita “Comando”

— Isso! Tem que ser essa. Aqui, pega essa granada, pode ser útil.

— Certo... — Violet olhou para o fuzil nas mãos do morto e pensou por alguns segundos até decidir leva-lo consigo. Conferiu a munição, vazia. Porém, havia um pente no corpo do segurança. Ela o pegou e recarregou a arma.

— Escolha inteligente — comentou a garota de olhos verde. — Agora vamos.

  Voltaram correndo para a sala de comando. Com os dedos cruzados, Carol colocou a chave na fechadura e ela se destrancou, liberando a passagem.

Diferente de outros lugares das instalações, a sala de comando estava intacta. Porém, havia sim um corpo ali, com sangue seco na cabeça e pelo corpo, mas ele não possuía feridas como os anteriores.

Estava ali, escorado na parede, com uma pistola próxima da mão, em um estágio avançado de decomposição. Suicídio. A jovem de cabelos cor de cobre parecia angustiada ao ver aquele homem.

Havia também, na mão dele, uma pedaço de papel com uma mensagem. Violet o pegou e leu.

— “Não sei o que diabos aconteceu lá embaixo, mas deu merda, deu muita merda. Todos nós sabíamos o que acontecia nesse lugar, mas tínhamos que ficar quietos, porque eram os monstros ou nós. Mas tudo começou a desmoronar quando aquelas duas pirralhas escaparam. Elas eram as estrelas do experimento e o Sr. White tinha muita esperança nelas. É claro, uma delas era sua própria filha... aquele cuzão de merda. Elas subiram as escadas e trouxeram muitos monstros pra cá, fazendo nossos seguranças serem eliminados em poucos minutos. E, no final, a mais velha ainda me ameaçou com uma lasca de metal, dizendo para eu liberá-las. Merda, não tinha mais o que fazer, não ia atirar em duas crianças! Acabei liberando o acesso ao elevador pra elas e sobrevivi, mas sabia que era por pouco tempo. Os monstros iriam me matar, ou pior, o Sr. White iria fazer isso. Adeus, Paul. Sei que tínhamos planos, mas... Eu escolhi esse trabalho e não dava mais pra voltar quando percebi que fiz merda. Me perdoa.”

— Uma carta de suicídio... — Violet se levantou e encarou Carol, que se recusava a olhar para o homem. — Você lembra dele não é? Era de você que ele falou na carta... Quem era a outra garota?

Carol apenas ignorou e foi até o painel de controle, procurando pelos botões para liberar o acesso às escadas.

— Não temos tempo para isso. Merda, não sei mexer nesse painel... Okay, acho que é esse.

O som da tranca se abrindo foi ouvido, e uma luz verde foi vista acima de uma porta de metal, metros à frente.

— Carolyn, te fiz uma pergunta.

— Isso já não importa mais.

— Claro que importa, eu preciso de informações para conseguir lidar com toda essa merda.

— Não! A única coisa que você precisa é calar a porra da boca e encontrar a pirralha da sua filha! Merda! — Em um momento de raiva, a jovem socou o painel com as duas mãos, fazendo Violet calar.

Mas o mesmo som de antes foi ouvido, e o barulho de portas de correr se abrindo chegou aos ouvidos das duas. Algo estava errado.

— Espera... — Carol olhou para as celas, antes trancadas, se abrindo. — Não, não, não! Fodeu! Fodeu muito! Temos que ir, agora!

A garota correu da sala de comando seguida pela detetive, mas já era tarde. Os monstros que saiam das celas as avistaram e subiam as escadas em direção a elas.

— Puta merda, e agora?! — Carolyn estava apavorada. — Tá acontecendo tudo de novo!

— Se acalma! Err... Certo, quando eu der o sinal, você puxa o pino e joga a granada lá embaixo. Vamos ter que pular.

— Mas é muito alto!

— Não o suficiente pra nos matar. No meu sinal!

Violet entregou a granada de luz para a companheira e preparou o fuzil.

— Certo... — destravando a arma, mirou nos monstros nas escadas. — Faz tempo que não uso isso, mas vamos lá.

Segurou o gatilho, cerca de 10 tiros foram disparados em poucos segundos. Soltou o gatilho. Fez o mesmo no segundo monstro, fazendo-o cair morto e derrubar o lobisomem de trás, lhe ganhando alguns segundos.

— Agora!

Carolyn fez como instruído. Puxou o pino e lançou a granada logo abaixo. Violet a protegeu e ambas fecharam os olhos. Quando abriram, todos os monstros estavam cambaleando, sem conseguir enxergar.

A detetive pegou a companheira pelo braço e pulou o parapeito, caindo alguns metros, mas sem ferimentos graves.

— Vamos, isso não vai segurá-los!

Correndo enquanto atirava nos inimigos atrás, a loira gritou. Alguns metros à frente, chegaram até a porta. Carol a abriu e entrou, esperando angustiada por Parker para poder fechá-la novamente. Um lobisomem estava a perseguindo ferozmente após recuperar sua visão. Violet, quando chegou próxima a saída, saltou em direção a porta, mas não conseguiu evitar o arranhão profundo feito pelas garras do animal.

A estudante fechou a porta e a tranca automática a bloqueou novamente, impossibilitando os monstros de prosseguirem. 



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