O Anjo da Porta ao Lado Me Mima Demais Japonesa

Tradução: DelValle

Revisão: Mon, Kurayami


Volume 11

Capítulo 9: Dia Branco e Grande Revelação

   O White Day havia chegado, e o clima estava bem mais tranquilo comparado à agitação do Dia dos Namorados.

   Alguns rapazes ainda estavam presos naquela tensão agridoce. Outros, que não tinham ganhado nada no Dia dos Namorados, fingiam não ter a mínima ideia do que era o White Day e não levavam presentes para as garotas. “White Day? Algum lanche novo e gostoso ou algo assim?” brincavam, ignorando o assunto como se não significasse nada. Alguns pareciam completamente ressentidos com a situação, enquanto outros exibiam a expressão serena e despreocupada de alguém que havia alcançado a iluminação espiritual plena.

   Na turma de Amane, as coisas estavam surpreendentemente animadas e descontraídas, graças a algumas garotas que distribuíram chocolates obrigatórios para todos no Dia dos Namorados.

   Elas deixaram claro que ninguém deveria retribuir o favor, então nem todos os rapazes apareceram com um presente. Ainda assim, a julgar por todas as sacolas e pacotes espalhados, a maioria dos rapazes havia trazido algo por cortesia.

   Amane já havia recebido sua cota de amizade e chocolates obrigatórios, então também viera preparado. Trouxera alguns doces em troca. Eram escolhidos com cuidado, ou pelo menos com tanto cuidado quanto sua memória um tanto nebulosa permitia. Ao longo do último ano, ele anotara mentalmente as preferências de cada garota a partir de conversas casuais e fizera o possível para combinar seus presentes de acordo.

[Kura: Amane evoluiu muito kkkk.]

   Ele optara por alguns doces mais caros, já que os consumíveis eram uma escolha segura e ponderada. Afinal, se o presente não caísse bem, seria difícil se desfazer de uma bugiganga.

“Bom dia. Obrigado pelo presente de Dia dos Namorados. É uma coisinha em troca. Só para garantir, você não é alérgica a nada, né?”

   Depois de refletir sobre o horário, Amane decidiu que era melhor entregar os presentes de retorno antes do início das aulas. Se esperasse até depois da aula, alguém poderia escapar antes que ele tivesse a chance. Mahiru não se importou e se despediu dele com um sorriso suave e encorajador.

   Hibiya tinha acabado de chegar à aula. Ela carregava uma sacola de papel cheia de alguns presentes de retorno. Só para ter certeza, Amane perguntou se ela tinha alguma alergia. Ela pareceu confusa a princípio por Amane ter falado com ela, mas seu rosto imediatamente se iluminou no momento em que ouviu as palavras “Dia dos Namorados”.

“Não, sem alergias!” ela disse animadamente. “E nossa, obrigada! Isso é muito mais do que eu esperava, especialmente um wafer de chocolate.”

“Não, sério, eu é que deveria agradecer.”

   Mesmo que fosse obrigatório, ele apreciou a gentileza por trás.

   Ele havia comido alegremente durante uma de suas sessões de estudo.

   Quando ele lhe entregou o pacote de biscoitos amanteigados cuidadosamente embalados, ela sorriu radiante. “Que legal! Com certeza vou fazer deste o meu lanche de hoje.”

   Sua alegria genuína fez Amane se sentir inesperadamente aliviado.

   Seus olhos se voltaram para Konishi, que acabara de chegar ao lado de Hibiya.

   Seus olhares se encontraram, e ela o cumprimentou com um sorriso gentil.

   Para Amane, pelo menos, não pareceu forçado. E o fato de ele não sentir desconforto ou culpa ao olhar para ela era reconfortante.

“Obrigado pelo chocolate também, Konishi. Gostei muito.”

“Que bom que gostou.”

   A resposta dela foi suave, sem hesitação ou constrangimento. Ela falou no mesmo tom calmo e firme de sempre, e Amane respondeu com a mesma naturalidade, como se nada tivesse acontecido entre eles.

“Aqui, isto é para você.” Amane estendeu a mão para Konishi. “Supondo que você não seja alérgica.”

“Não sou, então não se preocupe. Muito obrigada.”

“Eu ganhei algo de você, então achei que devia retribuir o favor. Posso pelo menos garantir que é gostoso.”

“Se você recomenda, Fujimiya-kun, então estou ansiosa para experimentar mais tarde.”

   Seu sorriso modesto era o mesmo que sempre exibia nas aulas. Amane respondeu com um sorriso amigável, do tipo que ele daria a qualquer colega de classe, e passou o presente para as mãos dela.

   Ele se lembrava vagamente de ter ouvido uma conversa entre as meninas, um tempo atrás, sobre seu amor por petiscos de matcha. Com base nisso, escolheu um conjunto de sablés de matcha com diferentes níveis de riqueza, um deleite que apreciava pessoalmente de vez em quando.

   Ele pediu à loja para embrulhar o produto e, embora a embalagem estivesse impecável, o papel semitransparente ainda permitia ver o que havia dentro.

   No momento em que Konishi o viu, seus olhos se arregalaram de surpresa.

   Ela olhou para ele, mas não havia tristeza ou lágrimas em seus olhos — apenas surpresa.

   Então, com a mesma rapidez, essa surpresa deu lugar a um sorriso brilhante e genuíno. Konishi sorriu radiante. “Obrigada, eu adoro matcha. Vou aproveitar cada mordida.”

   Com isso, ela se virou e foi embora, claramente mais animada do que antes.

   Enquanto a observava partir, Amane sentiu os últimos resquícios de um peso antigo, mas agora desnecessário, se dissiparem de seu peito. Ele expirou suavemente e voltou para onde Mahiru o esperava.

   Ela confiava nele sem questionar. E, pelo que ele podia ver, não havia o menor traço de dúvida em sua expressão.

   Parecia que tanto os sentimentos que Konishi um dia nutrira por ele quanto a culpa que Amane carregava em troca haviam sido gentilmente apaziguados. Talvez sabendo disso, Mahiru o recebeu de volta com seu doce sorriso de sempre.

“Terminou de distribuir tudo?” perguntou ela.

“Ainda não,” disse Amane. “Algumas pessoas ainda não apareceram. Entregarei a delas mais tarde. A Kido e a Chitose também ainda não chegaram.”

“Já que você mencionou... você tem razão. Elas geralmente já estariam aqui.” Eles se viraram em direção à porta da sala de aula. Bem na hora, Itsuki entrou.

   Ele havia mencionado que ganhara chocolates de algumas garotas e, com certeza, carregava uma sacola que provavelmente continha seus presentes de retorno. Mas hoje, Chitose não estava com ele.

“Bom dia. Vocês dois chegaram cedo,” disse Itsuki ao entrar.

“Bom dia,” respondeu Mahiru com um sorriso gentil. “Acho que chegamos um pouco mais cedo do que o normal hoje.”

“Bom dia. Cadê a Chitose?”

“Caminhamos juntas até o armário de sapatos, mas assim que chegamos, ela começou a reclamar que estava com as mãos congelando e saiu correndo para pegar algo quentinho em uma máquina de venda automática. Eu tinha coisas para distribuir, então disse a ela que iria na frente. Ela disse que estava a fim de um café com leite, então imagino que tenha ido à que ficava perto do refeitório.”

   A escola deles tinha máquinas de venda automática espalhadas por todo o campus, mas o café com leite que Chitose tinha se viciado recentemente era vendido em apenas uma máquina inconvenientemente longe da sala de aula.

   Se houvesse uma por perto, ela poderia ter ido até lá e pronto. Ir até a mais próxima levaria um pouco mais de tempo.

   Não acredito que ela está se esforçando tanto neste frio, pensou Amane, divertido e um pouco impressionado com sua dedicação.

   Ele olhou para Itsuki, cujo nariz ainda estava vermelho de frio. Itsuki não se importou com o olhar de Amane e voltou sua atenção para Mahiru.

“Ah, Shiina-san, Shiina-san! Tem um segundo?”

“Algum problema?”

“Vem cá, vem cá.”

   Por algum motivo, Itsuki estava acenando para Mahiru, apontando para um canto da sala de aula especificamente afastado de Amane. Embora um pouco confusa, Mahiru não pareceu desconfiada e o seguiu sem hesitar.

   Provavelmente era relacionado ao White Day — provavelmente seu presente de retribuição. Ainda assim, o fato de Itsuki tê-la puxado deliberadamente para o lado, fora do alcance da voz, deixava claro que o que quer que ele estivesse dando a ela não era algo que ele queria que Amane visse ou ouvisse.

     Que diabos ele está aprontando...?

   Sem querer bisbilhotar descaradamente, Amane os observava discretamente à distância. Itsuki tinha um sorriso caloroso e tranquilo enquanto tirava um pequeno pacote de sua sacola de papel e o entregava a Mahiru. Era claramente um presente de White Day.

   Mas simplesmente dar algo a ela não justificava arrastá-la para longe daquele jeito. Amane achou aquele ponto um pouco estranho.

   Então ele viu Itsuki pegar seu celular.

   Mahiru parecia genuinamente satisfeita ao aceitar o presente, mas havia um lampejo de suspeita em seus olhos ao olhar para Itsuki. Não que isso o perturbasse. Ele apenas continuava com aquele sorriso suspeitosamente inocente.

   Mesmo do outro lado da sala, aquele sorriso foi o suficiente para disparar o alarme na cabeça de Amane.

“...tem que... garantir que el—...ouça isso, okay...? Achei que você gostaria de saber disso, Shiina-san... e imaginei... que te faria feliz.”

[Kura: O que eu disse mesmo?? Que o Itsuki tinha gravado a confissão do Amane.]

   Amane só conseguia captar fragmentos do que Itsuki dizia. Ele falava baixo demais e estava longe demais para entender a conversa inteira. Mas mesmo aquelas palavras dispersas deixavam óbvio que, o que quer que Itsuki estivesse fazendo, ele havia planejado com cuidado e intenção.

   Depois de falar com Mahiru, Itsuki guardou o celular no bolso e casualmente virou a cabeça na direção de Amane. Totalmente ciente de que estava sendo observado, Itsuki lhe deu uma piscadela ofuscantemente presunçosa, seguida de um aceno atrevido.

   Amane ficou envergonhado por Itsuki não ter apenas esperado que ele desconfiasse; ele contava com isso. Ele esperou pacientemente o retorno de Mahiru, enquanto Itsuki foi distribuir presentes para as outras garotas em vez de ir até Amane.

   Mahiru voltou um pouco mais rápido do que o normal. Quando Amane a olhou, ela exibia um sorriso perfeitamente normal. Parecia alguém que simplesmente recebera um presente atencioso e o apreciara — nem mais, nem menos.

   O que quer que tivesse acontecido com Itsuki, ela não demonstrava em seu lindo rosto. “...Foi o presente dele de White Day?”

“Sim. Ele me deu esses adoráveis ​​biscoitos de cobertura em formato de animal.”

“Imagino que ele escolheria algo do seu agrado.”

   Sem precisar que lhe pedissem, Mahiru estendeu o presente para que ele pudesse dar uma olhada.

   Dentro da embalagem plástica transparente, havia biscoitos com formatos intrincados, cada um inspirado em um animal diferente e com delicados detalhes de cobertura. Os olhinhos redondos, os rostinhos expressivos e os padrões encantadores capturavam perfeitamente as feições de cada animal.

   Guloseimas fofas geralmente eram mais doces graças à cobertura, mas considerando o gosto de Mahiru tanto por coisas fofas quanto por sabores doces, provavelmente eram exatamente o que ela queria.

“Eu gosto deles, mas... hum, estou um pouco dividida.”

“Eles são fofos demais para comer, né?”

“Hehe, você me conhece bem demais.”

[Del: Essa eu tenho que fazer: “M-mas... seria um desperdício destruí-lo quando há um gatinho tão fofo…” - Cap 9 Vol 3. O café com escultura de espuma.]

   Quando visitaram um café para gatos, Mahiru hesitou em beber seu latte porque a arte em espuma era fofa demais para se estragar. Como ele esperava, Mahiru demonstrava a mesma preocupação agora.

[Del: Em minha defesa, eu li esse parágrafo depois… | Moon: Del está mais rápido que a própria Saeki-san!! kakak É como eu sempre digo, grande Delciclopédia… | Kura: Desconfio que foi antes kkkkk.]

   Os biscoitos em suas mãos eram decorados com tanto carinho e charme que até Amane se sentiria um pouco mal em morder um. Para alguém como Mahiru, provavelmente parecia um pecado. Vê-la hesitar em comê-los aquecia seu coração. Ele sentiu um pouco de pena dela, mas não conseguiu evitar um sorriso.

“Quanto melhor feitos, mais difícil é comê-los,” disse Amane com uma risada suave.

“Mas eu tenho que comê-los antes que estraguem... Uuuu...” Mahiru soltou um pequeno gemido, claramente angustiada.

“Bem, se você os ama tanto assim, tenho certeza de que Itsuki ficaria emocionado. Ele tem bons instintos para esse tipo de coisa.”

   Itsuki poderia facilmente ter seguido o caminho genérico, mas, em vez disso, escolheu algo que combinava perfeitamente com o gosto de Mahiru. E, a julgar pela maneira como ela continuava admirando os biscoitos, ele acertou em cheio. Mesmo que parte dela lamentasse a ideia de morder algo tão adorável.

   Observá-la maravilhar-se com eles com tanto deleite inocente trouxe um sorriso caloroso ao rosto de Amane. Foi um momento simples, mas que o fez se sentir aconchegado e confortável, como se gentilmente envolvido por um véu cálido de felicidade.

“...Então, deixando isso de lado,” ele começou gentilmente, “O Itsuki não sussurrou outra coisa para você também?”

   Ele fez a pergunta como namorado dela. Perguntou calmamente, deixando claro pelo tom e pela expressão que ela não precisava responder se não quisesse, e que ele não pressionaria.

   Mesmo assim, os ombros de Mahiru se contraíram de repente e de forma inconfundível.

“Não, ele...”

“—não?”

“...Eu prometo, eu não te traí nem nada do tipo. Não é nada disso.”

“Sim, eu sei.”

[Kura: Inocente kkkk coitadinha…]

   Amane não duvidou dela nem por um segundo. Ele conhecia Mahiru muito bem. Se havia uma coisa que ele podia dizer com absoluta certeza, era que ela jamais o trairia.

   Talvez a versão dela que o mundo via, a polida e intocável “Anjo”, pudesse parecer alguém capaz de guardar segredos. Mas a verdadeira Mahiru, aquela que só ele conhecia, não era assim. Ela não conseguia esconder nada dele, mesmo que quisesse. Era sincera e honesta demais. E mesmo que, na chance de um em um milhão de seus sentimentos mudarem, ela lhe diria isso na cara.

   Então, não, ele não estava perguntando porque suspeitava dela.

   Ele só queria saber se Itsuki havia dito algo estranho ou lhe dado algo questionável sob o pretexto de um conselho amigável ou um presente.

“E-Era, hum, algo que ele achou que eu pessoalmente gostaria!”

“Ah, entendi. Uma foto ou algo assim, então, hein? Se for só isso, então, sem dúvida.”

[Moon: Um certo áudio… Talvez kkkk, não comentei no capítulo em si, mas o Itsuki mexendo no celular depois daquela conversa foi um tanto suspeito…(Aguardem para compreenderem melhor) | Kura: Relaxa, comentei para nós dois.]

   No segundo em que ela deixou escapar “algo que eu pessoalmente gostaria,” a resposta poderia muito bem ter sido enfiada na cara dele. Amane assentiu, decidindo deixar por isso mesmo.

“Sinto que você me entende um pouco bem demais às vezes...” murmurou Mahiru.

“Bem, se o objetivo era fazer você sorrir, isso soa exatamente como o tipo de coisa que o Itsuki inventaria.”

   Mahiru nunca hesitava em nada quando se tratava de seus amigos. Mesmo que o chocolate que ela deu a Itsuki não fosse tão elaborado quanto os que ela fez para Amane, ainda assim fora cuidadosamente preparado e estava delicioso.

   E sabendo como Itsuki era íntegro das maneiras mais estranhas, ele provavelmente sentiu que apenas retribuir o presente não era suficiente para equilibrar a balança. Adicione a isso seu hábito de agir como um gremlin travesso especificamente com Amane, e não era difícil adivinhar que o gesto extra tinha sido em parte boa vontade genuína e em parte trolagem bem-humorada.

“...Você não está curioso para saber o que era?”

“Bem, eu estaria mentindo se dissesse que não. Mas não sinto necessidade de verificar. É algo pessoal e confio em vocês dois.”

   Mesmo como um casal, havia limites que não deveriam ser ultrapassados. Por mais próximos que fossem, o espaço pessoal importava. Bisbilhotar só para satisfazer a curiosidade não era algo em que Amane acreditava, especialmente com alguém que ele amava.

   Além disso, fosse o que fosse, o simples fato de ter vindo de Itsuki e ser para Mahiru lhe dizia que não era nada com que ele precisasse se preocupar. Já era o suficiente.

   Com a resposta relaxada e tranquila dele, Mahiru soltou um murmúrio suave e pensativo.

   Ela pareceu um pouco em conflito.

“...Estou muito feliz que você confie tanto em mim,” disse Mahiru suavemente. “E, hum... não é como se fosse um grande segredo ou algo assim. O que ele me mostrou foi, bem... uma gravação de voz.”

“Uma gravação de voz?”

“Ele disse que eu deveria ouvir sempre que me sentir sozinha sem você...”

[Del: Má nem que ele usou o celular para gravar naquela hora, o áudio dele falando tão apaixonadamente sobre ela. (Que o vol 11.5 tenha um capítulo dela escutando esse áudio.) | Moon: EU SABIA! Eu não estava louca quando revisei e disse “Ele gravou isso, não gravou?” | Kura: Finalmente kkkkk.]

   Ela se remexeu levemente, encolhendo-se, seu olhar se desviando enquanto suas bochechas ficavam rosadas. Ela não conseguia encará-lo.

   Amane se lembrou da vez em que ela adormecera enquanto falava ao telefone com ele. Esse fora o primeiro sinal de que ela gostava especialmente da voz dele. Às vezes, ela até pedia para ouvi-la antes de dormir.

[Del: Esse evento aconteceu no cap 16 do vol 5.5.]

   Itsuki deve ter descoberto isso de alguma forma e decidiu gravar a voz de Amane como um bônus junto com seu presente. Ou, mais provavelmente, como o verdadeiro presente.

     Um aviso teria sido legal...

“...Sabe,” disse Amane com um suspiro, “se você tivesse pedido, eu mesmo teria gravado algo para você.”

“Sério!?”

“Nossa, você está bem animada. Não posso negar o quão certeira foi a ideia do Itsuki.”

“U-uhm, eu... quer dizer...”

   Era verdade que Amane andava trabalhando meio período com mais frequência ultimamente, deixando-a sozinha mais do que o normal. Se ouvir a voz dele a ajudava a se sentir um pouco menos solitária, ele não se importava, mesmo que fosse um pouco constrangedor. Pelo menos, sabia dizer as coisas que ela queria ouvir.

“Bem, enfim... duvido que seja algo suspeito. Faça o que quiser com isso.”

“...Tudo bem para você eu ficar com ele?”

“Não consigo imaginar que Itsuki te daria algo estranho. Eu confio nele. Além disso, não cabe a mim dizer o que fazer com um presente. Foi dado a você, então se você quiser ficar com ele, fique.”

   Dito isso, Amane tinha a intenção de dar um merecido tapa nas costas de Itsuki mais tarde.

“Se te ajudar um pouco, acho que deixaria eu e o Itsuki felizes. Ele provavelmente consideraria a missão cumprida.”

“Amane-kun...”

“Sem fleeeerrtee! Guardem as coisas românticas para quando estiverem sozinhos!”

   Assim que seus olhares se encontraram e a atmosfera começou a ficar mais agradável, um braço se espreitou entre eles como uma cunha. Ambos reconheceram a voz instantaneamente. Virando-se para olhar, encontraram Chitose parada ali, com um café com leite na mão, o nariz vermelho de frio e uma expressão de dramática estampada no rosto. Ela nem tentava esconder a descrença.

“Bom dia, Chitose-san.”

“Bom dia! Vocês dois estão tão doces como sempre. Está congelante lá fora, mas ver vocês me deixa toda quentinha e animada.”

[Del: Sim. | Moon: Sim. | Kura: Sim.]

“Bom dia. Ou talvez seja a bebida quente que você está tomando e como está parada em frente ao aquecedor,” apontou Amane.

“Não seja desestimulante!”

“É isso que você ganha por tentar nos provocar.”

   Chitose fez parecer que era o estraga-prazeres da situação, mas Amane não tinha o menor interesse em ser o alvo das provocações dela.

   Ele lançou a ela um olhar que claramente dizia ‘Pare com isso,’ mas o sorriso travesso característico de Chitose permaneceu firme.

“Vocês sabem que eu não precisava impedir vocês, né? Teria sido tão divertido quanto ver o rosto de vocês ficar vermelho quando finalmente perceberam que havia pessoas por perto.”

   No segundo em que ela disse isso, ele entendeu. Eles ainda estavam na sala de aula. E embora o primeiro período ainda não tivesse começado, um número razoável de alunos já havia chegado. Amane sentiu as bochechas esquentarem e moveu os lábios desajeitadamente, tentando disfarçar.

“Fiz você corar um pouco, hein?”

“Cale a boca.”

   Claro que Chitose tinha notado. E sua risadinha presunçosa só piorou a situação. Amane limpou a garganta, tentando se recompor, depois enfiou a mão na sacola de papel e tirou uma lata quadrada, cuidadosamente amarrada com uma fita, com cerca de quinze centímetros de diâmetro.

“Aqui. Seu presente de retribuição.”

“Ooh, muito obrigada. Que gentileza sua. Então, o que tem dentro?”

“Eu adoraria dizer ‘espere para ver’, mas não quero criar muitas expectativas. É a lata de biscoitos de edição limitada do White Day, daquele lugar que você gosta. O tema deste ano é especiarias, aparentemente.”

   Independentemente de Amane ter ficado feliz em receber o chocolate de Chitose ou não, ela claramente havia investido muito tempo e esforço nisso. Então, depois de conversar com Itsuki, Amane reservou um tempo para escolher um presente que achasse adequado para ela.

   Depois de conhecê-la por quase dois anos, Amane descobriu que Chitose adorava comida apimentada, tinha uma queda por doces e apreciava sabores com um toque especial. Lanches apimentados estavam fora de cogitação para o White Day, mas algo com um sabor forte e distinto parecia perfeito para ela.

   A lata estava cheia de biscoitos ricamente infundidos com especiarias como canela, cravo, cardamomo e gengibre. Era uma mistura ousada que poderia facilmente dividir opiniões dependendo do gosto.

   Amane havia conversado com Mahiru antes, e ela confirmou que Chitose definitivamente gostava de sabores apimentados. A julgar pela forma como seu rosto se iluminou no momento em que viu a lata, era seguro dizer que ele acertou em cheio.

“Nossa, estes são incríveis. Eu adoro especiarias!” exclamou Chitose.

Afinal, você tentou mastigar um pau de canela,” mencionou Mahiru.

[Del: Mastigar cravo é legal também.]

“O que você estava pensando...? Essa coisa é literalmente casca de árvore...”

   Amane geralmente usava apenas a versão em pó, mas desde que começou a cozinhar a sério, Mahiru lhe ensinou que a canela era, na verdade, feita pela secagem da casca de um certo tipo de árvore perene da família do louro. Ele ainda se lembrava de como ficara estranhamente impressionado na época.

     As pessoas realmente comem qualquer coisa, né...

“Eu achei que fosse bom! Mas não gostei muito da textura…”

“Obviamente que não. Espera aí — então você realmente mordeu uma...?”

“A vida é sobre experimentar coisas novas!”

“Admiro o espírito aventureiro, mas talvez seja melhor estabelecer um limite em algum lugar.”

“Canela em excesso pode afetar o fígado, e alguns temperos não devem ser consumidos em grandes quantidades,” acrescentou Mahiru gentilmente. “Então, por favor, tome cuidado, okay? Ou melhor, mantenha as coisas com moderação.”

Tudo bem, Maaamãe.”

Ma—!? Ei...

[Del: Kkkkkkkk, mas sério gente, a Mahiru está certa. Como exemplo vivo, já passei por sérios problemas por comer comida altamente condimentada. Fiquei internado por 8 dias e praticamente tinha que fazer cirurgia (o que não aconteceu porque meu corpo estava fraco) | Moon: *Despretensiosamente removendo a pimenta da boca* | Kura: Vocês falando de comida, e eu vendo a reação da Mahiru.]

   Mahiru a repreendeu gentil e calmamente, sem se irritar. Chitose respondeu com uma resposta complacente, porém provocativa, o que fez Mahiru suspirar de vergonha e descrença.

   Seu lado protetor sempre parecia vir à tona perto de Chitose, e provavelmente era exatamente por isso que Chitose a via como uma figura ‘materna’. Não era difícil imaginar que foi isso que a inspirou a dar uma pequena cutucada.

Hmph.” Mahiru bufou, inflando as bochechas.

   Chitose, é claro, apenas riu.

“Pensando bem, onde está o Yuu-chan? Ele está... ah, é, ele ainda não voltou. Começou o seu round do White Day.”

   Ao ouvir seu nome, Amane olhou ao redor da sala de aula, mas Yuuta não estava à vista.

   Yuuta geralmente chegava cedo nos dias em que não tinha atividades do clube. E como Amane sabia que estava livre hoje, sua ausência foi um pouco fora do comum... até que ele se lembrou que dia era.

     Certo... não é de se admirar que ele ainda não tenha voltado.

   Yuuta tinha ganhado uma quantidade absurda de chocolates, afinal.

   As alunas do terceiro ano já haviam se formado, então pelo menos ele não precisava se preocupar em devolver nada para elas. Mas até mesmo compensar as meninas do primeiro e do segundo ano já era uma tarefa difícil. Tentar enfiar tudo no curto espaço de tempo depois da aula provavelmente não era realista. Algumas meninas já poderiam ter ido embora àquela altura, e não era garantido que todas ficariam por perto só para receber um presente. Então fazia sentido que ele tivesse ido entregá-las onde pudesse antes de chegar à aula.

“É impressionante como ele leva a sério retribuir o presente para todas as meninas. Não acredito que ele conseguiu trazer todos os presentes para a escola. Deve ter sido um pesadelo carregá-los.”

   Conhecendo Yuuta, ele provavelmente estava dando a mesma coisa para todas. Ele não era do tipo que tinha favoritas. Ainda assim, com a quantidade de presentes que tinha para devolver, mesmo que fosse apenas um biscoito por pessoa, carregar tanto não devia ter sido fácil. Amane estava um pouco preocupado com a quantidade de coisas que Yuuta estaria carregando quando finalmente chegasse à aula.

“Ele se esforça ao máximo, não é? Talvez essa consideração e diligência sejam o segredo da sua popularidade,” pensou Chitose.

“Não é algum truque ou estratégia escondida,” respondeu Amane. “É só quem ele é. Ele é sempre assim, e é por isso que as pessoas gostam dele.”

   De vez em quando, Amane ouvia os colegas menosprezarem a popularidade de Yuuta, considerando-a apenas um subproduto de sua aparência. Mas ele discordava. Se fosse só isso, Yuuta não seria nem de longe tão popular quanto é.

   Claro, mesmo do ponto de vista de Amane, Yuuta era bonito o suficiente para aparecer na capa de uma revista. Some isso à sua constituição magra e atlética, típica do atletismo, e não era difícil entender por que as garotas se importavam. Mas o que realmente atraía as pessoas nele era seu caráter, e Amane tinha certeza disso.

   Desde que se tornara amigo dele, Amane passou a apreciar o quão fácil era conviver com Yuuta. Por tudo o que Amane vira, não havia nele o menor sinal de hipocrisia. Calmo, atencioso e genuinamente amigável, Yuuta tratava a todos com carinho, sem nenhum traço de hostilidade ou condescendência.

   A boa aparência só valia até certo ponto. Se alguém fosse agressivo, reservado ou simplesmente tivesse uma má atitude, esse charme se desvanecia rapidamente. Acabariam não passando de colírio para os olhos. Pelo que Amane podia perceber, a maioria das garotas não era superficial em relação a esse tipo de coisa.

   Nesse sentido, a popularidade duradoura de Yuuta significava que sua personalidade combinava com a imagem que as pessoas tinham dele. E sua consideração em retribuir presentes a cada garota, uma por uma, era um dos muitos motivos pelos quais as pessoas naturalmente gravitavam em sua direção.

“Então você admira o Yuu-chan, é?” perguntou Chitose.

“Bem, você pode me culpar? O cara é praticamente impecável... Há muito nele que vale a pena aprender.”

   Amane não queria ser como Yuuta, nem achava que conseguiria. Mas o admirava genuinamente e queria aprender com seu exemplo.

   Sua compostura, como tratava os outros com respeito, sua sinceridade inabalável e como seguia em frente mesmo quando as coisas ficavam difíceis.

   Yuuta tinha muitas qualidades que valiam a pena imitar.

“Acho que a maneira como você elogia honestamente os pontos fortes das pessoas e aprende com elas é uma das suas melhores qualidades, Amane-kun,” disse Mahiru, sorrindo. “E não acho que você fica atrás dele em termos de sinceridade e consideração.”

“Na verdade,” acrescentou Chitose, sorrindo, “já que você dedica todos os seus sentimentos a apenas uma garota, seu amor por ela é ainda mais intenso. Sabe o que quero dizer? Você é, tipo, surpreendentemente super carinhoso e dedicado à sua querida.”

“Pare de me provocar.”

   Amane encarou Chitose.

   Talvez não a Mahiru, mas a Chitose definitivamente está tentando me provocar, pensou Amane.

   Mas Chitose e Mahiru não ofereceram nada além de sorrisos calorosos. Olharam para ele com olhos suaves e puros, como se estivessem assistindo a algo comovente.

“Estamos te elogiando, eu juro!” insistiu Chitose.

“Exatamente, Amane-kun,” acrescentou Mahiru.

“...Qual é, gente, sério?”

“Olhem para ele! Ele está tão nervoso que nem consegue argumentar.”

“E agora está tentando bancar o tranquilo desviando o olhar. O Amane-kun é tão adorável quando está envergonhado.”

   Mahiru definitivamente estava do lado de Chitose naquele momento. Ela podia não estar provocando-o abertamente, mas estava o bajulando como sua namorada. E, de alguma forma, isso era ainda pior.

   Reprimindo um resmungo, Amane lançou-lhe um olhar longo e penetrante de leve traição.

“Vou fazer você se arrepender disso, Mahiru. Espere só.”

“Espere, porque eu!?

     Quando voltarmos para casa depois do nosso encontro de hoje, vou mimá-la tanto que ela vai ceder e derreter numa poça de gosma.

“Você não é uma garota de sorte?” Chitose olhou para Mahiru. “Parece que ele vai te sufocar de amor esta noite. Ele te ama mesmo, né?”

[Moon: Ai minha santa glicose kkkakak | Kura: Você não falou isso Moon kkkkkk, seus picos de glicose vão às alturas.]

“Chitose…” Amane lançou um olhar furioso.

“Eita! Ele está me encarando!”

   Apesar do grito brincalhão, Chitose não pareceu nem um pouco arrependida. Ela abriu um sorriso largo para Mahiru.

“Você vai pagar por isso depois, Chitose,” avisou Amane, estreitando os olhos.

“Por que você está falando como se eu te devesse alguma coisa?”

“Pense no que você fez.”

“Ele tem razão, Chitose-san.”

“Você também deveria pensar, Mahiru.”

“Uuuh...”

   Claro, Chitose tinha sido a instigadora, mas Mahiru se juntou a ela com um pouco de entusiasmo demais para sair ilesa. Não era exatamente culpa por associação, mas Amane achou que ela também merecia uma pequena repreensão.

   Mahiru tinha o hábito de provocá-lo sempre que queria ver lados diferentes dele. Isso não era novidade. Mas Amane precisava que ela soubesse que, quando pressionasse demais, uma pequena vingança viria.

   Os ombros de Mahiru caíram e Amane sorriu. Ela achou que ele estava genuinamente chateado com ela. Ele estendeu a mão e afastou uma mecha macia de cabelo que havia caído sobre sua bochecha, colocando-a delicadamente atrás da orelha. Então, inclinou-se para perto, seus lábios pairando bem ao lado da orelha agora exposta dela.

“Mahiru,” murmurou Amane, sua voz baixa e deliberada, suave o suficiente para que Chitose não ouvisse. “Esteja pronta quando chegarmos em casa.” As palavras atingiram o alvo instantaneamente.

   Mahiru levantou a cabeça de repente, com os olhos arregalados e as bochechas ficando vermelhas enquanto o olhava em pânico e confusão.

   Amane, é claro, não deu continuidade. Ele apenas lhe deu um sorriso leve e provocador com o canto dos lábios.

[Del: Amane diabinho. | Kura: Muito tenso akakakaka.]

   O rosto dela já estava queimando. Sua imaginação claramente estava a mil, evocando todos os tipos de cenários para o que poderia aguardá-la mais tarde. O engraçado era que ele nem sequer dissera nada específico. Era ela quem estava se deixando levar, mergulhando em sua própria imaginação.

   Deixá-la fervilhar nessa expectativa durante todo o caminho para casa... seria seu castigo.

“Arrumem um quarto, vocês dois!” gritou Chitose, seu sorriso provocador direcionado diretamente a Mahiru, que agora estava tão vermelha que parecia um tomate seco.

   Amane lançou um olhar penetrante para Chitose.

   Ela se encolheu dramaticamente. “Iihhh, assustador! Bate na madeira, bate na madeira!” Ela gritou, como se estivesse se protegendo de um terrível presságio.

   Amane suspirou. Então, levantou uma das mãos à sua frente e formou um círculo fechado com o polegar e o dedo médio para lançar um peteleco.

   Chitose imediatamente gritou: “Kyaaa!” antes de disparar em direção a Itsuki, que acabara de distribuir seus presentes.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Assim que as aulas terminaram, foi fácil identificar quais garotos ainda não haviam distribuído seus presentes. Um por um, eles se dirigiram apressadamente às garotas que estavam esperando para se aproximarem. Yuuta, por outro lado, não parecia nem um pouco cansado. Ele saiu discretamente da sala de aula para entregar o restante de seus chocolates. Era difícil não admirar sua vitalidade.

   Amane, por sua vez, já havia retribuído os chocolates durante o intervalo para Ayaka e as outras que lhe deram alguns no Dia dos Namorados, então não tinha motivo para ficar por ali. Ele estava indo direto para o trabalho.

“Tudo bem, Mahiru. Te vejo mais tarde.”

   Como combinado, Mahiru planejava passar no local de trabalho de Amane depois de ir para casa se trocar, então eles estavam se despedindo por enquanto.

   Quando ele chamou, Mahiru, que ainda estava sentada à mesa, levantou a cabeça.

   Um leve rubor persistiu em suas bochechas, provavelmente um resquício do que ele a dissera antes. Mas seus olhos brilhavam de expectativa, um sinal claro de como ela estava ansiosa para ver onde ele trabalhava.

“Sim, te vejo mais tarde. Mal posso esperar.”

“Pegue leve comigo, está bem?”

   Mahiru não conseguia conter a empolgação. E embora ela se levantasse com passos leves e saltitantes, cada movimento ainda era elegante e gracioso, o que demonstrava a postura que Koyuki havia incutido nela.

   Amane lançou um sorriso tímido quando ela passou por ele.

   Por um momento, ele considerou acompanhá-la até o portão da escola, mas se lembrou do que ela havia dito. Moda leva tempo, e cada segundo importa. Então, ela provavelmente pretendia voltar para casa o mais rápido possível, sem correr.

   Bem, Mahiru sempre fica um pouco agitada antes de sair. Ela é exigente com o cabelo e as roupas, então... é, isso faz sentido, pensou Amane, percebendo o quão a sério ela estava levando a visita.

   Ele pegou a sacola de papel que havia embalado mais cedo e foi para o trabalho. Esta sacola não era um presente de retribuição, apenas uma muda de roupa que ele havia trazido para poder ir direto para o encontro depois do trabalho.

   Ao passar pela janela do corredor a caminho dos armários de sapatos, ele viu seu reflexo e se viu distraidamente ajeitando o cabelo.

   A constatação o fez rir baixinho.

     Parece que estou animado à minha maneira.

   Por mais constrangedor que fosse admitir, Amane sentia-se mais ansioso para fazer Mahiru feliz, para provar que conseguia lidar com seu trabalho direito... ou pelo menos esperava.

   E, claro, ele estava ansioso pelo encontro.

   Só espero não decepcioná-la, pensou, lembrando-se do olhar radiante e expectante em seu rosto. Um sorriso suave surgiu em seus lábios e, antes que percebesse, seu ritmo havia acelerado enquanto se dirigia ao trabalho.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Demorou até o White Day, mas Mahiru finalmente estava vindo ver onde Amane trabalhava.

   Dito isso, Amane ainda tinha que cumprir seu turno como de costume. Após uma rápida redefinição mental, ele retomou sua postura profissional e serena de sempre e começou a trabalhar.

“...Então o grande dia finalmente chegou, hein?”

“Por que você está tão animado, Miyamoto-san?”

   Amane pediu seu conselho, claro, mas Miyamoto não estava exatamente envolvido. Amane não conseguia entender por que ele assentiu, parecendo tão satisfeito.

   O café estava mais movimentado do que o normal, e a conversa ao redor quase abafou os sussurros. Mesmo assim, Amane entendeu o que Miyamoto havia dito e não resistiu a abordá-lo.

“Eu estava querendo conhecer sua namorada, cara. Você está sempre mantendo ela em segredo.”

“Bem, eu não sou de exibi-la.”

“Você parece o tipo de pessoa que guardaria tudo o que ama em um baú do tesouro.”

“...Você não está errado. Mas eu ainda deixaria a tampa aberta. Só porque eu me importo não significa que eu queira tirar a liberdade dela.”

   A voz de Amane era baixa enquanto ele pegava uma bandeja e um pano de limpeza para limpar uma mesa recentemente desocupada.

   Miyamoto riu baixinho. “Isso é amor, cara.”

   Amane apertou os lábios e saiu para limpar a mesa.

   Parecia que os últimos clientes não tinham saído há muito tempo, pois ninguém havia limpado a mesa. Amane recolheu os pratos e xícaras vazios que haviam deixado para trás e limpou rapidamente a superfície com um pano.

   Talvez fosse por causa do White Day, mas definitivamente houve mais pedidos de sobremesa do que o normal. Esta mesa não foi exceção. A julgar pelas migalhas e pelo creme restante, eles optaram por um conjunto de bolo. Não era apenas sua imaginação. Uma leve doçura ainda pairava no ar, misturando-se sutilmente com o aroma de café.

   Uma olhada no relógio de parede lhe disse que já estava em ação há um bom tempo.

   Mahiru chegaria em breve.

   Só esse pensamento já tornava difícil manter a compostura, mas com clientes por perto, ele não podia se dar ao luxo de demonstrar.

   Esforçando-se ao máximo para manter uma expressão neutra, ele passou por Miyamoto no caminho de volta com os pratos limpos. Miyamoto, que estava terminando de passar no caixa, olhou para ele e lançou-lhe um sorriso provocador que só ele conseguia ver.

“A propósito, sobre o que você disse antes...” começou Amane.

“Hm?” Miyamoto inclinou a cabeça, um pouco confuso com a mudança repentina.

   Aproveitando a chance de retribuir a provocação anterior, Amane se inclinou levemente, sua voz carregada de um tom travesso.

“E você, Miyamoto-san? Prefere mantê-la no baú também?”

“Não, ela não caberia mesmo se eu tentasse. E ela definitivamente não é do tipo que fica parada.”

“Ah... sim.”

“Não concorde tão rápido. É irritante.”

   Conhecendo Oohashi, Amane conseguia facilmente imaginá-la agarrando a vida pelos chifres e arrastando quem quer que estivesse com ela para o passeio. Quieta e reservada não fazia parte das suas características, ela desconhecia esses termos.

   Mas, mais do que isso, algo nas palavras de Miyamoto o atingiu. Seus sentimentos não eram recíprocos. O coração de Amane doía por ele.

   Ele não pretendia olhar para Miyamoto com pena, mas parecia que havia percebido mesmo assim.

“Tudo bem, some daqui vai,” murmurou Miyamoto, acenando preguiçosamente como se estivesse espantando uma multidão, mesmo Amane sendo o único ali.

   Amane deu um sorriso sem graça e se virou, indo até a pia com a louça na mão.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Hoje, Amane estava excepcionalmente atento a cada som e movimento ao seu redor.

   Cada vez que a campainha do café tocava, seus olhos se voltavam direto para a porta. Ele ainda estava fazendo seu trabalho, é claro, mas, só por hoje, a equipe permitiu que ele se movimentasse com mais liberdade até a chegada de Mahiru.

   Ele não conseguia agradecer o suficiente a Fumika e aos outros pela gentileza.

   Ding-a-ling — o sino familiar soou, e a cabeça de Amane se virou rapidamente em direção à entrada antes mesmo que ele percebesse.

“Eu recebo este,” murmurou ele, lançando um olhar rápido e apologético para Oohashi enquanto ela se aproximava para cumprimentar o cliente.

   Então, sem esperar por uma resposta, foi direto para a moça na porta.

   Era tecnicamente primavera, mas o frio persistente no ar ainda era cortante. As bochechas e a ponta do nariz da moça estavam rosadas pelo frio, e quando seus olhos pousaram no funcionário que se aproximava dos fundos da loja, arregalaram-se de surpresa. “Bem-vinda. Mesa para quantos hoje?”

   O tom de Amane era profissional, mas seu sorriso carregava muito mais calor do que o normal. As bochechas já coradas de Mahiru ficaram ainda mais vermelhas, e, desta vez, não tinha nada a ver com o clima.

“Um, por favor.”

“Muito bem. Temos mesas e assentos no balcão disponíveis. Você tem alguma preferência?”

“...Hum, se estiver tudo bem, posso sentar na mesa?”

“Claro. Por aqui, por favor.”

   A resposta hesitante dela trouxe um sorriso suave aos lábios dele. Ele ficou um pouco surpreso, e talvez até um pouco orgulhoso, de como se sentia calmo. Tranquilo e controlado, ele guiou Mahiru gentilmente para dentro do café.

   Felizmente, ainda havia mesas disponíveis, então ele a conduziu até uma, exatamente como ela havia pedido. “Sinta-se à vontade para usar esta cesta para colocar sua bolsa,” disse ele, esperando pacientemente enquanto ela se acomodava.

   Ela parecia um pouco perturbada, claramente nervosa, e foi preciso um esforço para não deixar transparecer o sorriso que se formava nos lábios dele. Em vez disso, ele delicadamente colocou o cardápio à sua frente.

“Aqui está o nosso cardápio. Quando estiver pronta para fazer o pedido, por favor, toque a campainha na mesa e alguém virá atendê-la.”

   Como o café era de propriedade privada de Fumika, o cardápio era bastante simples, mas cada item era cuidadosamente preparado. Seja qual for a escolha de Mahiru, ele não tinha dúvidas de que ela se adequaria ao seu gosto.

   Quando ela voltou sua atenção para o cardápio, Amane fez uma leve reverência e se afastou para buscar água e uma toalha de mão. Ao ir, ele passou por Miyamoto, que lhe lançou um sorriso cúmplice, que ele preferiu ignorar.

   Ele serviu água gelada em um copo, colocou-o ao lado de uma toalha cuidadosamente enrolada em uma bandeja e voltou para a mesa de Mahiru.

“Aqui está sua água gelada e sua toalha de mão.”

“Muito obrigada. Hum... posso fazer meu pedido agora?”

“Claro. Eu anoto o seu.”

   Amane lhe ofereceu um sorriso gentil enquanto se preparava hesitantemente para falar. As bochechas de Mahiru, que haviam começado a voltar à cor normal, ficaram vermelhas novamente.

   Embora ele não tenha agido de forma diferente, a reação dela foi impressionante. O jeito como ela o olhava, com os olhos cheios de desejo e admiração, deixava óbvio que o uniforme o havia transformado em um homem completamente novo.

   Mais cedo, quando ele se afastara, ela não conseguiu tirar os olhos dele. Só aquele pequeno detalhe foi suficiente para lhe dizer que ele havia superado o primeiro obstáculo.

   Até agora, ele estava correspondendo às expectativas dela.

“Vou pedir o bolo da estação... e para a bebida, hum, você tem alguma recomendação, Amane-ku— quer dizer, hum, senhor... garçom?”

   Mahiru gaguejou no meio da frase, quase dizendo o nome dele em voz alta antes de se conter. Ela lançou um olhar rápido para ele, com os olhos ligeiramente arregalados. Imperturbável, Amane manteve o sorriso calmo e gentil, gesticulando para a seção do cardápio que listava as opções de bebidas incluídas no conjunto.

“Depende das suas preferências, claro, mas com o bolo da estação, eu recomendo o nosso blend da casa. Ele tem um equilíbrio maravilhoso de acidez e amargor, que complementa muito bem o bolo.”

“Então, vou pedir o bolo da estação com o blend da casa, por favor.”

“Só confirmando então, um bolo da estação com o blend da casa. Correto?”

“Sim.”

“Muito bem. Por favor, espere um momento.”

   Ele repetiu o pedido enquanto o anotava cuidadosamente no bloco, depois lhe lançou um sorriso caloroso e profissional. “Vou pegar o cardápio agora,” disse ele, recolhendo-o delicadamente enquanto se virava para a cozinha.

   Ele não olhou para trás, mas podia sentir o olhar dela o seguindo por todo o caminho.

“Pedido. Um conjunto de bolo sazonal e um blend da casa.”

“Entendido,” foi a resposta descontraída de Minase, que estava de serviço na cozinha hoje.

   Na mesma hora, Miyamoto retornou, equilibrando uma bandeja cheia de pratos vazios. Ele devia ter se pegado conversando com um dos clientes habituais novamente.

“Aquela garota... Ela é sua namorada, certo, Fujimiya?”

“Sim, é ela.”

   Miyamoto provavelmente tinha percebido pela maneira como Amane assumiu a liderança em servi-la. Ele deve ter avistado Mahiru ao passar e decidiu perguntar, só para confirmar. Amane assentiu brevemente enquanto examinava as mesas vazias para acompanhar o fluxo de pedidos.

   O café não estava particularmente movimentado no momento, então era fácil imaginar um dos frequentadores puxando Miyamoto para uma conversa casual assim que o viram com um tempinho livre. Era o tipo de conversa familiar e descontraída que só poderia acontecer em um lugar calmo e acolhedor como aquele.

     ...Assim que os frequentadores descobrirem, com certeza vão me provocar.

   Amane havia se acostumado a trabalhar ali e, com o tempo, passou a reconhecer a maioria dos frequentadores pelo rosto, senão pelo nome. E agora, parecia inevitável que Mahiru se juntasse a eles. Esse pensamento o deixou feliz, mas também um pouco nervoso.

“Ela é super bonita, cara. Tipo, muito mais do que eu esperava, não vou mentir.”

“Tenho quase certeza de que já te disse que ela é bonita antes... E é exatamente por isso que eu não queria exibi-la. Eu sabia que você começaria a me provocar.”

   Miyamoto parecia genuinamente impressionado ao olhar para Mahiru. Mas Amane não sabia bem como se sentir. O elogio o deixou feliz, mas uma parte dele se sentia frustrada por deixar outra pessoa vê-la daquele jeito.

   Só havia uma palavra para descrever a roupa de Mahiru hoje: adorável.

   Como ainda era essencialmente inverno, ela usava um casaco grosso ao entrar no café. Mas, assim que Mahiru o tirou, revelou uma roupa que equilibrava perfeitamente charme e maturidade. Ela usava um suéter de tricô macio, cor marfim, combinado com uma saia longa bege-rosa discreta, com corte sereia.

   Em volta do pescoço e das orelhas, brilhavam o delicado colar e os brincos de flores que Amane lhe dera de Natal. Seu brilho sutil adicionava o equilíbrio perfeito entre elegância e refinamento, sem ser simples demais. Deixavam uma impressão graciosa e radiante.

   Em seu pulso, estava a pulseira com contas florais combinando, um presente do White Day do ano anterior, adicionando um toque de cor ao seu pulso. Seu cabelo volumoso estava preso em trança frouxa presa em um nó suave na parte de trás, criando um visual calmo e feminino, mas não excessivamente doce.

   Mas, por mais linda que fosse sua roupa, o que conquistou Amane foi o olhar encantado e febrilmente doce de seus belos traços e seu sorriso irresistivelmente suave. Havia algo quase diabólico naquele olhar.

“Ela obviamente te ama profundamente,” observou Miyamoto.

“...É. Eu sei.”

“Achei que você seria muito mais resistente em trazê-la aqui. Claro, parte disso provavelmente é porque você não queria que ela te visse trabalhando, mas acho que tem mais do que isso. Você não queria que ninguém mais visse o quão incrivelmente bonita sua namorada é, certo? Ela é tão adorável e nem percebe o quanto isso transparece. Não é de se admirar que você estivesse hesitante antes. Honestamente, eu entendo por que você quer fazer o seu melhor por uma garota como ela.” Miyamoto assentiu para si mesmo. Ele olhou para Mahiru e depois se virou para Amane. “Sua namorada parece tão feliz.”

“Ela estava querendo vir aqui há um tempo,” respondeu Amane. “Acho que ela está absorvendo tudo.”

   Ele estava no meio do preparo do pedido dela e não podia bajulá-la como de costume enquanto estava no seu turno. Mesmo sentada sozinha, porém, Mahiru não parecia nem um pouco entediada. Na verdade, parecia completamente satisfeita, saboreando o momento.

   Cada vez que seus olhares se encontravam, ela lhe dava um sorriso tímido e radiante. Era, sinceramente, um milagre que ele ainda não tivesse estragado um pedido.

“Caramba,” murmurou Miyamoto. “Alguém é amado.”

“Eu sei que sou... É exatamente por isso que eu não queria trazê-la aqui, a menos que fosse necessário.”

“Sim, entendi. Você está fazendo de tudo para não sorrir agora.”

“Senpai, por favor, fique quieto.”

   Miyamoto não estava errado. O afeto de Mahiru era óbvio em cada olhar que ela lhe lançava. E Amane lutava para manter o calor longe de suas bochechas. Ele estava fazendo tudo ao seu alcance para impedir que o sorriso repuxando seus lábios o denunciasse.

“Parece que vou ver um lado totalmente novo seu hoje.”

“Então desvie o olhar, por favor.”

“Não, não quero.”

“Rah? O Fujimiya-chan está corando? De verdade verdadeira?”

   Oohashi saiu da cozinha, piscando surpresa. Ela não tinha ouvido uma palavra da conversa, mas um olhar para o rosto de Amane lhe disse tudo o que precisava saber.

   Aparentemente, o rubor dele era mais óbvio do que ele havia percebido.

“A namorada dele está aqui.”

“Sério? Onde, onde?”

“Lá atrás, na mesa.”

“Você está falando daquela gracinha? Minha nossa. Fujimiya-chan, quem diria que você era tão azarão!”

   Oohashi se inclinou para cutucá-lo de brincadeira com o cotovelo até avistar Mahiru observando-os. Assim que percebeu, recuou um pouco mais do que o normal.

[Moon: Mahiru com certeza estava com aquele olhar… | Kura: Existem coisas que não tanco, e essa é uma delas…]

   Amane não sabia se admirava os instintos aguçados de Oohashi ou se simplesmente se sentia envergonhado por ela estar disposta a levar a provocação tão longe.

   Enquanto se contorcia por dentro, Oohashi lhe deu um aceno sábio.

“Bem, com uma namorada como ela, é claro que você não estaria dando em cima de mais ninguém. Não é à toa que você ignorou aquelas clientes que tentaram dar em cima de você.”

“Espera, o quê?” retrucou Amane.

“Ei, Rino, não jogue isso na cara dele,” repreendeu Miyamoto. “Ele claramente não fazia ideia. Agora você deu a ele mais um motivo para se estressar.”

“Hum, então ele as estava ignorando sem nem perceber? Nossa, isso é brutal.”

“...Você está falando sério?” perguntou Amane, piscando.

“Definitivamente sério... Mas você está falando sério?”

[Moon: Eu te entendo Amane…Eu te entendo.]

   Agora era a vez deles ficarem atordoados. Amane, por sua vez, estava completamente perplexo. A revelação inesperada o pegara de surpresa.

   Normalmente, eram os clientes mais velhos, da idade dos seus avós, que puxavam conversa com ele. Ele não se lembrava de nenhuma jovem o tratando como algo além de garçom. Mas, a julgar pela expressão nos rostos dos colegas de trabalho, ele claramente não tinha percebido nada.

   Ele olhou para Oohashi e Miyamoto, confuso. “Huh?”

   Ambos o olharam sem jeito. E considerando que não tinham nada a ganhar mexendo com ele ali, isso só significava uma coisa.

   Era a verdade.

“...Isso realmente não me diz nada.”

“É porque provavelmente nem percebeu. Você está tão focado na sua namorada que seu sorriso educado de cliente e sua guarda férrea subconsciente entraram em ação automaticamente. E, para deixar registrado, sabemos que você não estava interessado... tipo, nem um pouco. Era óbvio que você só as via como clientes.”

“...Agora eu só sinto pena da Mahiru. Ela estava preocupada esse tempo todo...”

“É, e você realmente não estava prestando atenção nelas...”

   Para Amane, uma cliente era apenas isso — uma cliente. Ele nunca as tinha visto como nada mais do que isso. Claro, ele conseguia se lembrar dos rostos de clientes regulares, mas quando se tratava de visitantes ocasionais, ele mal olhava para eles por tempo suficiente para reconhecê-los uma segunda vez. Simplesmente não havia motivo para isso.

   E foi exatamente por isso que a dor foi mais forte. Ele sabia que tinha boa memória, então o fato de não conseguir se lembrar de nada sobre nenhum daqueles supostos momentos o pegou de surpresa.

     Já fui chamado de denso não só pela Mahiru, mas também pela Chitose e pelo Itsuki... Cara, não consigo nem negar depois disso.

   Por não ter prestado atenção nas pessoas ao seu redor, as mesmas coisas com as quais Mahiru se preocupava aconteceram sem que ele percebesse. O choque e a culpa o atingiram como um caminhão, deixando sua mente momentaneamente em branco.

   Um tapinha firme nas costas de Miyamoto o tirou do transe.

“Certo, o bolo e o café estão prontos. Vá entregar.”

   Uma voz chamou da cozinha, e alguém lhe entregou uma bandeja com o bolo da estação e uma xícara de café fresco.

   Ainda estou com o horário de trabalho apertado. Não posso me dar ao luxo de me distrair, lembrou a si mesmo, recuperando o foco.

   Ao olhar para baixo para verificar a bandeja, algo o fez parar. Ao lado do pedido de Mahiru, havia um item extra que ela definitivamente não havia pedido.

“Eh? Mahiru não pediu isso...”

“A dona disse que é por conta da casa. Aliás, esse aqui é um bolo seu. Ela achou que seria um toque legal,” respondeu Miyamoto.

“Ah... Vou ter que agradecer a ela mais tarde.”

“Guarde para depois. Vamos, mexa-se.”

   Com um empurrãozinho de Miyamoto, Amane fez um pequeno aceno apreciativo em direção à cozinha, onde a dona ainda estava trabalhando. Endireitando-se, equilibrou cuidadosamente a bandeja e caminhou até Mahiru.

   O aroma quente do café se misturou ao aroma doce e tostado das nozes torradas enquanto ele se aproximava. Mahiru olhou para cima e, no momento em que seus olhos encontraram os dele, sua expressão se suavizou em um sorriso radiante e terno.

“Obrigado por esperar. Aqui está seu conjunto de bolo sazonal e blend da casa.”

“Ah, muito obrigado... Espera, hum, Amane-kun, isto...”

“Isto é por conta da casa,” disse ele, colocando a bandeja na mesa. “Fizemos alguns pratos especiais para o White Day. Depois do encerramento, todos contribuíram com o preparo. Esse — com este formato — foi meu.”

   Não era exatamente profissional, mas por um instante, Amane abandonou o tom formal e voltou à sua maneira habitual de falar com ela.

   O café tinha a tradição de oferecer guloseimas sazonais de tempos em tempos. No Halloween, distribuíam biscoitos de abóbora; no Natal, homenzinhos de gengibre; para Setsubun, soja torrada; e no Dia dos Namorados, um único pedaço de chocolate. Eram pequenas guloseimas disponíveis para quem pedisse.

[Del: Setsubun está relacionado à despedida do inverno e as boas-vindas da primavera.]

   Este ano, para o White Day, optaram por polvoróns, um biscoito amanteigado tradicional espanhol e quebradiço.

[Del: E polvilhado com açúcar fino, dando uma aparência branca.]

   Fecharam cedo na noite anterior, e os funcionários restantes ficaram para prepará-los juntos. A maioria optou por corações ou formas redondas simples, mas Amane optou por um cortador quadrado, o que facilitou a identificação de quais eram os dele.

   E o polvorón embrulhado na bandeja de Mahiru? Era quadrado.

“...Amane-kun, você sabe assar?”

“Fiz um bolo para você, lembra?” Amane lançou-lhe um olhar cético.

   Ele lançou-lhe um olhar desconfiado que dizia: ‘Sério? Você esqueceu o bolo que fiz para o seu aniversário?’ Os olhos de Mahiru se arregalaram em pânico e confusão enquanto ela balançava a cabeça, ansiosa para voltar atrás.

“S-sim, eu lembro, mas eu só não sabia que você também sabia fazer biscoitos...”

“Se eu sei fazer um bolo, eu sei fazer biscoitos. Segui a receita à risca, depois de realmente dedicar um tempo para entendê-la. Então, sim, acredite ou não, eu sei fazer!”

   Fazer um bolo era obviamente mais complicado do que biscoitos. E, além disso, Amane vinha melhorando constantemente sob a orientação de Mahiru há algum tempo. Contanto que tivesse uma receita sólida, ele conseguiria se virar na cozinha. Fumika não o teria deixado ajudar se ele não soubesse fazer biscoitos.

[Moon: Protesto! Biscoitos são bem mais difíceis de fazer!!! Eu já fiz os dois sozinha, eu sei o que estou falando aqui!]

   Mahiru riu da resposta, o som leve e melódico, como um sino suave. Seus olhos se suavizaram de afeto ao encontrar seu olhar amuado.

“Hehe, ouvir você falar assim vestido de garçom me deixa um pouco tímida.”

“Minhas sinceras desculpas. Nesse caso, por favor, aproveite seu tempo aqui.”

“Ah... você poderia esperar só um momento?”

“Sim. O que foi?”

   Embora o café estivesse silencioso àquela hora, Amane sabia que não podia ficar muito tempo. Mesmo assim, a pedido dela, ele rapidamente retomou seu tom educado e profissional.

   Mahiru ergueu a mão e fechou os dedos em uma garra solta, chamando-o para mais perto.

   Compreendendo o gesto, Amane deu um passo em sua direção. Então, com um pequeno movimento, inclinou a mão para baixo de um ângulo mais alto, incitando-o a se agachar para aproximar o ouvido.

   Ele inclinou a cabeça, ligeiramente confuso. Ela quer me contar algo em segredo?

   Amane dobrou os joelhos e se inclinou o suficiente para encontrar o sussurro dela.

   A doçura familiar do perfume dela o envolveu, e um calor suave pôde ser sentido entre eles.

“...Você está maravilhoso. É refrescante, diferente do normal, e combina muito com você. Você está tão bonito.”

   Ela murmurou docemente, e suas palavras penetraram em seus ouvidos como água morna em uma esponja.

[Kura: Chamem uma ambulância!! Não só para o Amane, mas para mim também!]

   Seu sussurro foi tão precioso que o arrepiou.

   Amane congelou, e então uma onda de calor insuportável o percorreu.

   Ele apertou os lábios, mal contendo o gemido que ameaçava escapar, e rapidamente se endireitou. Quando olhou para baixo novamente, Mahiru o encarava com um sorriso tímido, e seus olhos brilhantes revelavam sua satisfação.

     Argh, qual é!

   Mais cedo, Miyamoto e Oohashi haviam falado sobre como ela era fofa, mas agora, fofa nem chegava perto. Ela parecia um diabinho disfarçado. E a pior parte? Ela nem parecia estar fazendo isso de propósito.

“Boa sorte no trabalho, okay?” ela o encorajou.

“...Obrigado.”

   Amane conseguiu manter a voz firme enquanto respondia educadamente. Ele caminhou de volta para o balcão com passos calmos, mas a leve rigidez na parte superior do corpo o traiu.

   Esperando por ele estavam os mesmos dois rostos sorridentes.

“Fujimiya-chan, você está vermelho como um tomate!”

“Por favor... só não fale comigo agora.”

“Ah, o amor jovem.”

“Você também, Miyamoto-san. Cala a boca.”

   Amane resmungou uma resposta curta, mas isso só fez Miyamoto e Oohashi rirem juntos. Eles estavam claramente adorando cada segundo de sua frustração e sofrimento.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Depois disso, Amane não pôde mais ficar perto de Mahiru o tempo todo, então voltou às suas tarefas habituais, como prometido. Mesmo assim, Mahiru manteve os olhos nele enquanto apreciava seu bolo. Fosse lá o que fosse que ela achasse tão divertido, ele não fazia a menor ideia.

   O bolo especial de Fumika parecia ser exatamente o que Mahiru queria, enquanto ela o comia com um sorriso radiante e satisfeito. Quando Minase saiu da cozinha, percebeu a força daquele sorriso e congelou no meio do caminho com um “Urk” assustado.

   Ainda sorrindo, Mahiru olhou para ele e disse docemente, mas com firmeza: “Não vou te dar nenhum.”

   Minase balançou a cabeça freneticamente para insistir que não tinha tais intenções nefastas, o que fez Amane relaxar também.

   O café estava um pouco mais movimentado do que o normal devido à correria do White Day, mas a onda de clientes começou a diminuir antes do jantar. O lugar havia entrado em seu período de inatividade. Mas não duraria muito. Logo, clientes procurando uma refeição leve começariam a aparecer novamente.

“Ei, amorzinho do Fujimiya-chan~!”

   Amane reorganizava as cadeiras e limpava as mesas durante o momento de silêncio quando uma voz alegre, meio sussurrada, chamou atrás dele.

   Ele se virou, apenas para ver Oohashi aproveitando um raro momento livre para se esgueirar até a mesa de Mahiru enquanto segurava o que ele só podia presumir ser o segundo pedido de café de Mahiru.

   A única outra cliente restante era uma mulher mais velha, uma cliente habitual que costumava conversar casualmente com os funcionários, então Oohashi deve ter decidido que esta era sua chance de atacar.

   Isso pegou Amane de surpresa. Ele sentiu uma dor de cabeça começar a se instalar.

“Fujimiya-cha...?” Mahiru ecoou.

“Você é a namorada do Fujimiya-chan, certo?”

“Uh, s-sim...”

   Mahiru ficou claramente perturbada com a pergunta repentina. Mas não pareceu desconfiada ou alerta, apenas insegura sobre como responder. Ela reconheceu a mulher como a veterana com quem Amane estivera falando antes, então ignorá-la não era exatamente uma opção.

   Eu só tirei meus olhos dela por um segundo... Amane suspirou baixinho e lançou um olhar para Miyamoto.

   Miyamoto desviou o olhar rapidamente, sua expressão praticamente dizendo: ‘Ei, não me culpe.’

“Você pode não se aproximar da minha namorada tão rápido? Você vai sobrecarregá-la.”

“Agradeço o anúncio público de ‘namorada’~!”

“Miyamoto-san, por favor, venha buscar esta mulher.”

   Ooashi deixaria Mahiru cada vez mais nervosa se ficasse sozinha com ela, então Amane pediu apoio a Miyamoto, que sabia exatamente como lidar com ela. Mas tudo o que recebeu foi um olhar impassível: “Quanto mais cedo você deixar ela dizer ‘oi’, mais cedo ela vai embora.”

“Sou Rino Oohashi,” disse ela, animada. “Como você provavelmente percebeu, sou a veterana do Fujimiya-chan. Ouvi dizer que ele tem uma namorada que ele mima muito, e eu simplesmente tinha que te conhecer!”

“M-mima muito...”

“É! Tipo, ele nem pisca quando vê outras garotas, por mais bonitas que sejam. Ele é tão indiferente que nem percebe, a menos que eu conte.”

“Tenha um pouco de tato, idiota,” interrompeu Miyamoto, suspirando. “Mencionar outras garotas na frente da namorada? Sério?”

“Ah... desculpe, desculpe! O que eu quis dizer é que o Fujimiya-chan é totalmente dedicado a você. Tipo, muito dedicado. Ele não se importa com mais ninguém. Tenho quase certeza de que ele só pensa em livros didáticos e em você, a namorada dele.”

“...O que você acha que eu sou?”

   Amane retrucou, incapaz de ignorar a estranha impressão que Oohashi tinha dele, então suspirou profundamente enquanto olhava entre ela e Miyamoto.

“Hum, esses dois são os veteranos que me guiaram quando comecei. A mulher que acabou de se apresentar é a Oohashi-san, e o cara é...”

“Sou Daichi Miyamoto. Ouvi falar bastante de você, mocinha. Além disso, sinta-se à vontade para ignorar essa idiota.”

“Daichi! Que diabos?!”

“Você é barulhenta e não sabe avaliar bem o espaço pessoal. Só vai assustar a pobre garota.”

Hã!? Não seja tão rude!”

“...Mahiru, esses dois brigam como uma dupla de comediantes, mas você pode ignorá-los com segurança.”

“Quem você está chamando de dupla de comediantes, seu pirralho?!”

   Miyamoto estendeu a mão e deu um leve golpe na cabeça de Amane.

Ow!” Amane estremeceu.

   Mahiru piscou surpresa, observando a conversa se desenrolar. Miyamoto percebeu o olhar dela e imediatamente começou a acenar com as mãos, afobado. Mas Mahiru continuou olhando para ele com um sorriso divertido.

“Desculpe por bater no seu namorado,” disse Miyamoto.

“Você não está se desculpando com a pessoa errada?” murmurou Amane.

“Está tudo bem,” respondeu Mahiru friamente. “O Amane-kun disse algo rude, então, por favor, não se preocupe com isso.”

“Gostaria que eles se preocupassem um pouco,” brincou Amane.

“Mas a culpa é sua por provocá-los primeiro, sabia?”

   Amane não teve como responder. Com Mahiru apontando isso de forma tão casual, tudo o que ele pôde fazer foi apertar os lábios em silêncio. Os olhos de Oohashi brilharam como se ela tivesse acabado de encontrar um novo brinquedo favorito.

     Ótimo. Já consigo me ver sendo provocado até a morte sobre o próximo turno com a Mahiru...

   Só de pensar nisso seu estômago embrulhou. Ainda assim, se Oohashi se empolgasse demais, ele tinha um último recurso na manga. Ele simplesmente teria que jogar essa carta quando chegasse a hora.

   A atitude agressiva dela o lembrava um pouco demais de uma certa intrometida, e provavelmente era por isso que ele conseguia tolerar isso.

[Chitose: Atchiin–! | Del: Saúde. | Moon: Quando um dia isso for animado, eu prevejo essa cena… Espero que o Del já tenho sido inserido na história até lá kakaakk | Kura: Eu voto a favor!]

   Enquanto isso, Mahiru havia recuperado completamente a compostura. Sem dizer uma palavra, ela se levantou e fez uma reverência graciosa e educada para os dois veteranos.

“Desculpem a apresentação tardia. Sou Shiina Mahiru e estou namorando o Amane-kun. Obrigada por sempre cuidar dele.”

“Ah, não, deveríamos agradecer a ele. Ele sempre foi uma grande ajuda por aqui.”

“Não, não. O Amane-kun costuma me dizer na nossa casa o quanto é grato a vocês dois.”

“...Na casa de vocês?”

“Ela quer dizer quando está na minha casa,” interrompeu Amane rapidamente.

   Cada palavra foi tecnicamente a verdade.

   Amane já havia explicado brevemente a situação de moradia deles antes, mas não tivera coragem de admitir que, além da escola, dormir ou tomar banho, Mahiru estava basicamente na casa dele o tempo todo. E agora isso voltou a perturbá-lo.

   Mahiru, rápida em entender, continuou sem a menor hesitação ou indício de mentira. “Eu costumo visitá-lo durante a preparação para as provas, então...”

[Moon: Ela não está mentindo, só omitindo algumas partes!]

   Aliviado por Mahiru ter entrado na brincadeira perfeitamente, Amane fez o possível para não demonstrar. Ele manteve a expressão neutra, tomando cuidado para não revelar o desconforto que sentia por baixo da superfície.

“Ahh, bem, o Fujimiya é um cara bem sério... e parece que a namorada dele também é. Rino, talvez você devesse engarrafar um pouco da disciplina deles e transformá-la em chá. Depois, engolir.”

“O que eu tenho a ver com isso? E que tipo de lógica é essa!?”

“Você poderia aprender com a diligência e a elegância deles. Tudo o que você faz é barulhento e dramático.”

“Olha quem fala, Daichi!”

     Como eles sempre acabam discutindo toda vez?

   Miyamoto havia chamado Oohashi de indelicada mais cedo, mas, honestamente, Amane estava começando a achar que aquilo era apenas um bumerangue voltando para atingi-lo. Enquanto os dois se lançavam em outra discussão inútil, Amane guardou seus pensamentos para si. Afinal, ele valorizava sua vida.

   Quando os olhos dele encontraram os de Mahiru, ela lhe deu um sorriso pequeno e constrangedor. Em resposta, Amane se inclinou levemente e sussurrou, baixinho: “Eles são sempre assim,” com um leve dar de ombros.

   Ele soltou um suspiro silencioso, com cuidado para não desviar a atenção da dupla briguenta, e deixou seu olhar vagar pelo café... apenas para encontrar os olhos de uma mulher sentada a três mesas de distância. Ela era uma das clientes regulares que sempre chegava por volta dessa hora para tomar seu café.

   Seus olhares se encontraram e um arrepio percorreu sua espinha.

   Sem hesitar, ele se aproximou dela com passos silenciosos e fez uma leve reverência. “Sinto muito pelo incômodo.”

   A mulher levou a mão aos lábios, um sorriso refinado repuxando os cantos da boca enquanto soltava uma risadinha suave e divertida.

“Ah, está tudo bem,” disse a cliente. “O Daichi-chan e a Rino-chan são cheios de vida, e é isso que mais importa. Serem próximos o suficiente para brigar assim significa que eles se dão bem. Não me importo nem um pouco.”

“Eu agradeço.”

[Del: A mulher simplesmente falando tudo.]

   Ela era aparentemente uma das frequentadoras de longa data do café, que observava as travessuras de Miyamoto e Oohashi desde o início. As brigas entre eles não eram novidade para ela. Essa familiaridade, e o fato de que apenas Mahiru e aquela mulher estavam presentes, além dos funcionários, provavelmente fizeram com que ambos se sentissem confortáveis ​​o suficiente para abandonar seus filtros habituais.

“Você e sua namorada parecem se dar muito bem também, Amane-chan,” acrescentou a mulher com um olhar cúmplice. “Agora eu entendo por que você sempre me recusava quando eu me oferecia para apresentá-lo à minha neta.”

“Afinal, sou devotado à minha namorada.”

   Só para constar, ela foi a terceira pessoa que tentou apresentá-lo à neta.

[Del: É um baita partidão. | Moon: Grande Amane-chan! | Kura: Está chegando com a ajuda das vovós kkk.]

   Alguns outros clientes fizeram ofertas semelhantes depois, e embora ele soubesse que eram só brincadeira, recusou todas. Mesmo assim, as ofertas faziam seu coração disparar e sempre o deixavam com um pouco de culpa.

   Se pudesse evitar, preferia que nem tocassem no assunto.

   Ultimamente, esses comentários finalmente haviam diminuído, para seu alívio... mas agora, ouvindo-os novamente, ele não conseguia deixar de se perguntar.

   Será que realmente pareço alguém que vale a pena apresentar às suas netas? Quer dizer... sou apenas um cara que trabalha em um café que gostam. Somos praticamente estranhos, pensou ele, um pouco perplexo.

“Haha, ouvir você dizer isso me tranquiliza,” disse a cliente com um sorriso.

“...Isso parece um pouco contraditório, de certa forma.”

“Significa apenas que vejo que você realmente valoriza sua namorada. E isso é maravilhoso. Homens que traem deveriam ser chutados para a calçada, eu digo sabe.”

   Amane não conseguia acreditar que ela havia dito algo tão feroz com um sorriso tão digno e uma voz tão elegante. Ele decidiu não comentar sobre o contraste e simplesmente retribuiu o sorriso com um outro educado.

   Talvez ela tivesse passado por algo difícil no passado. Mas não era da sua conta perguntar, não quando mal a conhecia. E ele não iria se intrometer.

   Ainda assim, ele concordava plenamente com ela.

“Você tem toda a razão,” disse ele. “Acho que a sinceridade é essencial para construir uma vida juntos.”

   Suas palavras arrancaram um sorriso ainda mais caloroso da mulher.

“É ótimo que vocês dois se deem tão bem. Com o bolo e o doce que vocês dois me mostraram, fico bastante satisfeita. Posso pedir a conta?”

“Claro. Agora mesmo.”

   Atrás deles, Miyamoto e Oohashi continuavam discutindo. Amane era o único disponível para ajudar e, embora notasse um leve vislumbre de súplica no sorriso um tanto perturbado de Mahiru, lançou-lhe um olhar silencioso que dizia: ‘Aguente firme só mais um pouquinho,’ e guiou a mulher até o caixa, com o recibo já em mãos.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Quando Amane retornou do caixa, Miyamoto e Oohashi já estavam um pouco mais calmos. Ambos exibiam expressões emburradas.

     Eles parecem crianças quando agem assim...

   Miyamoto tinha a cabeça entre as mãos, mortificado por suas palhaçadas de sempre terem acontecido na frente de uma cliente. Quando finalmente percebeu que Amane havia voltado, ergueu a cabeça, forçou um sorriso tímido e murmurou:

“Agradeço por ter cuidado do caixa.”

“Ela era a única outra cliente aqui dentro, então não foi tão ruim, mas em circunstâncias normais, isso não seria apropriado. Além disso, ela observou o tempo todo com o sorriso mais caloroso, então é melhor se preparar para a provocação quando ela aparecer novamente.”

“Eu sei muito bem,” assentiu Miyamoto.

“Ooh, você acabou de ser repreendido,” brincou Oohashi.

“Estou falando com você também, Oohashi-san.”

“Espere, o quê?”

“Oh, por favor. Não tem como você se safar depois disso.”

   Amane lançou-lhe um olhar inexpressivo que dizia: “Como você pode se achar inocente?” Oohashi respondeu com um exagerado e prolongado: “Desculpe~!,” embora, honestamente, provavelmente Miyamoto deveria ter dito isso.

     Será que eles não podem ser um pouco mais honestos um com o outro...?

   Amane não disse isso em voz alta. Ele soltou um longo e cansado suspiro no momento em que Minase colocou a cabeça para fora da cozinha.

“Ei, Oohashi! Desculpe interromper, mas a proprietária precisa de você.”

“Huh? Para quê?!”

   O chamado repentino claramente a desconcertou. No momento em que ouviu Minase dizer que a dona queria vê-la, Oohashi entrou em pânico. Ela se virou e disparou em direção ao corredor nos fundos.

   Mas, com a pressa, seus movimentos ficaram desleixados. Ao se virar, a ponta da mão tocou a segunda xícara de café de Mahiru.

   Normalmente, a primeira xícara seria retirada antes da segunda ser servida. Mas como havia sido guardada para mais tarde e o espaço na mesa era limitado, a segunda xícara ficou muito perto da borda.

   Um tilintar agudo de cerâmica raspando contra cerâmica soou quando a xícara se ergueu bruscamente, com a borda inclinando perigosamente.

     Droga...

   Amane estava ali e reagiu instantaneamente. Ele se lançou para frente e pegou a xícara antes que ela tombasse e rolasse pela mesa, evitando por pouco um desastre completo.

   Mas Mahiru ainda não havia terminado a xícara. Ainda havia uma quantidade razoável de café lá dentro. Embora ele tenha conseguido evitar que caísse, um pouco do líquido escorregou por entre seus dedos e espirrou na mesa com um impulso considerável. A tentativa de Amane de bloquear foi em vão.

   Assim que a onda marrom-escura transbordou da borda da mesa como água caindo de um penhasco, Mahiru percebeu o que estava acontecendo e instintivamente estendeu as mãos para bloqueá-la.

   Embora a enchente não tenha transbordado completamente, gotas soltas e um fio fino que escapou de sua represa improvisada respingaram no tecido bege-rosado de sua roupa, deixando como consequência manchas marrons desagradáveis ​​e manchas

“Ah—!”

“Minhas sinceras desculpas, senhorita! Você se machucou?”

   Miyamoto foi o primeiro a falar. Sua voz, embora claramente em pânico, era firme e direta. Sem hesitar, ele se desculpou e correu em direção ao balcão para pegar suprimentos, substituindo Amane e Mahiru, que haviam sacrificado as mãos para minimizar os danos.

   Miyamoto, que tinha visto toda a cena se desenrolar da cozinha, já havia preparado algumas toalhas. Miyamoto as pegou sem hesitar assim que chegou ao balcão.

“Você está bem, Mahiru!? Queimou você!?”

“N-não, estou bem. Esta saia é bem grossa, e o café já tinha esfriado, então...”

   Embora Mahiru não parecesse estar com dor e não tivesse derramado muito café, Amane ainda estava preocupado que pudesse tê-la queimado. Ele observou atentamente sua expressão enquanto pegava uma toalha de mão usada e dobrada e a pressionava na poça sobre a mesa para absorver o líquido antes que pingasse mais.

   Assim que o pano absorveu a sujeira, ele limpou delicadamente a mão de Mahiru com a toalha limpa que Miyamoto havia buscado e a usou para interromper o lento e rastejante derramamento de café sobre a mesa.

   Tudo isso aconteceu em menos de um minuto.

   Miyamoto lançou um olhar mortal para Oohashi, que ficou imóvel em choque com o que havia feito.

“Rino, que diabos você está fazendo?”

“E-eu sinto muito...”

“Por favor, pare, Miyamoto-san. Não é hora de apontar dedos. Oohashi-san, você pode se desculpar mais tarde. Por enquanto, poderia perguntar à proprietária se pode levar a Mahiru para os fundos?”

“C-certo... sinto muito mesmo...!”

   Repreendê-la não ajudaria ninguém. A única pessoa com esse direito era Mahiru, a vítima da bagunça. Mas ela não demonstrou o menor traço de raiva. Olhando para a mancha recente em sua saia, ela falou com uma voz calma e serena:

“Precisamos remover a mancha rapidamente antes que seque.”

   O fato de Mahiru não a culpar só fez Oohashi se sentir pior. Mas ela se livrou do choque, se recompôs e correu para os fundos o mais rápido que pôde.

   Meio minuto depois, ela voltou e gritou: “Tudo bem, pode vir!”

   Aproveitando a deixa, Amane pegou a bolsa e o casaco de Mahiru da cesta e a guiou gentilmente para o quarto dos fundos.

“Desculpe perguntar, mas posso deixar a limpeza com vocês dois?”

“Nós cuidamos disso. Cuide da sua namorada, Fujimiya.”

“Hum, sinto muito pelo que fiz,” disse Rino a Mahiru, nervosa.

“Não tem problema nenhum. Não se preocupe. Se cuidarmos rápido, a mancha deve sair na hora que eu lavar a roupa. E não me queimou, então não precisa se estressar.”

   Oohashi abaixou a cabeça, o rosto tomado pela culpa.

   Mahiru ofereceu um sorriso gentil, balançando levemente a cabeça e acenando com a mão para dizer que estava tudo bem.

   Mesmo assim, Oohashi não parecia se sentir melhor. Ela era do tipo que ignorava problemas causados ​​a ela, mas se sentia péssima se causasse problemas para outra pessoa. Se tivesse orelhas de cachorro, elas estariam caídas contra sua cabeça.

“Não precisa se preocupar, okay?”

“Ah, parece que um cliente acabou de chegar. Vamos deixar o resto para depois. Miyamoto-san, você pode cuidar dessa?”

“Claro. Rino, vou deixar a limpeza com você. Eu cuido da frente.”

   Miyamoto assumiu, percebendo que não era uma boa ideia deixar Oohashi lidar com clientes em seu estado de choque, especialmente com a possibilidade de outro acidente. Ele assumiu uma expressão profissional suavemente enquanto se dirigia à entrada.

   Amane lançou um último olhar para Oohashi para se certificar de que ela ficaria bem sozinha e, em seguida, guiou Mahiru gentilmente em direção à sala de descanso dos funcionários, nos fundos.

   Quanto a Mahiru, que acabou tomando seu café através do tecido, parecia genuinamente intrigada com a área exclusiva para funcionários e com o layout do café, que normalmente não se teria a chance de ver.

   Assim que chegaram à sala de descanso e Mahiru se acomodou no sofá, Amane se ajoelhou ao lado dela e inspecionou cuidadosamente a mancha em sua saia.

   Graças a ambos terem instintivamente estendido a mão para bloquear o café, conseguiram evitar um grande derramamento. Mesmo assim, duas manchas — cada uma do tamanho de uma moeda de quinhentos ienes — haviam se espalhado pelo tecido perto de suas coxas. A saia não era totalmente branca, então a descoloração não era tão óbvia, mas ainda era clara o suficiente para que qualquer um notasse que algo havia sido derramado.

“Desculpe... Você se arrumou toda e aí aconteceu isso.”

“Tudo bem. Essas coisas acontecem às vezes. Eu mesma já derramei chá preto sem querer não faz muito tempo.”

   Mahiru balançou a cabeça gentilmente, calma como sempre. Sua atitude despreocupada só fez Amane se sentir ainda mais culpado. E se ele se sentia tão mal assim, então Oohashi provavelmente estava levando isso ainda mais a sério. Ela era do tipo que se preocupa mais com as coisas quando é perdoada do que repreendida.

   Enquanto Amane examinava a mancha mais de perto, se perguntando se Mahiru deveria trocar de roupa e vestir a roupa que haviam trazido para o encontro, uma batida suave e educada ecoou pelo quarto.

“É a Itomaki. Agora é uma boa hora?”

“Proprietária...”

   A voz de Fumika pegou Amane de surpresa. Ele tinha certeza de que ela ainda estava ocupada com o trabalho. Olhou para Mahiru, verificando silenciosamente se estava tudo bem deixá-la entrar. Quando Mahiru assentiu levemente, ele gritou: “Sim,” e a porta se abriu um instante depois.

   Fumika entrou na sala, com uma expressão de trinta a cinquenta por cento mais preocupada do que ele jamais a vira. Seus olhos rapidamente pousaram em Mahiru, que estava sentada calmamente no sofá, e suas sobrancelhas se franziram ainda mais.

“Peço sinceras desculpas pelo que aconteceu hoje, especialmente depois que você reservou um tempo para nos visitar. Claro, cobriremos o custo da sua refeição. Por favor, envie-nos também a conta completa da lavagem das suas roupas. E, só por segurança, gostaria que você consultasse um médico. Também cobriremos quaisquer despesas médicas que você possa ter…”

“N-não precisa se preocupar. O café não estava quente e nem tocou na minha pele…”

   Atordoada pelas desculpas rápidas de Fumika, Mahiru balançou a cabeça ainda mais vigorosamente do que antes. Mas Fumika ainda parecia profundamente preocupada.

“Mesmo assim. O fato é que nosso café… arruinou o tempo que você tanto esperava passar com ele.”

   Parecendo genuinamente arrependida, Fumika deixou escapar algo sem querer.

   Amane ficou tensa instantaneamente.

“Huh? A-Amane-kun, você contou a eles?”

“…Eu só mencionei isso como o motivo para sair mais cedo, apenas.”

“Oh, ele estava feliz da vida!” disse Fumika com um sorriso caloroso. “Disse que era como um pequeno encontro. Ficou tão feliz que você estava tão ansiosa quanto ele, que queria que tudo desse certo. Ele até verificou duas vezes seu atendimento ao cliente, praticou o sorriso e, hoje, antes de você chegar, ficou olhando o espelho para arrumar o cabelo e dando umas olhadinhas na entrada para ver se você já tinha chegado.”

“Okay, okay! Por favor, pare aí já, eu imploro!”

   Quando pediu para sair mais cedo do trabalho, Amane explicou o motivo a Fumika. E embora se sentisse um pouco mal por ter abordado esse ponto manso dela, mencionou casualmente o quanto estava ansioso pelo encontro com Mahiru, esperando que isso pudesse ajudá-lo. Além disso, comentou casualmente em turnos anteriores sobre como o dia o deixava igualmente nervoso e animado.

   Ainda assim, ele nunca imaginou que algo disso voltaria para assombrá-lo assim. Nesse ritmo, ele só queria enterrar o rosto nas mãos e desaparecer.

   Esses eram exatamente os tipos de momentos embaraçosos que ele não queria que Mahiru soubesse. Mas Fumika se sentiu tão mal com o vazamento que aparentemente decidiu que uma confissão completa dos esforços de Amane nos bastidores era parte de sua expiação.

   Amane estava prestes a soltar um resmungo e implorar para que ela parasse quando, de repente, os olhos de Mahiru se arregalaram. Então, de repente, eles brilharam.

“Não, por favor, me conte mais.”

“Mahiru!?”

“V-você pode mesmo me culpar? Não é sempre que você demonstra o quanto está animado... muito menos contar o porquê para outra pessoa.”

“...Eu não consegui evitar. Eu estava simplesmente empolgado.”

   Amane nunca quis que Mahiru soubesse que sua atitude indiferente era apenas fachada e que, por baixo, ele estava praticamente zumbindo. Mas agora que Fumika tinha contado tudo, não adiantava tentar esconder.

“Eu estava ansioso para ver sua reação quando me visse trabalhando... e, bem, nunca tivemos um encontro de verdade dessa forma antes. E quando mencionei isso para a proprietária, ela me lançou um olhar cheio de expectativa, então...”

“Bem, isso é porque... contribuiu para um bom enriquecimento...” explicou Fumika.

“Enriquecimento...?” perguntou Mahiru.

“Não pense muito nisso,” insistiu Amane.

[Del: Imagina, a Fumika é a Saeki-san, que agora escreve a história que ouviu. | Moon: Cara… Isso faz muito sentido… Aaahhh!! | Kura: Ela passa esse sentimento. Mas e se a Fumika for o personagem pelo qual a Saeki-san se coloca na história? | Del: Realmente.]

   Essa era apenas uma das peculiaridades de Fumika. Uma que, na opinião de Amane, era quase um mau hábito. Não havia motivo para Mahiru precisar entender isso em detalhes.

   Amane limpou a garganta para mudar o clima, depois olhou para a saia de Mahiru, querendo resolver o problema em questão.

“...De qualquer forma, precisamos lidar com a mancha. Uh, Proprietária, você tem alguma coisa para ela vestir?”

“Se um uniforme extra estiver bom, temos um disponível.”

   No setor de alimentação, acidentes inesperados que estragam as roupas de um funcionário acontecem com relativa frequência, então os locais de trabalho mantêm uniformes reservas de vários tamanhos à mão.

   Era apenas uma solução temporária, mas Amane sentiu-se genuinamente aliviado por Mahiru não ter que andar por aí com uma calça masculina grande demais.

   Assim que aquela sensação de alívio se instalou, ele viu a expressão de Fumika.

   Seu olhar de preocupação anterior havia desaparecido. Agora, ela parecia vagamente decepcionada.

“Ahh~, eu deveria ter deixado algumas roupas fofas de prontidão...”

“Você não pode tratar a Mahiru como uma boneca de pano só porque ela é fofa, okay?”

“Flertando bem na minha frente? Ora, obrigada pelo presente.”

   Nesse momento, Amane se perguntou se aquela mulher conseguia achar graça em qualquer coisa que ele dissesse. Ele não se deu ao trabalho de dizer nada e simplesmente observou Fumika sair para buscar roupas extras.

[Del: Não podemos culpá-la.]

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

   Enquanto Mahiru se trocava no provador feminino, Amane saiu e se concentrou em limpar as manchas da saia dela. Ele já havia limpado as duas manchas grandes de antes, mas, enquanto trabalhava, notou várias manchas menores espalhadas pelo tecido.

   Então, ele enxaguou cuidadosamente a saia com água e, em seguida, limpou as manchas com uma mistura de água e detergente. Felizmente, as manchas haviam desaparecido quase completamente.

   No entanto, as manchas haviam se espalhado mais do que ele havia percebido inicialmente. Quando terminou, a saia havia absorvido bastante água no processo.

   Não havia como torcer uma saia delicada como aquela sem arriscar danificar o tecido. Então, em vez disso, Amane pressionou uma toalha contra ela para absorver o máximo de umidade possível. Mesmo assim, ainda estava visivelmente úmida, e não havia como, em sã consciência, deixá-la usá-la daquele jeito.

   Com isso em mente, ele voltou para a sala de descanso... apenas para encontrar Mahiru já lá, completamente trocada e esperando por ele.

   E, por algum motivo, ela se esforçou ao máximo.

“Combina incrivelmente bem com você,” Fumika fez um elogio sincero a Mahiru.

   Como apenas a saia dela havia sujado, Amane não pôde deixar de sentir que dar a Mahiru o uniforme completo era mais travessura do que consideração. Ainda assim, conhecendo Fumika, provavelmente era pura boa vontade. E, como ela havia dito, o uniforme realmente caía excepcionalmente bem em Mahiru. Amane se perguntou se Fumika tinha o mesmo talento extraordinário que Ayaka para adivinhar as medidas de alguém com um olhar. Se ela fez isso ou não, ninguém sabe, mas o caimento era tão perfeito que parecia que o uniforme tinha sido feito sob medida para ela.

   Esse tipo de roupa poderia facilmente parecer estranha se o tamanho fosse um pouco diferente. Mas esta cobria graciosamente as curvas do seu corpo, ao mesmo tempo em que realçava a beleza da sua silhueta. Ela o usava com tanta naturalidade que era como se Mahiru estivesse dizendo: ‘Algum problema? Eu trabalho aqui o tempo todo!’ Ela poderia se passar por uma funcionária experiente de um café.



[Del: Melhor é o sorrisinho dela de “Olha olha, a roupa que estou usando.” | Moon: Mui-muito fofo! | Kura: Criança muito fofa kkkk. Usava que a Fumika usava óculos.]

   Oohashi sempre carregava um ar refinado e elegante em seu uniforme. Mas em Mahiru, a mesma roupa passava uma impressão completamente diferente. Ela parecia mais charmosa do que refinada.

   E, por algum motivo, ela até mesmo prendeu o cabelo em um coque elegante quando se trocou, claramente entrando no espírito da coisa em algum momento.

   A própria Mahiru parecia um pouco desorientada usando o uniforme de meio período, algo tão fora de seu guarda-roupa habitual. No momento em que Amane entrou, ela sorriu radiante, esticando os braços como se dissesse orgulhosamente: ‘Olhe para mim!’

[Del: Eu disse. | Moon: Você disse. | Kura: Ele disse.]

   Ela era tão incrivelmente fofa que Amane poderia tê-la puxado para um abraço e a coberto de carinho na hora se Fumika não estivesse no quarto.

   Ele estava mais do que satisfeito com a dose inesperada de fofura, mas ainda assim se virou para lançar a Fumika um olhar incrédulo que questionava por que ela havia se esforçado tanto para enfeitar Mahiru.

[Moon: Fumika tipo: “Meu presentinho por você se esforçar tanto no trabalho!”]

   Fumika retribuiu o olhar com um sorriso sereno e alegre. “Estou feliz que tenhamos o tamanho perfeito para você.”

“Obrigada por se esforçar. Agora, sinto que ganhei algo especial,” respondeu Mahiru. “Estar aqui assim... quase parece que trabalho ao lado do Amane-kun. E isso me deixa muito feliz.”

   Ela caminhou até Amane, sorrindo para ele. Era um sorriso tão brilhante, tão cheio de ternura, que Amane não pôde deixar de pensar: Não tem como eu deixar alguém ver isso.

   Isso roubaria o coração de qualquer cliente que ao menos olhasse para ela, sem questionar.

   Como a oportunidade havia surgido, Mahiru pediu permissão a Fumika e tirou algumas fotos com Amane. Ela parecia tão feliz fazendo isso que o rosto de Amane formigava de vergonha só de observá-la.

Ara ara. Eu não me importaria se vocês dois trabalhassem aqui juntos de verdade...” disse Fumika.

“Receio que minha guardiã jamais aprovaria,” respondeu Mahiru sem hesitar, interrompendo-a com um sorriso firme, porém doce.

“Além disso, se eu começasse agora, provavelmente me acostumaria ao trabalho bem antes de ter que pedir demissão. Agradeço muito a oferta, mas receio que terei que recusar.”

   Seu tom permaneceu gentil e seu sorriso brilhante, mas havia uma convicção clara em suas palavras.

   Fumika retribuiu o sorriso com suave ternura. “Nossa, é mesmo? Que pena.”

   Ela deve ter percebido algo mais profundo por trás das palavras de Mahiru, mas optou por não insistir. Em vez disso, recuou com graciosa contenção.

   Amane fez o possível para manter uma expressão neutra enquanto lançava um olhar furtivo para Mahiru pelo canto do olho.

   Ele podia ver. Por trás daquele sorriso deslumbrante, tão brilhante que quase dava vontade de proteger os olhos, havia uma sombra turva.

   Os alunos precisavam da aprovação da escola para aceitar trabalhos de meio período. Mas antes disso, menores também precisavam da assinatura e do carimbo do responsável legal na papelada. Esse era o procedimento padrão.

   O caso de Mahiru, no entanto, era diferente. Ela evitava entrar em contato com os pais o máximo possível.

   Amane só havia encontrado a mãe uma vez, mas isso era mais do que suficiente. Ela havia deixado bem claro que não queria ser contatada a menos que fosse absolutamente necessário. Com esse peso pairando sobre ela, Mahiru não tinha intenção de entrar em contato, a menos que não houvesse outra opção.

   Para Amane, insensível foi a primeira palavra que lhe veio à mente ao pensar na mãe de Mahiru. Seu pai, por outro lado, parecia mais tranquilo, e Amane imaginou que não seria muito difícil contatá-lo se a situação exigisse.

   Mas para Mahiru, até mesmo entrar em contato com ele agora era algo que ela queria evitar a todo custo. E, honestamente, Amane concordava. Se ficar longe do contato significava conservar sua paz de espírito, então essa era a escolha certa. Nesse ponto, até ele sentiu que era tarde demais para tentar consertar aqueles laços rompidos. Então, a menos que a própria Mahiru tocasse no assunto, ele jamais mencionaria.

   Ele sabia que era melhor ser atencioso naquele momento, mas sem exagero. Esse tipo de compaixão só piorava as coisas. Então, manteve a expressão neutra, fazendo o possível para agir com naturalidade.

   Mas Mahiru ainda conseguia enxergar através dele. Ela lhe deu um pequeno sorriso sem graça e, em seguida, murmurou as palavras “Estou bem” com os lábios levemente pintados.

   Se ela parecesse estar forçando a barra ou fingindo compostura, Amane não teria hesitado em dizer algo. Mas, a julgar pela expressão dela, ele não precisava se preocupar muito. Tranquilizado, ergueu o olhar.

“…Hum, sei que estou um pouco atrasada para dizer isso pessoalmente, mas queria agradecer direito. Obrigada por me ajudar com a surpresa de aniversário que o Amane-kun fez.”

   A expressão de Mahiru se suavizou, retornando à sua cordialidade habitual. Ela fez uma reverência educada para Fumika.

 

   Ela respeitara o desejo de Amane de esperar antes de visitar seu local de trabalho até que se sentisse pronto. E como Fumika certa vez brincou que vê-los namoricando já seria suficiente para agradecer, Mahiru se absteve de aparecer pessoalmente. Em vez disso, enviou sua gratidão por Ayaka, junto com uma carta escrita à mão e um pequeno presente.

“Ah, não, não foi problema nenhum,” respondeu Fumika alegremente. “Na verdade, eu deveria agradecer pelo enriquecimento. Fiz um grande progresso.”

“Progresso…? Com o quê?”

“Mahiru, você não precisa se aprofundar mais,” interrompeu Amane rapidamente.

   Seus olhos imploravam silenciosamente a Fumika para não dizer nada estranho na frente de Mahiru, mas tudo o que ela lhe devolveu foi o mesmo sorriso radiante e cintilante.

“Não entendo muito bem, mas se te ajudou de alguma forma, fico feliz,” respondeu Mahiru, inclinando levemente a cabeça.

“Oh, foi uma grande ajuda. Sinceramente, eu que deveria estar te agradecendo. Se eu consegui ajudar vocês dois a encontrarem um pouquinho de felicidade juntos, então estou mais do que satisfeita. Casais felizes são meus favoritos.”

“O-obrigada...?” respondeu Mahiru, ainda um pouco confusa.

“Sejam quais forem os seus motivos, eu realmente sou grato. Obrigado por tudo, como sempre,” acrescentou Amane.

“Quase não fiz nada que valha a pena agradecer,” respondeu Fumika com uma risada suave.

   Amane imaginou que provavelmente não havia uma única pessoa no mundo capaz de fazer Fumika mudar de ideia depois que ela começasse. Então, desistiu de tentar e simplesmente curvou a cabeça em agradecimento.

   Ela riu baixinho do gesto dele. “Vocês dois parecem tão próximos mesmo. É reconfortante ver.”

“...Obrigado.”

“O Fujimiya-kun sempre trabalha duro, e como dona deste café, eu não poderia pedir mais. Mas fiquei um pouco preocupada que isso pudesse estar consumindo o tempo que ele passa com você, a namorada dele... Mas se vocês dois estão se apoiando, isso é maravilhoso. Principalmente porque ele está fazendo tudo isso para te dar um—”

[Kura: Ouuuu se tá pirando mulher?? Calma kakakaka.]

“Tia Fumika, pare. Não perturbe muito com eles.”

   Uma voz interrompeu Fumika antes que ela pudesse dizer algo que Amane definitivamente não queria que Mahiru ouvisse. Pelo menos ainda não.

   O som da porta se abrindo foi seguido por uma voz que Amane conhecia muito bem — uma que ele ouvia com frequência na escola. Ele se virou instintivamente e viu Ayaka parada ali com um saco de papel nos braços.

   Seu rabo de cavalo de sempre estava solto e ela vestia roupas casuais.

“Kido-san...!?”

“Eu mesma! Olá, Shiina-san, Fujimiya-kun. Ah, e Fujimiya-kun, esse uniforme combina muito com você. Parece que valeu a pena esperar, né, Shiina-san?” disse Ayaka, dando uma piscadela perfeita.

   Ah, sim, pensou Amane, acho que a Kido nunca me viu de uniforme antes. Mas espera, ela nem é funcionária. Por que ela está aqui na sala de descanso?

“Espera aí, por que você está aqui, Kido?”

“A tia me pediu para trazer uma muda de roupa,” respondeu Ayaka, despreocupadamente. “Moro bem perto, então deu tudo certo. Não posso deixar a Shiina-san ir para casa com o uniforme do café, né? E com a saia dela ainda úmida, provavelmente é melhor lavá-la direito. Então, corri para cá o mais rápido que pude.”

   A julgar pelo horário, Fumika provavelmente contatou Ayaka assim que soube da situação.

   Fumika se sentiu culpada por ter chamado Ayaka tão de repente, especialmente no White Day, logo ali. Seus ombros caíram levemente enquanto ela lhe fazia uma reverência arrependida.

“Sinto muito por incomodá-la desta vez, Ayaka-san,” disse ela, com a voz cheia de remorso.

“Não se preocupe com isso,” respondeu Ayaka com um sorriso caloroso. “Nós todos ajudamos uns aos outros quando estamos em apuros. E peço desculpas a você também, Shiina-san. Você estava ansiosa para ver o Fujimiya-kun de uniforme hoje, certo? Provavelmente não é justo eu dar uma espiadinha, né?”

   Fiel à sua forma, Ayaka fora atenciosa em mais aspectos do que qualquer um poderia contar. Ela nunca deixou escapar para Mahiru o motivo pelo qual Amane começara a trabalhar, e até mesmo evitara visitar o café quando Amane estava lá para não vê-lo de uniforme. Para que Mahiru pudesse ter aquele momento especial só para si.

   Mesmo agora, apesar da situação, Ayaka ainda sentia pena por ter visto um vislumbre.

   Ela colocou as alças da sacola de papel na dobra do cotovelo e juntou as palmas das mãos na frente de Mahiru, murmurando silenciosamente um sincero “Desculpe!”

“N-não, não tinha jeito, e já estou mais do que satisfeita... Foi maravilhoso,” disse Mahiru, com as bochechas levemente coradas.

“Heh heh, que bom. Me faz sentir que apresentá-lo aqui valeu totalmente a pena.” Ayaka sorriu e estendeu a sacola. “Aqui está a muda de roupa. Desculpe se não é o seu estilo. Peguei algo que ainda não usei. Estava com pressa e acabei escolhendo algo que queria ver você usar.”

“Não, obrigada. Agradeço muito,” disse Mahiru ao aceitar a sacola.

“Você vai sair depois disso, certo? Eu não devo me intrometer mais, então agora que fiz a minha parte, vou-me embora.”

   Ayaka tinha vindo apenas para entregar a muda de roupa e, fiel à sua palavra, entregou a sacola e imediatamente começou a se preparar para sair.

   Amane não pôde deixar de sentir uma pontada de culpa por fazê-la ter esse trabalho.

“Você veio até aqui só para me trazer uma muda de roupa... Muito obrigada, principalmente quando está ocupada,” disse Mahiru, curvando-se em gratidão.

“Muito obrigada, Kido. Retribuirei o favor em algum momento,” acrescentou Amane.

“Não, não, sério... não é nada!” Ayaka acenou para eles com um sorriso alegre. “Afinal, a tia Fumika me convidou. E ela disse que eu poderia levar para casa os biscoitos que sobrassem como recompensa, então estou bem! Ah, e ocupada? Não exatamente — na verdade, o Sou-chan está me esperando lá fora. Ele veio junto.”

“Huh? Por que ele não entrou?”

   Fazia todo o sentido que o Souji — o namorado dela — tivesse vindo com ela. O sol da tarde já havia se posto no horizonte e a escuridão precoce do inverno começava a cobrir o céu.

   Mas Amane não conseguia entender por que o Souji não tinha entrado.

     Ele trabalha aqui. Mesmo que não esteja de plantão, pode entrar na sala dos fundos.

   Enquanto olhava para Ayaka, confuso, ela balançou a cabeça lentamente.

“Bem, a Shiina-san está aqui, não está? Eu sabia que ela precisava de uma troca de roupa, então não fazia ideia do que ela poderia estar vestindo quando eu cheguei. Além disso, o Miyamoto-san estava lá fora, mexendo com ele.”

“Ah… imagino.”

   Miyamoto provavelmente estava provocando Souji por estar com a namorada no White Day em vez de trabalhar. Ele podia mais ou menos adivinhar.

“E com isso, estou sindo! Tenho que resgatar Sou-chan e ir para casa para aproveitar um tempo de qualidade juntos. Então, agora vou me despedir! Puuf!

[Moon: Ayaka goat?!]

   Se ela estava saindo como um samurai ou ninja, ninguém sabia, mas com aquele comentário final teatral, Ayaka saiu rapidamente da sala de descanso.

   Mahiru e Amane trocaram um olhar e riram.

“Bem, então, Fujimiya-kun, você pode bater o ponto agora. Está ficando tarde, então, por favor, vá e acompanhe sua namorada até em casa.”

“Espere, ainda não está um pouco cedo?”

   Ele olhou para o relógio de parede. Os ponteiros marcavam quinze minutos antes do horário de término programado. Como ele não havia trabalhado um turno completo hoje, planejava ficar pelo menos até o final. Mas Fumika, como se pudesse ler sua mente, lançou-lhe um sorriso calmo e reconfortante.

“O movimento noturno é pequeno nesta época do ano, e temos bastantes funcionários esta noite, então não é problema algum. Considere isso um pequeno pedido de desculpas pelo problema que lhe causamos hoje. Ah, mas antes de ir, dê uma olhada na Oohashi-san. Ela parecia um pouco abatida.”

“O que aconteceu não foi culpa dela... Mesmo assim, vou aceitar sua oferta e ir embora então.”

   Fumika não tinha sido diretamente responsável pelo incidente, mas ainda assim se sentia responsável. Sentindo que seria rude não fazer isso, Amane aceitou sua gentil proposta e se virou para Mahiru.

“Mahiru, você poderia se trocar e me esperar aqui? Vou bater o ponto e me trocar também.”

“Sim, estarei esperando.”

   Mahiru está tão bonita com nosso uniforme, pensou Amane. Eu ainda gosto mais do estilo dela, no entanto.

   Antes de sair da sala de descanso, ele lhe deu um cafuné gentil na cabeça.

   Atrás dele, Fumika soltou uma risada encantada.

   Amane imediatamente se arrependeu de ter feito aquilo bem na frente dela. Ele deveria ter esperado até que ela fosse embora, mas aquele barco já havia partido.

   Sentindo-se um pouco envergonhado agora, Amane franziu os lábios e voltou para a frente. Antes de ir para o vestiário, ele parou para dar uma olhada no salão principal.

   Alguns novos clientes haviam entrado enquanto ele e Mahiru estavam fora, mas mesmo com apenas dois funcionários cobrindo o salão, tudo parecia estar funcionando perfeitamente.

   Só havia uma coisa. Oohashi estava perto do balcão com uma expressão sombria, fora do alcance dos clientes. Qualquer um podia dizer à primeira vista que ela não estava agindo da melhor forma possível. Ela não parecia mais em choque, mas era óbvio que seu humor estava no fundo do poço.

“Oohashi-san. A mancha saiu, então está tudo bem.”

“Mesmo...? Isso é incrível, mas... isso ainda não significa que esteja tudo bem...”

“Sinceramente, está tudo bem. Não se culpe por isso. Creio que a Mahiru também não está chateada.”

   Mahiru parecia mais surpresa do que qualquer outra coisa. A julgar pelo quão animada ela estava depois, tirando fotos com o uniforme emprestado, ela provavelmente se divertiu muito mais do que teria se divertido de outra forma.

   Claro, Amane sabia que era melhor não falar sobre seus sentimentos por ela, mas era seguro dizer que Oohashi não precisava estar afundando no chão de culpa.

“Não se trata de ela estar com raiva ou não,” disse Oohashi baixinho, com a voz carregada de culpa. “...Ela se esforçou para se arrumar, toda animada para o encontro com o namorado, e eu fui e estraguei tudo. É isso que eu não consigo superar. Quer dizer, eu ficaria tão chocada se isso acontecesse comigo... Pensar que fiz isso com outra pessoa é simplesmente... Dias especiais como este são memórias que você nunca esquece, certo? Então, o ideal é que eles sejam cheios de momentos felizes. Você não preferiria ter um aniversário para relembrar e pensar: ‘Aquele foi um dia maravilhoso’?”

“Bem, sim, eu acho...” respondeu Amane.

“Eu sei que ela provavelmente não está brava,” murmurou Oohashi. “Mas esse não é o ponto. É mais uma questão comigo.”

   Oohashi não duvidou do que Amane disse para confortá-la. Ela sabia que ele falava sério, e isso a fez se sentir ainda mais culpada.

   Oohashi não se arrependia apenas do erro; estava genuinamente decepcionada consigo mesma. Amane percebeu que não era algo que pudesse consertar com algumas palavras de conforto. Era uma questão de consciência.

   Nesse momento, tudo o que ele podia fazer era deixá-la processar a situação em seu próprio ritmo.

“...Se é assim, então eu realmente não posso fazer muito mais por você. Não vou supor que consigo ler completamente o coração de Mahiru, então não vou colocar palavras na boca dela — mas pelo menos lembre-se de que não guardo rancor do que aconteceu. Acredito que isso será outra coisa que poderemos relembrar juntos e rir um dia.”

   Amane acreditava em valorizar memórias felizes e evitar que as amargas se misturassem, se possível. Mas duvidava que este White Day se transformasse no tipo de memória amarga que Oohashi temia.

“Só para constar, a Mahiru ficou super animada vestindo nosso uniforme, mesmo que por pouco tempo.”

   Enquanto Oohashi erguia lentamente a cabeça, Amane se lembrou do rosto radiante de Mahiru e deu um sorriso fraco e irônico.

“Ela disse que parecia uma chance de sorte de fazer algo que normalmente não conseguia. Até tiramos fotos juntos com nossos uniformes combinando. Ela parecia completamente emocionada. Ela me disse que as guardaria com carinho.”

   Mahiru havia arrumado o cabelo lindamente e estava ao lado dele com um uniforme combinando, o rosto iluminado por uma pura e inocente alegria. Quem poderia imaginar que ela estava chateada?

   O que aconteceu pode não ter sido o ideal, mas Mahiru tinha um jeito de transformar até mesmo pequenos contratempos em algo significativo. Ela também havia lidado com esse acidente com calma e, de alguma forma, conseguiu encontrar sua própria maneira de aproveitar o dia.

   É claro que, assim que chegassem em casa, Amane ainda planejava falar com ela para se certificar de que ela não estava apenas fingindo coragem. Mas se havia uma coisa que ele sabia com certeza, era que Mahiru tinha um talento notável para encontrar a felicidade em seus próprios termos.

   Em breve, ele decidiu perguntar como ela se lembrava deste dia e o que significava para ela.

   Então, vendo o brilho nos olhos de Oohashi enquanto ela pairava à beira das lágrimas, Amane lhe deu um sorriso gentil.

“Bem, então eu vou primeiro. Bom trabalho hoje.”

“...Você também,” respondeu Oohashi.

   Quando o sino tocou e ela se virou para atender um cliente próximo, Amane a chamou mais uma vez. Sua resposta, embora ainda um murmúrio, teve um pouco mais de força desta vez.

   Ele a observou assumir seu sorriso alegre de atendimento ao cliente e a acompanhou até a saída. Então, virando o olhar, avistou Miyamoto retornando de uma mesa recém-limpa, com uma bandeja de pratos e xícaras equilibrada nas mãos.

   Miyamoto pareceu visivelmente aliviado ao ver Amane voltando, calmo e sereno.

“Sua namorada está bem?”

“Sim. Está tudo bem da nossa parte e, graças à gentileza da proprietária, me disseram que posso sair um pouco mais cedo. Vocês vão ficar bem aqui?”

“Comparado com o quão agitado estava antes, isso não é nada. Tenho certeza de que a proprietária voltará em breve para ajudar na cozinha ou no chão. E sim, depois de tudo o que aconteceu, não estou surpreso que ela tenha deixado você ir mais cedo.”

“Então vou deixar o resto com vocês. Ah, e por favor, não deixem de verificar a Oohashi-san depois. E não usem palavras duras agora. Ela está super desanimada.”

“Eu sei. Fui muito duro com ela mais cedo.”

   Miyamoto pareceu um pouco envergonhado quando Amane acrescentou o último lembrete.

   Miyamoto era amigável com todos. Direto, calmo e uma espécie de irmão mais velho para aqueles ao seu redor. Mas quando se tratava de Oohashi, ele tendia a ficar nervoso. Na verdade, ele frequentemente tratava completos estranhos com mais paciência e cuidado do que demonstrava com ela.

   Amane sabia que tudo decorria de alguns sentimentos conflitantes entre os dois, mas mesmo assim, não conseguia deixar de pensar um pouco melancolicamente: Se o Miyamoto-san suavizasse um pouco seu comportamento com ela, talvez a Oohashi-san se sentisse mais confortável para ser honesta com ele.

“Estimular alguém para melhor é ótimo, mas não revide com muita força no processo, okay? A Oohashi-san é mais sensível do que deixa transparecer.”

“...É, eu sei disso. Quem te fez o especialista?”

“Veja bem, eu ouço problemas de qualquer lado, seja de você ou da Oohashi-san. Acredite ou não, ela luta com coisas que você nem sabe.”

   Assim como Miyamoto às vezes desabafava com Amane, sabendo que podia guardar um segredo e ouvir sem julgar, Oohashi fazia o mesmo. Ela também lhe confidenciava suas preocupações e frustrações.

   Naturalmente, Amane nunca replicava uma palavra sobre essas preocupações pessoais para ninguém. Dito isso, a maioria das reclamações deles tendia a ser um sobre o outro.

   Do ponto de vista de Amane como mediador não oficial, havia apenas um conselho que ele gostaria de poder dar aos dois: ‘Sejam honestos um com o outro logo.’

   Quando Amane insinuou que havia coisas que nem ele sabia, Miyamoto o encarou com severidade, causando um leve arrepio na espinha de Amane.

   Ainda assim, ele não se encolheu. Em vez disso, encarou Miyamoto com um olhar inocente que dizia: ‘Eu não sei de nada!’

“Olha, em vez de me encarar, pense em maneiras de apoiá-la. Tente fazer com que ela se sinta confortável para se abrir. Além disso, outro cliente acabou de entrar.”

   O sino acima da porta soou e Amane inclinou a cabeça em direção à entrada.

   Em um piscar de olhos, Miyamoto assumiu seu habitual sorriso acolhedor e saiu para cumprimentá-los.

   Amane ficou mais uma vez impressionado com a rapidez com que conseguia mudar de assunto. Então, com um pequeno suspiro, rezou silenciosamente para que, um dia, os sentimentos de Miyamoto finalmente alcançassem seu objetivo.

 

 

✧ ₊ ✦ ₊ ✧

 

 

“Desculpe por fazê-la esperar,” disse Amane.

   Quando voltou para a sala de descanso, agora vestido com suas roupas casuais, encontrou Mahiru já trocada e esperando por ele. Fumika não estava à vista, então provavelmente estava na entrada ou escondida em seu escritório.

“Não, tudo bem. Não esperei muito. Além disso, às vezes esperar pode ser divertido.”

“Então, eu te fiz esperar um pouco...”

“Não sou tão impaciente a ponto de me cansar de esperar depois de apenas cinco ou dez minutos, sabe? Além disso, eu estava me divertindo imaginando que tipo de roupa você escolheria para usar hoje. Combina muito com você.”

“Mas não é nada chique o suficiente para atender às suas expectativas.”

   Ele havia pensado um pouco no que vestir, mas no final, não era nada chamativo. Apenas um tricô cinza-escuro sobre uma camisa branca, calças azul-marinho afuniladas e uma jaqueta. Se algo em sua roupa chamou a atenção de Mahiru, provavelmente foi o cachecol. Ele havia enrolado confortavelmente o que ela lhe dera no Natal passado em volta do pescoço.

   Usar algo que ela lhe dera de presente o deixava um pouco tímido, mas, a julgar pelo calor no sorriso de Mahiru, ela claramente apreciava.

“Você também combinou muito bem com essa roupa. Então foi isso que a Kido escolheu, hein?” disse Amane, observando o conjunto de Mahiru.

“Eu não costumo usar roupas assim, então elas parecem novas para mim.”

“Visuais com tamanho maior como esse também ficam bem fofos. Vou ter que agradecer à Kido mais tarde.”

   Mahiru vestia um macacão jeans folgado combinado com um moletom com capuz que tinha ilustrações divertidas e estilizadas de um gato e um coelho no peito. O design peculiar do moletom, completo com balões de fala cheios de trocadilhos, dava a todo o traje um charme divertido e excêntrico.

   Uma rápida olhada perto dos pés dela revelou que ela havia arregaçado as barras da calça porque estavam muito compridas, o que lembrou Amane de que Mahiru era bem mais baixa que Ayaka. Mas ele sabia que Mahiru faria beicinho se ele dissesse alguma coisa, então se conteve.

   Mahiru já tinha usado vários modelos antes, mas talvez por causa de suas preferências pessoais, ele não se lembrava de ela ter usado algo tão masculino. Isso tornava o visual especialmente moderno.

“Onde será que vendem moletons engraçados como este?” Mahiru refletiu. “Se tiverem outros modelos, eu adoraria comprar outro para combinarmos.”

“Você quer que eu use um também?”

[Kura: Parece uma criança, muito fofo.]

“Não seria fofo se a gente combinasse? Acho que seria divertido.”

   Visivelmente encantada com o design excêntrico do moletom, Mahiru riu e lhe lançou um sorriso brincalhão. Amane soltou um pequeno suspiro de incredulidade, mas a verdade era que ele já havia decidido mandar uma mensagem para Ayaka mais tarde para descobrir onde ela o havia comprado.

   Mahiru não pareceu nem um pouco envergonhada com o olhar. Na verdade, parecia que ela havia tropeçado em seu novo estilo favorito. Vê-la tão animada fez Amane sorrir também.

   Sem dizer uma palavra, ele se abaixou e pegou o saco de papel com as roupas que ela havia deixado ao seu lado.

“Vamos para casa?” Amane ofereceu a mão a ela.

“Claro.” Mahiru a agarrou sem hesitar.

   Ainda quentes do quarto aquecido, seus dedos estavam um pouco mais quentinhos do que o normal. Mas quando ele entrelaçou os dedos e saiu pela entrada dos funcionários, um arrepio percorreu sua bochecha.

   Era o início da primavera, mas o inverno ainda não havia ido embora por completo. Assim que a noite caiu, o frio subiu da calçada. Mesmo de casaco, Mahiru sentiu um leve tremor. Depois de um momento de inquietação, ela se inclinou em seu braço para roubar um pouco do seu calor.

   Amane não gostava muito de frio, mas naquele momento, ele se sentia quase grato por isso — mesmo que fosse apenas porque trazia à tona um lado irresistivelmente fofo dela.

“Você está se sentindo bem, Mahiru?”

“Você está perguntando sobre o frio?”

“Ah... bem, isso também, mas... eu quis dizer suas roupas. Elas ficaram sujas, não é?”

   Mahiru não pareceu se incomodar antes, mas ele esperou até que estivessem sozinhos para tocar no assunto. Mahiru olhou para ele com uma expressão que dizia: ‘Você ainda está preocupado com isso?’

“Ah, bem. Honestamente, não é algo que valha a pena fazer alarde. Se eu estivesse usando algo formal, como um furisode ou um vestido para uma ocasião especial, eu poderia ter ficado um pouco chateada ou preocupada. Mas esta era apenas uma roupa casual, e você já cuidou da mancha. Na verdade, me sinto pior pela Oohashi-san. Isso realmente a afetou.”

[Kura: O furisode é um quimono formal para mulheres jovens solteiras com mangas longas e fluidas.]

“Sim... definitivamente a afetou, mas não acho que haja muito que alguém possa fazer até que ela mesma se conforme com isso. Principalmente porque os clientes chegaram logo depois, então ela nem teve a chance de se desculpar direito.”

“Isso vai fazer com que ela se sinta ainda mais culpada, não é? Por favor, diga a ela que não precisa se preocupar. Você tirou a mancha completamente, então não é grande coisa.”

   Da última vez que ele viu Oohashi, ela conseguiu se recompor um pouco, mas uma culpa como essa não desaparecia rapidamente. Ele tinha a sensação de que ela eventualmente precisaria de uma chance de se desculpar.

   Ele imaginou que, quando chegasse a hora, conversaria com Mahiru e ajudaria a concretizar essa vontade.

   Com esse pensamento afastado, ele olhou para ela e a encontrou ainda animada.

“A propósito, o que você achou da sala dos funcionários? Tentei dar uma arrumadinha.”

“Foi meio emocionante dar uma bisbilhotada em um espaço que os clientes normalmente não veem.”

“É, a menos que você trabalhe lá, os fundos são proibidos.”

“Fiquei impressionada com o quão espaçoso era... e o cheiro de café era delicioso. Me lembrou do cheiro que você tem quando chega do trabalho, Amane-kun.”

“...Espera aí, eu fico com cheiro de café depois do trabalho?”

   Como ele trabalhava em uma cafeteria, geralmente era bem cuidadoso com isso. Ele mantinha spray desodorante na copa e sempre se borrifava bem antes de ir para casa.

   Aparentemente, não tinha sido o suficiente. Sem perceber, ele trazia para Mahiru uma lembrancinha com cheiro de café toda vez que entrava.

“Não é um cheiro ruim. É um cheiro quente, de aroma de café.”

“Acho que preciso usar mais desodorante.”

“Aww... mas eu gosto.”

“Então, qual você prefere? Meu cheiro de sempre ou o de café?”

   Mahiru tinha uma queda clara pelo cheiro de Amane. De vez em quando, encontrava uma de suas camisas deixada na sala, esperando para ser lavada. E, em vez de jogá-la na máquina de lavar imediatamente, saboreava o leve traço dele deixado nela.

[Del: Respira. Calma, isso já é quase que normal pra eles. Respira. | Moon: …… Perturbador e fofo… De certa forma, eu gosto. Mas não faria! | Kura: Ué? kkkk.]

   É verdade que a culpa era em parte dele por não tê-la jogado direto no cesto de roupa suja ou na máquina de lavar, mas ainda assim... Ele nunca imaginou que ela realmente a cheiraria. Na primeira vez que a pegou fazendo isso, ficou tão chocado e envergonhado que praticamente implorou para que ela parasse.

   Mas então ela o encarou com aqueles olhos suplicantes e perguntou suavemente: “Só um pouquinho...?”

   Perturbado além da conta, ele acabou cedendo, mas com a condição de que não poderia ser algo que tivesse transpirado.

   Então, agora, Mahiru tinha permissão para aproveitar secretamente o cheiro de suas jaquetas ou camisas que usara por pouco tempo... e Amane, para o bem ou para o mal, decidira simplesmente ignorar.

“É engraçado você dizer isso, porque você sempre cheira minhas camisas sujas com alegria,” disse ele, provocando.

   O olhar de Mahiru percorreu o ambiente. Seu rosto corou, ficando vermelho por algo além do frio.

“...E-essa pergunta não é justa. Pense nisso como se eu estivesse... mudando de sabor de vez em quando.”

“Sinceramente, estou com um pouco de medo de que você acabe desenvolvendo todos os tipos de gostos.”

“Como quais?”

“Você sabe — cheiros, músculos, voz… fetiches assim.”

   Para ser justo, já parecia que Mahiru tinha uma queda pelos três. E no segundo em que ele começou a listá-los, a postura dela ficou visivelmente rígida.

   Ela sabia exatamente do que ele estava falando.

“...E-Está tudo bem. Totalmente bem.”

“Uh-huh, claro que está.”

“Digamos que eu gosto de tudo em você, Amane-kun.”

“Nem vai negar que você tem um fetiche, hein.”

“Isso é só imaginação sua... Enfim, você não tem nada parecido?”

“Hoh? Você disse ‘você não tem’ — então está admitindo agora?”

   Sem responder, Mahiru bateu a testa no braço dele e começou a esfregar o rosto nele.

   Era um dos movimentos adoráveis ​​que ela fazia sempre que queria fugir de um assunto. Mas Amane sabia que era melhor não expor um de seus hábitos. Se ele fizesse isso, ela apenas soltaria um “Uuuh...” frustrado e começaria a ficar de mau-humor. Então, ele a deixou continuar seu pequeno ataque inofensivo.

   Amane olhou para o relógio em seu pulso livre. Eles estavam um pouco adiantados, mas o céu já tinha escurecido.

“De qualquer forma, o que você acha? Ainda tem vontade de dar uma olhada na loja selecionada, como planejamos?”

   A loja definitivamente ainda estava aberta, e não era tão tarde a ponto de correrem o risco de serem parados por ficarem fora por tanto tempo. Mas depois de tudo o que acontecera naquele dia, ele não tinha certeza se Mahiru ainda tinha energia ou interesse.

   Dependia inteiramente dela. Se ela topasse, ele ficaria feliz em fazer qualquer outra coisa que ela tivesse em mente. Mas se ela ainda estivesse com vontade, ele garantiria que se divertissem dando uma olhada juntos.

   Mahiru piscou, então soltou um pequeno “Hmm...” pensativo. Ela permaneceu perto, ainda aconchegada ao lado dele, então inclinou a cabeça para encontrar seu olhar.

“...Vamos guardar isso para o nosso próximo encontro. Quero levar o meu tempo escolhendo as coisas que usaremos todos os dias, então prefiro ir quando tiver mais energia. Hoje...”

“Hoje?”

“Nossa padaria favorita ainda deve estar aberta, certo? Vamos escolher algo de lá para o jantar. Só desta vez, vamos apostar em comida pronta.”

   Uma padaria local havia se tornado recentemente um de seus lugares favoritos. Abria cedo e ficava aberta até as sete da noite.

   Eles tinham uma ótima seleção, mas o lugar era popular — não havia garantia de que seus favoritos ainda estariam em estoque. Por outro lado, chegar tão tarde significava que eles poderiam encontrar algo novo, algo que normalmente não estava disponível durante suas visitas regulares. Essa pitada de imprevisibilidade parecia fazer parte do apelo para Mahiru também.

“Sim... Espero que encontremos algo bom.”

“Se eles ainda tiverem uma baguete ou pão de forma, vamos fazer rabanada (torrada francesa) para o café da manhã amanhã.”

“Perfeito. Hoje foi um dia adorável.”

   A ideia de caçar pequenos tesouros juntos fez com que parecesse um encontro doce e improvisado. Amane riu baixinho ao pensar nisso, e Mahiru, igualmente feliz, também deu uma risadinha.

“Hehe, você está se precipitando. Mas... é verdade, foi realmente um dia adorável.”

   Era um pouco cedo para dizer isso, mas, tendo escolhido encerrar o dia dessa forma, Mahiru agarrou o braço de Amane com um aperto suave e começou a caminhar em direção à estação com passos mais saltitantes. Acompanhando seu ritmo, Amane segurou suavemente as pontas dos dedos quentinhos dela.

 

-DelValle: Esse final teve um assunto diferenciado. Mas enfim, foi um cap bem longo e muito fofo e agradável, adoro observar esses dias a dias deles. Até o próximo cap, com uma surpresinha.

-MoonlakGil: Ela saltitantezinha, que fofo!! Esses dois acabam com as minhas doces de açúcar kk. Bom, mas um capítulo muito longo para vocês aproveitarem bastante e espero que tenham se divertido tanto quanto eu (e surtado)!!! Ma-ta-a-shi-taaa!!!

-Kurayami: Não minto, esse cap me surpreendeu, principalmente com as trocas de roupa da Mahiru, e também do café. A visita foi ótimo, além de ser fofo. Só o final que foi meio….

 

 

Traduzido por Moonlight Valley

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