Volume 1
— Capítulo 6: Clocktown —
Após vinte longos dias de jornada sacolejando na carruagem, finalmente pude esticar minhas pernas e me espreguiçar, aliviando o cansaço acumulado.
— Argh, finalmente chegamos — suspirou Antony Bloodrose, enquanto alongava os braços, a satisfação evidente em sua voz.
— Olhe só aquela torre do relógio, querido! Que elegância! — exclamou Amanda Bloodrose, seus olhos brilhando com entusiasmo ao admirar a beleza da cidade.
Enquanto isso, o pequeno Mickey Bloodrose, parecia intimidado e inquieto, se escondendo atrás da mãe.
— T-tem gente demais... — murmurou, espiando o movimento com evidente desconforto.
Antony, com o semblante sério, examinava as horas em seu relógio de bolso. Contudo, ao erguer os olhos e avistar o grande relógio no topo da torre — visível de qualquer ponto da cidade —, não pôde evitar um leve sorriso constrangido, colocando a mão no rosto.
— Certo, temos algumas horas antes da partida dos barcos para Avalon.
— Então precisamos comprar os materiais do Mickey, resolver aquele acordo, fechar o contrato de comércio... — disse ele, contando as tarefas nos dedos, a expressão um misto de cansaço e determinação.
Ele se virou para mim com um sorriso leve.
— Parece que vamos ter que nos separar, Artemy. Imagino que você também tenha seus próprios assuntos para resolver.
— Nem me fale. Mas vejo que vocês têm muito em mãos — respondi, acompanhando o tom descontraído.
Amanda sorriu calorosamente.
— Boa sorte, garoto. Muito obrigada por cuidar do meu pequeno. Espero que continuem se dando bem.
— Confesso que a ideia de sermos oponentes em Arcadya me assusta... mas acho que será divertido também — disse Mickey, superando seu medo com um sorriso hesitante.
— Artemy, obrigado pela escolta. Não sei se teríamos chegado ilesos sem você — disse Antony, apertando minha mão de forma calorosa antes de revirar a carruagem, lembrando-se de algo importante.
— Ah, sobre o seu pagamento... Deixa eu ver aqui... 10, 20, 30...
Antes que ele terminasse, peguei uma garrafa de uísque das mercadorias, que reluzia em suas linhas elegantes.
— Acho que isso aqui deve bastar.
Antony soltou uma risada breve.
— Hah, sem problemas. Mas a proteção da minha família vale mais do que uma garrafa. Aqui, pegue isso. — Ele lançou uma pequena algibeira na minha direção, o som das moedas tilintando de forma animadora.
O valor era impressionante. Com isso, eu poderia viver tranquilamente por alguns meses. Guardei a algibeira e a garrafa na mochila, despedindo-me da família Bloodrose. Um casal e um garoto que, de certa forma, tornaram-se uma companhia preciosa para mim durante a viagem. Espero cruzar com eles novamente um dia.
— Oh, pode apostar que vai — disse Cheshire, surgindo em seu jeito flutuante e casual, com um sorriso enigmático. — Aquele garoto parece destinado a grandes desafios, hehe.
Talvez ele esteja certo.
O aroma salgado da maresia dominava o ar de Clocktown, a movimentada cidade portuária. Sob o sol da manhã, as ruas fervilhavam com o burburinho de comerciantes e viajantes, enquanto carruagens luxuosas e bagagens pesadas compunham o cenário. Hoje, no entanto, algo diferente pairava no ambiente: um número incomum de jovens transitava pela cidade. Alguns vestiam roupas finas, com símbolos de casas nobres, enquanto outros, mais simples, carregavam o peso de suas malas com determinação.
Entre as figuras que se destacavam, algumas pareciam ter a minha idade, o que me levou a pensar que também fossem calouros.
Um rapaz loiro de aparência aristocrática admirava, quase em êxtase, uma grande estátua de um herói ancestral no centro da cidade. Seus olhos brilhavam como se a história do monumento estivesse viva diante dele.
Mais adiante, próximo a uma taverna, uma cena peculiar roubou minha atenção: uma garota alta, de cabelos vermelho-carmesim, estava cercada por pratos que se empilhavam sem parar. Ela devorava comida com tamanha voracidade que os atendentes, apressados, tentavam acompanhar seu apetite insaciável. O pequeno tumulto era quase cômico.
Seguindo meu caminho, uma visão ainda mais curiosa apareceu: uma menina baixa, de cabelos castanhos, com sardas e óculos redondos tão grandes que quase cobriam seu rosto. Ela carregava uma pilha monumental de livros, que oscilava a cada passo. Era óbvio que aquilo não terminaria bem.
Annabeth Bloomrise, com seus míseros 1,40m, lutava contra o peso dos volumes que comprara. A livraria onde estava com a família não tinha os títulos que precisava, forçando-a a buscar em outro lugar da cidade. No entanto, o trajeto de volta era mais complicado do que ela esperava. Mal enxergava à frente por conta da pilha de livros, e o esforço para equilibrá-los era visivelmente exaustivo.
De repente, como era de se esperar, Annabeth tropeçou. Sentiu o pé preso em alguma irregularidade da calçada de pedra e, antes de perceber, já estava sendo puxada em direção ao chão. Em sua mente, um único pensamento: "Lá se vai mais um par de óculos este ano..." como alguem pode ser tão desastrada?
Mas o impacto não veio. Um puxão firme a fez recuperar o equilíbrio antes da queda. Quando se deu conta, uma enorme mão segurava seu ombro, a erguendo alguns centímetros do chão. Ao olhar para trás, sua visão foi preenchida por uma figura imponente. Comparada ao garoto à sua frente, Annabeth parecia uma criança diante de uma montanha.
— Ei, tome mais cuidado. Andar sem enxergar numa rua de pedra é pedir pra cair — ele disse, em tom firme.
Annabeth ficou imediatamente intimidada. Queria agradecer, mas o medo de dizer algo errado a paralisava. Finalmente, curvando-se levemente e com a voz trêmula, respondeu:
— M-muito obrigada, senhor. E m-me desculpe...
— O quê? Esta pedindo desculpas porque caralho?— respondi com um tom serio porem confuso, inclinando a cabeça
— M-me desculpe por pedir desculpas! — gaguejou annabeth, quase chorando
A interação bizarra começou a atrair olhares curiosos, o que não ajudava na tensão crescente. Decidi aliviar a situação.
— Ei, relaxa ai.Eu so queria uma informação — disse soltando a garota no chão tinha esquecido que ela estava suspensa
Annabeth percebeu os olhares ao redor e tentou se recompor. Ainda assim, sua voz continuava tremendo.
— Cla-claro! Eu posso te ajudar. Me desculpe pela confusão.
E serio, para de pedir desculpas pra tudo...
— Então você também está indo para a livraria? — perguntei, adotando um tom mais casual.
— A-ah, sim. Tenho que encontrar minha família lá — ela respondeu, escondendo-se atrás da pilha de livros como se quisesse desaparecer.
— Beleza. Nesse caso, eu te ajudo com isso aqui, e você me leva até lá. Trato feito? — disse, pegando a maior parte dos livros de suas mãos com um rosto despreocupado.
— Ah! Claro, muito obrigada! — Annabeth respondeu, balançando a cabeça com um sorriso aliviado e genuíno.
Ao empurrar as grandes portas duplas de madeira, que pareciam pertencer a um prédio antigo e majestoso, fui imediatamente envolvido por um aroma peculiar. Era o cheiro inconfundível de papel envelhecido, aquele perfume sutil que parecia carregar décadas de histórias e sabedoria. O ambiente exalava conhecimento: estantes imponentes subiam até o teto, carregadas de livros e pergaminhos que pareciam guardar segredos ancestrais.
Eu tinha um objetivo claro. Em Arcadya, havia apenas tres formas de ingresso: pagar a exorbitante semestralidade, entrar como aluno por indicação ou conquistar uma bolsa de estudos ao superar o lendário teste escrito. Este último, porém, era famoso por sua dificuldade insana. Diziam que alunos dedicavam anos, às vezes uma vida inteira, para se preparar, apenas para enfrentar uma taxa de aprovação quase inexistente.
Por sorte, eu não precisava passar por essa tortura. Minha entrada em Arcadya fora garantida pelos Von Doix. Se dependesse de mim, nunca teria conseguido superar aquele teste absurdo.
Durante os dois anos que passei na cabana com Magnus, ele insistiu para que eu estudasse as matérias básicas de Arcadya enquanto aprimorava meu físico. Afinal, mesmo sendo conhecida por formar indivíduos poderosos, Arcadya ainda era, tecnicamente, uma escola.
O problema é que eu e teoria nunca nos demos bem. Fórmulas complexas e teorias abstratas? Só de pensar, minha cabeça já começava a doer. Nenhuma criatura, por mais feroz que fosse, conseguia me intimidar tanto quanto um livro de fundamentos avançados.
Mas, para sobreviver em Arcadya, eu precisava de pelo menos o básico. Por isso, estava aqui. Uma boa parte do dinheiro que juntei seria destinada aos materiais acadêmicos – e pelo que vi, não eram poucos.
Teoria espiritual, controle de éter, classes de atributos, domínio elemental, combate dinâmico, encantamentos, técnicas de defesa... Meu Deus, parecia uma lista infinita! Mas, considerando a reputação de Arcadya como a maior academia do domínio humano, isso não era surpresa.
Enquanto olhava ao redor, cercado por estantes repletas de conhecimento, senti uma pontada de excitação misturada com nervosismo. Estava prestes a entrar em um mundo completamente novo – e, de uma forma ou de outra, precisava estar pronto.
Carregando uma pilha confortável de livros nos braços, Annabeth atravessou as portas da biblioteca com passos determinados. Seus olhos estreitados vasculharam as prateleiras até que um grupo familiar chamou sua atenção.
Ali estavam: uma mulher de cabelos castanhos trançados e uma aparência que exalava maturidade; um homem rechonchudo de bigode espesso e castanho; e um menino pequeno, de postura encurvada, óculos redondos quase desproporcionais ao rosto sardento.
Sua mãe, Anastasia Bloomrise, seu pai, Jorge Bloomrise, e o caçula da família, Rony Bloomrise.
Com um sorriso que iluminava o rosto, Annabeth acenou e se aproximou com entusiasmo:
— Ei, pai, mãe! Consegui comprar os livros que faltavam. — Ela largou a pequena pilha de volumes sobre uma mesa próxima com um movimento cuidadoso.
Anastasia, ainda sorrindo, ergueu uma sobrancelha, confusa:
— Ah, Betinha! Que bom, filha. Mas… só esses? Do jeito que você falou, achei que seria uma montanha de livros.
O sorriso de Annabeth desapareceu num instante. Com o rosto levemente abaixado e o corpo tremendo
Pah!
O som abrupto de algo pesado batendo na mesa ao lado fez todos se virarem. Uma figura alta e corpulenta largava uma pilha de livros muito maior do que a de Annabeth, com uma expressão casual que parecia destoar de sua presença.
— Fala aí, tudo certo? — Artemy soltou, com uma voz seca
— A-a-ah, s-sim, claro... — balbuciou a senhora Bloomrise, instintivamente posicionando-se na frente da filha como se fosse um esquilo protetor defendendo seus filhotes.
Artemy, de fato, não era tão alto assim. Mas, para aquela família que mal superava os anões em altura, ele parecia um predio que havia se materializado do nada. O desconforto pairou por um segundo, até que ele virou o pescoço na direção de Annabeth, suando frio, como se implorasse por uma explicação.
Annabeth, ainda tremendo, levantou a cabeça. Suas bochechas estavam infladas e tingidas de vermelho, uma mistura explosiva de vergonha e raiva:
— Mãe, eu já não disse pra não me chamar de Betinha em público?!
O silêncio pairou... por um breve momento.
— Pfft.
Anastasia levou a mão ao rosto para esconder uma risada que escapava teimosamente. Rony, por outro lado, explodiu numa gargalhada barulhenta, abraçando a barriga enquanto ria.
— Vocês não deviam rir disso... É falta de educação, pfft! — tentou Jorge, virando o rosto de lado para disfarçar a própria risada trêmula.
— Pai, você também tá rindo, né?! — Annabeth protestou, com o rosto ainda mais vermelho de indignação.
O clima tenso de segundos atrás desapareceu tão rápido quanto surgiu. A livraria agora ecoava risadas, e Annabeth, mesmo contrariada, deixou escapar um sorriso discreto ao perceber o quanto aquilo era típico de sua família.
— Ah, desculpa, filha... — Anastasia disse, limpando uma lágrima que escorria de tanto rir. — Fazia tanto tempo que você não fazia essa cara.
— Ah, tanto faz... — murmurou Annabeth, moldando um beicinho irritado, parece que ela realmente não gosta desse apelido
— Inclusive, mãe, eram muitos mais livros do que esses aqui. Na verdade, eu nem conseguiria trazê-los sozinha. Quando estava vindo para cá, encontrei um garoto que me ajudou. Esse é o... er... — Apontando na minha direção, Annabeth parou por um momento, e só então pareceu se dar conta de que nunca havia perguntado meu nome.
— Artemy. E você deve ser... Betinha, certo? — Respondi com um tom sério, mas não consegui esconder o brilho de provocação nos olhos.
— Não, não, NÃO! É Annabeth! ANNABETH! — Ela respondeu, batendo o pé no chão e gesticulando com as mãos, as bochechas infladas com uma mistura de constrangimento e raiva.
— Certo, Annabeth... É um prazer conhecê-la — tentei responder com seriedade, evitando os risos presos na garganta.
Com a tensão inicial dissipada, Anastacia, que observava tudo, pareceu entender melhor a situação e logo reconheceu o mal-entendido que havia lhe confundido.
— Ah, então foi você quem ajudou minha filha com os livros? Muito obrigada, e me desculpe pela confusão! — disse ela, inclinando levemente o corpo em um gesto de agradecimento.
— Relaxa, tanto faz— respondi, gesticulando com as mãos de forma indiferente.
— Sou Anastacia. Estes são meu marido e meu filho. E, como você já deve ter percebido, sou mãe da Annabeth. É um prazer conhecê-lo.
Com as apresentações concluídas, um pensamento me ocorreu. Talvez pudesse conseguir mais uma ajudinha por ali.
— Ai, Annabeth! Valeu por ter me trago até a livraria. Mas preciso de mais uma ajudinha sua
— Hm, claro! O que foi? — perguntou, tentando parecer confiante, mas deixando escapar uma leve gaguejada.
— Eu tenho aqui uma lista dos materiais acadêmicos de Arcadya, mas não tenho certeza se está tudo completo.
— Oh, entendi! Deixa eu dar uma olhada — respondeu animada, pegando o papel da minha mão com agilidade.
— Certo, vejamos... Aqui estão as matérias básicas. Mas além disso, seria bom incluir herbologia, geolocalização, proficiência em familiares... Isso aqui... Ah, e aquilo ali também...
Enquanto falava, Annabeth caminhava pela livraria como se seguisse uma lista invisível. A cada palavra, acrescentava mais livros à pilha que crescia perigosamente em meus braços. Não demorou muito para que a pequena montanha de volumes bloqueasse completamente minha visão.
— Pronto! Acho que é só isso. Ah... Está tudo bem? — perguntou ela, notando a precariedade do meu equilíbrio.
Pah.
Coloquei os livros sobre uma mesa próxima com um suspiro de alívio.
— Arff... Meu Deus, quantos anos de conteúdo tem aqui? Nunca vi tanto material assim na minha vida!
— Anos? Acho que isso deve dar conta só do primeiro — respondeu Annabeth com um sorriso inocente, como se não tivesse acabado de proferir uma verdadeira barbaridade.
''Puta merda''. Por um instante, Arcadya pareceu muito mais assustadora aos meus olhos.
— Aliás, senhor Artemy, você tem algum conhecido que também vai ingressar em Arcadya este ano?
— Hã? Do que você está falando? Eu também sou calouro.
...
O silêncio se instalou brevemente antes de uma expressão de surpresa genuína se espalhar por toda a família Bloomrise. Era como se tivessem ouvido a coisa mais absurda do mundo — queixos caídos incluídos.
— Sério mesmo? Caramba, os calouros do Departamento de Combate são todos assim?
— Departamento de Combate? Como assim? — perguntei, genuinamente confuso.
— É um dos três departamentos de Arcadya. Quer dizer... você vai para o Departamento de Combate, certo? — Annabeth perguntou, com certo receio da resposta que poderia vir.
— Não sei, na verdade. Quais são as opções?
— Ah, bem... tem o Departamento de Combate, que é composto principalmente por Amplificadores e foca na maestria em armas.
— Além do Departamento de Magia, que é formado por Emanadores e preza o controle do éter atmosférico.
— E, por último, o Departamento de Alquimia, que reúne tanto Emanadores quanto Amplificadores, mas se especializa na criação e uso de itens de suporte em combate, como poções, granadas, artefatos e coisas do tipo.
— Deduzi que você fosse para o Departamento de Combate porque, normalmente, os alunos de lá são maiores e mais fortes fisicamente. Então... achei que era óbvio.
Ela tinha um ponto. Sabia a diferença entre os dois arquétipos graças aos livros da mansão. Resumindo: Emanadores manipulam o éter ao redor do corpo, enquanto Amplificadores o usam para fortalecer a si mesmos.
Fazia sentido que eu me tornasse um Amplificador, mas havia um problema. Embora eles sejam voltados para o combate, suas técnicas ainda dependem de éter — algo que eu não posso usar. Quanto aos Emanadores, nem preciso dizer nada.
No fim, acho que ainda vou ter que pensar bastante sobre qual departamento escolher.
— Bom... acho que ainda preciso pensar sobre isso. Mas, mudando de assunto, Annabeth, em qual departamento você pretende entrar?
— Ehh, b-bem... eu pretendo entrar no departamento de alquimia. Não sou muito boa com controle de éter, e, bem, gosto de criar coisas — respondeu Annabeth, mexendo timidamente nos cabelos, como se buscasse coragem para sustentar suas palavras.
Antes que o silêncio pudesse se acomodar entre nós, uma figura que vagava pela biblioteca — observando livros e pessoas com um sorriso enigmático — decidiu se intrometer na conversa.
— Ora, ora, hehehe... Normalmente, os alquimistas são subestimados quando o assunto é combate, mas, no fim das contas, são os mais requisitados. Afinal, e impossivel causar dano aos inimigos caso voce esteja morto não e?, hehehe.
A voz vinha de Cheshire, com sua presença etérea sempre tão inconveniente quanto misteriosa. Ele continuou, sem perder o tom zombeteiro:
— Inclusive, garoto, se quiser me responder, não precisa falar sozinho. Você tem a minha marca e pode se comunicar mentalmente comigo. Mas, confesso, seria hilário te ver sendo taxado de maluco por falar com o nada, hehehe.
Fiquei surpreso com essa revelação. Parecia que o contrato com Cheshire tinha lá suas vantagens, embora também me privasse da desculpa de ignorá-lo quando estivesse sendo insuportável. Que droga.
"Ei, o que você quis dizer com 'alquimistas são os mais requisitados'? eles são como suportes?"
— Apesar de não serem bons em combate direto ou controle de éter, a criação de itens que qualquer um pode usar é incrivelmente conveniente.
Cheshire flutuava preguiçosamente entre as estantes, explicando como quem narra um segredo óbvio demais para ser ignorado:
— Poções, granadas, artefatos... itens com efeitos próprios que podem ser usados por qualquer um. Mas produzir essas maravilhas exige habilidade e tempo. Os melhores alquimistas tendem a ser... digamos, meio excêntricos, hehehe.
Enquanto falava, ele começou a circundar Annabeth, o sorriso enigmático ainda mais largo.
— Inclusive, essa garotinha aqui é muito interessante, hehehe. Essa sede insaciavel de conhecimento me lembra uma certa raposa...
"Sede de conhecimento? De onde você tirou isso? Ela mal falou direito."
— Hehehe, às vezes você me subestima demais, garoto — riu Cheshire, como se soubesse muito mais do que estava disposto a revelar.
Será que algum dia eu vou entender esse gato?
A despedida da livraria e da família Bloomrise aconteceu de maneira tranquila, como um capítulo que se fecha sem alarde. Ainda assim, sentia que, cedo ou tarde, o destino daria um jeito de cruzar novamente meus caminhos com Annabeth. Não era uma questão de “se”, mas de “quando”.
A mochila, já abarrotada, pesava ainda mais com o “meio mundo de livros” que Annabeth insistiu para que eu comprasse. Ela provavelmente sabia que seriam úteis, mas, naquele momento, eu só queria encontrar algum lugar onde pudesse me estabelecer e aliviar o peso — da mochila e dos pensamentos.
Chegando ao porto de Clocktown, fui recebido por uma visão grandiosa: imponentes navios, com velas que ostentavam o brasão de Arcadya, uma intricada mistura de espada, poção e glifos magicos. O relógio principal da cidade badalava ao marcar o meio-dia, e com ele uma multidão de jovens começou a se dirigir aos navios, cada um carregando sonhos, medos e expectativas. Segui o fluxo.
Na entrada, um grupo de organizadores fazia seu trabalho meticuloso: orientavam os jovens, confirmavam inscrições e anotavam nomes. Logo, me vi diante de um homem que vestia o uniforme preto e dourado dos inspetores de Arcadya. A expressão em seu rosto denunciava a longa jornada que aquele dia ainda lhe reservava.
— Nome e sobrenome — exigiu, num tom automático, quase monótono.
Meu coração acelerou. Ali estava eu, no momento inevitável de proferir aquele nome que tanto desprezava. Engolir meu orgulho era um preço que precisava pagar, mas a inquietação se arrastava como um veneno silencioso.
— Artemy Von-Doix — disse, deixando transparecer toda a amargura que carregava.
— V-Von-Doix? O quê?! — O inspetor, até então entediado, foi tomado por uma surpresa quase cômica. A exaltação em sua voz quebrou o protocolo, e seu espanto ecoou, chamando a atenção de quem estava ao redor.
O burburinho foi instantâneo.
— Von-Doix? Isso é sério?
— Ele é daquela família nobre? Como assim?
— Mas não já estão todos em Arcadya?
— Não eram quatro filhos...?
Meu rosto se contorceu em um olhar raivoso enquanto enfrentava o inspetor, que continuava imóvel, sem esconder o embaraço.
— Será que dá para andar logo com essa merda? — rosnei, impaciente.
— Ah… c-claro, claro! Um momento! — gaguejou o homem, quase derrubando sua lista ao procurar meu nome, ainda visivelmente incrédulo.
— Artemy… Artemy… Ah, aqui está! Artemy Von-Doix! — disse, finalmente encontrando meu registro.
Apesar das perguntas que transbordavam em seus olhos, a pressão do ambiente o fez engolir as palavras.
— Por favor, entre — concluiu, abrindo passagem para o imenso navio.
O burburinho ao meu redor diminuiu aos poucos, mas a situação tinha deixado um gosto amargo em meu dia. Ainda assim, a vista para a magnífica ilha de Avalon ao longe trouxe um breve alívio.
Um mundo repleto de provações e superações me aguardava. Arcadya prometia ser tão desafiadora quanto fascinante.
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