Volume 1 – Arco 2

— Capítulo 11: Flor flamejante —



Por um instante, tudo se dissolveu.

Era como flutuar em águas mornas, até que o burburinho abafado do grande salão foi engolido por um silêncio ensurdecedor. Então, vieram os assobios de pássaros, o farfalhar das folhas ao vento, e a luz do sol queimando de leve meus olhos, até que a visão se acostumou à paisagem de uma floresta exuberante.

Do outro lado da clareira, a figura dela se erguia imponente. Olhos verdes como esmeraldas faiscavam sob longos cabelos escarlates que pareciam chamas vivas. Um sorriso estranho curvava-se em seus lábios enquanto me observava.

— Pode tirar esse sorriso do rosto? É irritante demais.

A mudança ainda me parecia impossível de acreditar. De um salão abafado e lotado, agora eu sentia a brisa fresca contra a pele, o cheiro da terra, o peso real da natureza.

Estávamos em uma clareira cercada por uma muralha de árvores que pareciam não ter fim. O quão absurdo era o poder daquele cara?

— Vai ter que se esforçar pra tirar esse sorriso de mim, babaca.

Os cabelos ruivos de Lilith esvoaçavam, rindo como uma criança que acabara de ganhar um brinquedo novo.

Confesso, no calor do momento, me empolguei. Mas agora… devo admitir.
Eu estava nervoso. Uma gota de suor escorreu pela minha têmpora.

Essa seria minha primeira luta real. O quão forte ela era? Eu deveria atacar primeiro? Estava a apenas dez metros de distância quando meus pensamentos foram interrompidos.

— Vejamos… acho que vou começar. Tente não morrer.

— O o quê—

O chão sob os pés de Lilith se partiu, e sua figura desapareceu. Antes que pudesse reagir, um sopro de vento cortou meu rosto, junto com algo quente escorrendo pela minha pele.

— Oh, desviou? Sortudo. Teria perdido a cabeça nessa.

Rápida. Rápida demais. Mal tive tempo de perceber. Mesmo assim consegui esquivar quase inconscientemente, ou talvez tenha sido só sorte.

Decidi fazer meu movimento, Girei o corpo, saquei Hati do coldre e disparei.

Bang!

O estampido ecoou pela floresta, espalhando o cheiro de pólvora. Lilith, intacta, desviará com um golpe seco na minha mão.

— Droga!

— Brinquedinho legal, mas não vai me acertar dessa distância.

Ela estava certa. Enquanto a luta fosse corpo a corpo, era só questão de tempo até eu cair. Cada golpe que descia sobre mim era rápido, pesado, brutal. Desviar era quase impossível, bloquear doía como socar uma parede.

Eu precisava de espaço.

Esquivei por um triz de um soco no estômago e contra-ataquei com o que parecia uma coronhada.

— Tsk, lento.

Lilith desviou e minha mão passou rente ao seu ouvido. Mesmo assim, sorri.

— Cuidado com o que desvia.

Bang!

Disparei a centímetros de seu ouvido.

— Aargh!

Lilith cambaleou um passo para trás, atordoada por apenas um segundo — tempo suficiente para me afastar. Saquei Skoll. Agora, com as duas pistolas em mãos, abri fogo.

Bang, bang, bang!

— Heh, boa tentativa, otário. — O sorriso dela continuava intacto.

Um gesto rápido da mão, de forma ascendente

— Labareda!

Fwoooosh!

Um muro de fogo se ergueu, derretendo os projéteis antes que a alcançassem. O som metálico das balas caindo em pedaços no chão ainda ecoava.

— Tá de sacanagem… — suspirei, incrédulo.

— Ei, ei… aquilo doeu pra caralho, sabia?

Ela limpou uma gota de sangue que escorria do ouvido,o sorriso crescia parecendo cada vez mais raivoso

— Melhor se preparar para os juros.

Chamas escarlates envolveram seus punhos. Num piscar, Lilith desapareceu.

— Merda!

POW!

O impacto ecoou pela floresta. Metal? Ossos? Difícil dizer. Meu corpo voou, arremessado contra uma árvore, o ar sendo arrancado dos meus pulmões.

Lilith retomou a postura com o punho ainda fumegando, enquanto ponderava consigo mesmo

— Tsk… sem energia, é? Papo furado

Olhando a sua frente via o garoto encostado na árvore segurando a ferida, com certa dificuldade de respirar, mas na sua mão, uma faca de caça, suja de sangue na ponta

lilith então limpou o sangue que escorria do corte em seu rosto



— Não só bloqueou parte do impacto como ainda conseguiu contra atacar com a faca.

Por essa e outras que odeio rumores…

Ela entendia que qualquer pessoa sem energia teria desmaiado nesse golpe, além disso conseguia sentir uma fraca fagulha de éther vindo do corpo do garoto, não era forte mas ele possuía energia, mesmo assim conseguia acompanhar até certo ponto durante a luta, esquivando e bloqueando alguns ataques, interessante…

Mas mesmo assim, não é nada demais

suspirou desapontada.

Mais um golpe ou dois e o garoto deve ceder, Lilith esperava uma batalha mais desafiadora contra alguém que era tão arrogante.

— decepcionante, mal consegue ficar de pé! Por toda essa pose, eu esperava mais, uma pena… podia ter sido divertido.

Ela caminhava lentamente, pronta para encerrar a luta.

Fwoooosh!

De repente, uma fumaça branca explodiu no ar, cegando seus sentidos.

— Cof, cof… o quê?

Quando a névoa se dissipou, não havia mais sinal do garoto. Apenas os cacos de um frasco quebrado no chão.

Lilith estreitou os olhos, irritada.

— Tsk… mas que ratinho



Ainda era difícil acreditar.

Peter sempre confiou no poder do estudo. A vida inteira fora tachado como um ninguém, fraco, pobre, nascido na periferia. Mas, noite após noite, entre páginas empoeiradas e olhos ardendo de insônia, ele se ergueu. Lutou contra o peso da mediocridade e, agora, finalmente, colhia os frutos do seu esforço

Havia sido aceito como instrutor júnior na maior academia de arcanistas do mundo. E naquele dia, em seu primeiro passo oficial como parte da instituição, o nervosismo pulsava em cada gesto seu, estampado sem disfarces no rosto.

Convocado junto de outros novatos, funcionários e até mesmo nobres ilustres, Peter adentrou ao salão designado para assistir à avaliação prática dos calouros. O recinto era amplo, confortável apesar da multidão, e as paredes estavam tomadas por portais que exibiam paisagens distintas: florestas enevoadas, montanhas, desertos incandescentes, vulcões em erupção. Cada imagem parecia um fragmento de outro mundo.

E ali, entre aquela elite, Peter se sentia sufocado. Logo conheceria nobres tão ricos que poderiam comprar sua vida dez vezes. Logo veria os professores lendários de Arcadya, cada um com poder suficiente para derrubar uma nação.

Mas havia alguém ainda acima deles.

O diretor Atlas D. Arcadya. Um dos três arcanistas de grau único entre os humanos comparável apenas ao Rei dos Reis e à Arquimaga de Cristal.

Um homem cujo poder era descrito como capaz de despedaçar um continente.

O que esperar de alguém assim? Um tirano autoritário? Um deus arrogante que esmagaria um subordinado por um olhar torto? Peter não sabia. Apenas temia.

Mas a realidade, às vezes, tem seu senso de humor.

— Senhor Atlas, devo alertá-lo mais uma vez sobre sua compulsão por cafeína?

A voz firme ecoou, seguida por um puxão vigoroso em sua orelha. Era uma mulher de cabelos negros como a noite e olhos azuis tão profundos quanto o mar. Seu tom era profissional, mas a irritação transparecia em cada sílaba.

— T-tá bom, Serenna… chega, vai arrancar minha orelha!

Ali estava ele, o homem que poderia obliterar reinos inteiros, reclamando como uma criança levada. Atlas largou sua oitava xícara de café na mesa, por livre e espontânea pressão

Peter piscou, incrédulo.

— Não pode ser… Ele só pode estar fingindo.

— Não está! Serenna provavelmente aplicou força suficiente para dobrar uma barra de metal.

A resposta veio por uma voz grave ao seu lado Peter virou-se e deu de cara com um homem colossal, de ombros largos e pele marcada por cicatrizes, o cabelo preto cortado rente como de um soldado. Seu olhar estava cravado nos portais, sério, quase imperturbável.

Brock Volkov, Professor de Combate Físico.

— Oh, mas ela parece mais irritada que o habitual. Será que rolou alguma coisa entre os dois?

A pergunta veio em tom jovial de uma jovem mulher que flutuava num travesseiro translúcido em forma de panda. Um enorme chapéu de bruxa ocultava parte de seu rosto, mas não o brilho lilás de seus olhos, cintilantes como estrelas. O sorriso era luminoso, quase inocente.

Dorothy Starfall, Professora de Espiritualismo.

— Talvez, mas de todo modo, devemos agradecê-la. É provável que seja a única capaz de pôr esse homem na linha.

Respondeu outra voz feminina, desta vez firme, mas suave. Era uma mulher de corpo atlético, pele bronzeada e marcada por cicatrizes de queimadura. Seus cabelos e olhos cinzentos reluziam como aço sob a luz, e seu olhar unia ternura e autoridade.

Vanessa Darkwood, Professora de Engenharia Arcana.

— Vocês vieram para avaliar ou conversar? Sejam competentes.

Interrompeu um homem, a voz cortante. Sua presença exalava arrogância contida: cabelos negros azulados, olhos semicerrados, trajes elegantes em tons de ébano, adornados com pérolas negras nas orelhas. 

Victor Black, Professor de História e Teologia Arcana.

— Senhor Atlas, preciso repetir ou devo adotar medidas ainda mais severas?

E então, retomando a bronca, a voz inicial soou novamente. A dona da repreensão era uma mulher de beleza impecável. Seus cabelos negros estavam perfeitamente alinhados, os olhos azuis transmitiam serenidade gélida e seu uniforme, tão bem arrumado, parecia intocado pelo mundo. Era a personificação da disciplina.

Serenna Potter, Professora de Conjuração de Éther.

 — Tá, tá… já entendi. Nada além de oito xícaras. Que chatice…

Sentado na cadeira de couro um homem resmungava e protestava como uma criança, sussurrando talvez com medo de ser ouvido pela mulher ao seu lado. Cabelos e olhos multicoloridos como uma galáxia em constante mutação, uma presença ao mesmo tempo infantil e assustadora

Atlas d’Arcadya, Diretor da academia de Arcadya

Ali estava a elite da Academia: cinco professores e um diretor. Todos detentores de feitos e poderes inimagináveis. Peter engoliu seco ao perceber que estava entre monstros. Rapidamente se afastou, buscando refúgio entre os outros instrutores júniores.

Ainda assim, antes de recuar por completo, recebeu um gesto silencioso de boas-vindas: um aceno cordial de Brock e um sorriso leve de Dorothy.

E, de repente, o futuro em Arcadya pareceu um pouco menos opressor do que ele havia imaginado.

Os portais ainda cintilavam no ar, múltiplos espelhos de realidades fragmentadas que se abriam diante da plateia. Para Dorothy, aquela visão era quase impossível de compreender centenas de arenas coexistindo ao mesmo tempo, como mundos sobrepostos.

— Esses portais ainda me impressionam… é insano poder acompanhar tantos duelos simultâneos — murmurou, os olhos brilhando diante da miríade de paisagens que se desdobravam no espaço.

— Não elogia demais, ou ele fica convencido — respondeu Serenna, de braços cruzados, o olhar frio como o aço.

De fato, o atributo de Atlas era assombroso. Mas mais do que o espaço moldado, o que realmente assustava era sua energia inesgotável, capaz de sustentar centenas de portais e subespaços como se fossem apenas brinquedos em suas mãos.

Os duelos se sucediam em cada cenário. Nobres arrogantes enfrentavam plebeus determinados, prodígios se batiam contra esforçados incansáveis. Entre os combates, alguns se destacavam pela extravagância.

Bolt Stormrider, entediado, estava literalmente sentado nas costas do adversário enquanto batia seu bastão eletrificado contra o chão, como se quisesse espantar o próprio tédio. O calouro derrotado mal havia lhe arrancado suor.

Annabeth Bloomrise, em contraste, saltitava de alegria após forçar seu oponente a inalar a fumaça de uma poção sonífera. O rapaz dormia feito pedra, vergonhosamente estirado no chão.

Já Vannila Novigrad… talvez tenha exagerado. Seu adversário, outrora confiante, agora jazia preso sob uma montanha de gelo tão colossal que engolira toda a floresta da arena. A plateia só conseguia pensar no mesmo: “que desnecessário…”.

As arenas se sucediam, mostrando espadas rápidas demais para serem vistas, fios de sombra guiando corpos como marionetes, até mesmo um aluno que “venceu” o duelo subornando o adversário com moedas de ouro — que, no fim, não passavam de ilusões.

Era um espetáculo. Cada luta, um lembrete do porquê aquela academia carregava tanto prestígio.

Mas entre todas, um combate chamou a atenção. Uma arena coberta de neve, onde o branco imaculado destacava ainda mais o dourado das lanças de luz e o escarlate do sangue.

Mickey Bloodrose contra Pollius Fairytail.

— Mas… aquele garoto, o Mickey… ele não parece desesperado? — questionou Dorothy, franzindo o cenho.

Um grito ecoou pela arena.

— AAAAAAAAAAAHHHHHH!

Mickey corria pela neve, tropeçando quase em desespero. As lanças de luz de Pollius rasgavam o ar, velozes e impiedosas, mas o garoto desviava delas quase sem perceber, como se instinto puro guiasse seus passos.

— PARA DE CORRER, MOLEQUE! — bradou Pollius, frustrado.

Qual é a desse cara? Mickey escapava de todos os ataques perfeitamente, e ainda assim fugia como um covarde. Qual o sentido? além disso. ele era rápido demais, depois de segundos de perseguição a distância aumentou tanto que pollius perdeu seu alvo no meio dos montes de neve

Mickey, por sua vez, tremia. Escondido atrás de uma elevação de neve, o coração disparado, ele lutava contra si mesmo. Era sua primeira luta real, e tudo nele gritava para fugir. Tentou pensar no que Artemy faria. A resposta ecoou em sua mente, quase como uma lembrança zombeteira: “Cai dentro, purpurina.”

— N-nem a pau! — gaguejou para si mesmo. — Como eu deveria fazer isso?!

As lágrimas mancharam seu rosto. A lembrança do pai lhe pesava como uma maldição. Você estava errado… eu não passo de um covarde… como vou sobreviver em um lugar como este?

Foi então que notou. Na palma da mão, uma pequena marca roxa pulsava.

— É… é verdade…

Era apenas um subespaço. Ele não podia morrer ali. E, por mais ínfima que fosse, uma fagulha de coragem começou a se acender dentro dele.

Do lado de fora, os professores notaram.

— Do que ele está falando?  Ele não percebe que está desviando perfeitamente? — Dorothy franziu a testa

— Talvez acredite que foi apenas sorte — ponderou Brock, de braços cruzados.

— Para alguém tão covarde, a velocidade dele é surpreendente — comentou Victor Black, cuspindo as palavras com frieza.

Mas qualquer análise foi interrompida pelo espetáculo seguinte.

Um turbilhão escarlate surgiu ao redor de Mickey. O ar vibrou, e jatos de sangue começaram a girar em sua órbita, cada vez mais velozes, até formar um tornado de energia.

— O… o quê?! — exclamou Dorothy.

— Isso é energia demais para um calouro… — murmurou um dos professores, os olhos arregalados.

Os professores cerraram os olhos, atentos. Aquilo parecia um ataque devastador… mas, no fim, o que surgiu em suas mãos foi apenas uma pequena lâmina de sangue. Fraca. Frágil. Apenas o suficiente para denunciar sua posição.

— Hã???

O salão inteiro estremeceu em surpresa. Como uma tempestade de energia poderia resultar em algo tão insignificante? Ele estava se contendo?

— Não… — disse Atlas, girando calmamente em sua cadeira de couro. — Ele está dando tudo de si.

Silêncio.

— É como se o próprio corpo dele o impedisse. Como se não quisesse ferir ninguém.

— Então a fraqueza dele é ser… bonzinho? — questionou Dorothy, perplexa.

— Difícil dizer… talvez ele simplesmente não acredite que seja capaz — respondeu Atlas.

Victor soltou um suspiro de desprezo.

— Que desperdício.

A neve caía silenciosa, engolindo sons e rastros, enquanto Pollius vasculhava o branco infinito em busca do adversário desaparecido. Um súbito turbilhão de energia, irrompendo atrás de um monte de neve, denunciou a posição.

— Heh… achei você!

Do topo surgiu Mickey, brandindo sua adaga de sangue. Seus movimentos eram desajeitados, quase grotescos, mas a rapidez com que se lançava ao ataque era alta

— O-opa, que perigo! — Pollius se esquivou por um triz. O instinto lhe dizia que, se fosse atingido, não sobraria espaço para segundas chances.

Era o momento. A hora de colocar à prova a técnica especial que vinha planejando.

Concentrando-se, Pollius reuniu energia e materializou diante de si um objeto de luz dourada. A forma era tão dispersa que mal lembrava uma arma. Ainda assim, ele ergueu o braço com um sorriso confiante.

— Espada Justiceira do Herói! — proclamou com entusiasmo, exibindo o brilho tremeluzente que mal se sustentava.

— Meu Deus, que nome horrível… — escapou da boca de Mickey, que logo a cobriu, pálido.

Silêncio constrangedor…

— R-rude! Eu só sou um pouco ruim com nomes… — Pollius rebateu, claramente ofendido.

— D-desculpa, não foi isso que eu quis dize—

Tarde demais. O garoto da luz avançou em uma saraivada teatral de golpes, sua “espada”  cortando o ar em estalos luminosos. Apesar da execução pouco refinada, a ofensiva era estranhamente eficiente. Mickey se esquivava de forma desajeitada, mas veloz, sofrendo cortes superficiais que logo tingiam a neve de vermelho.

No salão de avaliação, os professores observavam em silêncio, atentos. Vanessa quebrou o ar contido, avaliando em voz baixa:

— Um atributo de luz… fascinante.

— Não é aquele o garoto que entrou por indicação do diretor? — perguntou Dorothy, erguendo uma sobrancelha.

— Sim. Parte disso se deve ao seu atributo, mas também demonstrava talento. Só que… éh… digamos que ele seja um tanto excêntrico. — respondeu Atlas jogado na cadeira

O peso daquela revelação percorreu a sala. Todos sabiam da raridade do atributo de luz: um dom único, tão incomum quanto o espacial de Atlas

— Seus ataques têm potencial destrutivo, mas o controle é meio duvidoso — avaliou Dorothy, com cautela.

— Péssimo, você quis dizer — retrucou Victor, frio.

— Ei, não fala assim do coitadinho! — defendeu Vanessa.

De fato, o controle de Pollius era desastroso. Conseguia irradiar luz em surtos vastos e devastadores, mas falhava ao condensá-la. Espadas, lanças ou qualquer forma mais definida acabavam dispersas, enfraquecendo o poder real.

Mesmo assim, a luta se mantinha equilibrada… até que algo mudou.

Os golpes de Pollius se tornaram mais opressivos, a pressão crescente. O sangue de Mickey jorrava em finos rastros pela neve, mas, em vez de fraquejar, o garoto parecia acelerar. Seus pés se moviam mais rápido, seu corpo respondia com reflexos além do humano.

— C-como…? — Pollius arregalou os olhos, sem compreender. Perder sangue deveria deixá-lo mais fraco… não o contrário.

— Desculpa… mas eu ainda quero vencer. — A voz de Mickey carregava um peso estranho, quase um pedido.

Num instante, após tanto defender e recuar, Mickey reuniu sua energia num último ato. Avançou, o punho envolto em sangue fresco, e o soco encontrou o estômago de Pollius com uma força brutal.

— Urghhh!

O impacto o lançou metros atrás, até se chocar contra uma árvore, desacordado, o corpo tombando com um baque seco.

— A-ahhh… d-desculpa! Eu não queria bater tão forte… — Mickey gaguejou, olhando para as próprias mãos em desespero.

Mas, logo, a lembrança da regra do subespaço trouxe-lhe alívio: ninguém sofreria consequências permanentes.

E, assim, a neve voltou a cair em silêncio.



— Urgh… que gosto horrível.

Encolhido sobre o galho mais alto de uma árvore da floresta, Artemy terminava de engolir o resto daquela poção de recuperação barata. O amargor grudou na língua, mas o alívio que percorreu seu abdômen, tornando a dor tolerável, valeu cada gole.

— Aquele golpe deve ter quebrado uma ou duas costelas… tsk. Maldita garota monstruosa.

Murmurei, avaliando o estrago. Na minha análise pós-combate havia uma única conclusão: enfrentar Lilith de frente era suicídio. Força, velocidade, técnicas, ela me supera em tudo… E mesmo assim, eu nem vi ela usando alguma arma.

só consegui escapar graças aquela poção “fracassada” que annabeth me deu, ela serviu como cortina de fumaça me dando tempo para escapar

— E como dizem… o lixo de um é o tesouro de outro, não é? Hehe.

Flutuando ao meu lado, o mesmo gato sorridente de sempre me olhava com um tom de pura zombaria.

— Não enche, Cheshire.

Respondi sem nem virar o rosto. Estava usando cada pedaço do meu foco pra encontrar uma solução naquele combate impossível. Mesmo durante a luta unilateral, Lilith fez de tudo para não ser atingida pelos meus disparos.

Amplificadores como ela podem fortificar a pele, mas balas desse calibre ainda deveriam doer. Mesmo assim, era impossível acertá-la de frente: ela reagia e bloqueava sempre a tempo.

O que eu preciso aqui é de um ataque inesperado.

— Uma pena que sua única cortina de fumaça já foi, né? Hehe.

Cheshire falou preguiçosamente, como se risse da minha cara 

Tsk… o pior é que ele tem razão. Não sei como conseguir outra oportunidade daquelas sem um distrator. O que eu deveria fazer?

Foi quando um raio de luz incomodou meus olhos, refletindo no pequeno anel prateado na minha mão direita. No centro, o cristal de éther exalava uma energia quase inexistente.

— Talvez eu poss—

POOW.

— O-o quê?!

Um estrondo gigantesco veio da floresta abaixo, o impacto fez tudo tremer e quase me derrubou do galho.

— Hehe… acho que seu tempo tá acabando, garoto.

Ela estava mesmo derrubando as árvores só para me caçar? Que impaciência absurda.

Na sala de avaliação, agora, a atenção estava voltada para aquela luta,  uma das poucas que ainda permaneciam ativas.

— Ela parece meio irritada, né? Haha… — Dorothy comentou com uma risadinha nervosa.

— Meio?! — três vozes responderam em uníssono.

Lilith estava literalmente derrubando uma floresta inteira na base da força bruta, o rosto marcado por puro ódio.

— Enquanto isso, o outro continua escondido… — Victor Black disse em tom frio e analítico.

— Ah, aquele é o garoto deserdado dos Von Doix, não é? Houve um burburinho ontem sobre ele ter entrado na academia. — Dorothy balbuciou, ainda flutuando confortavelmente em seu imenso travesseiro.

— Ele tá com uns boatos bem pesados nas costas. Parece que os calouros não pegaram leve com ele. — Vanessa respondeu, girando uma estranha chave entre os dedos.

— Boatos são apenas boatos. Mas, vindo da família daquele homem… nada mais me surpreende.

Victor disse em sua voz fria. Todos ali sabiam de quem se tratava. Anatolius Von Doix, o patriarca da família, era um nome cercado de títulos e feitos. Para muitos, apenas um nobre aclamado, mas, para quem já havia estado diante dele…

— Nem me fale. Aquele velho me causa uma sensação péssima sempre que o vejo. Parece… morto. Ele consegue ser mais mórbido que você, Victor. — Vanessa alfinetou, com um sorriso maldoso.

— Meça suas palavras, senhorita Darkwood… — a resposta de Victor veio cortante como aço.

O clima pesou na sala de repente, a pressão vinda de ambos sufocava as pessoas mais fracas presentes, trazendo suor frio à pele dos instrutores juniores e dos nobres ali reunidos.

— E-ei… mas é verdade que ele não tem energia nenhuma? Aquela coisa de “acorrentado”? — Dorothy mudou o assunto às pressas, tentando quebrar a tensão sufocante.

— Sim. Por incrível que pareça, eu mesmo verifiquei na cerimônia de abertura. — Atlas respondeu quase com orgulho, como uma criança exibindo a lição de casa feita, ao mesmo tempo em que tentava furtivamente roubar um doce da mesa à frente.

— Considerando isso, é surpreendente que esse garoto ainda esteja vivo após um embate com Lilith Lionheart.

Serenna falou, olhos fixos no portal de observação. Com um laço de água perfeitamente controlado, derrubou o doce das mãos de Atlas sem sequer desviar a atenção.

— Sendo assim, ele infelizmente só está adiando o inevitável.

Brock comentou ao fundo, com uma sombra de tristeza pelo destino certo do garoto.

— Aquele rato maldito… tsk.

Lilith avançava pela floresta derrubando árvores com golpes vigorosos, cada vez mais furiosa. A vitória óbvia havia escapado por entre seus dedos, e sua paciência estava no limite.

— VAI FICAR SE ESCONDENDO PRA SEMPRE, SEU MERDA?!

O grito ecoou pela mata, sacudindo as copas, fazendo bandos de pássaros fugirem em disparada.

Silêncio.

A resposta foi apenas o silêncio ensurdecedor.

— Heh… não vai sair, né? 

Um sorriso afiado surgiu em seu rosto. Com um simples movimento das mãos, Lilith puxou do nada uma imensa lança, retirada de seu armazenamento dimensional. A arma ostentava uma lâmina negra adornada por incrustações de esmeraldas, com pontas que lembravam pétalas afiadas de uma lótus.

De repente, a energia em torno dela explodiu. O ar esquentou, rodopiou como um tornado abrasador, enquanto sua presença crescia como uma muralha de calor.

— Florescer da Lótus Carmesim.

FWOOOOSH.

Chamas surgiram em torrente, abrindo-se como pétalas incandescentes de uma gigantesca flor. A lótus flamejante desabrochou na mata, e o fogo se espalhou violentamente, engolindo árvores e transformando o mundo ao redor numa tempestade ardente.

— Se você não vai sair… eu mesma vou te arrancar daí.


 

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