Volume V – Arco 14
Capítulo 132: Sangue Frio
Avistando a ponte que servia de palco para a batalha, o general Houkara que comandava a guarda pacificadora no avanço ao Império Ao, se recolhia a uma cabana improvisada por seus homens, quando viu sua catapulta se transformar em um grande bloco de gelo.
— Pensei que estávamos numa temporada de tempestades não de neve — virou-se para seus homens — Quem é o inimigo agora?
— Não sabemos, senhor.
— E os nossos homens no Vale? Alguém retornou? Por acaso, ninguém fez o seu trabalho hoje?!
— Verificamos, senhor, a estrada sofreu um deslizamento. Todos ficaram pelo caminho.
— E aí isso aparece — apontou para a catapulta imobilizada, seguida por uma figura atravessando os guardas enquanto surfava em uma ponte de gelo — Nessas horas o culto daquele mascarado não dá as caras.
— Senhor, o Cônsul julgou melhor alocar os súditos do caos para…
— Eu não te perguntei nada, não precisamos dele — ergueu a voz — Eu sou um general e esta é minha batalha! Estamos perto desse tal fulgur, não pretendo dividir essa conquista! Retirem os arqueiros da ponte, está ficando tarde e temos que botar as crianças na cama.
Circulando a colina onde a estava a catapulta, Keiko impunha barreiras, congelava soldados e se unia aos Heishis para afastar a ameaça em terra. De repente, uma chuva de flechas caiu sobre eles, o obrigando a subir outra cobertura para o exército azul.
— Recuem, posso levá-los até a ponte — respondeu Keiko.
Erguendo uma plataforma de gelo acima dos Heishis, o prodígio traçava uma ponte paralela à principal, feita de pedra, onde a batalha ocorria. Sem conflitos diretos, os homens buscaram refúgio atrás das linhas de Senshis, quando as flechas caíram de novo, dessa vez somente em Keiko.
Sua plataforma e a ponte foram destruídas. Os homens que transportava subiram para a ponte de pedra bem a tempo, mas não havia mais ninguém ao redor do garoto. Uma das flechas passou rápido demais para suas defesas, atingido seu ombro. Duas cavalarias o atacaram, enlaçando seu corpo para puxá-lo pela terra.
A seiva da noite escorria de seus olhos com a lama e a chuva, de modo que a mera visão dos Kuro escurecia sua visão.
— Sai de perto de mim — sua voz vacilava — Vão embora…
O garoto se envolveu em uma crosta de gelo. Os golpes dos inimigos sequer riscavam a casca, ao passo que o rapaz recobrava a visão.
— Mamãe, papai — levava às mãos à flecha no seu corpo, jorrando sangue — Me ajuda…
Em Komukai, Doku chegava aos muros onde Torigami e Uchida guiavam os homens na batalha.
— General, as armas de fulgur estão sendo distribuídas aos homens no portão. Estão prontos para apoiar as defesas.
— Você se engana, garoto — Uchida dizia, com os olhos fixos na batalha — Essas armas não foram feitas para Komukai. Nenhuma vai entrar no campo de batalha hoje.
— O Imperador me trouxe para…
— O Imperador está em sua casa, não aqui. Por que sacrificar os nossos, se já temos os Senshis? Era tão fácil em Nokyokai, o que os fez mudarem agora?
— A situação mudou, general — apontou para a entrada da ponte — Não é só o fulgur que precisa de proteção.
Descendo a montanha, o casulo de Keiko atropelava todos ao redor, debaixo de flechas e bombas até finalmente desmanchar na entrada da ponte. Os inimigos se aproximavam e os Senshis haviam recuado para o meio da passagem.
— Bem jogado, garotinho — Torigami abriu um sorriso desdenhoso — Arriscando uma criança? Seu pai teria orgulho.
— Se descer imediatamente para dar cobertura, os Aka podem resgatar Keiko. A escolha ainda é sua, general — Doku descia para o interior da muralha.
Os portões de Komukai foram abertos logo em seguida. Armados com o novo carregamento, os Heishis se uniram às forças vermelhas na ponte, empurrando o inimigo para encontrar Keiko no meio do caminho. Na linha de frente, Umi e Aiko se encontraram com o prodígio, que jogava as mãos para o ar atrás de ajuda.
— Segura aqui — Umi deu o ombro para Keiko se apoiar — Como isso aconteceu?
— Tudo ficou escuro — gemia de dor, se apoiando entre as duas meninas — preciso tirar essa… — mal completou as palavras e desmaiou.
Diante da emergência, as duas aceleraram o passo até Yukirama passar por elas e tomar Keiko nos braços. Atravessando até o outro lado do muro, ele colocou o garoto deitado em cima de duas caixas conjugadas, onde retiraram a flecha e colocaram um curativo. O prodígio estava pálido, fraco, mas seus olhos abriram.
— Me avisa quando conseguir ficar de pé — disse Yukirama — Temos que voltar lá.
— Isso é sangue? — perguntou Keiko, tateando o corpo sem olhar.
— Depois de tantos que matou, agora tem medo de sangue?
— Congelados, todos eles… Sem gritos de agonia, ou sangue. Meus professores sempre diziam para encarar o medo. “Deixa para chorar depois”. E agora isso — olhou de canto para as ataduras no seu ombro sujas de sangue — Eu tenho que voltar para lá mesmo?
— Isso só depende de você — estendeu a mão, colocando Keiko sentado — Não dá para se recuperar sem primeiro ficar de pé sozinho.
— Esse Suzaki… Ele não está aqui. Era tudo uma mentira?
— Ele é real.
— Então vou ter que lutar até encontrá-lo. Apesar de tudo, acho que quero ver esse maldito sangrar… Estou me tornando o que meus professores queriam, né? — Keiko desceu dos caixotes, ficando de pé — Eu só… queria que as coisas voltassem a ser como eram! Você… você tinha dito que perdeu seu pai, o que você fez com quem te causou sofrimento?
— Eu nunca nem soube quem matou meu pai.
— Mas gostaria? Diferente de você, bateram na minha porta para me colocarem contra o assassino da minha família!
— Neste momento, estou pedindo que salve todo mundo. E este foi um chamado que eu nunca recusei. Se, ou como, você vai se vingar, eu sinceramente não ligo.
— Você é forte — disse Keiko, descendo dos caixotes para ficar de pé — até quando está fraco.
Yukirama ofereceu ajuda, mas Keiko rejeitou. Indo até a beirada da ponte, o ar condensou em água, para depois solidificar-se entre os alicerces, rastejando até o outro lado da passagem. Os ventos daquela tempestade trincaram o gelo e a ponte começou a cair. Do alto da muralha, Uchida percebeu o mesmo risco que Takuma logo abaixo. Ambos gritaram para seus homens recuarem.Os espinhos de gelo brotaram como paliçadas na entrada da ponte, bloqueando os inimigos. Os inimigos que cruzaram antes de o bloqueio ser erguido, agora corriam para o outro lado por suas vidas.
O portão levadiço se ergueu quando o último Senshi cruzou. O que sobrou dos Kuro caiu junto com a ponte. Tudo que restou era Komukai, um abismo e a montanha do outro lado, com nada para preencher o vácuo exceto a voz de Houkara.
— Isso fujam! É tudo que podem fazer. E quando voltar, vou colocar as cabeças de vocês nessa ponte — fincou uma lança no paredão do gelo — Não podem nos negar o que é nosso por direito para sempre!
Keiko desabou no chão. Yukirama o colocou de volta nos dois caixotes, quando ouviu uma voz familiar.
— Deve ter custado muito a ele — disse Doku, parando ao lado dele — mas sabia que daria conta do recado.
— Eu cumpri minha parte do acordo, Doku — se virou para ele — E quanto a minha?
— No seu devido tempo. Por enquanto — estendeu a mão — Vou levar a espada.
— Ainda não confia em nós…
— Essa arma não faz parte do acordo, o uso do Fulgur é restrito à autorização do imperador. Agora, me dê isso.
— Ei, vocês dois — Umi apareceu entre eles — Algum problema com o Keiko?
— Só está exausto — Yukirama entregou a espada para Doku — E eu também. Vamos nos encontrar com o comandante Takuma — parou para cochichar ao ouvido de Doku — Mais tarde, terminamos isso.
Na recuada em direção ao monte Nokyokai, os Kuro se viram à mercê das tempestades. Com exceção das cavernas, não havia para onde fugir. Houkara não fez o caminho de volta a Nokyokai. Em vez disso, levou alguns de seus homens para a estrada que foi destruída durante a perseguição vinda da Forja. Refugiado nas cabanas, ele via seus homens estendendo cordas até o precipício, quando um brilho verde iluminou a escuridão.
— O que faz aqui, Bruxo? Não lembro de ter te… — o general massageava a base do dedo arrancado, quando recuou ao ver o objeto em posse da sua visita.
Era um baú largo sujo de terra, amassado dos lados, mas com o cadeado intacto. Imediatamente, Houkara mandou seus homens pararem de lançar as cordas.
— Isto deve amenizar seus insucessos mais recentes — os tentáculos que traziam o objeto recuaram para dentro da túnica de Seth.
— Isso é… o material que caiu no abismo — sentiu a textura do baú com os dedos — Era apenas isso?!
— Negativo, mas o Consul sabe que você é tão confiável quanto uma criança quando se trata dessas posses — uma voz surgiu do portal ainda aberto.
Surgindo da fenda, estava um homem largo, estatura média, cabelo curto e barba bem feita de cor negra, com destaque a sua testa que carregava uma cicatriz. Nenhuma armadura aparente e braços expostos, revelando sua musculatura bem definida.
— Hidetaka — Houkara voltou-se a Seth — quem ordenou que o trouxesse à minha presença?!
— Nosso Chefe em pessoa — o acompanhante de Seth pôs as mãos no baú e o escancarou rompendo o cadeado com apenas uma das mãos — a hora decisiva se aproxima.
As armas reluziam com o brilho da aura de Seth, enchendo os olhos de Houkara. Ele ameaçou levar as mãos ao conteúdo, mas teve seu pulso agarrado por pelo outro general, enquanto o feiticeiro sorria afirmando:
— General Hidetaka precisa do pouco que conquistou para… Desenrolar a história desta guerra para um novo rumo.
— Esse armamento foi uma conquista minha! — tentou se forçar para fora do general, sem sucesso.
— Não, é de nosso superior Itoshi, que confiou a mim. Afinal — ergueu o pulso de Houkara exibindo o dedo arrancado — como vai segurar uma espada deste jeito? Soldados feridos devem evitar as linhas de frente, a menos que queira perder outro.
— Se soubessem o que tive que enfrentar — Houkara ergueu a voz — As tempestades não cessam, passamos os últimos meses traçando-a para Komukai, lutando contra a própria natureza apenas para sermos atrasados, não derrotados, por uma ameaça que nem conhecíamos! Com esse equipamento eu poderia…
— Você não pode nada! — esmagou a mão de Houkara, que inclinou-se perante Hidetaka pela dor.
— E você pode? Acha que bajular esse… Esse culto vai arrecadar graças do Lorde Itoshi? — soltou sua mão de Hidetaka — Você é só um obcecado em guerras, não sabe nada sobre conquistas.
— Vencedores discutem resultados. Perdedores questionam os métodos — respondeu Hidetaka — e o seu resultado nestas últimas semanas me diz que se não fosse pelos Súditos, sequer teria êxito em sua primeira campanha. O novo fronte demanda uma liderança forte, coisa que lhe falta.
— Então está aqui para me substituir?
— Bem que eu queria, mas para sua sorte, o Chefe tem outros planos para mim e meus homens.
— Os Pretorianos? — Houkara riu — Pelo que ouvi do deserto, a situação não exigia tanto desespero. Qual motivo exigiria tal ambição?
— Itoshi e Alfa concordaram em uma coisa que vou repetir para você, general — disse Seth, se virando para voltar ao portal — “Chegou a hora de tomar o que um dia foi nosso”
— Está me dizendo que… espera — se levantou indo em direção a eles — não se atrevam a me deixar apodrecendo aqui enquanto usam o tesouro para conquistar…
— Adeus, Houkara — interrompeu Hidetaka rindo.
Houkara correu para se segurar a eles, mas assim que saltou os dois visitantes sumiram por outra fenda verde brilhante, fazendo sua queda terminar em uma poça de barro. Restando apenas o silêncio, o general que restou nas montanhas limpou sua boca momentos antes de soltar um grito de raiva.
Uma semana se passou após o afastamento da Guarda Pacificadora de Komukai. Os Heishis celebraram timidamente a vitória, já que agora teriam de dividir a cidade com os Senshis, destituídos da base do outro lado da ponte destruída. Os festejos foram reservados a Yoroniwa. Entre os visitantes atrás de alguma diversão por aquela noite, estava Torui com um compromisso nas mãos e um destino: a sala do gerente.
O lugar estava do jeito que a baronesa havia deixado. Três poltronas ao redor de uma lareira, a única coisa que faltava eram as meninas. No lugar delas, Doku estava sentado no assento que pertencia à sua mãe, fumando um cachimbo.
— Mensageiro Torui, fico feliz que tenha recebido meu convite — dizia, atiçando as chamas — Tenente Torigami não estaria com você, estaria?
— Não, senhor — se sentou numa das poltronas vagas — Os Heishis estão lá embaixo. Somos só nós dois.
Com um aceno de Doku para a entrada da sala, Kyoko fechou a porta atrás de si.
— Tem a carta? — estendeu a mão.
— Eu não entendo — sacou um envelope selado e o entregou — Minhas cartas estão à serviço de Uchida para o Imperador. Por que você de repente?
— Uchida está com Satoru para discutir o último mês, mas sua tarefa é diferente — rompeu o selo da carta para lê-la — As armas coletadas da Forja pertencem a mim agora e Komukai será abandonada de efetivo e imediato. E eu preciso saber a extensão do que Uchida andou fazendo aqui.
— Uma decisão dessas sem a presença do general… — pegou na pena para escrever — O que está tramando?
— Seu trabalho é relatar, não questionar — terminou de ler — e está indo bem até então. Dispensado, Torui.
O mensageiro deixou o estúdio sem ar. Ignorando as mulheres que se ofereciam para ele, Torui correu para seu quarto reservado no casarão e começou a escrever. Já era de manhã quando a carta foi selada para envio. O posto para envio de correspondências estava do outro lado da rua.
— Eu preciso entregar esta carta com urgência — se debruçou sobre a bancada da recepção — Eu mesmo posso mandar meu pombo correio, só me deixe entrar!
— Mensageiro Torui? — a recepcionista manteve a cabeça baixa, olhando apenas para a carta — Por favor, não há motivo para pânico. Vamos entregá-la neste exato momento.
— Obrigado, muito obrigado! — andou até a porta — Vou observar daqui.
Quando observou do telhado um pombo voar entre as nuvens cinzas, com um papel enrolado numa das pernas, ele suspirou aliviado antes de retornar às suas dependências. Do lado de dentro, a recepcionista descia do telhado em direção a um escritório nos fundos. Ao tirar a boina, revelou seus cabelos escuros, desfazendo do restante do disfarce, se aproximou do grupo que lhe aguardava.
— Está aqui, como solicitado — Kyoko entregou a carta furtada.
— Nos trouxe aqui para vermos que ficará com as provas? — questionou Yukirama.
— Pelo menos, devemos saber a verdade — insistiu Aiko, indo para o lado de Umi — Não é?
— Leia ela para nós, assim podemos testemunhar…
— A carta é de vocês — interrompeu Doku, depois de expelir fumaça — Afinal, já tenho toda evidência que preciso nesta — exibiu a outra carta de Torui — Posso considerar nossos assuntos terminados, mirim?
— Só depois que Uchida pagar pelo que fez — Umi tomou a resposta para si.
— Há uma hora correta para isso. Retornem para Komukai — Doku andou até a saída — Vocês serão convocados no devido tempo.
— Até mais pra você também — acenou rapidamente Umi, seguindo o curso com Aiko.
Yukirama se manteve intacto por um momento fazendo seu último pedido:
— Doku, quando vir o garoto de novo, agradeça ele por mim.
O confiado de Satoru não reagiu ao pedido, porém Kyoko olhou para trás novamente com a expressão de desprezo:
— Não devia confiar neles, são arrogantes!
— Sabe, meu pai sempre me dizia que os Aka e Ao eram como água e óleo — tragou o cachimbo — minhas expectativas foram frustradas.
Doku e Kyoko retornaram com sucesso depois de alguns dias de viagem. Na mesma noite do dia da chegada dos confiados do imperador, as chuvas diminuíram de intensidade ao redor do palácio imperial. Em seu lugar, uma queda vagarosa de neve vestiu muralhas e telhados de branco. Admirando o novo tempo, criado de suas próprias mãos, Keiko olhava pela janela da sala do trono de Satoru.
— Doku me avisou que viria — Satoru entrava pela porta, carregando a coroa debaixo do braço — Não quis vir com Uchida ontem?
— Nunca vi ele na vida — respondeu, vislumbrando o imperador se aproximando dele pelo reflexo — Por que tinha que vir com ele?
— Se já é insubordinado com seu general nos pequenos assuntos, que dirá em batalha — colocou a mão em seu ombro — Seu pai não te ensinou a obedecer?
— Eu obedeci a minha vida toda — inclinou a cabeça, evitando contato direto.
— Cá entre nós, Uchida realmente não é digno de obediência, sempre foi apenas um cabo, praticamente um mercenário por dívida.
— O que mudou para chamarem ele de general? Ele não parece com o tio Tadashi.
— Você sabe o que aconteceu — Satoru sentou no chão, ao lado do garoto — céu limpo.
De repente, as grades de ferro e o vidro da janela foram tomados por gelo. O ar da sala ficou pesado.
— Para comandar um império, vagas precisam ser preenchidas e papéis desempenhados. Quando os melhores morrem, gente pior assume. Ou no seu caso, os inocentes saem para fazer o trabalho dos adultos.
— Meu pai nunca precisou viajar para longe. Só daquela vez — se virou, olhando Satoru de cima para baixo — Porque vocês o chamaram? Ele nem gostava de...
— Havia pessoas mais… dispensáveis para fazer o papel dele. Seu pai era o Duque, mas o Vale era coordenado por Aotaka, o marquês.
— O que aconteceu com ele?
— Suzaki Sora começou sua rebelião meses antes do ocorrido, semanas depois de seu retorno do Rito de Passagem. Aotaka foi um de seus principais oponentes, mas ele e seu tio tinham outros planos que não contaram ao meu pai na época — se levantava explicando, com um sorriso discreto — Me siga, porfavor.
O prodígio do gelo foi levado ao lado de fora, para a entrada das catacumbas. Keiko mantinha a cabeça inclinada, olhando suas pegadas na neve, enquanto Satoru prosseguia:
— Meu pai ainda acreditava que seu filho muito amado podia ser salvo. Eles não acreditaram nisso e conspiraram para a morte do meu irmãozinho caçula… No fracasso dessa tentativa, o criminoso que matou sua família nasceu.
— Eu não entendo, senhor Imperador… O massacre foi por causa de um crime cometido no passado de Suzaki.
— Me chame de Satoru — parou na frente do elevador para o subterrâneo, gesticulando algo para os guardas — Te contaram a verdade, embora não toda ela. Quando um crime de traição é cometido, a corte deve julgar o réu. Aotaka representava o Vale do Trovão, mas quando seu golpe foi descoberto e exposto, seu pai assumiu o cargo temporariamente.
— Então esse Marques tentou trair a corte, e por isso meu pai estava na reunião aquele dia? — arregalou os olhos.
— Exato. Mas Claro, sua família nunca poderia ter antecipado que um desastre desse ocorreria. Eu descobri que, mais importante que subordinados competentes como Tadashi ou um ralé como Uchida, é a lealdade. E infelizmente, Uchida tem me decepcionado muito.
Keiko cerrou os punhos, enquanto os guardas subiam as cordas do elevador. Algo estava subindo até eles. Quando a corda parou de ser puxada, Satoru deu um passo atrás ficando atrás de Keiko que percebia um homem sujo saindo da escuridão, se assustando com a seus cabelos e barbas volumosos, além da podridão que se encontrava.
— Estou livre! — comemorava Aotaka na saída das catacumbas, beijando a terra — eu serei eternamente grato, Impera... — conteve sua fala — espera, esse é... — coçou os olhos — Keiko?! Como você cresceu criança! Um milagre — correu aos pés dos dois.
Keiko deu um passo atrás mas se escorou no corpo do Satoru que lhe deu um empurrãozinho enquanto sorria, o marquês caiu de joelhos diante do garoto:
— Sinto muito, posso estar um pouco sujo por isso não se lembra, mas sou eu criança, Aotaka o Marques do vale do trovão, amigo de seu papai.
— Você recebeu o que merecia, Aotaka. Keiko está aqui e agora está livre — declarou Satoru.
A expressão de Keiko mudava, o garoto deu um passo a diante, Aotaka puxou a mão delicada e fria do jovem para beijá-la, mas o garoto recusou.
— O que houve, criança, não precisa temer...
Keiko usou a bota para chutar o marques, caminhando em sua direção com olhos assassinos, a vitima se rastejava já cuspindo sangue:
— O que há com você criança?! — virou-se notando a criança sacando uma lâmina de gelo nas mãos — Satoru, o que é isso? Nós tínhamos um acordo! Nós tínhamos…
Seu corpo caiu com a garganta aberta. Sangue escorria pela neve, esguichando na criança que terminava suja em vermelho assim como o solo. Keiko encarou o sangue desiludido quando finalmente, Satoru agachou em suas costas o abraçando, sujando seu único braço com o líquido vermelho.
— Vai ficar tudo bem, eu estou aqui — sussurrou em seu ouvido, antes de falar para os guardas — Limpe essa sujeira do meu gramado.
De volta a Komukai, os mirins foram recebidos na nova casa do corpo militar de Takuma. Uma casa de dois andares, uma dúzia de quartos, um estábulo na entrada, longe das bases Heishis, mas não tão perto do muro rompido pela batalha. Os Senshis dividiam aposentos aos trios, quartetos dependendo do tamanho do lugar. Alguns dormiam no chão, mas era um teto de verdade sobre as suas cabeças. Yukirama voltava para seu quarto, quando ouviu Umi e Aiko discutindo lá dentro:
— Eu não vou escrever nada disso! Jin é como um irmão pra mim, ficou louca?
— O jeito que ele te olha é diferente — dizia Aiko rindo — eu sei disso por que o Usagi…
— Olha só, eu pedi pra você me ajudar a escrever a carta, não para dar pitaco sobre vida amorosa! — empurrou Aiko para o lado.
— Atrapalho? — Yukirama apareceu na porta, Umi enrubesceu.
— Imagina. Pode se sentar, Yuki — coçou a cabeça Aiko.
No chão, um papel era escrito com pena nas mãos de Umi. Aiko estava ao seu lado lendo cada palavra, quando Yukirama se sentou, também com um papel na mão.
— Veio pedir a pena emprestada? — perguntou Aiko.
— Também, mas primeiro queria pedir desculpas.
— Pelo quê? — perguntou Aiko, enquanto Umi deixava a pena de lado.
— Eu sempre fui criado como um valentão, por isso acabo arriscando além do que deveria. Há alguns anos uma pessoa me fez entender que meus exageros não podem arriscar a vida de outras pessoas — cerrou os punhos — Eu falhei nisso com vocês duas.
— Tá tudo bem — Aiko colocou sua mão sobre a dele.
— Desculpas aceitas — ela respondeu — ao mesmo tempo, tem uma hora certa para exageros. O fato da gente ainda tá aqui mostra que a sua decisão teve seus acertos. Só não perde a carta que Doku nos deu até voltarmos.
— Você me lembra o comandante Iori com esse morde e assopra o tempo todo — sorria timidamente,Yukirama.
Umi então rapidamente dobrou a sua folha, colocando na frente do rosto na medida em que se levantava.
— Terminei! Vem Aiko — puxou a amiga pelo braço — deixa o valentão sozinho. Ele precisa de tempo para responder a amada dele.
Aiko e Umi cairam na risada, Yukirama apenas permaneceu calado sem nem responder os acenos das duas. Finalmente sozinho, Yukirama sacudiu a fala de Umi da cabeça, respirou fundo, pegou a pena e pôs-se a escrever:
“Prezada Masori,
Creio que lhe devo primeiramente uma explicação de minha permanência nas montanhas. Notamos um desinteresse estranho dos Ao em proteger o território e a luta árdua acabou por levar muitos dos nossos, a maioria deles você já sabe. Arata ainda estava vivo quando cheguei para ajudá-lo, só que o inimigo era muito forte e eu nunca me senti tão fraco.
Eu fiquei para entender o porquê disso tudo. Treinei minha vida toda e de repente um garoto da minha idade arrasa boa parte de um exército, inclusive meu professor, como se fosse nada. Queria saber como melhorar e rápido, até que li sua carta e tudo fez sentido. Hoje tenho certeza que nunca ficaria impotente tendo o desejo de voltar para casa, rever todos vocês e batalhar pouco a pouco para as coisas voltarem a ser como eram, na medida do possível.
Para você não achar que só estamos aqui por birra, estamos com informações vitais sobre o que aconteceu em Nokyokai, transformando o que antes era uma suspeita em realidade. Por causa da importância delas, pretendo entregá-las pessoalmente aos nossos superiores no meu retorno, que não vai demorar.
Tudo que peço é confiança e paciência, pois nosso reencontro será em breve. Diferente de meu pai, voltarei vivo.
Assinado por seu companheiro,
Yukirama”.
Ilustradora: Joy (Instagram).
Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.
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