Nisōiro Brasileira

Autor(a): Pedro Caetano


Volume IV – Arco 13

Capítulo 117: Xeque Mate Pt.1

O céu da madrugada já clareava, Suzaki e Yasukasa deixaram suas armas de lado. Eles circulavam em um campo de batalha a passos vagarosos. A matriarca tinha um olho em seu adversário, e no lugar onde a bandeira estava antes da fuga de seus homens:

“O Sol Reluzente não pode começar sem pelo menos as quatro bandeiras plantadas. Os Kishis precisam estar alocados no nascer do sol, mas enquanto houver um súdito eles nunca estarão a salvo. Preciso ganhar tempo.”

Suzaki avançou primeiro. Girando em um chute no baço. Yasukasa segurou seu tornozelo, porém o rapaz girou no ar com a segunda perna, mirando o rosto. Ela se protegeu com os braços, devolvendo o equilíbrio ao seu oponente, que revidou com um soco. Recobrando sua postura, a primogênita de Osíris também desferiu seu punho. Os dois terminaram nas mãos um do outro.

— Não vai durar muito tempo disputando força comigo, nanico — Yasukasa crescia na sua frente.

— Eu já tenho você onde quero — retrucou deixando as mãos espalmadas.

Mesmo sem a força do súdito, Yasukasa não conseguia livrar-se dele. Seus cabelos eriçaram com a eletricidade em seu corpo, quando Suzaki puxou seus braços com os dela, tomando impulso para um chute com as duas pernas. 

Areias se ergueram entre eles, absorvendo o chute e prendendo a perna do príncipe renegado. A Matriarca o tomou pelos braços, o jogando contra o chão com força antes de chutá-lo, rolando para longe.

Suzaki deslizou pela solo, recobrando sua postura. Sua oponente vinha até ele, mas com um balançar do corpo para o lado, o súdito escapou de seu soco e a chutou nos joelhos. Yasukasa ajoelhou-se bem na altura de seu oponente, que ergueu sua perna em um chute que a lançou do chão. 

Aterrissando, Yasukasa deu uma cambalhota para ficar de pé, enquanto refletia:

“Sem ataques fatais, por que ele estaria ganhando tempo? Mais uma tentativa de me capturar com vida? Espera só até perceberem que o Sol reluzente irá acontecer com ou sem…”

— Não fique aí parada — interrompeu Suzaki correndo em sua direção.

— Vai ser bom ver sua pose de arrogância sumir quando tudo estiver acabado — respondeu erguendo areias.

Suzaki desviou dos membros projetados da terra, balançou em um deles até subir por cima dos muros que a cercavam, descendo com sua sola sobre a cabeça dela. 

— Você ainda não acredita, não é mesmo? — A pegou pelos cabelos — Acha que é só arrogância, que ainda sou um pirralho que se segura? Isso me lembra um imperador que cruzou meu caminho um dia. 

Com as mãos carregadas de energia, Suzaki lançou uma descarga de eletricidade no estômago de Yasukasa com uma série de socos, terminando com um chute no queixo que a atirou no ar, apenas para ser recolhida pela própria parede de areia que formou no caminho.

— Tem razão — suspirou a mulher após tossir — eu não reconheço mais o garoto que dizia que a paz deveria ser a primeira alternativa — se levantou com dificuldades. 

— Lembro bem de ouvir da sua boca, que a paz nem sempre é uma opção — sorria sarcasticamente — Anos abusando da boa vontade das outras nações, da pena que sentiam da miséria do seu povo, para no fim, justificar uma guerra com a promessa de dias melhores.

— Eu não sou o seu pai, Suzaki — Yasukasa cuspiu areia da boca — trégua é uma coisa que o lado que está apoiando nunca irá aceitar, querem exterminar todos! 

— Você, Koji, Itoshi, são apenas parte do plano — ergueu as mãos — quando isto terminar, não haverá mais a alta cúpula do mundo. E aí sim, a paz será o único caminho. 

A rainha trincou os dentes correndo, chocando os antebraços, os dois trocaram golpes. Um chute interrompido por outro. Soco ou cotovelada sendo espelhados mutuamente. Os membros de Yasukasa eram maiores, mas Suzaki penetrava seus espaços com rapidez. 

Correndo agachado, ele desviou de um soco, enfiando seu cotovelo no estômago da irmã de Hoshizora. Ao menos sinal de ferimento, ela trazia as areias para perto, o obrigando a se retirar.

Dessa vez, Suzaki se antecipou saltando para o lado, mas ele sentiu seus pés afundarem. Areia movediça. Yasukasa se aproximou para agarrá-lo pelo pescoço, mas uma força a repeliu, ao mesmo tempo que atraía as areias.

Finalmente, uma descarga de choque explodiu os grãos para o lado. Yasukasa se recompunha, quando percebeu o Sol surgindo no horizonte. De repente, a linha apagada do Sol Reluzente se conectava com as outras bandeiras.

“Ainda bem, eles estão a salvo. Agora, sou só eu e você”, pensou.

Os raios se conectaram às bandeiras, formando um arco maior que cruzava o horizonte até o topo da encosta direita. Suzaki olhava para o céu, depois notava o sorriso cínico de Yasukasa. 

Alguns soldados se distraíram com o céu pintado de amarelo. Os Kishis do topo estavam em uma formação de pelo menos três círculos de centenas de homens. Todos admirando a região invadindo as terras: 

— Isso é… 

— Não se assustem — juntava as mãos — é apenas um estágio de pré-ativação — relatou Hoshizora — Kotaru, os Aka precisam ser evacuados o quanto antes!  

— Já foram alertados, assim como os nossos com as armas imperiais — respondia o cavaleiro, andando entre os muitos homens. 

— Tudo vai terminar ainda nesta manhã — concluiu a princesa encarando seu tabuleiro — Essa área mesmo reduzida é muito até pra mim… Estarei na tenda, me concentrando. Mantenham a guarnição ao meu redor.

Aves sobrevoavam a região, mesmo debaixo do domo de luz. Uma delas fez um voo rasante, molhando suas garras no riacho que percorria o caminho estreito. O olho de águia captava o avanço das tropas de preto, em decorrência da recuada em massa dos oponentes. 

O alçar voo do animal acompanhou os raios solares no leste da região, percebendo o cerco de homens de armadura sob uma fortaleza bem estabelecida. Seu reconhecimento, quando chegou perto, durou pouco, uma vez que fora acertada em cheio por pedras arremessadas. 

— Nosso pequeno avanço carece de mérito próprio — Seth descobria um de seus olhos — nossos inimigos estão cedendo o terreno. Creio que faça parte da estratégia deste terceiro dia.

— Menos crenças, mais provas, seu… 

O general era interrompido pela grande luva estendida do mascarado, que solicitou: 

— Traga um deles a mim.

Imediatamente um portal surgiu de trás de Seth. O feiticeiro brotou no campo de batalha, em meio ao choque entre os exércitos. A atenção chamada pelo brilho verde, fez descer contra ele lâminas de todas as partes. Porém todas forma defendidas por tentáculos de energia que surgiram de suas costas abraçando um Kishi, no qual atravessou outro portal junto a ele.  

Os dois eram transportados de volta, antes que pudesse se espernear e gritar por socorro, a mão de Nobura alcançou o ombro do raptado, sua pupila foi tomada pela escuridão.

— Diga-me suas ordens.

— Proteger as bandeiras — o interrogado respondia sem relutar — Guardar a matriz e auxiliar na evacuação imediata dos Aka

— O que é a matriz? — andou até suas costas.

— É o ponto focal da estratégia. Sem ela o plano fracassa. 

— Qual é o plano? 

O kishi permaneceu imóvel e em silêncio. Junichi procurou explicações ao olhar para Seth, mas o feiticeiro só tinha olhos para Nobura e sua presa. Quando estava prestes a responder, as duas mãos do mascarado giraram seu pescoço contra o tronco. 

— Enlouqueceu, moleque? Ele estava prestes a falar! — reclamou Junichi. 

— Ele estava sob a influência do poder do Alfa. Se soubesse do plano teria respondido rapidamente — explicou Seth, cruzando os braços — Provavelmente ocultaram informações da ralé, prevendo uma tentativa de interrogatório. Negação plausível…

— Matriz… — Nobura pegou o cadáver numa das mãos.

O Mascarado observava o raiar do sol, voltando seus olhos para o cânion, onde arremessou o sujeito que havia acabado de matar. Durante a queda do corpo, o líder dos súditos trouxe um encontro recente na memória.

Era tarde da noite. Em uma das câmaras na igreja onde Pandora conduzia sua pesquisa, ele observava o pátio abaixo através das vidraças. A cientista estava em sua escrivaninha, terminando de preencher um documento com sua pena:

— Minhas criações são diferentes de tudo que você já viu. Não são soldados, porque não precisam de ordens. Já deixaram de ser homens comuns, pois seus corpos ultrapassaram seus limites. É um novo jeito de travar guerras… Uma nova espécie.

— Basta que sejam úteis.

— Não para seu chefe e toda essa conversa de supremacia. Sabe, muito do que chamam de iro também é cultural e vice-versa. Os Aka com toda essa conversa de igualdade, poucos ali são realmente úteis isolados do bando. Já os Ao são tão egocêntricos, que só cultivam suas técnicas nos campeões eleitos. 

— Nosso inimigo principal agora são os Kiiro.

— E até mesmo eles têm um padrão. Kiiro cresceu ao redor da dinastia. Como não podem compartilhar a energia de seus corpos, como nós — acariciava seu cabelo ruivo — eles criam uma reserva externa que então é manipulada por um indivíduo, chamado matriz. Hierarquicamente, como servos dedicados ao seu nobre.

— Então retirando este elemento…

— Você neutraliza qualquer técnica de grande escala Kiiro. Ou pode destruir os fornecedores de energia para enfraquecer o ponto focal. É por isso que meus experimentos são tão importantes. Os Kiiro não saberão no que focar: um punhado de servos moribundos ou os súditos do caos? Quando perceberem nossa força, vão gastar todas as suas forças, revelando seu ponto fraco e… 

— Basta  — se levantou abandonando a mesa — Quando a fraqueza dos Kiiro for revelada, não vou deixar pedra sobre pedra. Como isso será feito, caberá apenas a mim.

— De nada… Alfa.

A última lembrança de Nobura foi o sorriso de Pandora retirando seus óculos. No presente, bastou o cadáver que havia arremessado se espatifar nas águas para o líder tomar a decisão, virando-se para os seus com o dedo apontado: 

— Beta, leve as duas súditas para a base. 

— Qual é o plano? — perguntou Mayuri. 

— Quero que vocês duas impeçam a evacuação. Zeta já está atrasando a matriarca, juntas não será desafio fazer o mesmo com os cavaleiros no rio.

— E como isso resolve essa bolha amarela no céu? — questionou Junichi.

— Eu vou resolver essa questão pessoalmente — pegava uma enorme maleta da carruagem estacionada — Vamos de encontro a aquelas centenas de homens para descobrir do que se trata essa matriz — retirava uma enorme arma de detalhes em vermelhos, vestindo correntes ao redor de seu corpo. 

— Como pretende garantir minha segurança nessa bagunça, garoto? — se espantou com a foice do mascarado.

— Recomendo que fique aqui — dizia o feiticeiro — sem um de seus membros irá apenas figurar pelo campo de batalha. 

— Cale a sua boca, bruxo insolente! — o ameaçava — essa batalha é minha. 

— Fizemos um acordo a respeito do momento de agir — apontou sua foice — esqueceu, general? 

Junichi apenas engolia seco percebendo a grandeza da arma do mascarado, ao tempo que Nobura concluiu:

— Fique aqui e estará fora de qualquer alcance inimigo, buscaremos você quando for plausível. 

— Só resolva isso de uma vez — cuspia no chão — moleque — andou para próximo dos guardas. 

Com o estalar de dedos do feiticeiro, o primeiro portal surgiu para Mayuri e Nubi. Quando as duas passaram, uma nova fenda se abriu por onde os Nobura e seu braço direito passaram diante dos olhos do general.

As duas súditas despencaram em direção às águas. O portal verde que pairou pelo caminho do cânion, logo chamou atenção dos que estavam ao redor. Mayuri ficou de pé sob as águas enquanto Nubi se molhava sendo segurada pela companheira.

— Aquele desgracado fez isso de propósito — sorria, enquanto observava os mesmos homens de antes cercando a região — Digama, posso contar com você? 

— Só me diga o que fazer — respondeu a jovem, tomando impulso. 

Nubi emergia das águas flutuando com sua aura negra, voando acima da cabeça da súdita mais experiente. 

— Vamos juntar nossas forças como te ensinei, assim será mais rápido — uma força invisível tomou forma ao redor de Mayuri — como diziam nos velhos tempos: “É pegar e sair”.

Imediatamente as redondezas trêmularam com a influência exercida por Mayuri que brilhava em negro junto a Nubi. Os cavaleiros se espalharam, Raijin escalava pelas paredes, enquanto Tsuruta formava plataformas novamente para ele e Riki, que gritava:

— Se segurem  e continuem correndo para a recuada! 

— É com aquela que lutaram no primeiro dia — questionou Raijin, amarrado num rapéu — aquela outra voando, é uma criança? 

— Está mais pra uma aberração — percebia o escudo invisível — não dá pra avançar daqui. 

— Se o tremor continuar pode acontecer desabamentos, temos que atacá-la — juntou as mãos Tsuruta — Irei fertilizar a areia debaixo de nossos pés com o poder do sol. Isso irá enfraquecer o escudo.

— Esse campo invisível não se estende por trás das paredes — cogitou Raijin ativando a aura — com vocês pelo alto e eu pelos lados, teremos uma…

Ao olhar para o outro lado, Tsuruta já estava em queda livre. A areia debaixo dos pés de Riki tremulou cedendo quase ao mesmo tempo:

— Droga! Era ela ontem! 

Raijin se escondia pelas paredes, os outros dois eram capturados em meio ao ar flutuando ao redor da súdita mais velha que ria dizendo: 

— Muito bem, Digama. E aí, encantados, sentiram minha falta?  

— Voltou para provar que não consegue dar conta de nós sozinha — provocou Tsuruta — não é atoa que perdeu para a matriarca. 

As espadas se desprendiam do corpo dos cavalheiros, sobrevoando a órbita ao redor da súdita. 

— Não sou eu quem comecei em dupla essa luta, mas agora eu não preciso mais ganhar tempo — erguia as mãos.

— Tempo é tudo o que vocês duas vão precisar agora — sorriu Riki — todos vocês estão exatamente onde gostaríamos — apontou para as tropas avançando. 

De repente, debaixo do rio, uma mão segurou o calcanhar de Mayuri que foi puxada para água. A distração serviu para os cavalheiros caírem do céu em direção a Nubi, enquanto Raijin emergiu do rio na mesma direção da garota que flutuava. 

Cercada a jovem garota arregalou os olhos fazendo um gesto com o dedo da esquerda para a direita gritando: 

— Não me toquem! 

O gesto de Nubi arremessou os três com tudo na parede. Ao tempo que Mayuri se levantava sob as águas, os cavalheiros gemiam de dor na beira do rio. 

— O que foi aquilo? Ela mal se mexeu. 

— Eu diria que aquela garotinha é mais forte que a outra — limpou sangue da testa, Tsuruta — temos que… merda não consigo me mexer. 

— Estamos muito próximo delas! — gritou Riki. 

O tremor voltava, enquanto os cavaleiros estavam imóveis, Mayuri andou sob as águas em direção a Nubi que se aproximou dela. 

— Isso não vai acontecer de novo Digama — abaixava seu capuz — vamos acabar com isso logo — agachou em meio às águas. 

Nubi ficou quieta, apenas contornando a mulher colocando sua mão sob suas costas, a aura das duas cresceu formando uma só. O cabelo de Mayuri subia, ao mesmo tempo que a pressão ficava tão alta que as águas se agitavam para os lados, fazendo as duas pisarem no solo firme. 

O tremor ficava forte o suficiente para ninguém conseguir manter o equilíbrio em pé. Os cavaleiros observaram já inundados pela água, a súdita erguer sua mão aberta. O gesto fez o terremoto parar por uns instantes, porém ao fechar seu punho um estrondo surgiu como uma bala de canhão cortando o cânion.

Enormes rachaduras se formaram, o nível intermediário cedia junto a uma quantidade imensa de lama, terra e rochas que despencaram na direção das duas.  Raijin livrava os dois outros companheiros do soterramento, tirando os três de dentro de uma rocha. 

— Essa destruição — percebia, corpos entre os escombros — vejam! — apontou Tsuruta. 

— O nível intermediário foi rompido — observava aliados se esgueirando pelo resto de terra que restou — precisamos ajudar! — gritou Raijin. 

Outros seguravam para não caírem na base do rio, que agora estava partido em dois. Os cavaleiros ameaçaram irem em direção aos Aka, quando de repente pedregulhos deslizavam atrás dos três, surgindo de um buraco Mayuri e Nubi aos suspiros, olhando seus oponentes de cima para baixo.

No olho da fortaleza que guardava cabana de Hoshizora, a mesa que apoiava o tabuleiro da princesa havia cedido com o terremoto. Mesmo assim, a conselheira da matriarca continuou posicionando as peças nas areias, quando ouviu uma voz chamando:

— Princesa, está tudo bem aí? O tremor passou mas… 

— Eu disse que preciso me concentrar, Kotaru — sinalizou, com olhos no cavalo inimigo. 

— É urgente, os níveis intermediários cederam — imediatamente a princesa saia da cabana — alguns Aka estão presos na região entre as bandeiras. 

— Temos que dar um jeito de evacuar todos! — ordenou. 

— A maioria conseguiu, são apenas alguns que se perderam entre os escombros e o rio. Os inimigos estão na posição perfeita para…

— Não haverá sacrifícios, a evacuação completa faz parte do plano — afirmou Hoshizora com lágrimas nos olhos — o sol reluzente não será ativado! 

O berro da princesa deixou o cavalheiro sem palavras, até que o mesmo ouvia gritos e urros vindo de suas tropas, sem demorar muito para ouvir os relatos:

— Senhor! Há uma ofensiva nas regiões mais externas do cerco de guardas! 

— É um súdito? — perguntou Kotaru. 

— Com certeza — afirmou a princesa, se recolhendo para dentro da cabana. 

— Não se preocupe, alteza — dizia pela brecha do esconderijo.

Hoshizora levou uma mão à cabeça ao tempo que ouvia do lado de fora as ordens de Kotaru para um de seus principais homens.

Na entrada do acampamento onde a matriz do Sol Reluzente manipula os arcos dourados no céu, um portal surgia. Os Kishis de guarda puxaram suas espadas, enquanto a fenda apresentava seus tentáculos, que os enrolaram e puxaram para dentro.

Todos os Kishis mais próximos partiram para a fenda atrás de seus companheiros, mas o portal os puxou também. Logo depois, Seth desceu do portal:

— Há muito tempo que seus talentos não tocavam um iro estrangeiro.

Kiiro, Kuro… são humanos — Nobura saía do portal, rodeado de Kishis  — Pouca diferença.

Os capitães do acampamento gritaram ordens, entrando em formação assim que avistaram o pequeno exército clandestino avançando sobre a fortaleza, protegidos por um escudo de areia erguido pelos possuídos.

— Ele está perto? — perguntou Seth.

— Próximo o bastante — respondeu Nobura.

Os Kishis fizeram uma linha na metade do terreno. O capitão tomou a frente, erigindo um tronco, cabeça e braços de areia. Um verdadeiro monstro controlado pelo iro doado de seus subordinados, projetando uma sombra sobre seus invasores. 

Os demais sob o controle do mascarado ergueram seu próprio homem de areia, embora de menor tamanho. Os monstros construídos colidiram, mas o do capitão era mais forte. A criatura feita pelos servos de Nobura se esfacelava ao menor golpe.

— É inútil pedir subordinados para fazer o trabalho do líder — correu na direção do inimigo — O capitão é meu.

Nobura correu até as costas do homem de areia enfraquecido. Os possuídos desistiram de lutar, lançando sua criatura em um ataque suicida contra o inimigo. Enquanto a formação se desfazia, da nuvem de areia, brotou o Alfa, descendo sobre o capitão do exército aliado bem na frente de seus homens, que só puderam assistir ao homem de areia vitorioso se voltar contra eles. 

Enquanto o monstro destruia o acampamento, Nobura vagava pelas tendas, em busca de seu alvo. Ele passou por um poste com as correntes arrebentadas e grunhiu.

Antes que continuasse sua busca, o homem de areia foi partido em dois por uma luz cortante. Vários de seus Kishis possuídos caíram no chão, desacordados, porém vivos, presos pela areia. Erguendo-se da poeira, surgia um cavaleiro de armadura:

— Você deve ser o mascarado.

— Ele é um dos cavaleiros pessoais — Seth brotava de um portal ao lado de Nobura — Aquele que enfrentou o Aprimorado para proteger este lugar.

— Eu sei que está por aqui, Nagajiyu — gritou Nobura — Quanto tempo pretende se esconder por trás dos Kishis que tanto odeia? 

— Desista do meu prisioneiro e ordene seu exército a se retirar enquanto há tempo — Kotaru apontou sua espada — Sua insistência só vai lançar um poder inimaginável que vai extinguir seus homens. Podemos encontrar uma solução sem mais derramamento de sangue.

— Vai cuidar deste sozinho? 

— Seus acordos — respondia Nobura, enquanto o restante dos Kishis sob seu controle investiram contra Kotaru — não significam nada para mim.

— Não sei por que ainda pergunto — deu um passo para trás, Seth.

Os primeiros que atacaram Kotaru foram cegados pela luz refletida em sua espada. Os raios luminosos se fizeram sólidos dispersando um ataque que os desarmou. Antes que pudessem voltar a enxergar, o cavaleiro de Yasukasa os derrubou no chão, desacordados, porém ainda respirando.

“Como ele os controla?! Eles não vão parar de vir até lidar com este homem”, pensou Kotaru, costurando pela defesa de Kishis. “Preciso chegar mais perto”

Os Kishis ergueram areias para impedi-lo, mas a espada de Kotaru e a luz que refletia dela cortavam por tudo. Prestes a fatiar a última barreira, um Kishi se jogou em sua frente. Ele se impediu, retirou o corpo da sua frente, e tentou de novo. 

Quando estava próximo de se aproximar do mascarado, seus homens que tinham suas pupilas tomadas pela cor negra, começaram a abrir suas gargantas. 

— Não! — Kotaru impedia um deles, mas uma lâmina atravessou o peito do possuído.

Erguendo o corpo do chão, Nobura o  jogou fora, revelando sua arma. Uma foice de duas pontas, cujas lâminas eram presas ao cabo por correntes, mais parecendo ganchos, com dentes longos. 

— É inútil. Seus destinos estavam selados muito antes de cruzarem meu caminho — dizia Nobura — assim como a peste que tenta proteger.

— Está matando ao bel-prazer. Não brinque com a vida alheia! Se seus homens no cânion têm algum valor pra você, abaixe essa arma! 

— Odeio repetições.

Kotaru ergueu sua espada, despejando uma luz sólida que sequer moveu Nobura com o impacto. Com sua arma protegendo o corpo, ele andou para frente. Virando a espada de lado, Kotaru lançou raios cortantes, que foram aparados pela foice inimiga. 

Chegando mais perto, ele emitiu um brilho cegante. No meio daquele clarão, ele sentiu uma mão agarrar seu pescoço.

“Como?!”, pensou, sendo jogado no chão.

Com as próprias mãos, Nobura esmurrou Kotaru até colorir as areias com sangue. As bochechas do cavalheiro inchavam a cada soco, seu visão era tomada de vermelho. Foi então que pegando o cavaleiro pelos cabelos, exerceu seu poder sobre ele perguntando:

— Quais são suas ordens? 

— Proteger a matriz do Sol reluzente, a vida da princesa Hoshizora e o sucesso da batalha estão sob minha proteção. 

— Honroso, apesar de tolo — ficou de pé — você não tem mais utilidade alguma para mim, morra entendendo que não existe barganha com o caos. 

Nobura deu as costas, caminhando até a foice que deixou fincada no chão. Antes que o mascarado se virasse, saindo debaixo da própria areia, Nagajiyu abraçou Kotaru. Um portal negro brotou no solo onde os dois estavam, Nobura desferia o golpe no vazio. 

— Truques até o fim.

— Certamente foi um fim — explicou Seth — Aquele corpo debilitado não resiste à construção de um portal. Mais uma vez fútil, como tudo que esse garoto faz. 

Os Kishis estavam praticamente erradicados do acampamento com o avanço do exército possuído. Uma única energia restava no lugar. Nobura usou de sua foice, com um golpe fez a barraca se desfazer. 

Por mais que não houvesse mais cobertura, a jovem garota continuava sob uma sombra, dessa vez projetada pelo mascarado que estava atrás dela. 

— Não, espera! O que é você?! Onde está Kotaru?! — se desesperava Hoshizora. 

A tentativa de fuga da princesa foi frustrada pelo feiticeiro no qual ela esbarrou sem olhar para frente. Foi então que Nobura colocou a mão sob a cabeça da garota que tinha seus olhos tomados, se ajoelhando logo depois. 

— Vocês… — chorava a princesa. 

Seth se aproximava das peças sob a areia, percebendo o tabuleiro do jogo abriu um sorriso de canto:

— Quem diria que uma pobre criança fosse a mente disso tudo. 

— Uma obra de arte, necessitada de alguns ajustes. Diga-me, princesa, como funciona este poder?


Ilustradora: Joy (Instagram).

Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.

 



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