Nisōiro Brasileira

Autor(a): Pedro Caetano


Volume IV – Arco 13

Capítulo 110: Defesa das Ruas

No topo da torre central de Oásis, lar da família dinástica Kiiro, Chaul e seus acompanhantes escutavam as duas irmãs movendo as peças no tabuleiro. Elas prosseguiram a respeito do avanço inicial, como a batalha começaria após as primeiras bandeiras, a força de seu exército e o papel dos Aka nisso tudo.

Chaul escutou tudo aquilo martelando as solas no carpete até finalmente ter a chance de falar:

— Entendo que um gambito inicial de nossos inimigos não será páreo para nós. Contudo, nossa derrota em Nokyokai veio por outras vias. Quando eles começarem a usar suas melhores peças, como vão agir? 

— Não estamos falando de qualquer tropa. Seus poderes vão além do normal, uma dupla foi capaz de mudar o rumo da batalha, levando vários de nossos melhores titulares. — comentou Ryoma. 

— Houve somente um episódio parecido com Nokyokai — completou Kusonoki encarando o chão — a invasão pelo deserto do ano passado.

Yasukasa apenas gesticulou para o tabuleiro, permitindo que sua irmã explicasse. Hoshizora tomou um dos bispos do lado negro e o moveu para o centro do tabuleiro, em rota de colisão com os cavalos brancos e impedindo a saída da rainha.

— Se for como Nokyokai, esses indivíduos serão lançados após medirem nossas forças. Nossa melhor chance é guardar os melhores esforços para este momento. Em outras palavras, transmitir uma força incompleta e ao mesmo capaz de vencê-los nas primeiras rodadas.

— Eu sei que isso pode vir como surpresa para vocês — Yasukasa puxava de uma gaveta na mesa um pergaminho enrolado por uma fita azul — Mas durante o fechamento de nossa aliança, o Império retornou nosso chamado. Recebemos um investimento bélico considerável nesta última semana. 

— Me pergunto o que eles teriam a oferecer agora, que não puderam em seu próprio território — Ryoma procurou a reação de seu rei.

Enquanto Kusonoki tomava o documento nas mãos para ler, o rosto de Chaul se contorceu. Os olhos de Hoshizora fixados no bispo negro, agora encaravam sua mesa, com a mesma posição das peças sacudindo pelo ataque da ameaça que acabara de chegar.

— Aquela mulher que saiu do portal — Kotaru comentava observando de cima — em pouco tempo causou essas falhas e deslizamentos. Nossos exércitos não podem avançar na parte superior com essa falha e tampouco nossas forças no meio conseguem passar por ela. 

— Estamos presos. Kotaru, chegou a hora! — ordenou a princesa — o armamento imperial, ele precisa chegar até a linha de frente. 

Kotaru lançou mão de um grupo de Kishis não maior que dez homens. Uma carruagem completamente coberta por lonas guardava inúmeros baús, os quais cada dupla de homens se apossou para levar adiante. Junto a cada baú, uma estaca e cordas para descê-las da encosta.

No marco zero do incidente, os destroços formavam um monumento à destruição, que obrigava as tropas aliadas a interromper seu avanço. Mayuri descia com duas espadas em mãos, frente a frente com os únicos dois cavaleiros que não recuaram um centímetro. 

— Melhor que se afastem mesmo — Riki olhou para trás — melhor que deixem conosco.

— Eu até gosto deles perto — Mayuri recuou os braços.

— Capitão — os Kishis protestaram nas costas — Não podemos nos mover.

Riki e Tsuruta perceberam o chão rachado com a força imposta sobre o grupo. Ao mesmo tempo, pedras e grãos de areia começaram a rodear a súdita na frente deles.

— Para cima dela — apontou Tsuruta despertando sua aura, quando sentiu seus pés presos — Riki, eu não posso ser único que…

—  Ela está exercendo uma força invisível sob nós — lutava para dar um passo à frente — Não podemos recuar, só andar para frente. Cubra minha guarda. 

— Como guarda pessoal da matriarca, saiba que eu sou o encarregado de dizer isso — ativou sua aura, batendo com uma braçadeira na outra e tomando a frente.

— Sai pra lá — usou o ombro para tomar espaço, apontando para trás — você precisa proteger eles.

Mayuri parou, balançou as duas espadas em suas mãos e os chamou com os braços:

— Não importa quem vier primeiro. O resultado será o mesmo.

— Solta eles — os dois se pegaram falando em uníssono, antes de se afastarem negando com a cabeça.

Tsuruta foi o primeiro a avançar, apenas para um enorme pedaço de terra se descolar da encosta, vindo na direção da súdita. Mayuri no último instante saltou para trás, abrindo caminho para o objeto completar seu arco. Como uma catapulta, o objeto caiu sobre eles.

Os dois cavaleiros se empurraram para os lados, gritando para a linha de frente se mover, mas o pedregulho pintou a passagem de vermelho ao atingi-los. Mayuri avançou sobre Tsuruta, que teve seu primeiro ataque desviado, como se uma força mudasse a direção de seu braço. De repente, seu corpo foi erguido do chão:

— O que… o que é isso?! 

— Droga, eu sempre vou ter que resolver tudo por aqui? — Riki levava as mãos ao solo — Segura a respiração, Tsuruta!

Um forte vapor ascendeu sob os pés dos três. Um calor que queimava na garganta e ardia no couro de seus calçados. Tsuruta sentia o efeito sobre ele enfraquecer, quando Mayuri o arremessou na encosta, antes de saltar para trás. Riki via seu amigo emergir da névoa densa e escaldante balançando numa das cordas penduradas no paredão de volta ao seu lado.

— Aprendeu de uma vez? — Riki apontou para a fumaça — Sem afobação.

— Eu não tô vendo o inimigo derrotado ainda pra você ficar se gabando — Tsuruta soltava a corda.

— O soldadinho todo experiente ficou nervoso? — comentou ela, atraindo a rocha para si e subindo nela como uma plataforma — quer me pegar? Vem.

Olhando para trás, Riki via os Kishis capazes de se mover agora que Mayuri se afastou alguns metros. Tsuruta então apontou o dedo para sua adversário, rindo:

— Para nós, aqui já está muito bom. Até você tem seus limites.

O vapor subiu para encobrir Mayuri. Seu corpo foi envolvido, porém em poucos segundos o que saiu de dentro da névoa foi a plataforma de pedra. Agora, o objeto voou na direção deles escurecido e derretendo de tão quente. O próprio impulso que o atirava era o bastante para desmontar a rocha em pedaços.

Os cavaleiros então sentiram-se atraídos novamente. Todos em rota de colisão dos projéteis escaldantes. Tsuruta pisou na areia, levantando gêiseres de grãos que absorveram partes da saraivada. 

“Com essa velocidade, eu não posso desfazer isso”, Riki observava seus aliados atingidos pelas pedras. Seus corpos eram atravessados e queimados pela rocha, até serem arrastados pelo campo ao redor da súdita.

De todos os lados vieram destroços na direção dos homens de armadura aglomerados em torno da súdita, trazendo até Riki junto dos outros. Mayuri se preparava para recebê-lo com espadas em mãos, quando Tsuruta apareceu andando pelas paredes da encosta apoiado pela corda que acabara de usar. 

Acima dela, ele saltou sentindo a própria atração levá-lo até ela. De punhos cerrados o impacto era certo, mas Mayuri desfez seu campo no último instante. Todos caíram no chão, com Tsuruta aterrissando bem na frente de sua oponente. Ela desceu sua espada sobre ele, mas parou em sua braçadeira dourada.

— Acha que pode me enganar se aproveitando de meus próprios poderes? — Mayuri continuava a castigar suas braçadeiras.

— Eu ainda não te enganei — abria seu punho — ainda.

O vapor que circundava os lutadores assumiu um brilho amarelado, como o da aura de Tsuruta. Mayuri ao inalar o gás, sentiu o ar abandonar seus pulmões. Tossindo compulsivamente, ela apenas agachou no chão, deixando que outra pedra avançasse sobre o cavaleiro. Tsuruta voltou para perto de seu parceiro, na medida em que o objeto caiu no rio seco.

“Esse gás”, permanecia engasgada, sentindo seu rosto com grãos. “O que ele colocou aqui dentro? Dane-se, qual é o problema? O outro gera calor, mas enquanto essa luta entre as encostas a sombra vai limitar ele. Agora este segundo, a aura dele é tóxica?”

Virando para a linha de frente, Tsuruta gritou:

— Recuem. Dêem o fora daqui

— Já pode parar de bancar o herói — Riki via seu braço sangrando — Conseguiu aprender alguma coisa com essa sua tentativa de suicídio? 

— Para a glória da Matriarca, ela tem um cavaleiro muito competente  — se levantava — essa força invisível que ela controla tem suas regras como qualquer poder debaixo da majestade do sol. Até agora ela pode atrair coisas para si e prendê-las num campo invisível. Pelo visto pode expandir o tamanho desse campo.

— Isso eu percebi com dois minutos de luta. Qual a novidade? 

— Ela parece ter dificuldade para fazer os dois ao mesmo tempo. Quando me atirei nela, foi como se ela só tivesse concentração para uma coisa.  

— Tipo só se ela estiver vendo? — os dois percebiam a mulher se reerguendo após as tosses — E outra, já percebeu que essa força dela nunca nos repeliu? Ela sempre afastou a gente arremessando algo. 

— Não me arrisco a ser reducionista desta maneira.

— Ah é? Tem ideia melhor, gênio? Porque ela não vai cair no mesmo truque de novo — Riki olhou para as mãos — E eu ainda não esquentei o bastante para outro ataque. 

— Sabe que posso te ajudar nisso. Só precisamos de tempo para combinar nossos…

As pedras enegrecidas foram atraídas para a mulher vindo de trás dos cavaleiros, formando anéis ao redor dela. O vapor criado por Riki se dissipava, sobrando apenas o brilho negro da aura da súdita:

— Aprenderam a fugir com a mulher que os comanda?

— Quem falou em correr? — respondeu Tsuruta. 

— Pensei que estava só tentando intimidar quando disse que era uma criminosa — Riki estendeu o braço — mas alguém tão durona assim não precisa tomar a arma dos outros.

A resposta veio com a mão estendida de Mayuri atraindo os dois cavaleiros para seu domínio: 

— Nunca me dei bem com a misericórdia, só com a miséria. 

— Riki! — Tsuruta se debatia no meio do ar, com sua aura vazando para o restante da área — agora é uma boa hora para esquentar as coisas. 

Além dos cavaleiros, Mayuri atraía as armas e armaduras dos Kishis abatidos. Eram lâminas, lanças todas apontadas para os dois oponentes restantes. Riki esticou os braços alcançando a aura projetada de seu parceiro, tocando na sua própria. 

A luz que emanou das auras combinadas pôde ser vista até mesmo do ponto mais alto das encostas por Kotaru. O calor gerado pelas auras derretia os metais mais próximos, até entrarem em contato com a pele de Riki. O cavaleiro gritava de dor, mas seus braços lutavam contra aquela força, empurrando a lâmina para fora do corpo. Tsuruta também começava a se mexer dentro dos domínios de Mayuri.

— Impossível — ela percebia seu poder se desgastando, ao tempo que as lâminas se afastavam dos oponentes — Como é que…

Seu campo era incapaz de expandir. Os cavaleiros já conseguiam se mover, brigando-a a soltá-los de seu controle. Por fim, Mayuri voltou ao topo da montanha de terra que construiu entre as duas encostas.

— Um inimigo desse calibre só pode ser combatido por algo que vem dos céus — Tsuruta juntava as mãos — agradeço a procedência celeste e de nossa matriarca por confiar a mim este destino. 

— Corta essa, ainda não acabou — disse Riki também brilhando — Sai da frente que eu já esquentei. 

Com um soco no chão, Riki evaporou o restante da água no local, gerando outra nuvem de vapor.

“O que pode ter acontecido? O calor desfez a força?!”, Mayuri acompanhava o movimento das auras na fumaça “Essa névoa está muito quente… eu não posso continuar atraindo isso até mim. O raio do meu campo precisa ser menor, pouco além do meu corpo” 

Saindo da fumaça, Tsuruta se fez visível, escalando os destroços para atacar. Mayuri o acompanhava apenas com os olhos, quando o cavaleiro entrou na névoa mais uma vez. E assim ele repetiu os movimentos, entrando e saindo, até que ela esperou sua saída pelo lado esquerdo. Quando apareceu, ela saltou para lá, expandindo seu campo na margem do vapor.

Tsuruta foi arrastado, porém do lado direito, intocado pelo campo retraído de Mayuri, Riki surgiu.

— Acerta ela, Riki! 

Em poucos segundos, a névoa foi condensada entre as mãos do cavaleiro, acumulando todo o vapor em uma energia bruta que foi despejada diretamente na súdita.

O impacto lançou Mayuri em sua própria montanha de terra. Para amortecer o impacto, ela deslizou pelos escombros até atingir o nível do rio seco. As espadas dos cavaleiros pairou no ar antes de cair. A dupla saltou para encontrar suas armas, cercando a rival que se encontrava de joelhos no chão. 

— É a sua chance de se render, se quiser provar da misericórdia de nossa… — Tsuruta engoliu seu discurso ao notar a oponente se levantando sem arranhões. 

— Não pode ser, meu ataque deveria ter ferido ela o suficiente para ficar imóvel — uma gota de suor escorria por sua testa. 

— Provavelmente ela conseguiu acionar aquele escudo no último instante, apesar de não ter nada orbitando ela agora — os dois apontaram as espadas — ou então você errou. 

— Queria muito que fosse uma explicação simples — os olhos de Riki brilharam ao tempo que fazia um gesto para as tropas de trás.

Os Kishis que haviam recuado aos poucos foram se aproximando por todos os níveis do campo de batalha. Mesmo aqueles que estavam no topo das encostas apontaram suas lanças e flechas para a súdita do caos. 

Todos que a cercavam contemplaram Mayuri retirando a túnica negra danificada. Mesmo de longe era possível perceber seu corpo tomado por diversas cicatrizes em todo seu torso. Ao ficar de pé, pedaços da base do amontoado de terra se desgrudaram, formando pequenos cubos maciços que rodeavam ela novamente imersos em uma aura negra:

—  Acham que progrediram? Mesmo com tudo isso, o resultado ainda não mudou. 

Alguns Kishis na passagem acima do rio traziam consigo dois baús trancados nas mãos para oferecer a dupla, quando o chão sob os pés dos cavaleiros rachou e uma forte atração os puxou na direção de sua adversária. Os pedaços de terra faziam arcos mais largos, indo bem na direção dos dois até que suas espadas partiram os obstáculos em dois. 

— Cavalheiros — um dos Kishis gritou, exibindo um dos baús — o armamento enviado pela princesa está aqui!

— Joguem eles no chão — ordenou Tsuruta — Já chegamos aí.

Mesmo destruídos, a terra continuou rodando, ao mesmo tempo que mais coisas se uniam à tempestade criada por Mayuri. Um de cada vez, eles tentavam atingi-la com a espada, apenas para outra coisa entrar em seu caminho. Mayuri defendia-se com tudo que arrastava para si. Seu campo cresceu, arrastando um largo pedaço das paredes do córrego de rocha, que acertou o lado de Tsuruta, o tirando para fora do campo.

A segunda placa de pedra foi desviada por Riki, que abaixou os ombros para deslizar as mãos pela areia do chão, absorvendo o calor dali. Mayuri viu seu braço tomar um brilho mais forte e desativou seu campo. Todos os objetos caíram no chão, abrindo caminho para Riki despejar outra onda de calor que encontrou como obstáculo a aura negra diante dele.

Como um ralo, as mãos de Mayuri esvaziaram todo o ataque. Riki girou sua espada em sequência para acertá-la, porém o campo se reativou, dessa vez arrastando o próprio cavaleiro para as mãos dela. Ao tentar pressionar contra a garganta do sujeito, sentia o calor emanado por sua aura como se estivesse colocando sua mão no fogo.

Em uma rápida reação, Mayuri mirou os guardas que a cercavam, arremessando o cavaleiro enquanto exercia força para que Riki voasse, acertando os outros Kishis antes de cair na passagem acima do rio seco.

Estão todos bem? — se erguia o cavaleiro olhando de um lado para o outro, com os kishis balançando a cabeça — foi mal.  

— Riki! — reconhecia o grito de Tsuruta vindo do alto. 

Ao olhar percebia um baú aberto com duas lâminas nas mãos de seu companheiro. Riki se preparou prevendo o arremesso de seu parceiro de uma das armas em sua direção. Segurando bem na empunhadura, notava a espada escura com detalhes que só em contato com sua aura brilharam em um tom alaranjado. 

Riki e Tsuruta retornaram para o solo frente a frente a súdita, com as armas diferentes em suas mãos se unindo à coloração de suas auras. 

“Essas armas novas, estão absorvendo o iro?,” reparou Mayuri. “É parecido com a do Zeta”. 

Sua reflexão resultou na atração de rochas ao seu redor para o campo de força em torno dela. A súdita usou delas como plataformas para escalar entre as passagens do nível intermediário das encostas. 

— Nos ajudem! — gritou Tsuruta — A vitória está próxima. 

Riki saltou em uma das plataformas em órbita, logo sendo atraído para o centro. Ele saltou para outro, que foi atraído de novo, até parar num terceiro, o mais próximo de todos do centro. 

Daquela distância, era seu corpo que sentia o puxão do centro. Contudo, antes que pudesse chegar até Mayuri, ele esticou sua espada. Seu iro envolveu o metal até se prolongar para além dele. Uma lâmina de energia saltou, perfurando as pedras no caminho. 

“Esse material, só lutei contra uma vez”, Mayuri saltou para o lado. “tenho que me adaptar a essas novidades”.

Apesar do desvio, a espada fez uma curva, atraída pelo campo de Mayuri. Ela desviou de um lado para o outro, até parar mais perto da encosta do lado contrário. O efeito de seu campo enfraqueceu do outro lado, permitindo Riki se equilibrar na plataforma, ainda controlando a projeção de sua espada, quando Mayuri parou de correr. 

— Pensa que isso vai funcionar?! — ela gritou, erguendo as mãos — armas não forjam grandes guerreiros, é o contrário.

Enquanto a mulher falava de trás surgia o segundo algoz, sua sombra projetada fez Mayuri se defender com uma rocha entre ele e ela. Tsuruta fincou sua lâmina regra na grande rocha, seu sorriso foi acompanhado de uma pequena explosão que partiu a rocha em vários fragmentos. 

Ao se virar a súdita percebia o mesmo gás amarelo em sua direção. Agindo rápido ela moveu as pequenas pedras na direção da armadura do inimigo, prendendo ele em outro pedregulho que levitava.  

Erguendo suas mãos Mayuri fez com que gás areiado se desfizesse de repente, ao tempo que sua pele tomava uma cor avermelhada. Veias saltaram da pele, ao passo que ela trincava os dentes e suava frio. As tosses compulsivas fizeram a súdita perder a concentração, permitindo Tsuruta se soltar.  

— Mas como de novo… — Mayuri olhava suas mãos trêmulas —  O que você fez?!

— Isto é a energia solar, divina como seus poderes — gritou Tsuruta, apontando para si — nós Kiiro por sermos filhos, somos imunes, mas costuma ser letal para os outros.

A influência de Mayuri perdia força ao tempo que ela ia ao chão sentindo seu corpo ainda formigar, os soldados avançaram uma vez mais enquanto o escudo da mulher vacilava.

— Senhor, as flechas do armamento imperial estão em prontidão!

— Apontar! — gritou Riki, tomando posição saltando entre as plataformas que perdiam força até um alto do outro lado da encosta — fogo! 

As flechas pretas das tropas viajaram pelo ar até ela. Suas pontas emanavam uma luz amarela assim como as outras armas. Ao entrarem em contato com o campo reduzido de Mayuri ao seu redor, elas já estavam brancas de tão quentes, mas orbitaram ao redor do seu corpo sem encostá-la.

— Vocês são burros demais para entender com o que estão lidando — comentou Mayuri, na medida em que as flechas perdiam o brilho — O que adianta absorver todo esse calor se não vão conseguir me atingir? 

— É você quem não entendeu. Eu não absorvo calor— Riki estendeu a mão que começava a brilhar como um segundo sol — Eu sou o calor, e o transfiro quando bem entender.  

Das mãos de Riki uma onda de ar quente percorreu o feixe de luz na direção das dezenas de flechas, Mayuri arregalou os olhos diante o brilho. Em um piscar de olhos, elas estouraram a centímetros da súdita.

Todas as plataformas que levitavam se desfizeram ao tempo que a poeira se misturava à fumaça da explosão. Os pássaros se dispersaram do ambiente voando até o alto, enquanto Riki sorriu suspirando fundo.

Longe dali, Seth terminava de narrar o que acabava de ver. Suzaki então sacou sua arma, andando até Nobura:

— Você precisa de mim. Ela não vai vencê-los sozinha. Comigo lá, eu…

— O ultrajante tem razão, se a incompetência persistir terei que enviar reforços mais cedo do que esperava — protestou Junichi. 

— A luta está longe do fim — o mascarado fez sinal para esperar — O que você vê Seth?

— Estão celebrando a vitória. Um dos inimigos se aproxima da origem da explosão — colocou uma das mãos em um olho — deve ter percebido que não foi suficiente. 

No campo de batalha, as tropas no rio se juntaram aos cavaleiros, rodeando a fumaça que ainda subia. Os urros de vitória percorriam sob todo o cânion, causando um efeito manada de comemoração de todo o exército da Dinastia. 

— Olha Tsuruta — chegou por trás do companheiro — não queria me gabar, mas acho que a Matriarca finalmente vai tomar sua decisão de me promover como líder do esquadrão quando descobrir que eu…

— Precisamos verificar o corpo — interrompeu Riki, indo adiante na fumaça.

— Corta essa, está subestimando o meu poder. 

— Antes de explodir — se lembrou Tsuruta — ela brilhou em preto. 

De repente a poeira girava de forma coordenada em torno de um brilho que surgia do centro. Uma aura esbranquiçada surgia daquela que havia sido abatida pela explosão. Mayuri caminhava normalmente para fora dos destroços, limpando o sangue que escorria sob sua testa. 

O silêncio tomou conta do campo de batalha novamente, toda a fumaça se desfazia enquanto os cavaleiros davam passos para trás engolindo seco. 

— Eu disse — rosnou Mayuri, cuspindo no chão — que não iriam me acertar — continuou andando em frente.

— Mas como, aquilo explodiu na cara dela! — trincou os dentes, Riki.

— Ela absorve — respondeu Tsuruta — de alguma forma ela absorve nosso poder, como fez com a energia solar naquela hora. 

— É só isso que vocês tem né? — perguntou Mayuri sorrindo, com sua aura ainda amarelada. 

— Cala boca, fala, fala e ainda não fez nenhum arranhão em mim — Riki dizia — enquanto a Dinastia e a Matriarca se manter, somos invencíveis!

— Lutam pelo aplauso dos outros, pior, uma mulher. Mulheres só servem para serem lideradas. 

— Não tem direito de falar da Matriarca — Tsuruta apontou o dedo e ergueu a voz.

— E você, luta para o aplauso daquele seu líder asqueroso? 

— Os caprichos dessa gente só me importa, se for para tomar deles — grãos de terra ao redor de Mayuri levitam do chão — Desde que nasci, eu luto para sobreviver.

Foi então que a luz amarela ao redor dela se estendeu como uma névoa de energia que envolveu o ambiente. As mãos da súdita de repente brilharam, assim como as de Riki há alguns minutos. O feixe de luz estava na direção do exército, fazendo com que aquela área atingisse temperaturas maiores que as do próprio deserto.

— Vocês não conhecem essa luta — Mayuri juntou as mãos que brilhavam em único punho — A primeira coisa que se aprende nas ruas é tomar uma pancada… E devolver na mesma moeda!

Com um soco no chão, o amarelo que preenchia o campo atrator da súdita do caos foi liberado em uma espiral de calor. A expansão arrastou consigo os restos da encosta arrancada por ela no começo da batalha. Uma tempestade quente e indomável preencheu a passagem do rio seco. 

Tsuruta e Riki, que estavam no epicentro da explosão, sumiram de vista. As passagens nas paredes das encostas, racharam com o impacto. Os Senshis se afastaram da borda, mas o calor penetrava até mesmo em suas gargantas, além de arder a alça de seus escudos.

Assim que a poeira baixou, uma Mayuri ofegante começava a vislumbrar o resultado de seu ataque. Uma fila de armaduras vazias, preenchidas com restos de sangue, pele derretida e alguns ossos. Mais distante ela ouvia tosses, podendo escutar também a estrutura da encosta cedendo. Quando um dos pássaros com olhos esverdeados passou perto dela, ela cruzou os braços perguntando:

— Tá bom para vocês?


Ilustradora: Joy (Instagram).

Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.

 



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