Volume IV – Arco 12
Capítulo 104: Monstro
Deitado sob o solo úmido, um garoto com uma capa vermelha sob seu torso repousava, seu descanso com os olhos vidrados num céu cinzento e nublado era frustrado por um raio que vinha em sua direção. Se levantando pelo susto, Yanaho estava de volta na montanha, tendo Suzaki em sua frente novamente com os olhos exalando um forte brilho.
De repente o chão se abria logo abaixo do mirim que tentava se segurar desesperadamente nas paredes do abismo, quando a voz de seu algoz podia ser ouvida do topo:
— Eu também falhei em ajudar meu pai. Ele quer que eu realize seus objetivos. Depois de tudo que ele me deu, é o mínimo que posso fazer.
Com toda a sua força, Yanaho escalava do buraco. Os pés escorregam, mas seus braços tinham força para fincar seus dedos, às custas de suas unhas. Outras vozes surgiam, agora do fundo:
— Que estranho, meu pai nunca teve muita coisa para me dar, mas ele sempre diz que pais devem apoiar os objetivos dos filhos.
— Nunca pensei nisso — respondeu a voz do topo.
A tempestade se acirrou e a fenda começou a se fechar. Yanaho acelerou sua escalada.
— Por que acha que espadas são forjadas? — perguntou as vozes no fundo — O sonho do meu pai morreu e passar essa culpa adiante é o que nos restou.
— O Suzaki quase fez a mesma coisa — as vozes do topo responderam — Esse não é o Suzaki que conheci.
Atingindo a superfície, o sujeito que pertubava sua mente estava à sua espera. Correndo em direção ao seu rival, os dois colidiram suas espadas:
— Mas quando chegava na hora da morte era sempre alguém como eu, nunca alguém como Koji.
— Já falamos sobre isso — outras vozes gritavam nos ouvidos de Yanaho — Eles conheciam o risco e mesmo assim foram.
— Cala a boca — Yanaho fechava os olhos.
O golpe de Suzaki parou na defesa do mirim, mas o arremessou contra uma árvore. Ele uniu as mãos mesmo atordoado pelas vozes que não cessaram. Yanaho abriu os olhos com a espada de fulgur vindo na direção do seu pescoço. Seu kazedamu afastou o oponente.
— O mundo não é maior do que aqueles que o comandam. Eu vou colocá-los de joelhos um por um — Suzaki insistia, batalhando contra o vendaval.
— Eu só tenho mais uma coisa pra te perguntar, Suzaki — o punho do mirim brilhava em vermelho — porque abandonou Aiuchu e seu filho?
O chão se abriu novamente entre os dois, dessa resultando na queda livre de Yanaho, com tudo ao redor desaparecendo, uma última voz sussurrou:
— Ele fez a escolha dele e eu a minha… Yanaho, não conte ao Suzaki sobre isso, por favor.
Suspirando alto, o menino da capa vermelha despertou a realidade numa cama, encarando a cobertura da cabana onde estava deitado. Ele tocou seu corpo e mãos, procurando por feridas, quando ouviu alguém chamá-lo.
— Ainda bem. Já estava pensando que iria fugir da luta como antes — disse Yukirama se aproximando.
— Onde estou? O que houve? — levava a mão à cabeça.
— De volta ao acampamento. Você perdeu a consciência depois que chegamos. Até a regeneração tem seu preço, principalmente quando usa técnicas pouco treinadas.
— Eu precisava senão… — olhava sua mão toda enfaixada antes de notar o céu escuro do lado de fora — Cadê os outros?
— O comandante está com o que sobrou dos dois exércitos na floresta, contendo os Kuro até termos o suficiente para fugir — se sentava ao lado da cama — Vocês se conheciam né? Vendo você conversar com ele, tentando até o que não sabia direito. Eu nunca te vi assim.
— Eu achei que o conhecia — socava a própria coxa — mas agora, ele matou Arata e os outros…
— Sabia que tinha algo te motivando bem no fundo. Mas não imaginava que era algo tão grande assim.
— Ele não é um alvo — ameaçava descer da cama — ou pelo menos não era pra ser. Preciso terminar com isso.
— Não me fale que ainda tá pensando em continuar — impediu Yanaho de descer da cama.
— Se ainda podemos, precisam de nós!
— Yanaho, esse cara acabou com a gente. Matou Arata, quase matou eu e Kazuya, e fará o mesmo com quer que esteja no caminho — colocou a mão em seu ombro — meu pai pelo menos voltou com uma vida salva, mas podemos não ter a mesma sorte.
— Já tivemos, fizemos a coisa certa. Estamos todos aqui, não é? — olhou para a outra cama onde Kazuya dormia — Eu preciso pará-lo! Se não tentarmos…
— O que vai fazer que ainda não tenha feito? Olha para o seu braço.
— É que… ele ainda não sabe de tudo — se levantou passando pelo companheiro — Mesmo assim obrigado, Yukirama. Se não tivesse falado da arma dele, eu teria perdido a minha no primeiro golpe.
— De nada mas, que diferença isso vai fazer se morrer?! — elevou a voz Yukirama.
— Se nos prepararmos bem — pegava nas espadas apoiadas na parede — isso não vai acontecer — oferecia a arma para o companheiro — vai fugir dessa?
A troca de olhares dos dois resultou na resposta quieta de Yukirama que apenas pegou na empunhadura de sua arma.
No decorrer da descida, a Guarda Pacificadora encontrava a última resistência da aliança entre vermelhos e azuis na floresta ao pé de Nokyokai. Protegidos pela seiva da noite em seus olhos, os Senshis se defendiam em duas frentes: combate direto e armadilhas.
O inimigo pisava em buracos falsos, ativava espinhos de madeira ao atravessar uma corda estendida, porém as principais eram ativadas remotamente. Nas barreiras feitas com os troncos de árvores cortadas, os mirins preparavam o tiro de uma balista.
O Senshi responsável por eles, guiado pelo sangue Aka depositado no alvo, atirou um projétil flamejante no alvo, um buraco por onde os Kuro passavam. Um pilar de fogo subiu até a altura das folhas no alto da floresta.
Iori observava as outras balistas fazerem o mesmo, sentado em cima da mureta. Enquanto aguardava a batalha chegar até ele.
— Vai precisar — se aproximou o homem de túnicas com marcas de lua — a Seiva da Noite serve é um poderoso anestécico, pode ser usado para combate — explicou Kurome — Se entrar no organismo, algumas funções do corpo param de funcionar, principalmente iro.
— Pensei que tinha dado errado usar isso contra o garoto das tempestades — encarou o frasco nas mãos — Por que devo confiar dessa vez?
— Não deve, mas se é para trabalharmos juntos — caminhava em outra direção — Sei que está esperando o que nos atacou na floresta, eu vou atrás da outra aberração. Boa sorte.
As chamas das armadilhas pintaram a floresta de laranja, se espalhando pela manipulação dos Senshis em conjunto com a artilharia. Entre gritos de ordem e de dor, os Kuro recuaram. No lugar deles, veio outra coisa. Os Tsuki mais próximos, notaram perto, correndo para as barricadas, gritando para que se protegessem. Os da linha de frente, procuraram longas pedras e árvores como cobertura.
Cortando o frio ar daquela noite, tal como na batalha do dia anterior, outra chuva de pedras vinha da montanha. Iori se abrigou junto com os atiradores assim que via aquela saraivada descer sobre o grupo mais avançado. Tsuneo e Yachi se esconderam juntos com o comandante, ao mesmo tempo que assistiam a saraivada destruir suas armas.
— Isso era para acontecer? — perguntou Tsuneo.
— As catapultas vinham do outro lado da montanha ontem. Devem ter descido durante o dia — explicou Iori — Cadê o Jin?
— Na outra balista — Yachi pegou um escudo no chão — Não reconheço ele entre os caídos.
— Nossos homens estão todos parados — Iori pressentia pelo sangue — É isso que ele quer.
Quando o ataque cessou, Iori encontrou a floresta tomada por uma fina nuvem de terra. Alguns corpos jogados, outros saíram de suas tocas para receber o exército inimigo que voltou a avançar.
— O inimigo está aqui, avançar — um Senshi gritava por perto.
Iori seguiu a voz até um homem correndo entre os destroços das barricadas, olhando de um lado para o outro.
— Vamos defender nossa nação! — ergueu sua espada contra o companheiro.
Pelas costas, Iori o pegou pela armadura e o arremessou no chão. Ao ver seu rosto, percebeu suas pupilas tomadas pelo tom preto. Antes que o homem feroz reagisse, o comandante acertou seu queixo com o bico dos sapatos, o derrubando na hora.
Iori ouvia passos arrastados na direção dele. Uma figura saltou das sombras em cima do comandante, sendo afastado com um chute. Sangue dos cadáveres espalhados grudou em suas botas e em sua capa preta na medida em que se levantava.
— Cadê a garota?! — grunhia Kimijime.
— Esta foi a última vez em que agiu como um covarde — espiou por baixo do capuz — Mas do jeito que você é, entendo a sua vergonha.
— Que foi? Tá com medo também? — Sacou sua espada — melhor não olhar para mim então!
O ataque de Kimijime parou na guarda do Senshi, que aos seus pés, viu uma cobra rastejando até seu pescoço. A visão logo se dissolveu. Iori girou seu corpo para atacar, obrigando o súdito a saltar para trás.
— Saquei, você não é como os outros — rosnava Kimijime.
— Então você cria ilusões. Isso explica as traições e porque ninguém sabia dizer de onde vinha os ataques — apontou a espada para ele — devo imaginar o quanto dos nossos você usou.
— Você tem pena dos fracos e eu que deveria sentir vergonha? Imagina como deve ser para eles ver a morte inevitável vindo de alguém que julgaram pela aparência — gargalhou — Eles nem sabiam o que estava acontecendo.
Com o sangue se espalhando pela terra, Iori sentia seus pés serem presos. Ele olhou para os pés depois para Kimijime, sorridente ao balançar a espada contra o comandante. Deixando-se acertar no ombro, ele puxa seu oponente para perto e acerta-lhe uma cabeçada.
Seu ombro já se recuperava no ferimento, na medida em que arrancava seus pés dos calçados para avançar na luta. Kimijime dá mais passos para trás até passar por outra poça de sangue, que irrompe numa série de fios que ligavam dois troncos em uma enorme teia que separava os dois lutadores.
“Além de ilusões, esse cara manipula sangue”, sua espada se agarrava nas teias que tentava cortar. “Uma técnica que exige uma rara abundância do elemento, e ele gera com a matança”, olhava aos cadáveres ao redor em vermelho. “Tenho que me aproximar antes que ele possa criar mais dessas coisas”
Kimijime enfia sua espada entre as teias de sangue para perfurar seu oponente, que escapa para o lado, cortando uma das árvores onde a teia está formada. Após ter sua criação desmanchada, o Kuro toma outro cadáver. Com uma das mãos, ele entrelaçou o sangue nos dedos, formando um plasma na palma.
Vindo com força total, Iori girou sua espada apenas para interromper o golpe na mão ensanguentada de Kimijime. O cadáver sob os pés de ambos começou a sacudir até explodir uma erupção sanguínea que engoliu Iori.
— O sangue de vocês é diferente — dizia Kimijime, vendo Iori se contorcer no meio das teias — Essa é a origem da força dos Aka? Se for, não achei nada de mais.
A aura de Iori crescia, ao passo que o pequeno compartimento de sangue endureceu com o calor até se tornar quebradiço. Com um único golpe, o comandante despedaçou a formação.
— Não é o único que controla sangue aqui. Quer saber a força dos Aka? — disse Iori, tirando as teias endurecidas do corpo como se fosse poeira — Mesmo na morte, nossos aliados lutam conosco.
Quando Iori avançou, Kimijime caminhava de costas para o próximo cadáver, mas as teias passaram longe do comandante do exército vermelho. Após circular a torrente vermelha, seu ataque acertou apenas o capuz do súdito que escapou no último instante.
— Você é um monstro só de rosto — Iori via o rosto de Kimijme.
— Falando demais para alguém ainda rodeado de cadáveres. Seus parceiros mortos são sua força? Eu vou fazê-los te arrastar para morte.
O sangue dos Senshis caídos formaram uma esfera maciça nas mãos de Kimijime. Ao dispará-la, o projétil deixou um denso rastro de vermelho pelo terreno. Prestes a bater numa árvore e explodir, Iori roubou um pouco do fogo da floresta, deu as costas ao súdito, e disparou contra a explosão iminente.
Um jato concentrado de chamas dividiu a bomba de sangue para todos os lados, protegendo seu corpo.
— Não me ignore — gritou Kimijime, chegando por trás.
Com a explosão contida, Iori apagou suas chamas para se defender com sua espada. Kimijime o empurrou para perto do sangue espalhado, porém o Senshi movia suas pernas, agachava e contra-atacava sem sequer tirar os olhos do oponente.
— Os arqueiros de antes… O sangue Aka é compartilhado — percebia Kimijme — está coordenando meus ataques!
— Eu ainda não terminei — usou uma das mãos para capturar mais fogo.
De mãos trocadas, Iori afastou a arma do súdito de seu peito, enquanto apontava seu ataque flamejante para ele. O único reflexo de Épsilon foi puxar sua capa ensanguentada. O golpe o arremessou contra as árvores, sua capa e capuz se tornaram cinzas. Braços rasgados, unhas pontudas, e corpo disforme de Kimijime, revelados em meio às chamas.
— Sou monstro o bastante para você, agora? — gritou o súdito, abrindo os braços.
Grandes disparos das catapultas chegaram ao campo de batalha. Mais reforços da Guarda Pacificadora chegavam, com nuvens carregadas com raios invadindo o espaço que antes era do luar.
— Então eles já chegaram — percebeu Kimijime — Essa luta já terminou..
— Para onde você pensa que vai? — questionou Iori.
— Nenhum lugar. Eles é que vão vir até mim.
Alguns Heishis batiam em retirada, indo em direção às barricadas somente para serem pegos nas teias que Kimijime tinha formado. Iori puxava as chamas para atacar, mas as teias puxavam seu braço, entrelaçaram-se em sua perna.
“Vindas de todos os lados, isso é muito para antecipar”, Iori usava sua aura para esquentar, endurecer e cortar as teias, “O que ele está tramando?”.
Quando tomou a terceira vida de um membro do exército imperial, Kimijime apenas esperou Iori se libertar das suas amarras para colocá-lo em outras. O sangue Ao indetectado por sua aura permeou o campo de batalha assim como o Aka.
Antes que o Senshi pudesse atacar, um fio pegajoso foi amarrado em seu pescoço. Ele foi arrastado, envolvido por mais teias e terra, formando um casulo que o suspendeu do chão.
“Ele misturou sangue azul com terra… Não pode ser endurecido. Eu não consigo respirar”, Iori lutava para puxar os fios de seu pescoço. “Mesmo sendo sangue, a estrutura é alterada pelo iro, talvez eu possa…”
— Agora — Kimijime esfregava as mãos, se voltando para as barricadas — A garota!
Kimijime sumiu na floresta rumo ao acampamento. Os Senshis aos poucos eram obrigados a fazer o mesmo. Eles correram para trás das barreiras, já despedaçadas pelas catapultas. Em meio a fuga, Jin corria na direção contrária, surgindo de onde estava escondido, portando uma faca para cortar a casulo.
— Qual é — forçava a lâmina contra o casulo — Você não pode morrer assim! Anda!
— Jin — chamou Tsuneo, vindo com Yachi logo do lado — Rápido, aquele cara pode voltar se você continuar aqui.
— Para com isso — afastou os mirins — Ele tá atrás da Umi, não ouviu? Temos que tirar o comandante daqui!
De repente um barulho se fez ouvir dentro do casulo. Uma mancha negra brotava em sua superfície, seguida de uma espada. Jin logo enfiou as mãos na fenda, que também era empurrada pelo lado de dentro. Iori emergiu lutando para respirar. De dentro do casulo desmanchado, escorria seiva da noite de um frasco estilhaçado.
— Senhor Iori — o ajudava a levantar — Ainda bem.
— Corram… — limpava os cacos de vidro da mão na terra — Sigam os Senshis, este lugar está condenado.
— Comandante — Tsuneo tomou a palavra — Eu acho que v-você precisa saber que…
— Não há tempo — ficou de pé, puxou sua espada e a sujou no líquido preto que restava dentro do casulo — Vou voltar e salvar minha filha. Vocês irão comigo, quero qeu aproveitem a primeira chance que der para fugir e pegar logo a primeira carruagem de volta. Fui claro?
— Sim, senhor — os jovens responderam em uníssono.
Eles se moviam, com Iori tendo dificuldades para correr, ao tempo que puxava seu criado pelo ombro:
— Jin, preciso conversar com você.
Arrastados pela Guarda Pacificadora, os Senshis retornaram à base em meio a uma luta ininterrupta desde a floresta. A lua já aparecia no céu e na floresta, as únicas luzes eram do incêndio que havia começado no pé da montanha e as tochas no acampamento de Uchida. O general dos azuis, pouco esperou o retorno de seus dois confiados. Recebendo os Heishis em fuga ele os apontava para a saída:
— Para as carruagens. Não esperem por mais transporte!
Entre a debandada de homens, duas meninas escutavam os gritos. A que levava as mãos a cabeça era conduzida pela mais alta que distraiu seu olhar vendo dois garotos partindo na direção contrária.
— Yanaho? Yukirama? O que fazem…
— Nos recuperamos, que bagunça é essa?! — interrompeu o mirim com capa.
— São os Kuro — apontou na direção da floresta — meu pai ainda está lá com o restante, estamos indo para o acampamento. Aiko está muito assustada desde que viu… aquele monstro.
— Vá depressa, Kazuya está por lá, estarão seguras! — sinalizou Yukirama.
Os dois garotos observavam nuvens carregadas vindo do topo do monte, já invadindo as florestas. Umi percebia a passada de seus companheiros ainda em direção ao campo de batalha:
— Para onde pensam que vão?
Seu chamado foi ignorado pelos dois que se apressaram. Umi então ia em direção contrária segurando no braço fino de sua amiga, chegando ao acampamento.
Aiko entrava em um abrigo aos prantos, agachando de joelhos. O barulho de corridas e gritos não cessava. A garota assustada percebia que estava só de repente. Voltando para fora, via sua amiga partindo na contra-mão, segurando sua mão logo depois:
— Ficou doida?! Seu pai pediu para ficarmos aqui!
— E deixar eles sozinhos? Nem pensar! — tentava se soltar — você está segura aqui!
— Pare com isso, não podemos fazer nada, precisamos fug…
Aiko interrompia sua fala ao perceber que a companheira parou de tentar se soltar. A chegada dos Senshis frustrava a esperança de Umi de ver seu pai, quando percebia aquela mesma coisa que viu na floresta, empilhando corpos de soldados, indo na direção das duas.
Subitamente Umi correu novamente com Aiko:
— Droga!
— Achei vocês! — Um grito surgiu se aproximando dos abrigos
Percebendo a direção do grito Umi aproveitou a deixa para arremessar uma lança de surpresa em Kimijime. O súdito apenas sorriu desviando facilmente. As meninas correram por dentro da cabana, desmanchando suas estacas, derrubando a lona em cima do súdito, porém ele continuava sua marcha.
Com o acampamento atacado, Kazuya corria junto delas sem protestar. Os Heishis no caminho do inimigo eram rapidamente presos nas teias e sufocados até que o sangue extraído de seus cadáveres se aproximava das duas encurraladas.
— Quer repetir do que me chamou na floresta? — provocou Kimijime.
As formações vermelhas estavam distantes quando um Senshi saltou entre os mirins em fuga. Sua espada manchada de preto cortou fios de cabelo do súdito e no retorno cortou seu braço.
— Chegamos — Jin dizia, puxando Umi e Aiko com ajuda de seus outros dois companheiros — Vai ficar tudo bem agora.
— Pai? — percebia Umi.
As duas observavam o homem de pé diante delas, Iori estava com Kimijime frente a frente.
— Você de novo! — Kimijime balançava a cabeça — Sabe, eu tava segurando minha raiva até agora.
— Você fala como se alguém se importasse com isso — respondeu Iori.
A postura do comandante tremulava com a espada nas mãos, ao passo que a seiva da noite escorria do cabo até sua pele. Kimijime reparava em suas teias cortadas, depois no corte em seu braço, agora dormente.
— Então essa gosma preta enfraquece o corpo — passava a mão na ferida, que vazava preto — e você ainda tem coragem de me chamar de covarde? Usar isso é um atestado de sua fraqueza!
— Reclamar da sua situação não vai mudar nada. Até agora foi um acerto meu e nenhum seu.
Trocando a espada para o outro braço, ele arrastou a lâmina até Iori, cujos olhos viam triplicado. Legiões de Kuros correndo na sua direção, incontáveis e impossíveis de conter antes que atingissem os mirins. Quando ouviu os gritos deles, ele fechou os olhos. Ao abrir, Kimijime estava diante dele. Nenhum outro inimigo. Eles cruzaram suas espadas na realidade.
— A sua coragem te deixou tão burro assim? — ria Kimijime enquanto forçava, obrigando Iori a andar para trás — o líquido te enfraqueceu também, né?! Eu posso sentir a sua mente enfraquecendo. E tudo isso por crianças insignificantes.
— A força dos Aka — cerrou o punho livre brilhando em vermelho — vem exatamente disso!
O punho rubi jogou o súdito para trás desequilibrado. Iori avançou, passando por ele com um corte na coxa. Kimijime caiu em um joelho só, segurando a própria ferida para gerar fios, mas a seiva da noite não permitia consistência.
— Essas crianças insignificantes se tornarão grandes Senshis, que formarão outros como ela e assim por diante. De geração em geração, a nossa força sempre avança. Ninguém pode vencer o tempo!
— O que você chama tempo, eu chamo morte — provocou Épsilon levantando sua face transfigurada com um sorriso — E ela matará esses outros também.
Kimijime abria a ferida com os dedos, deixando o sangue sobrepor a seiva da noite até ter o bastante para construir as teias. Com os dentes trincados de dor, contendo as risadas, ele riscou o chão com seu sangue. O líquido escarlate rastejou aos pés de Iori, entrelaçando em seus tornozelos.
Imóvel, Iori usou sua espada para cortar os fios, mas eles não partiram. Kimijime atacou simultaneamente, enterrando a espada no peito do Senshi:
— Ou melhor, eu vou!
Iori fechou seus olhos. O gosto de ferro na sua garganta sumiu, assim como o frio metal que sentia atravessar seus ossos. Retornando outra vez para a realidade, ele viu Kimijime, com as mãos ensanguentadas correr na direção dos mirins em vez da sua.
Yachi e Kazuya tomaram a frente, batendo com suas espadas uma na outra. A faísca do contato cresceu e viajou até o súdito, que desviou por baixo sem parar a corrida, ele preparou seu golpe na direção de Umi.
Quando Jin já se preparava para entrar na sua frente, a terra debaixo deles, sacudiu com uma onda vinda de Iori. Kimijime foi varrido contra uma árvore, na qual se espatifou de frente.
— De novo?! Como você… — Gemia de dor levando as mãos à face avermelhada pela pancada.
— Eu sei qual a sensação de ser perfurado, não era essa — se desprendia dos fios de sangue — além disso, única explicação para eu não conseguir desfazer as teias, era ser outro truque.
— E por falar em truques — cuspiu a terra da boca — Os seus já estão acabando.
Kimijime guardou sua espada e se arremessou contra Iori. Dessa vez, ele se protegeu da sua lâmina com a teia formada em sua mão, enquanto a outra acertou a face de Iori, borrando a seiva da noite em suas pálpebras. Os dois cruzaram olhos, ativando a escuridão no olhar dos Kuro.
Iori escutou Kimijime sacar sua espada e ergueu os antebraços. Então, ele recuou sua espada e atacou simultaneamente na direção de onde ouviu o metal gemendo no ar. A próxima coisa que sente é a espada atravessando sua barriga. Dessa vez era real, porém também era real que sua arma estava encravada em carne.
Sua visão clareou, Kimijime puxava a espada do estômago do Senshi, ao mesmo tempo que ele também retirava sua espada atravessada no braço do súdito. Iori ativou seu poder de cura.
— Seu teimoso, imbecil — Kimijime gritava de dor entre cuspes — Não vê que isso me fortalece?
O próprio sangue de Épsilon unia sua pele aberta, sustentando seu braço por trás da densa camada de seiva da noite que o impedia de utilizar seu sangue para luta. Foi então que ele saltou por cima de Iori, em meio a sua recuperação. Ambas as espadas da dupla escapavam de suas mãos fracas.
— Comandante Iori! — gritou Yachi — Nós podemos ajudar.
O grito alertou o súdito, que descia seus punhos sobre o Senshi sem ordem ou força, para a presença dos mirins. Ele ergueu-se do chão e mancou até as crianças que começaram a cercá-lo.
— Que dor desgraçada — praguejava Kimijime — Maldito seja vocês Senshis! Maldito seja esses pirralhos ficando entre mim e a minha presa!
A ferida de Iori acabara de se fechar. Ele rastejou, ficou de pé, começou a correr até sua espada, mas Jin a pegou primeiro.
— Jin! Saia daqui! — gritou Iori.
— Você disse que eu vou me tornar um grande Senshi — respondeu o mirim — A hora é agora!
Os outros gritavam o nome dele, Iori esticou o braço, mas a terra não se moveu, faíscas não saíram de suas mãos. Tudo que pôde fazer foi assistir o súdito, mesmo debilitado, com um só golpe atravessar a guarda de seu filho. Kimijime erguia Jin do chão, transpassado por sua espada onde devia estar seu coração.
Ilustradora: Joy (Instagram).
Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.