Nisoiro Brasileira

Autor(a): Pedro Caetano


Volume III – Arco 8

Capítulo 64: Salvação

Na fronteira com os Kuro, as nuvens cercavam uma lua crescente admirada por uma jovem garota na entrada de uma caverna. Sua paz, contudo, era encerrada com o relincho do cavalo que chegava na sua morada. 

Desgovernado, o animal balançava seu condutor semi-consciente quando se chocou com um tronco. O rapaz caiu e o cavalo continuou com sua fúria. 

A menina correu para acalmar o animal, prendendo suas rédeas para logo dar atenção ao rapaz inerte na grama.

— Suzaki?! — reconhecia o corpo.

No momento em o colocou de pé, ele a empurrou para o lado e saiu mancando às pressas, rumo à luz laranja na caverna. Foi então que Aiuchu reparou num objeto, reluzindo na grama, mas escolheu partir para a caverna.

A luz da sua fogueira a permitia vê-lo nitidamente recostado nas paredes de pedra, com o rosto oculto pelos cabelos ensebados. Dos dedos aos cotovelos ensanguentados, roupas sujas de lama, além do corpo encolhido por trás dos joelhos envolvidos em seus braços.

— Deixa eu ver o que aconteceu.

Agachando para junto dele, assim que estendeu a mão, seu braço foi recebido com um tapa. 

— Sai! — berrou Suzaki, se arrastando para longe dela.

— Sem chance, olha só para você — continuou cercando-o.

Ainda sem responder, ele recostou em outra parede. Aiuchu pegou o pelo ombro príncipe, mas precisou se inclinar para trás, pois o punho de Suzaki acabava de passar rente a sua face. Com um grunhido de frustração, ele recolheu os braços e voltou a dar suas costas.

— Tudo bem. Pode ficar se quiser, eu… — suspirava Aiuchu, dando passos para trás — Passo a noite lá fora.

Aiuchu se retirou para frente da sua caverna e ali ficou admirando a lua, ainda que ao som dos gemidos e soluços que vinham de dentro.

“O que aconteceu com você?”, pensou, deitando na entrada.

No dia seguinte à sua visita desavisada a Kyoko, Ryo já estava de volta ao acampamento de sua família. Estava deitado em seu quarto, encarando o teto com seu único olho:

“Sem as buscas, jamais vamos saber o que aconteceu. Nenhuma pista… Talvez meu pai esteja certo e ele tenha morrido, mas… Que chances temos sem ele?”

Sua concentração, contudo, foi interrompida por um rugido distante. Inúmeras rodas de metal rasgando a terra, cavalos a toda velocidade e armaduras tilintando ao ponto de ensurdecer sua sensível audição.

Quando Ryo saltou da cama e saiu de casa, uma trombeta ressoou pelo acampamento. Heishis subiam na murada principal por torres móveis, chacinando todos os vigias dali. Depois que todos os Tsuki se reuniram armados na entrada, o grosso portão de madeira da sua fortaleza foi sacudido por um aríete do lado de fora.

O impacto silenciou o grupo, que então escutou um homem bem ao centro do muro, que bradava um texto que lia em voz alta:

— O tempo de insubordinação à vossa majestade, o Imperador, acabará hoje. Com a morte de seu principal malfeitor, Suzaki Sora, o Marquês Aotaka pede a rendição incondicional dos Tsuki aqui presentes, ou esse cerco permanecerá até que não reste mais nada. 

De trás de Ryo, seu pai empurrava a pequena multidão, apontando dedos.

— Pensa que na morte de um garoto nossas divergências vão sumir? Koji pode ser Imperador do mundo, mas nunca da nossa família!

O arauto olhou brevemente para o incômodo e voltou a ler seus termos:

— Se porventura quiserem discutir um acordo, estaremos disponíveis até o dia seguinte. Só temos uma condição para conversarmos: de que a fornalha onde guardam Tetsuhi cesse de funcionar. Enquanto houver fumaça sendo expelida de suas chaminés, a invasão vai continuar até a rendição.

O garoto caolho passava pelos homens próximos a Yomi, o agarrando pelos ombros.

— Pai — sussurrava — precisamos de tempo, estamos completamente cercados… se isso continuar vamos ser massacrados aqui e agora!

— Avisem Tetsuhi para parar — esbravejou para seus subordinados — e diga que estamos chegando lá para uma reunião. A batalha começou.

Vendo Yomi partir com seus homens, Ryo veio logo atrás, com um pensamento na cabeça:

“Koji não te mataria, isso só pode ser uma mentira para nos rendermos. Então… onde você está, Suzaki?”, encarava o céu daquela madrugada.  

O amanhecer trazia consigo os cânticos dos pássaros, que acariciavam os ouvidos de Aiuchu, já de pé fazendo seu caminho de volta do bosque para a casa com os braços cheios de frutas. Perto da caverna, ela percebeu um anel prateado, com uma pedra escura incrustada nele. Estava abandonado próximo de onde Suzaki havia caído. 

Após vestir o anel em um dos dedos, para não ocupar as mãos, ela retornou para a caverna.

— Suzaki — ela chamou por ele da entrada — Eu vou entrar.

Ele permanecia de costas para ela, mas seu olhar tímido a vigiava por cima dos ombros, principalmente o que tinha nas mãos. 

— Está com fome? — perguntou ela, estendendo uma maçã para ele.

O príncipe não correspondeu. Ela chegou perto e agachou na sua frente, e deixou as frutas no chão. O sujeito olhou para as fruta por mais alguns segundos, depois agarrou uma depois da outra, começando a devorá-las. 

— Você dormiu bem? — perguntou, sendo respondida somente com um aceno de cabeça — Que bom porque ontem quando você chegou, isso aqui caiu do seu bolso — tirou o anel dos dedos e o exibiu — Deve ser seu, ele é lindo.

O anel reluzia com a luz que entrava na caverna, refletindo no rosto de Suzaki, cujos olhos cresceram para então se encherem d’água. De repente, ele inclinou-se para frente, jogando a cabeça no peito de Aiuchu.

— Eu falhei — sussurrava, chorando — Eu falhei, eu falhei, eu falhei. 

— Calma — dizia, tocando seus cabelos com cuidado — Já passou.

As mãos de Suzaki apertavam Aiuchu, que aproveitava a situação para olhá-lo mais de perto. Suas feridas abertas se misturavam com a lama endurecida em sua pele. Acariciando seus cabelos, ela pegava em sua mão de forma sutil. 

— Suzaki, você está ferido. Eu preciso que venha comigo — sussurrava — Mas precisa confiar em mim, tudo bem?

O príncipe balançou a cabeça de cima para baixo, a permitindo entrelaçar suas mãos nas dele. Aiuchu deixou que ele se apoiasse nela, para que levantassem juntos do chão. 

As pernas de Suzaki tremiam, quando saíram da caverna. Foi então que Aiuchu jogou os braços do jovem por trás de seus próprios ombros. Com as mãos livres, ela pegou uma caneca que repousava no canto da entrada, antes de conduzir o príncipe pela trilha do bosque.

Os campos por onde passaram terminaram em um pequeno lago. Às margens dele, Aiuchu sentiu as mãos de Suzaki apertar sua roupa sempre que dava um passo em direção a água. 

— Não precisa ter medo — parou, descendo até suas botas — você já veio até aqui. 

Descalçando o príncipe, ela se deparou com os pés repletos de bolhas estouradas, encharcados de sangue. Tomando o jovem nos ombros novamente, ela lutou contra seus grunhidos e apertos e o levou até a margem.

— Um passo de cada vez — o toque da água nos seus pés cessou sua luta — Pode me avisar quando quiser parar, agora.

Com o rapaz nos ombros e a caneca de metal numa das mãos, Aiuchu entrou dentro do lago com ele, deixando uma trilha de sangue por onde andava.

Eles estavam próximos do centro do lago, quando Suzaki apertou as roupas de Aiuchu novamente. A água ainda estava na altura da barriga de ambos quando pararam.

— Seu rosto — acariciava os cabelos de Suzaki para o lado — Você pode fazer isso — juntou suas mãos com as dele descendo até a água.

Mergulhando suas mãos na água, Suzaki vislumbrou seu reflexo na superfície, turvado pelo sangue que escorria de seus dedos. A visão estremeceu seus lábios e o obrigava a apertar os olhos.

Ele lutava com a imagem, balançando as mãos dentro da água, até Aiuchu segurá-las e lentamente erguê-las até seu rosto.

Depois, com a caneca que trazia consigo, Aiuchu derramou água nos cabelos de Suzaki, que passou a lavar sua face com as próprias mãos. Tirando os cabelos da frente, ela encontrou o rosto do jovem limpo e abriu um sorriso.

— Posso? — pediu, levando as mãos até a camisa de Suzaki.

Ao invés de permiti-la, Suzaki negou com a cabeça e levantou sua camisa com as próprias mãos. Na medida em que a tirava, Suzaki sentia o tecido grudar em seu corpo, esfregando nas suas feridas. Com um último grunhido de dor, ele largou sua roupa para boiar sobre as águas.

— Precisamos ir mais fundo — insistiu Aiuchu, relutando de tocá-lo — vamos, falta pouco. 

Contudo, Suzaki ergueu os ombros e abraçou a si mesmo, relutando a avançar. A única alternativa para Aiuchu, foi lavar o seu corpo com a água que enchia pela caneca.

— Vire de costas — pediu Aiuchu.

Pouco a pouco, os ombros de Suzaki baixaram e seus braços descolaram do tronco. A lama que escorria pela água, nublava seu reflexo na superfície, ao tempo que seu tom de pele começava a aparecer novamente. 

Com os dois frente a frente novamente, Aiuchu pegava a face cabisbaixa de Suzaki pelo queixo, e o fez olhar em seus olhos, dizendo:

— Agora sim parece o Suzaki que conheço.

De repente, lágrimas desesperadas escorreram gotejando sobre o lago. Suzaki voltava a se encolher, levando as mãos ao rosto, quando Aiuchu segurou seus braços.

— Estou aqui com você. Não precisa se esconder — o abraçou sorrindo. 

A garganta de Suzaki se fechava, ao tempo que se soltavam grunhidos que se tornavam cada vez mais altos, se tornando gritos de dor. O choro incessante passou a descer de seu rosto como um rio, encharcando o ombro da garota.  

A cada berro, ele a segurava mais forte, já não se importando na dor que sentia ao ser tocado. Era alto suficiente para alertar animais próximos tanto quanto as nuvens escuras que se formavam no céu, anunciando a tempestade daquele dia. 

Quando o silêncio voltou, ele a deixou que o levasse mais fundo, perto do rio que chegava por ali. Lá, Aiuchu deslizou suas mãos até seus braços, depois seus ombros e finalmente sua cabeça, onde o empurrou com delicadeza para baixo. As águas envolveram o corpo do príncipe, submergindo-o completamente.

Mais tarde naquele dia, Suzaki abria os olhos, vendo estalactites. A fogueira iluminava a caverna escura sem sinal da moradora. Ficando sentado sobre a pedra, reparou no corpo enfaixado no peito, além dos antebraços descendo até as mãos. Ao lado de onde dormia, estava seu anel prateado, que guardou novamente no bolso da calça.

Quando saiu da caverna, as nuvens já cobriam completamente o Sol. Andando novamente pela trilha que fez naquela manhã, encontrou no final dela Aiuchu, debruçada no riacho com a blusa do príncipe nas mãos.

Pelas suas costas, ele sentou-se na margem cruzando as pernas e voltou a encarar seu reflexo na correnteza, distorcido toda vez que Aiuchu mergulhava a camisa nas águas. Quando terminou, ela estendeu a roupa na rocha de um lado ao som de um vento gélido que cruzou por eles.

— Obrigado — dizia Suzaki — e me desculpe. 

— Foi um susto no início, mas — Aiuchu se sentava ao lado, deixando seus pés no meio da correnteza  — passei a noite pensando que devia ter um por que para você vir para cá. Foi então que procurei alguma maneira de te acalmar. Tudo tem um motivo.

Aiuchu terminou sua fala abrindo um sorriso para ele, mas Suzaki, que não parou de admirar seu reflexo, pegou uma pedra nas mãos e sussurrou:

— O motivo de tudo... 

— O que foi? — perguntou, se aproximando. 

— Desde o início de meus treinamentos — arremessou a pedra que quicou poucas vezes e afundou — até as viagens, os riscos que corri… Sempre quis entender, porque eu tinha que fazer tudo aquilo.

De repente o vento soprou mais forte, farfalhando as folhas nas árvores e jogando os cabelos dos dois para o lado. O rio se agitou, então Suzaki passou a olhar o sangue ressecado nas faixas de suas mãos e antebraço.

— Eu sempre pensei que não era muito diferente do vento soprar, do rio correr, do sol nascer — ergueu seus olhos para um céu mais escurecido — eu pensava que realizar o sonho do meu pai fosse minha natureza. Treinar, estudar e vencer era o meu caminho para a felicidade.

— Não temos as respostas para tudo, Suzaki — balançava seus pés na água. 

— Tem razão — começou a remover as faixas em seus pulsos — Mesmo assim, eu me segurei a essa resposta até que encontrei uma nova.

— Cuidado na hora de trocá-las — alertou Aiuchu, antes de continuar — Então como foi isso?

— Quando saí para o rito de passagem, eu tinha medo de deixar minha casa para trás — enrolava suas mãos em ataduras novas — mas foi exatamente enfrentando o desconhecido que eu descobri outra coisa mais forte guiando as pessoas que conheci.

A mente de Suzaki divagou por alguns segundos, trazendo o poço que visitara com Mitensai, o lápide nos fundos da casa de Okada e, finalmente, Yanaho se levantando pela enésima vez em seu primeiro treino.

— Nada que fazia naquele castelo me abriu um único sorriso sequer. Agora aqui fora, as pessoas nunca precisaram de muito para estarem em paz. Mesmo com as guerras, doenças, pobreza, eles ainda eram felizes. 

— Então, por que você seria diferente? — chegou mais perto, o ajudando com as faixas no outro braço.

— Exatamente — puxava seu antebraço para perto — Eu nunca quis lutar, espionar, herdar o Império, nada — terminava ele mesmo de enrolar a faixa — tudo que queria era proteger a felicidade que encontrei aqui.

Segurando a mão semi-aberta, Suzaki sentiu a corneta que Daisuke lhe confiara no resgate de Hoshizora. Quando aquela visão saiu de sua mente, ele cerrou o punho, suportando a dor e ergueu o braço para frente. 

— Por isso eu prometi, que ajudaria as pessoas a encontrar um caminho para as cores viverem em paz — socou o chão — era isso que queria mostrar ao meu pai, mostrar para o mundo. Mas todos… Ele… nem ao menos leva isso a sério! Nem sei se tudo que dizia de bom sobre mim era verdade.

— Suzaki… — juntou suas mãos com as dele — Nada é real se não puder tocar e sentir no coração.

— É como se — tomou sua blusa da rocha e a vestiu — o mundo me obrigasse a desistir disso tudo.

Assim que o jovem se levantou, a garota de cabelos vermelhos pegou em sua mão: 

— Eu nunca te contei, mas… Sei como as cores não podem conviver entre si. 

— Do que está falando? — questionou Suzaki.

— “O lugar que você nasceu, não é o mesmo que cresceu”. Era o que minha mãe sempre me dizia, quando morava no seu território. 

Os olhos de Suzaki saltaram de sua face: 

— Uma Aka morando entre os azuis? 

— Minha mãe me disse que eu era um bebê abandonado em um riacho como esse — estendia mechas de seu cabelo vermelho — Mas que me tornei um presente dos céus, assim que ela me resgatou. 

A visão de seu reflexo nas águas se tornava seu rosto mais jovem, refletido em um espelho dentro de uma casa, passando a mão pelo mesmo cabelo. 

— Ela me criou sozinha. Só fui ter noção de que era diferente quando olhei pela janela e ninguém tinha essa cor — exibiu os cabelos.

— Você teria sido morta em pouco tempo se não escondesse isso.

— E foi isso que ela fez — leves pingos de chuva começaram a cair — Minha mãe cortava meu cabelo mais curto que o seu, além de cobrir minha cabeça. Também não deixava eu falar com ninguém. Eu nunca entendia porque daquele medo — cerrou os punhos. 

— Uma vez me disse que tinha fugido — um trovão ressoou nos céus — Sinto muito pela sua mãe.

— Nós brigávamos o tempo todo até que minha mãe me prometeu que um dia eu estaria pronta para sair. Mas essa hora chegou antes do que ela queria.

A chuva começou cair sobre eles, distorcendo seus reflexos no rio.  

— Numa das nossas saídas, o pano que cobria meus cabelos se soltou na frente de toda a vizinhança. Não demorou muito para homens cercarem nossa casa — tirava os pés das águas —  Minha mãe lutou com três deles, gritando para que eu corresse — se levantou com os olhos no chão — e foi o que eu fiz. Nunca mais a vi.

O príncipe colocou a mão sobre o ombro da garota, que encolhia a cabeça aos prantos.

— É sempre assim, não é?

— Já era de noite e corria, corria sem parar. Havia uma bola branca e brilhante no céu. Eu a persegui até perceber que não estava mais sendo seguida. 

— E foi assim que encontrou esse lugar?

— Eu nunca tive pra onde voltar e finalmente estava livre como queria— estendeu os braços sorrindo — No final tudo aquilo teve um propósito.

— Propósito na desgraça? — soltou o ombro da garota.  

— A Ordem que nos cerca — estendeu os braços para o ar — dá propósito a todas as coisas. Ela me permitiu passar por tudo isso, para que eu vivesse livre em comunhão com ela. E agora — puxou Suzaki pelo braço — ela nos uniu por uma causa. 

— Onde quer chegar? — perguntou indiferente. 

— Fuja comigo, Suzaki. Sempre me disse que seria melhor para mim, mas eu não consigo. Com você — aproximou seu rosto com o dele — eu faria qualquer coisa.

Suzaki virou o rosto. Suspirando fundo, ele puxou seu braço de volta:

— Eu não posso. 

— Não… p-pode? — arregalava os olhos — espera aí, como assim não pode?! 

— Eu preciso voltar — ficou de pé. 

— Espera! — aos gritos, ela tentou alcançá-lo, mas ele recuava — Você acabou de dizer que não tem motivos para isso, que só podia desistir disso tudo!

Apesar das pernas trêmulas, Aiuchu correu e agarrou Suzaki de frente.

— Lembre de como chegou aqui? Do que esse mundo te fez passar? — encostou sua cabeça no peito do príncipe — Podemos ser livres das promessas e das dores que vem dela, livres de…

— Aiuchu — repousou suas mãos nos ombros dela e a afastou lentamente — não pode me prender aqui. 

Com a fala, a garota de cabelos vermelhos arregalou os olhos, desistindo de sua luta. Ela caiu de joelhos no chão e voltou a chorar.

Por sua vez, Suzaki comprimiu os lábios e semicerrou os olhos, virando as costas para ela, enquanto balançava a cabeça. Retornou para a caverna durante a chuva, ele montou seu cavalo e partiu.

Com alguns trotes na chuva, o príncipe tranquilizava o animal que relinchava, assustado pela noite anterior, seguindo o caminho até que sentiu uma aproximação de repente. 

Suzaki ficou alerta, olhando em todos os cantos, quando na rota de terra à frente no breu completo percebia a silhueta de um homem de alta estatura.

Puxando as rédeas, ele desceu do animal e foi confrontá-la. Afiando sua visão, ele reparou no formato de uma máscara, quando ouviu uma voz fria e grossa: 

— Está levando mais tempo do que eu esperava. 

O homem de preto saía das sombras, com um passo à frente. Imediatamente, Suzaki se lançou com o punho na direção de seu rosto oculto, mas com um mero passo para o lado, Nobura desviou. 

Seu segundo golpe foi segurado pelas mãos do mascarado. Foi então que sua mente o comandava para agir, porém seu corpo parou de obedecer. 

“O que é isso?”, pensava não mexendo um músculo. “Não consigo fazer nada!”

— Achei que estivesse mais disposto a me ouvir — circulava o garoto paralisado — seus olhos e reações já estão diferentes.  

— Eu não quero te ouvir. O que você fez comigo? 

— A pergunta é: o que você está fazendo? Insistir em planos fracassados é o jogo dos tolos.

— Ainda não fracassei. Eu estou só começando.

— Pensa que está corrigindo o curso da sua jornada, mas na prática vai acabar da mesma forma, como todas as coisas nessa vida. 

— E para onde seria?

— Caos — se colocava nas costas do príncipe — O destino de toda a criação é a destruição. Lutamos contra ela, mas a marcha do tempo não admite erros, somente atrasos. Ainda que vença seu pai, o que ganharia com isso além de atrasar a guerra que vem por aí em… Talvez um ano ou dois anos, se tiver sorte.

— Não haverá guerra quando acabar com a corte — disse Suzaki, aumentando o tom.

— Sabe que está errado, isso parece com a crença das pessoas que serão salvas na morte. Continue com este ideal de salvação e quando menos perceber, não restará mais nada.

— E então você vai aparecer para mim de novo? — perguntou notando a sombra do homem sob ele. 

— Errado de novo. Quando terminar, será você que virá até mim — encostou novamente no príncipe.

De repente, Suzaki sentiu seu corpo voltar ao seu comando. Caindo no chão, ofegante, ele se virou e não havia mais homem nenhum, até que ouviu uma voz reverberar pelas sombras:

— Sua indecisão será sua ruína, caçador de sombras. 


Ilustradora: Joy (Instagram).

Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.

   



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