Volume II – Arco 4
Capítulo 28: Selecionados
Um novo dia chegava aos mirins do internato, dessa vez com céu acinzentado. As aves pousavam entre as árvores do complexo para alimentar seus filhotes, quando um barulho ressoou pelo local, as dispersando. Um som grave e pomposo, que também acordou os mirins nos alojamentos.
Yanaho abria seus olhos ao passo que Katsuo se colocava de pé. Partindo junto ao companheiro, se encontrou com os outros mirins, que formavam uma fileira liderada pelos professores do local.
Arata e Tomio passavam ao lado das filas, contando a presença dos alunos até que um deles foi à frente. Ele bateu no peito esquerdo, seguido por todos ali na forma, que brilharam em vermelho naquele mesmo instante.
— Eu acho bom vocês estarem acordados porque nesta semana, vamos fechar o ranqueamento que começamos meses atrás, tão ligados né? — levantou a voz, Arata — Os grupos para o exame serão baseados nele.
— Os melhores da lista, vão se garantir na fila para Senshi, caso sejam aprovados no exame — Tomio foi para junto de Arata, segurando uma lista nas mãos — Porém, os piores precisam da aprovação para ficarem nesse programa caso contrário serão expulsos.
Com o anúncio dos professores, alguns engoliram seco.
— Eu ouvi dizer que todo ano rola uma festa dos fracassados com quem desistiu mais cedo — comentou Arata — Estão dispensados para comer!
— Não esqueçam de se apresentarem para a equitação em uma hora! — completou Tomio.
Despachados, os mirins se dirigiram para o refeitório para, em pouco tempo, chegarem aos estábulos. Yanaho chegou junto com Katsuo, que mantinha a cabeça baixa.
— Erga a cabeça, ou então vai ser chamado atenção — pegou no ombro do amigo.
— Do jeito que as coisas estão, isso é o que menos importa.
— Eles avaliam tudo que fazemos. Anda logo, dependendo de como você for nessa semana pode ficar bem ranqueado.
— E se for tarde demais para isso — ergueu a cabeça — Poxa, eu não quero voltar para casa assim.
— Fique tranquilo, vamos conseguir te melhorar nos testes.
De repente, outro mirim esbarrava nas costas da dupla
— Ei, você… — cambaleou.
— Tá incomodado, manda aquele poder te salvar de novo — provocou Yukirama, porém foi afastado por Masori, que o puxou pelo braço — Daí você assusta os cavalos, é suspenso e eu não preciso ficar olhando para essa sua cara.
Yanaho não reagiu. Katsuo deu um passo à frente, mas hesitou ao reparar que o amigo abaixou a cabeça para a disputa.
Nos estábulos, cada um se aproximou da baia colocando selas em seus cavalos. No corredor, os professores passavam suas instruções.
— Esse é um exercício de trabalho em grupo. Vocês farão fileiras, e terão que conduzir seus cavalos juntos um do outro, na medida em que passam pelos obstáculos e guiam os selvagens pelo pasto. Quando o percurso terminar, vou pedir que construam essa formação — explicou Tomio, apontando para um desenho pregado na parede — E cerquem os animais de volta para cá.
Separados em pelotões, os primeiros mirins escolhidos largaram pelo circuito. Durante o trajeto, o grupo passava pelos obstáculos com sucesso, mas Yanaho não tirava os olhos Yukirama. Já no final, virou para seu companheiro ao lado para se distrair:
— Kazuya, parece que nossos cavalos se dão muito bem. Devíamos fazer os exercícios juntos na formação de agora em diante.
O companheiro ao lado não gastou saliva, estalando as rédeas e ignorando o pedido ao partir com velocidade.
“De todos que eu podia sugerir algo, por que fui tentar logo com Kazuya? Bem feito pra mim”, pensou.
Graças a mudança repentina de Kazuya, Yukirama corrigiu a formação ao reduzir a velocidade, ficando lado a lado com o mirim de capa vermelha. Assim permaneceram sem trocarem uma palavra ou olhar por minutos, criando um clima tenso.
Yanaho então, percebia o pelotão de seu amigo terminando o exercício. No entanto, vindo de trás, uma jovem perdia o controle do cavalo na hora de frear. O animal ejetou-a de suas costas e chocou-se com o do Katsuo.
— Debandada! — gritou Yukirama.
Os cavalos perdiam a calma, desfazendo a formação das equipe recuadas. Os mirins adiantados acalmaram suas montarias rapidamente, ao passo que Katsuo falhava em manter-se montado, sendo arremessado para fora do cavalo.
— Katsuo! — gritou Yanaho.
Saindo de seu pelotão, Yanaho foi atender seu amigo, ao mesmo tempo que o animal recebia atenção de outro mirim que chegava por ali.
— Ele estava sentindo dor, bastava um carinho na região — acariciou o animal acima do rabo — O animal precisa que passe sua confiança para ele, então não se desespere!
— Obrigado, Yachi — disse Katsuo, se levantando.
— Está tudo bem? — perguntou Yanaho — Você se machucou?
— O que faz aqui? — questionou Katsuo — Não devia estar…
Outros mirins passavam por ali, junto da menina responsável pelo acidente.
— Me desculpe — pediu a garota.
— Cara, era só puxar as rédeas — gritou Etsuko — O que você estava fazendo?! Só podia ser você mesmo, Aiko.
Tomio aproveitou para se juntar aos mirins que acalmaram os cavalos selvagens. Já Arata foi advertir Aiko e Katsuo.
— Esse era um dos testes mais simples. Vocês estão ligados que só vai piorar daqui para frente? — disse Arata, coçando a cabeça — Quanto a você, colônia de férias…
— O que tem eu? — se espantou.
— Ninguém falou para você sair da formação! — olhou rapidamente para a cerca — Eu acho até que um dos cavalos fugiu. Perdeu pontos de bobeira, tá ligado? — voltou sua atenção ao caderno nas mãos, onde anotou algumas coisas
— Mas eu só… — tentou se explicar.
— Depois falamos sobre como você pode corrigir isso.
Arata dispensou o grupo, que fez o seu caminho de volta aos estábulos para guardar os animais.
— Poxa, foi o que eu disse. Não precisava sair da formação.
— Só queria… — se impediu de explicar — Quer saber, isso não vem ao caso. Vamos ter que melhorar nos próximos testes.
Nos dias seguintes, os mirins foram submetidos a um teste de sobrevivência prolongado no objetivo de testar a capacidade de cura e resistência.
O local era uma floresta úmida onde, mesmo com as chuvas, o calor era intenso principalmente pelas roupas pesadas que os alunos usavam. A primeira tarefa do teste, era de formação de batalha. Por hora, o grupo sofreria uma emboscada de Senshi’s treinados. Nela, deveriam demonstrar suas reações e capacidades defensivas.
Após uma intensa chuva que encheu as margens do rio onde estavam, os mirins recuaram para mais fundo na floresta, onde passaram a noite. Quando a lua apareceu no céu, os professores conduziram os mirins a um campo mais aberto.
— É melhor vocês terem mais um pouco de energia sobrando — jogou uma sacola com lanças na grama — Guerras não te dão tempo para recuperar. Tem que dar o máximo sempre.
— Queremos medir a distância do arremesso de vocês. Façam uma fila!
Todos naquela noite estavam arfando de cansaço. O simples ato de pegar a lança parecia erguer uma montanha, quanto mais atirá-la. Alguns mirins depois e chegava a vez de Yanaho.
— Vê se consegue voltar ao que era, rapaz — sinalizou Tomio — A reta final é o último momento onde você deve relaxar.
O garoto apoiou a lança no ombro e respirou fundo. Observou o campo, e encontrou as lanças mais distantes, pouco depois das árvores. Dando três passos, ele arremessou o projétil com um grito de esforço.
A lança caiu sobre as árvores mais ao fundo da floresta, levantando suas folhas. O garoto começou a contar os passos, porém foi interrompido.
— Dá para ver daqui que você atirou mais longe que o resto, rapaz. Volta para os outros, seu trabalho aqui acabou.
— Muito bem, Yanaho — comentou Katsuo.
No decorrer da fila, Katsuo estava logo antes de Yukirama, que tocou em seu ombro para chamá-lo.
— Saia da frente, você não se importa de eu arremessar primeiro né? Katsuo — sussurrou passando à frente do garoto.
— Espera, eu me importo sim e… — cochichou tentando impedir.
— E vai fazer o que? — a provocação de Yukirama, interrompeu completamente o garoto. — Olha e aprende — disse Yukirama, olhando para fila atrás dele enquanto sacava sua lança.
Com um grande impulso, Yukirama repetiu o mesmo movimento de seu rival e atirou a lança mais alto, cruzando a lua no céu. Fincada no chão, ela ultrapassou todas as outras antes arremessadas. Todos ficaram boquiabertos, enquanto Katsuo reparava em Yanaho, longe da fila, com os olhos fixos na lança que caiu mais longe que a sua.
No decorrer dos dias, a expedição chegou a uma montanha.
— Os primeiros a chegarem vão mostrar pra gente que suportaram de vez a sobrevivência — se lembrou Yanaho das palavras dos tutores, ao passo que escalava.
“Se eu manter esse ritmo com certeza serei um dos…”, interrompia seu pensamento percebendo Katsuo escorregando.
Prontamente, Yanaho desceu alguns metros da trilha para socorrê-lo. Puxou o amigo para terreno firme, quando na volta, percebeu Yukirama, agora mais adiantado.
— Não precisava, Yanaho — limpou a lama de seu rosto — foi só um deslize!
— Um deslize aqui e você pode morrer — reparou que Katsuo mancava — Quer saber, vou ficar com você senão não vai chegar lá nunca.
Quando finalizaram o trajeto, percebeu que havia já algumas equipes descansando.
— Quem foram os primeiros? — perguntou Yanaho.
— Adivinha… — brincou Umi, apontando para um mirim mais alto que conversava com os outros — Chega a ser injusto. Se meu pai fosse um médico eu também ia saber controlar melhor minha cura para aguentar essa droga.
— Isso não tira o mérito do Kento. Ele estudou muito, já chegou aqui letrado. Você sabe que a profissão do pai não faz o filho melhor do que ninguém — comentou Yanaho.
— E por falar nisso, Jin ainda não chegou — completou a garota ajeitando seu curto cabelo.
Aos mirins restava passar aquela última noite na floresta, produzindo um bom acampamento. Os grupos recolhiam madeiras e suprimentos, enquanto Arata os avisava do crucial.
— É melhor não serem encontrados com feridas, hein! Este teste é pautado em vocês acabarem ele apenas com cicatrizes. Não podem se dar ao luxo de serem Senshi’s, se falharem em se curar. Precisam aprender a acelerar o processo usando a energia iro de seu sangue. Senão, não poderão ter isso — apontou para uma marca em seu pescoço, o selo de Senshi.
Com a partida do tutor, nas tentativas de criar uma fogueira com madeiras úmidas, feridas não iriam escapar das mãos dos jovens. Assim que Yanaho terminava de aprontar o fogo, mãos brilharam com seu iro, regenerando os machucados.
— Até que enfim acabou. Agora é só dormir — respirou fundo, se deitando com os olhos voltados para o céu — E amanhã, vai dar tudo certo.
— Eu não vou passar — murmurou Katsuo.
— Não fala isso. Estamos bem e ainda temos tempo até o exame.
Seu companheiro levantou a calça, mostrando seu joelho ainda machucado.
— Eu tentei usar meu iro, mas não consigo! — levantou a voz, apontando.
Yanaho viu a ferida de perto e colocou suas mãos sob o joelho do amigo
— Isso não é pra mim mesmo — resmungou Katsuo — De que adianta?
— Eu acredito que tudo tem um propósito. Se está aqui, é por que precisa continuar em frente.
— E você, está seguindo em frente também?
— O que você acha? — tirou as mãos, curando Katsuo completamente.
— Obrigado, Yanaho — os dois sorriam um para com o outro.
Com o amanhecer, os membros do internato retornaram da longa jornada. Liberados para descanso, alguns sequer saíram dos dormitórios o dia todo. Próximo ao pôr do sol, Yanaho andava pelo complexo quando encontrou outros mirins reunidos onde estavam os alvos públicos para tiro ao alvo.
— Yanaho — acenou Jin, o chamando — A lista sai daqui a pouco. Fica por aqui
— Depois desses dias vocês querem atirar?
— Eu só tô aqui vendo. Yachi disse que seria melhor esperarmos competindo, sabe como ele é né? Olha — apontou — agora é a vez do irmão dele.
O mirim atirou, acertando próximo a lateral, longe do centro.
— Já disse para relaxar os músculos, Nakama — comentou Yachi — Porque não mostra a ele, Yanaho?
— Bom, tudo bem — consentiu Yanaho recebendo o arco de Nakama — Ei, Yachi, quem você acha que vai passar, além de você, Yukirama e Usagi?
— Está querendo saber se vai ser selecionado? — riu — Yanaho, você teve as melhores notas nos últimos dois anos. Duvido que uma semana vai te colocar mal. Ficaria mais preocupado com quem você vai ser emparelhado.
— Mas foi por isso que perguntei — respondeu respirando fundo e relaxando os músculos, terminando seu tiro, acertando um pouco acima do alvo — Queria alguém para me ajudar com Katsuo.
— Os professores costumam sortear os melhores e deixar os piores para escolha livre. Então mesmo no sorteio, você vai cair com alguém capaz — disse Yachi, pegando o arco de volta
— Eu só não iria querer um fracote junto comigo — provocou Jin.
— Duvido que você fique entre os selecionados, com todo respeito, Jin — comentou Yachi, entregando o arco a uma garota na fila.
— Como se eu me importasse — respondeu Jin desviando o olhar.
Todos pararam de conversar para ver a garota que atirou a flecha bem no alvo.
“Essa é a Masori. Uma tentativa só”, percebeu Yanaho, vendo a garota devolver o arco e seguir seu caminho sem dizer uma palavra.
Eles admiravam o disparo, quando um Senshi pendurou na parede do dormitório onde estavam a lista. Um dos mirins reparou e chamou a todos, que correram para ver a configuração das duplas. Yanaho passou pela pequena multidão quando congelou ao ver seu nome junto com outro conhecido.
— Isto, só pode ser brincadeira — engoliu seco — de todos que eu podia cair para a primeira prova, será logo com você… Kazuya!
Ilustradora: Joy (Instagram).
Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.