Nisōiro Brasileira

Autor(a): Pedro Caetano


Volume I – Arco 3

Capítulo 17: Os Hanmã

Suzaki aguardava as novas instruções de seus superiores tocando sua ocarina em seus aposentos, quando um Heishi entrou no escritório de Daisuke com urgência. Seus gritos puderam ser ouvidos pelo príncipe que estava no andar de cima e não demorou muito para o mesmo ser chamado de volta a presença do mensageiro do império.

— Suzaki, tenho boas notícias! Uma oportunidade chegou à nossa porta, felizmente.

— No que eu posso ajudar? O que aconteceu?

— Uma das princesas Kiiro foi raptada. Venha chegue mais perto — pediu, apontando para o mapa na mesa — Osíris vai adiantar sua campanha militar para forçar os Aka a devolverem sua filha.

— Os Aka estão diretamente envolvidos?

— Os homens identificados no sequestro tinham olhos vermelhos e vestes escuras. Seria muito exagero pensar isso?

A descrição dos sequestradores despertou memórias em Suzaki, que olhando para o mapa, começou a ligar os pontos do incidente. Durante sua fuga de Midori, homens do reino Aka com as mesmas roupas disseram algo semelhante.

Tudo isso para uma criança mimada…”

— Durante minhas viagens, encontrei um grupo de bandidos que batem com essa mesma descrição. Na época, pensei que estavam atrás de mim. Agora vejo que as rotas que usavam perto do deserto, usando a Floresta Negra como escape, tudo já era um plano para isso — apontou os lugares no mapa correspondentes.

Pegando o mapa em sua posse, com as marcações que fez em suas viagens, Suzaki traçou linhas, ligou pontos e deu seu veredito.

— Eles devem ter fugido por aqui de volta lá. Estarão protegidos pelo ambiente, pelos Midori logo atrás e principalmente por uma rota de fuga confiável que leva até o Reino Aka.

— Excelente, Suzaki. Viu, suas viagens poderiam ser mais úteis se ficasse nisso e não nessas suas amizades duvidosas. Nosso acordo inicial com Osíris era ajudá-lo nessas incursões aos Aka e com esse sequestro temos a chance perfeita de fazermos um acordo duradouro.

— E como seria isso? — olhou para o território Aka e reconheceu a região circulada — O local de ataque dos Kiiro será essa região? Conheço ela, é um lugar fronteiriço a cidadela que descobri no Índice.

— Nossa própria força militar, resgatando a princesa, vai se aliar a Kiiro para derrotar o exército inimigo. A região do ataque se chama Vila da Providência.Teremos uma boa parte daquilo quando os Aka caírem sob nossos pés.

— Um conflito ali seria devastador. Aqueles moradores são inocentes — tomou seu mapa da mesa.

— Por favor, Suzaki, já discutimos sobre isso — jogou os braços para o alto, reclinando-se na poltrona.

— Onde estão Onochi e o aluno dele?

— Aqueles dois? Osíris mandou prendê-los há pouco tempo, acusados de terem ajudado no sequestro.

— O quê? Estão cometendo um erro — tentou sair da sala, mas Daisuke levantou-se para interrompê-lo.

— Suzaki, Suzaki, digamos que você os ajude e depois? Pensa que vai ficar mais um dia sem revelar para eles quem é de verdade? O que vão pensar de alguém que mente para os próprios amigos? — disse Daisuke, colocando as mãos nos ombros de Suzaki e sussurrando — Vai mesmo trocar a sua família por essas pessoas?

— Desculpe, eu não quis dizer isso.

— Está na hora desse faz de conta acabar, eles não são seus amigos. Sua família é a sua amiga. Seu pai tem grandes planos para você e para este continente. Jogando isso fora, não sabemos quando a oportunidade vai aparecer de novo — pegou algo do bolso e colocou na mão direita do príncipe — Isso é um instrumento de guerra. Quando estiver na floresta, nossas tropas na região vão estar esperando ouvi-lo para começar a incursão.

Midori está tomada de gangues e já buscam por mim. Como pretende fazê-los chegar lá?

— Ainda tem muito o que aprender sobre o mundo, jovem alteza — riu — Nossos vizinhos verdes são bem permissivos quando o assunto for dinheiro. Não se engane, nossas tropas já estão posicionadas e aguardando ordens. A diferença é que elas virão de você. Pode se reagrupar com eles, resgatar a princesa e irem juntos para Aka pela rota que encontrou. Isso é o que seu pai quer de você, alteza.

O príncipe segurava o objeto com força, olhando fixamente para o instrumento em suas mãos. Ele tinha um formato de um chifre, com ornamentos dourados, mas pintado de azul como sua própria jaqueta. Um instrumento de sopro como sua ocarina, embora maior, capaz de fazer um som alto e grave o bastante para ouvirem de grandes distâncias.

— Pode contar comigo — respondeu.

— É isso que queria ouvir. Bom garoto! Vou deixá-lo até resgatar seus amiguinhos. Chame-os para ajudar se quiser, mas não esqueça que a refém deve estar nas nossas mãos no final de tudo.

Naquela mesma tarde, um grupo se reunia após atravessarem uma rota abandonada. A escuridão da mata obrigava-os a iluminar o local com suas tochas. O caminho de terra se mesclava às matas, bloqueios feitos de restos carruagens e barreiras roídas pelo tempo, quando atingiram seu acampamento.

— Senhor Isao! — saudou os recém chegados.

— Tudo foi de acordo com o planejado! — outro se aproximou. 

— Cadê a garota? — perguntou o chefe. 

Isao foi conduzido a uma caverna. Na entrada estava outro membro da organização sentado, garantido que a princesa permaneceria presa. 

— Então aí está você, perdeu a diversão na madrugada — disse Sota bebendo um líquido com um cheiro amargo. 

— Isso aqui não é brincadeira — disse Isao, entrando na caverna.

— Ela acordou já faz um tempo. Não parava de gritar e chorar, mas eu fiz ela se acostumar com a coleira — disse o criminoso apontando para o fundo da caverna onde Hoshizora estava sentada com a cabeça sob os joelhos. 

— Pegue algo para alimentar ela — ordenou ficando a sós com a refém — Saudações alteza, já lhe deram boas-vindas? — levantou sua voz. 

— Me deixa em paz. Eu só quero sair daqui. 

— Deve ser difícil viver com um pai como o seu. Ele lembra um pouco o meu. Uma coisa que ele sempre me ensinou, é que numa luta, sempre temos que atacar primeiro.

— Por que disso? — sussurrou — Sabe que pode causar uma guerra. Muitos podem morrer, Aka e Kiiro — disse levantando a cabeça.

— O seu destino e de todos vai depender de como seu pai agir. Quando for mais velha, se tiver sorte de viver até lá, vai entender que é assim que o mundo funciona: o trabalho mais importante é sempre o mais ingrato — disse, indo embora quando outro membro chegava para alimentar a capturada. 

Saindo da caverna, Isao sentou-se sozinho perto de uma fogueira até que um subordinado sentou-se ao seu lado: 

— Esse lugar além de tenebroso é um lixo, nem meio-dia fica muito claro. Estamos arriscando demais com isso. Mal dá para nos defender assim.

— É tarde para questionar os planos agora, Takeda.

— Só tô perguntando se tu tem algum plano reserva. O patriarca tem cara de ser louco o bastante para continuar com a invasão sem filha e tudo.

— Quando o assunto é família, todo mundo fica fraco, até os Kiiro. Então seja lá o que estão planejando, vamos descobrir logo. A garota será nossa moeda de troca.

— Queria ter essa confiança toda — se levantou, espreguiçando — Eu ia te pedir para dar no pé para a capital e ficar de olho nos Senshi’s.

— Você é muito valioso para precisar de permissão minha. Só vou pedir que assim que souber de alguma coisa, volte para nos ajudar.

Takeda se despedia, quando o céu já estava recheado de nuvens tímidas prenunciando a noite.

Longe da floresta, Onochi galopava de sua quase prisão para o reino das árvores vermelhas de outono. Foi então que ele tinha chegado no coração do território Aka.

“Irmão, eu espero que você possa saber o que está acontecendo de alguma forma”, pensou, chegando em seu destino, a base das autoridades Aka.

Os Senshi’s o receberam com pressa, levando-o às suas lideranças. Com vestes vermelhas sofisticadas, um homem de barba feita, cabelo acima dos ombros, sentado em uma mesa larga saudava o visitante:

— Esperava uma negociação rápida, só não tanto — se levantou, ao notar a seriedade no rosto do sujeito.

— Eles estão vindo.

— Então era pior do que pensava. 

— Como o Senshi Supremo não me contou que homens de olhos vermelhos raptaram a princesa mais nova da dinastia.

— Caso suspeite de nós Onochi, saiba que essa notícia é surpresa para mim também.

— Quem são os responsáveis por isso então? Deve saber de alguma coisa!

— Primeiro me conte sobre o ataque dos Kiiro — disse ao tempo que se retirava da sala sendo acompanhado pelo homem de vestes brancas — Temos tropas a avisar. 

— Seu alvo é próximo das regiões Shiro. Ryoma, precisamos nos antecipar antes que vidas inocentes sofram. Sinto que Osíris esconde algo perigoso.

— Se o poder que guarda nas mãos for devastador como suspeita deve ser por isso que a princesa foi raptada. Imagino que eles tenham agido por antecipação. 

— Eles quem?

— Os Hanmã, uma organização independente da hierarquia militar de nosso reino. Usam túnicas acinzentadas justamente para demonstrar essa neutralidade. Capazes de qualquer atrocidade, se julgam o que beneficia os Aka no fim. — se aproximaram de uma carruagem.

— Beneficiar? Eles só colocaram o reino em maior risco.

— Depende do ponto de vista. Fato é que o avanço deles veio numa hora inoportuna e terei que preparar a região para isso — a autoridade abria a porta do veículo. 

— Supremo, sinto insistir, porém sem saber onde eles estão não vai ter resgate.

— Nós investigamos os Hanmã por anos. Teremos um plano de busca. Peço apenas paciência — colocava um de seus pés para dentro — Você vem? — convidou Ryoma, ao tempo que o Shiro obedecia.

Em outro lugar da Floresta Negra, três jovens subiam uma ladeira íngreme quando o sol já se despedia. Um deles parou tentando capturar o exato momento no qual o corpo celeste encostou na borda do horizonte cor vermelho alaranjado. 

— Yanaho — chamou atenção do garoto que se virou — Estamos quase lá.

— E para onde estamos indo? Já estamos há horas aqui  — perguntou ofegante, limpando o suor da testa.

— Não consigo dizer onde os sequestradores estão acampados, apenas que estão aqui. Conheço alguém que pode nos ajudar e estamos perto — disse, enquanto acompanhavam a margem de um rio com uma forte correnteza.

“Ele parece querer ajudar, mesmo assumindo ter nos espionado. Pode estar agindo por interesse, mas que interesse teria por Hoshi? Odeio admitir, mas ele é o que me restou para resgatar minha irmã”, refletiu a amarela. 

— Chegamos! — apontou Suzaki sorrindo para uma cachoeira.

— É pra gente tomar banho? — perguntou Yanaho.

— Idiota! — indagou Yasukasa se sentando para descansar. 

— Ele que apontou para a cachoeira! 

— Na verdade é um ponto de encontro — respondeu Suzaki — Agora tenho que ir mais a fundo da mata para encontrar um poço.

Então o trio ouviu algo se esgueirando entre os arbustos.

— Não precisa se esconder, sou eu — comentou o príncipe.

— Suzaki! — um garoto com cabelo liso e verde saiu correndo em direção ao príncipe — Eu disse para não voltar aqui tão cedo! — pegou em seus ombros.

— É bom te encontrar sem procurar muito, Mitensai — disse o afastando o suficiente para o garoto perceber seus companheiros.

— Era só o que me faltava. Ainda trouxe amigos de outros reinos para cá?! Você está doido.

— Quanta covardia — respondeu Yasukasa se levantando, soltando o cabelo. 

Reparando na princesa, o jovem Midori piscava seus olhos sem parar, na tentativa de entender quem estava diante dele. 

“Não sabia que anjos eram amarelos.” 

Sob a luz da lua naquela noite, o grupo atualizava Mitensai dos acontecimentos ao mesmo tempo que retomavam suas energias comendo e descansando.

— Sei. Então a área reservada na floresta negra realmente era pros Aka. Não lembro da Gangue ter bons acordos com os vermelhos — disse o garoto levando a mão ao queixo. 

— Queria saber se você viu alguns deles, onde eles poderiam estar e como poderíamos recuperar essa garota sem muita confusão. 

— Então, eu sabia onde estavam, mas se moveram tem uns dias. E sobre as outras perguntas, não tem como. Faz tempo que não passo nem perto de lá, é escuro demais. Vai dar confusão, com certeza.

— Poderíamos usar nossas auras para iluminar — sugeriu a princesa.

— Isso denunciaria nossas posições — contrapôs Suzaki.

— Eu não tenho medo de um combate.

— Sua irmã estaria indefesa. Yanaho seria a melhor alternativa.

— Quem? Eu? 

— Quando estava aprendendo sobre a energia Aka, descobri que os usuários dessa energia podem sentir a proximidade de um parceiro da mesma cor, desde que canalize a energia de forma correta — lembrou.

— Eu nem sabia que esse moleque tinha aura — reconheceu Yasukasa —  Isso explica o Shiro com ele.

De pé, Yanaho respirou fundo, encostando seu punho em seu peito e emitiu um brilho vermelho que tomou primeiramente seus olhos, percorrendo o resto do seu corpo suavemente. 

— Que incrível! Nunca vi uma vermelha assim — comentou Mitensai. 

— Agora concentre-se na mesma sensação que está em você, depois ao seu redor. 

Com os olhos fechados em alguns segundos de concentração, Yanaho sentia uma sensação de poder vindo de uma direção.

— Ali — apontou, ainda sem abrir os olhos.

— Que incrível! — comentou Mitensai.

— Muito bem, Yanaho — se aproximou Suzaki colocando a mão em seu ombro. 

— Obrigado — abria os olhos ao tempo que os dois sorriam um para o outro — mas… Ainda não acabou, temos que salvá-la!

 


Ilustradora: Joy (Instagram).

Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.

   

 



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