Volume 1

Capítulo 9 : O tempo Cura, ou você Muda.

Dia 44 do mês 3 de 182 Rei Rubi, Palácio de Rubi, Reino de Janfor.

6 horas, um trio de garotas dorme em cima duma enorme cama abraçadas. O quarto era simples e arrumado. A coberta era leve e vermelha. O quarto estava ficando mais claro aos poucos, havia uma fresta na cortina da janela. A luz acerta diretamente nos olhos fechados das garotas.

— ...alguém apaga o Sol... — reclama a garota do cabelo rosa.

— ...eu não tenho tanta magia... — murmurou a garota do cabelo azul.

— ...humm... irmãzona Mirai fecha a janela por favor... — pede a garota do cabelo vermelho.

— ...vai você...

— ...irmãzona, por... hum? Irmãzona Mirai? — a princesa abre seus olhos e ignora a luz nos olhos.

— Mirai? — sem ter combinado Yutyssia reage da mesma forma enquanto repete o nome da amiga.

— ...que? — a garota em questão era a única ainda confusa.

— Mirai!

— Irmãzona!

Duas garotas abraçam fortemente a garota ainda sonolenta, elas esfregavam levemente o rosto como se fossem dois cachorrinhos. Um som estranho veio do quarto ao lado. A aporta foi chutada com força e quebrou, a responsável uma mulher do cabelo azul com um pouco de baba na boca, cabelo bagunçado, olho vermelho e um pijama meio caído olhou para a cena.

— MEU ANJINHO!!!

Naquele momento, toda a qualidade da cama foi testada. A mulher pulou em cima da cama abraçando com suas forças as três garotas. As pessoas do castelo foram forçadas a acordar com um grito nesse dia da mulher seguindo do pedido de socorro da garotinha.

— SOCORRO AR! EU TE AMO, NÃO VÁ EMBORA!

Gritar por socorro não a salvaria, naquele ritmo ela poderia morrer do amor sufocante vindo das 3 direções. Com toda a gritaria, servas do castelo correram para o quarto em pânico.

“ Aconteceu algo! ”

As servas chegaram no local, apenas para ver 3 mulheres sufocando uma garotinha completamente saudável. Com um suspiro das servas a calma quase ficou no local.

Vindo do quarto ao lado uma mulher andava, com seu cabelo rosa bagunçado, sem emitir barulho. Um frio dominou o local, as servas começaram a tremer, quando olharam na direção, Helena estava lá com um olhar perigoso. Ela andou até a porta, como um assassino procurando sua vítima, seus olhos pareciam os mesmos dos dragões dos mitos.

— NÃO ATRAPALHA O MEU SONO E VE SE NÃO SUFOCA A MINHA FILHA, SUA FILHA DA PUTA!!!

Enquanto toda a gritaria acontecia, Miria olhou para as pessoas sufocando ela.  Havia lagrimas nos olhos das pessoas. Foi sufocante respirar e mesmo assim, apenas suspirou e aceitou a situação. Sua vista estava embaçando, ela mesma derramava lagrimas quando se deu conta. Era uma sensação boa, um alivio.

“ ...obrigado...”

Os pensamentos dela não iam para nenhum lugar, foi apenas o suficiente para agradecer. Sem nenhuma cortesia, mas com toda vontade. Aquelas palavras nunca sairiam da sua boca.

Quando todos foram tomar um café da manhã, a Rainha Akas estava cansada. Além da insônia da noite, ela tinha claramente chorado com os resultados da punição do seu filho. Seu rosto era péssimo, quando enfim dormiu ela ouviu gritos do castelo. Agora, com uma voz sem elegância, uma dor de cabeça e a uma mão girando a colher no café, ela sem nem mesmo levantar a cabeça falava:

— Tem como não fazerem barulho? Filha para de usar os convidados como poltrona.

— Não! A Yuty e eu vamos ficar juntas! — a resposta da princesa recebeu um abraço da Yutyssia.

— Ela é fofinha, confortável e gostosinha de abraçar, não posso julgá-la — Mirai defende a amiga.

— Mas você é ainda mais fofinha, muito mais confortável e extremamente mais gostosinha de abraçar meu anjinho! — a mãe forçava a filha sentar no colo dela, Mirai se sentiu em uma cadeira com almofadas fofas e confortáveis na cabeça.

— Por que eu estou tendo que ver isso?

— Eu também não sei, mas no final elas estão felizes, não é?

A dupla das mães mal-humoradas por serem acordadas se perguntava.

— Hummm... agora eu queria abraçar minha filha...

Sem dizer nada, Akas realmente tinha a mesma vontade, mas ela acabaria ficando um tempo longe da sua filha pelo andar das conversas da noite anterior.

“ Pedra falsa... meu filho, eu... eu errei aonde? ”

Enquanto a Rainha pensava nos resultados, Sara tomou um gole do café antes de beijar o topo da cabeça da sua filha e falar com ela.

— Como foi a noite anjinho? Teve... algum pesadelo?

— Não. Por quê? Aliás, por que não estamos em casa?

— Tem a ver com o fato de você só olhar para baixo e não ter olhado diretamente para ninguém ainda e manter seus olhos fechados a maior parte do tempo fingindo estar cansada e com sono.

—  ...

A resposta da criança veio das sombras, uma mulher saia dali. Completa de preto e com seu olhar vazio, Clara invadiu a sala. A enfermeira encarava a criança, não era possível dizer se ela dormiu em algum momento, sua aparência era perfeita e a mesma da noite anterior, mas a dúvida das pessoas era outra: “ desde quando ela estava observando tudo? ”

— Mirai?

— Irmãzona?

Duas mãos pequenas seguravam a camisa da Mirai, as perguntas vinham respectivamente da Yutyssia e Iris. Ela não olhou as mãos, mesmo com elas puxando sua roupa levemente. Seu corpo começava a tremer.

— ...filha você —  

— O silencio é a sua maior resposta sabia? — Clara sem medo interrompia Sara.

A mãe apenas abraçou sua filha em silencio, sem querer falar mais alguma coisa.

— Consegue dizer o que sente? Teve algum pesadelo? Sente alguma dor?

— Eu ...

“ Nunca consegui contar sobre as visões, não será diferente agora. ”

— ...quero voltar para casa, só isso.

Ela olhou as pessoas perto. A primeira coisa em seus olhos foi o cabelo da sua mãe, depois a rosa da amiga, mas quando chegou o vermelho da princesa, sua reação mudou drasticamente.

 Sua respiração ficou irregular, olhava com medo para a pequena princesa. A criança tinha olhas gentis e mesmo assim estava sem ar, seu corpo parecia frio.

Sua mãe segurava da forma mais gentil possível e beijou o topo da cabeça dela. Com um suave e baixo tom, ela sussurra para sua filha.

— Não precisa falar, eu garanto vou estar com você sempre, você está bem, a Iris não fez nada.

A sua respiração melhorava com as palavras, mas sua mente encontrou um problema diferente.

“ Ela... ela vai me deixar? ”

Sua mãe não apareceu na visão.

“ ... por que? ”

Não eram muitos anos à frente.

“... quando? Como? Mamãe... ”

Era apenas uma mãe tentando confortar a filha, se foi um pesadelo ou um trauma o tempo diria. Uma filha agarrava as roupas da mãe com o medo da morte, mas não a própria morte.

— Eu estou aqui bebe, mamãe não vai sumir.

“ ...mentira. Mamãe... mamãe... não estava lá. Mamãe vai ... vai morrer...  Eu não vou mais ver a mamãe... quando? Quando não vou mais? Quando vamos nos separar? ”

— Quero ir para casa...

A garota não se lembra direito do que aconteceu depois, ela se lembra de ter ouvido a Iris e Yutyssia, mas não conseguia entender nada só estava pensava em uma coisa naquele momento.

“ Não vá... ”

 

 

Sua rotina mudou, não sorria mais como antes. Era como se não valesse a pena investir em uma mentira, quando tentava as pessoas notavam e olhavam com tristeza. Estava sem nenhuma responsabilidade e mesmo assim, nunca foi tão alegre quanto antes.

Era como alguém recentemente resgatado da morte, passando por alguma reabilitação em um psiquiatra. O dia todo tentava passar o máximo possível com sua mãe, em seu colo ou ao seu lado. Se ela estivesse ocupada observava em silencio, se estivesse livre conversavam ou brincavam.

Havia dois problemas. Todos os dias, em algum momento ela caia no chão, desmaiada. Sua Queda de Mana era constante. Clara apareceu 1 vez por dia para verificar e garantir sua segurança, foi necessário preparar um quarto para uso dela.

O segundo problema foi seu medo. Não conseguiu ver um homem na sua frente, assim como White previa, ela não conseguiria interagir com eles durante um tempo. Suas recomendações foram para não forçar interações durante algumas semanas e voltar aos poucos apenas quem ela mais confiava.

Yutyssia praticamente morou naquela casa depois do ocorrido e Iris começou a aparecer em sua casa constantemente. Elas foram em partes a única forma para tirar Mirai da sua mãe por um curto tempo.

Mirai as vezes ouvia as conversas escondidas das pessoas. “Seu medo parecia muito seletivo ”, “ Ela contraiu androfobia   ”, “ A doença dela vai matá-la em breve ”. As fofocas corriam pela mansão.

Ninguém saberia seu motivo da doença atacar tanto recentemente, mas aquilo era como uma estranha forma de desculpas no final. Foi como se fosse alguém ajudando a própria Mirai a se recuperar.

A primeira visão tinha vindo eventualmente e sempre foram o motivo da sua queda de mana. Naquela visão descobriu mais do próprio dom.

“ O que? Não! Para, apenas para! Para com isso! ”

A visão tinha obedecido ao desejo, mas isso não a impediu das sensações e emoções do momento, muito menos a impediu do gasto completo da sua magia durante o momento.

“ ...quente? Por que, tudo está... bem... ”

A visão era algum dia daqui em alguns anos. Uma garota com cabelo rosa abraçava ela, pendurada em suas costas. Lembrava uma versão da Yutyssia maior. Era estático, a cena nunca mexeu, sem som, só as cores e as emoções.

O Sol agradável, a grama levemente molhada, tudo era muito mais notável. Com o tempo parado ela podia ficar muito mais tempo presa em suas visões observando o cenário inteiro.

“ ...eu posso ficar aqui? ”

Sem ninguém saber ou ter como descobrir, onde não era preciso dizer se existia ou se não existia  em primeiro lugar, ela parou e ficou sem fazer nada. Ali começou a acumular mais e mais tempo de vida.

Um dia se passava para os outros, mas não para ela. Seus dias viravam semanas, apenas pouco antes da beira do desmaio, ela cancelava a visão tentando evitar uma queda total do outro lado.

As vezes a visão mostrava uma garota como a Iris rindo com ela. Outras vezes ela estava sentada frente a sua mãe tomando chá e comendo alguns doces.

Sua mente e seu corpo não possuíam mais uma sintonia. A cada dia, o tempo acumulava mais e mais, aos poucos, meses e anos se acumulavam em sua mente e não em seu corpo.

Agora suas visões sempre mostravam um momento alegre diferente, um confortável e doce local. Cada cena foi como uma fotografia. Sentia a alegria, o conforto e a paz.

As vezes tentava deitar e dormir durante as visões, por quem sabe quantas horas ou dias. Cada nova visão seu tempo era mais longo sem perceber.

Ainda mais tempo podia ficar e ainda mais tempo acumulava.

Lá onde não existia o som, apenas do tato.

Onde não havia medo, somente a paz.

Podia dormir, sem ter hora de acordar.

Podia pensar, sem se preocupar com os olhares.

Podia existir, sem temer o próprio destino.

Não precisava de mais nada, ali tinha tudo que queria.

E cada vez mais tempo acumulava e ainda mais durava cada visão.

Tudo para poder ter, cada vez mais um segundo de paz em sua vida antes do final.



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