Volume 1

Capítulo 9: A Garça Desditosa no Teste de Marcar

Há poucas respostas para tanto mistério ao redor do mundo. Acho que a humanidade, em geral, não sobrevive sem um. As lendas primitivas de vários povos ao redor do planeta relatavam que um mistério gerou toda a nossa existência, enquanto as outras raças se originaram de outros fatores.

Eu não acreditava que só eram os humanos. Pois os olhos âmbar de Fainara, naquele momento, pareciam agitados, à procura de alguma resposta definitiva no meu rosto. A procura da resposta.

Todas as raças do planeta, seja flemeios ou humanos, extrovertiam a ânsia pelo mistério nos pequenos atos. A origem resumia a transformação das eras, não era à toa que o Estado da minha nação queria tanto moldá-lo pelo tempo. Seja matando quem ia contra os cidadãos, seja opositores. 

Foi isso o que comecei a pensar ao ver o rosto dela.

— O quê? — Ela não entendeu o meu sussurro.

—  Está brincando com a minha cara, Fainara?

— Mas por quê?

— Não se faça de desentendida. Sei que está desconfiada de que vou puxar alguma lâmina e começar a apunhalar a sua família ou invocar um dragão imortal milenar pra escapar pela janela. É por isso que você não dormiu até agora, né? É por isso que vive me observando. 

— Eu não pensei em nada disso. Eu acordei agora porque você gritou.

É, aparentemente havia uma escuta no quarto. Não pense que isso é uma possibilidade louca, leitor. Estamos falando de uma época onde pedras falam, fogueiras andam e macacos formam gangues para perseguir humano numa floresta. Ser espiado como se estivesse num reality show não iria me assustar nem um pouco. Talvez o apresentador do programa estaria debaixo da cama do quarto.

— Você está nessa porta há quanto tempo? — cruzei os braços.

— Há uma hora, mais ou menos.

— Por acaso você é uma psicopata!?

— Só estou garantindo a segurança de todos.

Balancei o rosto, decepcionado. Parece que aquele confronto do dia anterior só agravou a desconfiança dela.

— Dormir é opcional aos flemeios, né? — disse eu. — Quando os fios não estão acesos, o corpo já traduz como um descanso leve. 

— Me pergunto como você sabe disso.

— Existe vida fora dessas terras, sabia? Todas as raças ocupam o mundo em diversas áreas. O estranho seria se eu parasse aqui e não soubesse quem diabos são as lamparinas andantes.

— Então fala de que nação você veio. — Ela cruzou os braços e levantou um dos cantos da boca. — Aqui não há muita informação sobre os forasteiros, sabe? 

É impressionante a minha habilidade em me botar no perigo.

Eu não cairia naquele teste de quinta.

A verdade é que, se eu entrasse na disputa com ela sobre noção geográfica, seria uma batalha assimétrica. Alguns povos do território já poderiam ter uma noção das nações dominantes e de vários mapas espalhados pelos estrangeiros. O ensino que tive o mérito de receber não chegava nem perto de abordar as outras origens dos continentes e nações exteriores dali, muito menos quais povos realizaram mais expansões marítimas até o continente Aurora — o da minha pátria. 

Em outras palavras, se eu mentisse, teria uma chance mínima dela ter noção geográfica o suficiente pra captar. Ou se não tivesse, eu teria que ter muita postura e criatividade para inventar um monte de abobrinhas sem esboçar reações estranhas ou gaguejar para não ser decifrado por instintos femininos e ainda enfrentar a possibilidade dela descobrir a mentira mais tarde.

— Sou de um lugar onde pessoas não fazem interrogatórios em plena madrugada. — Comecei a puxar a porta. — Boa noite-

Ela colocou o cotovelo na borda da porta, me impedindo de fechar.

— Espera. Eu não esqueci da sua promessa com relação ao... aquele pensador... 

— Heitaro.

— Exato. E nós ficaremos famosos. E você voltaria a sua terra depois disso? Ou é uma missão sem volta, como alguém que abandona tudo pra visitar um mestre?

— Não tenho motivos pra retornar. Aqui já está horrível o suficiente.

Ela cruzou os braços e se afastou, recostando no guarda-corpo do corredor perto da escada.

— Eu sei bem como é. Não ter motivos suficiente em vislumbrar o passado e ter que conviver com toda essa esquisitice.

Decidi não fechar.

— Que surpresa você achar tudo ao redor estranho. Pensei que nasceu por essas terras. 

— Estou falando da minha família. 

Por essa eu não esperava.

— Quer dizer, não que eu os odeie. Eu os amo. Mas desde que eu comecei a morar com eles, não consegui me acostumar com... você sabe...

— Lavar pratos ao imperador? Limpar o chão dos timens?

— Derrubar gaivotas do céu usando bananas... ou coisas assim. 

Tive medo de perguntar os detalhes das "coisas assim".

— Por que caçar uma gaivota?

— Gaivotas são largos frangos alvos voadores e bananas são poderosas de se arremessar se você tiver fé. É teste de guerreiro anão, segundo meu pai.

Eu sentia que eu iria me lembrar dessa justificativa quando eu estivesse prestes a dormir.

Respirei fundo.

— Talvez eles sejam normais... por outros parâmetros regionais. — Acabei dizendo.

— De início, você pode estranhar o jeito deles. É como escalar uma grande árvore pela primeira vez.

— Uma árvore imensa — retruquei.

— Colossal, cheio de galhos... — Ela adicionou.

— E repleto de ameaças de mortes.

Ela deixou uma risadinha escapar enquanto ocultava os lábios com uma das mãos. Por algum motivo ela achou engraçado o fato de que eu fiz menção as ameaças de mortes que eu levei logo depois da proposta que fiz.

— Digo isso — continuou — porque não sou uma verdadeira filha deles.

— Eu devo ficar surpreso por você não ser filha de dois anões ou é algum tipo de teste? — Ousei dizer.

— Não nesse sentido, idiota. Estou dizendo que não fui criada desde pequena por eles. Cheguei quando eu já era adolescente e banguela. Foi um dia estranho, mas, do pouco que eu me lembrava da tribo de que vim, não fazia diferença.

Como alguém consegue esquecer de onde veio em plena adolescência? Bateu a cabeça num tronco no meio do caminho? Tenho propriedade para falar disso, afinal, na última vez que eu tentei, não deu certo. Ao menos ainda obtive um novo mascote: um galo na minha testa.

— Então estamos em situações diferentes. Me lembro muito bem do que passei antes de encontrar vocês. Ah, como eu lembro. Parece que faz um dia desde que saí de lá e cheguei na floresta... pelo porto, é claro.

Estou brincando com fogo.

Literalmente.

— Estou dizendo que ambos passamos pelo mesmo processo: ser acolhido por eles depois de uma viagem. Eu estava cansada de ver tantos animais e arbustos pelo caminho ao ponto de até ouvir os timens, que me expulsavam de seus sítios com pedras, me xingando já era algo que me dava esperança de algum dia eles não se importarem mais com minha presença vagante. Porém, quase fiquei insana ao ponto de pensar que uma samambaia me xingou durante a noite.

Sinto que eu passaria por isso, com a diferença de que o delírio seria real, pela ocasião que me encontro.

— Foi aí então que vi dois flemeios bem diferentes entre si e próximos da minha idade me seguindo pelo bosque do Túmulo Eterno. Foi próximo daqui que tudo começou. 

— Os animais parecem ser uma opção bem mais viável do que receber pedras em propriedades alheias.

— Pode até ser, mas foi graças a essa ilusão tola de acreditar que os timens iriam mudar que consegui reunir forças o suficiente para visitar vilas e encontrar uma que pudesse me acolher, mesmo que de forma temporária, como foi o caso dos donos dessa hospedaria. A senhorita Chinkapa e o velho Kapirichim foram os únicos que reservaram um quarto para eu dormir depois de tanta viagem. As suas crianças gostaram da ideia e me faziam companhia de vez em quando, mesmo que tivessem medo do meu cabelo quando eu tinha de acender. Então, eu encontrei as pessoas que eu sempre vou amar.

Aquilo parecia tão pueril e artificial. Uma combinação de fatores que eclodiram contra a carência dela. Ficou tão impressionada com o afeto mínimo que recebera dos mercenários que até considerou a rejeição algo que ajudou a reerguê-la. 

Cada vez mais eu entendia o motivo pro governo da minha era persistir tanto na regulação de encontros familiares. O sujeito se torna uma força movida a pequenos acontecimentos para ocasionar em suposições. Não é à toa de que cultuavam tanto o “destino” quase como uma entidade.

Delineei um sorriso exausto e apoiei o cotovelo na borda da porta. 

— A gente pode discutir isso outro dia, que tal?

— Não há nada para discutir... pelo menos até essa missão durar — respondeu, diminuindo a densidade das chamas até ser menor do que minha lamparina. — Só queria te dizer que não há necessidade para tanta preocupação. Ninguém aqui vai te tratar com descaso só por você esconder algum segredo sobre quem é ou o que pode ser capaz de fazer. Não atrapalharemos seus negócios-

— Não sou agiota.

— Claro, claro...

— E eu sou um livro aberto. — Fechei a porta de maneira rápida. Manso o suficiente para não provocar alguma combustão nada-espontânea no meu corpo por motivos de indelicadeza. 

Respirei fundo e fechei os olhos, depois de instantes.

“Está certo”, pensei. “Já acabou, posso dormir em paz. Está tudo encerrado, ela não olhará mais pra mim igual uma águia de Nelino.... ela não...”

Fechei o punho com força. “Mas que...”

Um minuto depois, abri a porta de maneira abrupta.

— Por acaso minha porta é bonita pra cê ficar a noite inteira parada aí?

— Eu não estava a noite inteira... só há quatro horas.

— Aumentou?!

— Desculpe, quatro horas e meia.

Se eu perguntasse mais, talvez chegaria ao ponto dela declarar que me observou dormindo antes mesmo de eu fechar os olhos.

Fainara ainda estava recostada no guarda-corpo. Ela virou para o lado e caiu fora em silêncio até o quarto próximo do meu. Finalmente eu teria um descanso decente depois de conversar com aquela desconfiança encarnada em mulher. Até parece que eu cairia num truque tão barato quanto afinidade com o predador.

Entretanto, algo foi tirado mim...

Eu já estava sem sono. 

                                                                 

Restava apenas uma manhã para o prazo final. Toda falha seria crucial para que meu destino fosse traçado até a bandeja com a maçã na boca destinado ao império de Nelino. Por isso, todo mundo acordou antes do amanhecer. 

É claro que a manhã começaria como uma sinfonia trágica.

Nunca pensei que odiaria tomar banho e comer refeição matinal depois de ficar acordado por um bom tempo, arranjando forças para ignorar a presença das janelas. Céus, aquele baldezinho humilhante de madeira num banheiro que parecia uma jaula de terra fez meu chuveiro do projeto ser algo de uma ilha perdida paradisíaca. Fora que não havia algum sabonete para saborear... na pele. 

Tudo piorou quando pensei que o livramento viria ao pegar um ar livre. Cheguei a caminhar pelo bosque Túmulo Eterno. Parecia um belo lugar para completar a missão, com seu manto de flores douradas sob girassóis nos pés das árvores, mas a família da pesada resolveu ir mais afundo e entrar na grande floresta, na boca do meu inimigo mortal.

Caminhamos por mais ou menos meia-hora até Scholisto levantar a mão, ao ver uma árvore de tronco grosso coberta por um manto de cipó ruivo. Carialista deu um passo adiante, afastou os cipós abaixo do peito do tronco, revelando um símbolo riscado pequeno que, por algum motivo, me lembravam dois pés exibindo os calcanhares frente a uma folha.

— Estranho o símbolo estar tão baixo — disse eu.

— “Tão baixo” quer dizer na altura dos meus pais, né? — Mêrigo findou um olhar incendiário até mim.

— Você que supôs isso.

— Os anões são os únicos autorizados a pedir favores aos chrupiris — respondeu Scholisto. — E também, eles são um pouco mais baixos do que nós.

Eu já sabia que eles eram baixos. A essência física dos chrupiris era contrária aos dos grandalhões da vila. Não é à toa que seus pés eram virados. Agora: “os anões eram os únicos a pedir favores” era no mínimo estranho, já que os chrupiris, apesar de serem vários grupos espalhados com diversos reis e rainhas pela floresta, tinham a mesma natureza de negociar com qualquer raça. 

Então...          

— Aconteceu alguma coisa em especial pra eles ajudarem somente anões?

Todos ficaram em silêncio, focados na árvore.

— Isso só o papai pode dizer — disse Flero.

— Não há tempo para falar sobre o passado. Uma missão nos espera e já estamos muito atrasados. — Mêrigo virou-se até a anã. — Mãe...

Ela assentiu, respirou fundo e deu sequências de socos no símbolo.

— Vem cá: os favores são só para anões ou só para vocês dois? — perguntei. — E por que você tá socando? É uma atitude muito específica pra qualquer aleatório pedir...

— É instinto dos anões socar qualquer símbolo escondido — disse Carialista. — E os chrupiris daqui sabem disso. As passagens secretas dos reinos dos nossos antigos aliados se revelam dessa forma. Contudo, de vez em quando socamos curiosos que querem saber mais do que devem. 

Me afastei lentamente. Eu queria que minha carga dentária estivesse intacta até o cumprimento da missão.

De repente, ouvimos um assobio estridente vindo direto das copas atrás de nós, seguido de um silêncio. Ficamos parados por minutos a espera de algo que recolocasse sentido em toda a nossa expedição no meio do mato.      

— Humano, preste bem atenção: — Mêrigo sussurrava ao meu lado como se ouvisse um predador caminhando nas redondezas. — Olhe ao redor e quero que me diga de onde as criaturinhas vão sair.

— O quê? Cê não sabe de onde...

— Cala a boca e começa a olhar!

Ele tratava aquilo como um caso de vida ou morte. O que era aquilo, um pique-esconde mortal?

— Eu não acho que-

Num lapso, senti um peso recostando na lateral de uma das minhas pernas. As folhas do chão ergueram-se a minha altura, seguido de um vento que soprou nas copas das árvores brevemente.

— Deixa eu te contar um segredo, jovem fogaréu: — a voz era feminina, vinha do lado esquerdo abaixo de mim. —  Aqui nós somos onipresentes. É por isso que você sempre vai perder a nossa aposta de nos olhar surgindo.

— O quê? I-isso é jogo sujo!

Olhei para baixo. 

A rainha.

A dona da voz era uma baixinha morena de cabelos vermelho-acastanhados, com olhos igualmente da mesma coloração, possuindo a mesma característica de traços afiados. Tinha uma coroa com hastes de galhos e três folhas brancas no meio. Trajava um vestido de manga boca de sino esmeralda, ornamentado por um colar de folhas também alvas. O que mais se destacava mesmo nos meus olhos eram os pés virados ao lado contrário. Era até um pouco incômodo de se olhar. 

Mal pude me espantar com a presença dela e vi dezenas ao nosso redor, todos com menos de um metro. A maioria eram homens, que trajavam túnicas marrons com colar de folhas verdes. O único que mais se destacava além da princesa era o idoso que estava do lado da rainha, se apoiando num cajado. Ele era careca, com rosto tão enrugado que impedia de ver os pequenos olhos no rosto, tão pouco a sobrancelha.

— Nossa dependência à árvore é o preço que se paga para obter segurança em tempos de guerra. — A provável rainha fitou o anão. — Não é, Scholisto?

Ele devolveu com um sorriso cansado.

— Há quanto tempo, vossa majestade Rischeta.

— Parece que o vovozinho aí conseguiu finalmente completar o que vocês desejavam! — disse Flero, agachando-se. — Só falta saírem mais de casa... 

— Calado, Flemeio, vocês não são autorizados a falar sem a nossa permissão.

Quando a rainha respondeu, a galera baixinha começou a dizer “é!”, “isso aí” igual uma trupe de papagaios. Como eu pensava. Não eram só os timens que odiavam as lamparinas ambulantes. Tudo se conectava com o antigo conflito. Até me impressionei pelo fato dela fazer uma parceria com o anão, mesmo com os filhos adotivos que ele possui.

— Foi algo trabalhoso — disse o velho. — Às vezes, eu pensava que não iria conseguir graças aos entraves que a mana estrutural fornece. E, se não bastasse tal labor de cinco penosos anos, vinte dos nossos que participaram da alteração da realidade nunca poderão sair daqui.

— Que terrível — disse Flero, depois de se afastar da cotovelada do irmão.

A rainha deu alguns passos para trás a fim de ver meu rosto melhor. Ela delineou um sorriso.

— Arranjou outro filho, Carialista?

— Não. Ele é um...

— Meu nome é Síssio — interrompi. — Prazer.

— Um humano, hein? Eu admiro como vocês dominam sem serem retalhados e metem o nariz em questões que mudam a região. No fim de todos os conflitos, vocês só queriam a parte mais brilhante do ofício. Fazem isso de maneira singela.

— Obri... gado?

— Infelizmente, humano, você está do lado de três flemeios. Logo, todo o respeito que tenho é equalizado. 

— O quê? Por que diabos não faz isso com os anões, também?

— No dia em que você puder encolher até 1 metro e vinte centímetros talvez o seu tratamento seja igual ao deles.

Qual é a ofensa em ter mais de um metro e sessenta centímetros naquela sociedade? Meu pé era uma ameaça em potencial? Destruidor de reinos?

O idoso baixinho pigarreou.

— Perdoe os más modos da minha neta, caro homem. — Ele virou para me fitar ao lado da plateia de pitocos menores que crianças.

— Vovô...!

— Meu nome é Chorioto, sou o Pilar Espiritual da nossa morada, ao lado do Fortificante, que é a minha neta.

— Ainda não arranjaram o “outro pilar”? — perguntou Fainara, que estava agachada, agarrando os joelhos coberto pelas placas da armadura escura.

Rischeta fulminou a flemeia através de um único olhar. O avô balançou a cabeça.

— O Pilar Indicador está vazio por...

— Falta de opções. — A rainha respondeu pelo velho.

Scholisto assentiu para a esposa antes de explicar a eles o que pretendiam, omitindo a parte de que era uma clara afronta as regras do próprio reino e que a cripta tinha a ver com o passado de dois povos, dizendo que era apenas uma masmorra abandonada qualquer.

Pelo semblante de Rischeta, parecia que aquela oferta era interessante.

— Nelino, hein? Aquele moleque não para de ver tesouro em locais estranhos. Desconfio até que ele possui clarividência ou algo assim.

Uma clarividência bem penosa, diga-se de passagem. 

— Bem — continuou. — Eu normalmente procederia dizendo que isso me cheira a extorsão ou uma armadilha pra eliminar flemeios na surdina.  

Por que isso soou tão genuíno?

— Mas, mesmo que não seja um problema tão grave assim, eu ainda me importo com vocês, Scholisto e Carialista, e sei que se importam com... esses aí. Então, eu pergunto: vocês tem certeza que vai dar tudo certo ali? 

A família exótica trocou sorrisos pela conquista que prenunciava perigo. Que diversão, ir pra cripta alheia com a companhia de mais anões (ou Chrupiris, tanto faz) pra peitar criaturas no escuro. Era quase uma viagem a um trampolim eterno na escuridão de uma fossa espinhosa. Mas pra eles, era um verão de fim de semana.

— Com uma condição.

Aquela frase fez todo mundo fitá-la. A rainha ajeitou a coroa e andou entre os chrupiris como uma palestrante que se prepara para subir no palco. Em vez disso, era uma rocha com alguns cogumelos rasos.

Ela apontou os dedos em direção aos três irmãos com cabelos flamejantes.

— EU não confio neles. Isso é óbvio e saber que mais uma entrou pro bando de vocês me deu uma preguiça inexplicável nos meus ombros. Por isso, terão que passar pelo lago marrom para nos fazer um certo favor enquanto nós batemos um papo com esses três flemeios. Considere isso mais ou menos como um teste. 

Um teste.

O desastre eminente em uma palavra. “Teste”.

Maldição, até no passado que só tem mato, inseto, purpurina e fadas ainda tem testes? Pensei que marcar duzentas questões por “c” de confiança e “d” de desespero já faria o universo perceber que eu era péssimo em testes!

A rainha voltou a olhar para mim.

— Infeliz, meu caro?

Tive que alargar um sorriso tão longo quanto uma garça.

— Só no final poderei dizer.

"Se eu não estiver numa bandeja amarrado até o final do dia", pensei, "talvez eu ao menos consiga responder".

 

 

 



Comentários