Volume -5
Capítulo 6: Miasma, O Refúgio dos Doentes
Quase anoitecendo, Abigail, com seu único braço e uma assertividade do tamanho do mundo, adentrou uma pequena taverna na lateral da estrada da cidade, a luz do sol fez com que a sombra de sua silhueta chegasse até o balcão do barman, chamando a atenção de todos para ela.
— Ih! Esse rosto aí é novo na cidade! — disse um dos homens nas mesas.
— Será que é mais um mágico?! — questionou um outro homem.
— Nem ferrando! Esse aí é aleijadinho! Deve ser só mais um coitado! — Exclamou mais um outro homem em uma outra mesa.
A taverna era uma clássica taverna tebaliana, com um aspecto rústico, lâmpadas à gás, absurdamente raro para a época, e por trás da mesa do barman, dezenas de tipos de bebidas, das mais comuns às mais estranhas, incluindo até mesmo o raro e caro Conhaque Feérico, que era basicamente Sangue de Fada Destilado.
Abigail, com todo aquele murmúrio, apenas pensou:
Uh, que desgraça, hm, eu não tô em condição de rebater ninguém aqui, eu não posso me exaltar.
E logo se sentou numa cadeira na frente da mesa do barman. Um homem enorme na cadeira ao seu lado, apelidado carinhosamente por Abigail como “brutamonte”, cuja enorme altura o fazia precisa genuinamente abaixar a cabeça enquanto estivesse na caverna.
— Um lugar cheio de animais como esse, não é muito adequado para uma mulher como você!
— Sim sim, você tem toda razão, eu deveria estar na minha ilustre casa em uma das cidades mais importantes do reino tebaliano, a Cidadela Mágica! mas… nem sempre podemos ter o que queremos. — disse Abigail, levantando a mão para chamar a atenção do barman.
O mesmo homem ao seu lado logo disse:
— Hm, então você veio da Cidadela Mágica? Que… original, mas ainda é muito incrível, então… você foi banida? Ou…
O barman, apressado, logo chegou para pegar seu pedido.
— O que desejas?!
— Eu não quero bebidas, quero uma informação, eu… — Disse Abigail, antes de ser interrompida pelo barman.
— Aqui eu não dou informações, eu as vendo! E seja rápida ao sacar o dinheiro, pois eu preciso atender mais umas 4 pessoas além de você.
Uh, parece que ser bonitinha não foi o bastante para conseguir vantagem aqui. — pensou Abigail, enquanto tirava logo um punhado de notas de Tibras e batia a mão com o dinheiro com força na mesa, chamando a atenção do barman novamente. Abigail logo questionou.
— Você sabe de algum lugar que eles conseguem resolver o problema do meu braço… ou… da ausência dele?
— Eu não faço a menor ideia, nessa cidade não trabalhamos com serviços assim, nem de forma clandestina… sério, acredite e mim… — disse o barman, já esticando a mão para pegar o dinheiro no balcão, quando o homem gigante ao lado de Abigail começou a falar.
— Olha, eu sei.
Ao ouvir isso, Abigail logo pegou de volta o dinheiro no balcão, olhando firme para o barman e dizendo.
— Obrigado. — O barman havia ficado ligeiramente irritado com isso
Abigail se virou para o grandalhão, que bebeu todo o seu copo de bebida de uma só vez, e se preparou para começar a falar.
— Olha, eu diria que você tem duas opções:
— Primeira opção! À leste daqui, no Continente Dourado, existe uma nação… que se baseia unicamente na tecnologia, é a nação mais desenvolvida desse continente nesse quesito! Todos os prédios são metálicos e o seu terreno, completamente terraformado! Eles podem construir uma prótese mecânica perfeita para você! — disse o gigante, abaixando sua cabeça no balcão e levantando o braço para o barman — Mais uma!
— Uh, Leste? Eu passo, eu meio que justamente tô me matando para ir para o Oeste, e outra… essa coisa de reino avançadíssimo, parece idioma demais para ser verdade, igual a teoria dos elfos escondidos no Continente Gelado.
— Ei mulher, o que você ganha por ser tão estupidamente cética? Parece que… ceticismo é a sua religião, não é mesmo? — Ele começou a rir de modo abafado com a cabeça ainda abaixado na mesa.
— Bleh, que seja, ei! Me diz qual a segunda opção! — disse a maga.
O bartender havia chegado com a bebida do homem, que logo levantou a cabeça da bancada para a tomar, e novamente tomou tudo em um gole só, pedindo mais bebida de novo, e voltando sua atenção à Abigail para dizer a segunda opção.
— Ok! Segunda… Opção…!! Há sudoeste daqui, no reino de… uh… nome meio complicado, Ca… Caeli… Pag… Pag alguma coisa, não sei, mas lá… é um reino bizarro!! Cheio de bruxas, psionicos, místicos, invocadores, espiritualistas, xamãs, Lá tem a porra toda! Só a ralé que foi banida da Cidadela! Igual você!
— Ei… eu não sou… ralé…! Mas me diga, o que isso tem a ver com como eu posso recuperar o meu braço?!
— Lá não tem só magistas esquisitos… também tem… cientistas esquisitos! Biomantes Necromecanicos que podem anexar um braço de cadáver no lugar e deixar completamente funcional, microbiurgistas que podem fazer um braço novo crescer apenas com multiplicação de micro-organismos, psiconomistas que podem fazer você crescer um braço novo só com o poder da mente! Genomicistas que podem editar seus genes para isso! O que não falta lá são opções!
— Ugh, obrigado… eu acho. — disse Abigail, hesitante, mas ainda preferindo isso que andar quilômetros à leste em um reino que ela sequer sabia se era real ou não.
O homem logo riu e disse:
— Haha não tem de quê! — E procedeu em dar um “inocente” tapa em suas costas, anexando algo metálico entre o tecido da roupa de Abigail, mas sem que ela percebesse.
Saindo de dentro da Taverna, já era noite, e Abigail se deu conta de algo, quase não haviam mulheres naquela cidade, na verdade, ela não havia visto nenhuma na rua e nem por trás das janelas das casas, mas aquilo não o intrigava à ponto de querer buscar saber sobre isso, então apenas foi explorar a cidade mais um pouco.
Abigail não queria mesmo ter que passar a noite na casa de dois estranhos que ela havia conhecido no mesmo dia, só de pensar em tal hipótese, memórias abomináveis vinham em sua cabeça, a fazendo latejar e deixando Abigail em um estado de trauma e transe temporário, olhando para o nada com um olhar vazio.
Ela adentrou uma pequena e compacta loja nos arredores da cidade. A porta se abriu e pôde-se ouvir o sino que sinalizava quando novos clientes entravam na loja. Mais uma loja de aparência rústica, paredes de muros de pedra, uma iluminária que funcionava à base de gordura animal e um piso de madeira, que ao invés de fazer um barulho rígido, fazia um barulho oco a cada passo como se não houvesse nada abaixo.
Abigail notou isso, mas apenas olhou para o chão por uns segundos, pressionando o pé nas telhas, mas ignorando e voltando a falar com o vendedor.
O vendedor, de aparência velha e bondosa, um bigode caricato que se enrolava para fora e óculos redondos e pequeno. O homem logo lhe deu as boas vindas, mas logo foi cortado por Abigail, que estava apressada para comprar certos itens.
— Você tem… barraca de dormir? Saco de dormir? Algo que me permita dormir fora sem morrer de alguma doença?!
— Oh, não, mas possuímos algumas armas para se defender contra os monstros de fora, for isso que procura!
— Hm, acho que dá pra ver que eu não estou em condições de manejar nenhum arma, mas… você possuiria alguns cajados, ou varinhas… mas de preferência cajados mesmo, sabe?
O vendedor, ao ouvir aquilo, serrou seus olhos em direção à ela, e Abigail logo percebeu a indiferença quanto à pergunta, então questionou na maior ingenuidade e nervosismo enquanto olhava para o lado, fingindo observar os queijos enormes:
— Hm… Uh, eu realmente… hm, queria sacos de dormir, ok? — disse ela enquanto olhava para baixo e passava mão no queijo, se fazendo de cínica, então o vendedor jogou uma pergunta ainda mais cínica pra ela.
— Pois então, por que você quer cajados e varinhas?
Abigail, enquanto encarava os queijos, se deu conta de um mofo crescendo sobre o queijo, e logo alertou ao homem.
— Esse queijo não deveria estar com esse mofo, e uh, é uma quantidade razoável de mofo que há aqui — Disse ela, passando o mindinho no mofo e olhando de perto.
O velho e gentil homem deu uma breve risadinha, e voltou à falar com Abigail de um jeito genuinamente amigável.
— Ho! Você realmente parece saber sobre queijos! A maioria gosta de parecer inteligente e assumir que é um mofo benigno para o queijo! Ah… esses jovens…
— Eu sei, minha mãe trabalhava em uma fazenda, especificamente… na parte de queijaria, anexada à… leitaria… — disse Abigail enquanto olhava fixamente e apaticamente para o queijo, como se aquele queijo fosse um espelho que refletisse para o passado.
O velho homem logo simpatizou com a moça, então a chamou para o seguir .
— Ei, venha comigo. — disse ele em tom seco, e andando lentamente para a porta atrás de Abigail.
Abigail saiu do transe relacionado ao queijo, mas antes que saísse, lambeu seu mindinho mofado e logo sorriu.
— Estou indo — disse ela.
Ao abrir a porta, uma escadaria diretamente pare um subsolo, logo abaixo das tábuas de madeira ocas no piso da loja.
O velho acendeu uma lâmpada amarela no alto do teto, revelando um amontado de caixotes, paredes de muros de pedras desgastadas, um piso quase apodrecendo que chegava a transparecer a terra de baixo, e por fim, dois homens apoiados em cima da caixa, que se assustaram quando a luz acendeu, e um logo começou a falar.
— Ei pai! Que susto do caral… caramba! Você mesmo não tinha conversado pra não irmos aí em cima e nem você aqui embaixo quando está de noite? Já ia pedir pro mano descarregar o mosquete em você! — disse um dos filhos do vendedor enquanto o outro filho apenas ficava triste por não poder ter testado seu mosquete em alguém.
Abigail ficou intrigada com a imagem do mosquete, apenas ouvia e ouvia falarem sobre, mas nunca havia visto um pessoalmente e seu ceticismo cego a fazia acreditar que aquilo era a maior mentira, e intrigada, decidiu puxar assunto, mas sem querer parecer tão idiota:
— Isso é o tal… “Mosquito”? Hm… ele… não parece ser tão comum nesse reino, ou nesse continente mesmo, sabe? Onde você achou?
O filho com o mosquete não disse nada, apenas olhou para o pai, esperando que ele que respondesse aquilo ou pelo menos fosse direto ao assunto. O pai então disse.
— Enfim, vamos direto ao assunto, você queria saber de cajados e varinhas, não é? Então veja. — Disse o velho, removendo a cobertura de cima das caixas, revelando diversos cajados e varinhas, empilhados aos montes.
Abigail logo encheu seus olhos, e com apenas o braço que restava, começou a fuxicar a todas as caixas, mais interessada em ver o conteúdo do que realmente escolher um cajado ou varinha.
Enquanto ela revirava os cajados e varinhas, ela se deu conta de algo.
— Varinha! Espera… de… bruxa? Não, isso não funciona.
Abigail então pegou outro.
— Cajado! De… xamã? Não!!!
— Varinha de… místico?! An?! Não… Não…
O desespero começou a bater, e ela começou a procurar com cada vez mais euforia e nervosismo, suando e pingando até que as próprias varinhas começaram a escorregar de sua mão.
Ela então tentou abrir a tampa de outra caixa, que ao ser aberta, revelou uma quantidade abissal de varinhas de Pactários, e só de Pactários.
Pactários, diferente de magos, feiticeiros e outros conjuradores, consegue seu poder ao assinar um pacto ou fazer um pacto ritualístico em nome de uma divindade, boa ou ruim, assim fazendo a Entidade conseguir dar parte de seus poderes ao Pactário, contanto que ele cumpra o pacto.
Mas haviam muitas varinhas desse tipo de conjurados, o que fez Abigail apenas ficar mais e mais confusa, então ela se virou para o velho e seus filhos, com um olhar preocupado.
— Cadê… cadê as varinhas de mago?
O velho logo riu e respondeu:
— Ho Ho! Magos? Você quer dizer os… mágicos normais? Oh, a gente não tem isso, só desses conjuradores mais… esquisitos, sabe?
Abigail parou em pé, e olhando fixamente para o homem, o questionou com assertividade e frieza:
— Como vocês conseguiram tantos canalizadores mágicos? E ainda de mágicos tão… exóticos?
O velho, sorrindo, colocou as duas mãos atrás das costas, e a questionou, com um sorriso no rosto.
— Você sabe por que… Miasma é conhecida também como o “Refúgio dos Doentes"?
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