Volume -5
Capítulo 3: Caldo de Ossos
Acompanhada por um grupo de 5 guardas, Abigail era arrastada do tribunal até fora dos domínios da Cidadela, sujando sua túnica laranja de um marrom terroso, ela se contorcia, mesmo sem sequer saber o que eles deveriam fazer quanto à isso.
Qualquer conjurador mágico possui poder o suficiente para destruir aqueles simples guardas e até mesmo a Cidadela inteira, mas simplesmente… não valia a pena acabar com toda a sua reputação com a Cidadela, entrar na mira de muitos caçadores de mago, e também, obviamente, acabar com o maior marco mágico da humanidade.
Do domínio da Cidadela para fora, havia uma enorme floresta, e à caminho dela, uma enorme pradaria, perfeita para que aqueles no topo possam observar estrangeiros ou apenas subjugar exilados de cima.
Ao ser largada bruscamente no mato pelos guardas, um deles, de pura má fé, agarrou seu chapéu, e gargalhando, o pôs na própria cabeça, fazendo os outros guardas rirem e apenas deixarem a maga no chão, à mercê das enormes pradarias ao redor da Cidadela e sendo conteúdo de piada para aqueles que a viam de cima dos muros e enormes estruturas.
Abigail, caída no chão e suja de terra, olhava fixamente para os muros da Cidadela, completamente desligada da realidade e absorta em seus pensamentos, principalmente nos dois pensamentos que mais percorriam sua mente.
"Sair daqui e preservar minha moral, ou ficar e aguardar que os guardas tenham pena de mim e me aceitem?"
No fim, a única ação que a mente de Abigail conseguiu destilar com base nisso tudo, foi furiosamente começar a bater na terra com o punho enquanto olhava fixamente para o chão para evitar olhares que julgassem suas ações, Abigail sabia que seria vergonhoso, ela só queria realmente extravasar.
Pingos de suor e lágrimas caiam sobre a terra esmurrada, os dentes de Abigail se rangiam um contra o outro, e a conversão entre aqueles dois pensamentos anteriores haviam se fundido em uma pura motivação de ódio.
Mas antes que esses pensamentos a fizessem ter alguma ação impulsiva, enquanto ainda ainda estava prostrada e olhando para o chão, a parte ensolarada do sol havia sido coberta por uma sombra de silhueta humana, e quando em lágrimas Abigail levantou a cabeça, viu a imagem de um conhecido recorrente na Cidadela, o feiticeiro do frio, Auster, o melhor amigo de Abigail, com uma mão atrás das costas e a outra estendida para ajudar Abigail.
Auster possuía uma aparência típica da de um feiticeiro carregando a essência da Mana de seus poderes, por ser um feiticeiro de gelo, sua pele era completamente pálida e de aparência quebradiça, seu cabelo era completamente branco, seus globos oculares com quase nenhuma veia, de tão esbranquiçada que era, suas íris azulada, mas sem uma pupila
— Você… está bem? — questionou Auster.
— Por acaso eu pareço BEM pra você?! Estúpido... — disse a maga, ainda prostrada no chão, mas olhando pra cima.
— Seria falta de educação não perguntar. — disse o feiticeiro, ainda com a mão estendida.
— Uh… e é falta de educação preferir ser educado do que realmente ser útil nessas horas. — disse a maga, segurando na mão do feiticeiro para ficar em pé, então ela se deu conta de algo.
— Hm, sua mão não tá tão gelada como sempre foi.
— Oh! Você preferia ela gelada e quase queimando a sua mão de frio!
— Não… eu odiava isso, e ainda odeio, só que eu estou tão quente e vermelha de raiva que realmente queria sentir algo gelado na minha pele. — disse Abigail, olhando fixamente para o chão, tentando esconder as lágrimas e suor no rosto.
O silêncio se manteve por uns 5 segundos, o que pode parecer pouco, mas naquela situação, era um tempo abissal, então Abigail tentou criar assunto:
— Mas… você não… vai me dizer como fez para as suas mãos deixarem de ficar frias? Eu acho que nem existe treinamento que faça isso parar. — Disse a maga.
— Claro que eu digo, oh ho — disse o feiticeiro, animado e casualmente tirando um jarro de trás das costas, na qual estava o outro braço até aquele momento — aqui está.
Era uma jarra enorme, da qual era possível entender porque estava atrás das costas. Havia um líquido de cor amarronzada, mas meio transparente, como se fosse mais água do que realmente os ingredientes, e no meio dessa água boiavam inúmeros pequenos ossos dentro, alguns grandes, outros pequenos. Abigail não entendeu nada e logo se assustou.
— Ew, o que é isso? Eu não entendi? É pra eu parar de chorar? Eu realmente não entendi...! — disse Abigail, com um sorriso torto.
— Oh… tão inteligente pra umas coisas, mas pra outras… eu tô explicando o motivo das minhas mãos não estarem geladas, tonta! — disse o feiticeiro.
— Espera… você… bebeu isso? — disse a maga enquanto começava a sentir seu estômago embrulhar.
— Oh sim, isso é o que os vendedores da Cidadela chamariam de “Caldo de Ossos Inibidor de Mana”, apesar de não reduzir a minha produção de Mana, ele diminui a intensidade dela! — disse o feiticeiro com um sorriso no rosto.
— Uh… você não pode sair por aí acreditando em tudo que tem um nome complexo… isso… isso deve ser só efeito placebo. — disse a maga, colocando a mão sobre o estômago e tentando não se contorcer enquanto olhava para baixo.
— Nah, isso aqui é bem real, tem ossos de várias criaturas com capacidade de produzir Mana, se eu não me engano, aqui tem ossos de Gnoll, Hobgoblin e Troll! — disse o feiticeiro, enquanto aproximava a jarra para perto da visão de Abigail e apontava para um osso em específico que se mexia sem parar. — esse aqui, por exemplo, é um osso de Troll! Ele tá tentando se regenerar! Não é o máximo?!
— Uh… que nojo… eu… eu acho que vou vomitar… — disse a maga, enquanto sentia seu pescoço se encher com um bolor extremamente enjoativo, como se alguma coisa estivesse subindo com força.
— BLUEEEEERGH — a maga vomitou, ouvindo apenas os respingos grudentos de vômito no chão. Ela se preparava para falar enquanto ainda estava com a cabeça virada para o chão.
— Lágrimas… suor… sangue do meu joelho ralado… e agora vômito… isso… isso não pode ser verdade… por que… por QUE VOCÊ TÁ ME MOSTRANDO ISSO?! — berrou a maga, se recordando novamente de tudo que havia acontecido com ela e canalizando tais emoções contra o feiticeiro.
— Ué, nós, feiticeiros, obtemos nossa magia através da nossa Mana, já vocês, magos, conseguem canalizam suas magias através da Trama mágica que permeia o universo, e bem… muitos arcanistas estudiosos dizem que Mana é só a Trama dentro do corpo do ser vivo, então… faz sentido que isso te ajude, né?
— Eu… eu nunca vou tomar isso… vai se.. ferrar.. tem ossos se mexendo ainda… — disse a maga, que após expulsar toda a raiva de sua mente, sobrava apenas tristeza e cansaço.
— Hm, que não seja por isso, você pode usar pra dar pra alguma criatura pra enfraquecer os poderes dela, e então, matar ela com mais facilidade.
— Isso… é sádico… mas tendo em vista que eu vou ter que ir à pé até minha casa, em outra região do continente, acho que… vai ser bom ter, eu acho. — disse Abigail, receosa e pegando o frasco da mão do feiticeiro.
— Hm… você vai embora da Cidadela? O que foi que deu no geral? Eu fiquei tanto tempo tentando te convencer a pegar aquele frasco que eu gastei umas 800 Tibras só pra te dar, que acabei me esquecendo dessas coisas.
— Ah Auster… eles… eles me exilaram por ter criticado o Misticismo e os místicos da Cidadela. — disse a maga, não mais triste, “apenas” vazia.
— Que pena, olha… eu realmente queria ir junto com você, mas eu tenho coisas pra fazer aqui, eles tratam os efeitos colaterais da minha Mana, na verdade, desde que a era da perseguição aos feiticeiros acabou, tudo tem ficado bem melhor pra mim, e bem… eu só tenho à agradecer à você. — Disse o feiticeiro enquanto tirava umas notas de dinheiro do bolso.
— Nossa, quanto dinheiro é isso? Pra mim?
— Não sua tonta, é pra eu esfregar na sua cara como eu sou rico, hahaha, mas é óbvio que é pra você. — disse o Auster, entregando o dinheiro à ela — aqui, 42.200 Tibras, consegui sendo material de estudo para alguns arcanistas.
— peguei tudo o que tinha, seu exílio aconteceu bem do nada, então… não deu pra eu preparar a minha doação pra você, mas espero que sirva!
— Muito… obrigado!! — disse a maga, correndo para abraçar Auster.
— Ha… suas costas e peito ainda estão… gelados… — disse a maga, fechando lentamente os olhos.
— Você não parece estar achando ruim… — disse Auster, abraçando de volta Abigail.
— Não mesmo… — Disse Abigail, ainda abraçando Auster.
O rosto e corpo de Abigail começavam a queimar de frio, causando uma dor intensa à qualquer um com o mínimo de auto preservação, mas ela não se importava, na verdade não parecia nem sentir, e apenas queria o abraçar pelo máximo de tempo possível.
— Abigail… seu rosto… parte dele está começando a ficar cinza... — Disse Auster, enquanto lentamente parava de abraçar Abigail. — Uh… tudo isso por causa de 42.200 Tibras.
Abigail continuava abraçada.
— Não é só isso… é que… eu acho que nunca vou te ver de novo… — Dizia Abigail enquanto lacrimejava.
As lágrimas escorriam e rapidamente se tornavam cristais de gelo devido à proximidade com o corpo de Auster. Auster precisou intervir, empurrando Abigail para longe.
— Não inventa! Sua carente! Uh… 42 mil Tibras nem é tanto assim… se você for para algum comércio de câmbio e trocar pela moeda do continente, provavelmente não vai dar mais que 5 mil Estros, ugh…está anoitecendo, é REALMENTE melhor que você se apresse para encontrar algum lugar para passar essa noite.
Auster, de modo estressado, se despediu rapidamente de Abigail, voltando para dentro dos domínios da Cidadela enquanto deixava Abigail sozinha com uma tremenda cara de embaraçada e a metade esquerda do rosto queimado de frio, que foi logo quando a dormência da carência finalmente acabou, a fazendo sentir toda a dor da queimação.
Ela colocou uma mão sobre a parte esquerda do rosto e começou a gemer de dor:
— HmmMmmmMm… meu rosto… que… merda.. será que valeu tanto assim a pena, Abigail? — questionou Abigail para ela mesma. — sim, valeu muito a pena. — ela mesma se respondeu.
A noite caia, e Abigail limpou a sujeira de seu manto, colocou o capuz, e carregando a jarra de caldo, se pôs a adentrar a floresta que cercava a Cidadela, em busca de chegar em sua cidade natal.
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