Volume 2

Capítulo 4: Saqueadores no Portão

Aqui é o Satou. As formigas são sempre consideradas trabalhadoras esforçadas, mas existem algumas espécies cujo “trabalho” causa muitos problemas para os humanos, assim como os cupins. E, pelo visto, haviam formigas naquele mundo que eram ainda mais perigosas...

Quando chegamos na pousada, encontramos alguns soldados do conde que tinham acabado de voltar da patrulha.

Ah, Zenacchi!

— Lilio! Olha, a Iona e a Lou também então aqui!

Assim que terminaram o serviço na frente do portão principal, as 3 guarda-costas vieram nos cumprimenta. Talvez tivessem lutado contra algum mostro durante o dia já que as suas armaduras estavam cobertas de arranhões e estava faltando uma ombreira na da Lou, a mais alta delas.

Zena correu em direção a elas e começou a curá-las com sua magia de vento.

— Mestre, eu vou entrar primeiro para guardar as compras.

— Tudo bem, obrigado.

As garotas se dividiram ao entrar na pousada, Arisa foi para o quarto e o resto para o estabulo. Zena estava concentrada enquanto conjurava a magia de cura, então falei com a Lilio e as outras no lugar dela.

— Parece que o trabalho foi difícil hoje. Acabaram encontrando outro wyvern?

— Se esse tipo de monstro aparecesse o tempo todo, eu já teria desistido de ser um soldado a muito tempo — suspirou Lilio, balançando a cabeça para os lados.

“Então as pessoas também negam com a cabeça nesse mundo. ”

— Não, o que encontramos foi um monstro chamado formiga gigante com presas.

— Aquele rato de merda! Se eu encontrar algum de novo, vou cozinhar o bicho vivo pro jantar.

Iona respondeu minha pergunta, mas o que a Lou falou me deixou confuso. “Então foi um rato ou uma formiga? Será que alguém pode explicar pra mim?”.

A Iona deve ter percebido a minha dúvida e começou a esclarecer as coisas. — Antes de encontramos as formigas, uma cavalaria de homens-rato invadiu o nosso território. Lou está brava porque acha que foram eles que trouxeram os monstros em nossa direção.

Pelo visto eles usaram uma técnica famosa nos MMORPGS — mob training!1 — basicamente, pegar o aggro2 de vários monstros e usá-los para matar outro jogador. Esse tipo de coisa poderia fazer o condado de Seiryuu declarar guerra contra os homens-rato.

Parando para pensar, estava mesmo tudo bem falar isso para alguém como eu, uma pessoa que não tinha nada a ver com a situação? Bem, talvez o Reino de Shiga não se importasse muito com esse tipo de informação, mas, se não fosse esse caso, significaria que os soldados precisariam de mais disciplina.

— Ele era o único usando aquele capacete vermelho, quando eu colocar as minhas mãos naquela desgraça, vou levá-lo direto para a forca!

A Lilio só parou de reclamar quando a Zena terminou o feitiço de cura.

— Valeu mesmo, Zenacchi!

— De nada.

Um sorriso caloroso se formou no rosto da Zena quando o trio agradeceu. Depois disso ela começou a curar o resto dos soldados feridos.

◊◊◊◊◊◊

Aaah!

Escutei o grito de uma garotinha vindo do pátio da pousada. “Merda, esqueci que o radar ainda estava focado. ”

Aquela foi a voz da Yuni. Devia ter sido só uma cobra ou um inseto que apareceu e deu um susto nela, mas, mesmo assim, decidi ir ver se estava tudo bem. Por algum motivo, as 3 guarda-costas foram junto comigo.

— Opa, peguei!

— Mestre! Olha só, senhor!

Tama foi correndo para a minha direção carregando alguma coisa com os braços acima da cabeça, a Pochi vinha junto segurando um galho na mão.

As 3 escoltas desembainharam suas espadas ao mesmo tempo. Quando viram aquilo, as crianças, assustadas pela sede de sangue repentina, ficaram paradas no lugar.

— Calma, já está morta — falei para as soldados depois de ver a mensagem de um pop-up AR3. Então voltei o meu olhar para a Tama. — De onde essa formiga veio? — Sim, a coisa que carregava era o cadáver de uma formiga voadora gigante.

— Nós acabamos com ela!

— Esse monstro pulou para cima da gente do teto da carruagem, senhor!

As duas não paravam de se mexer enquanto respondiam minha pergunta.

O exoesqueleto da formiga morta, que a Tama jogou no chão, estava cheio de amassados, alguém deveria ter usado uma arma branca para fazer aquilo. Também havia um buraco na parte da cabeça, a Liza deve ter dado o golpe final.

— Mestre, não parece ter nenhuma outra por aqui.

A Liza apareceu falando isso enquanto carregava sua lança sobre os ombros. Havia um buraco na cabeça do mostro, ela devia ter dado o golpe final. Yuni estava atrás dela parecendo assustada, a mão da garotinha que segurava seu sobretudo não parava de tremer.

Hm... a raça deve ser diferente, mas será que é da mesma espécie que atacou as meninas hoje?”

O raio do Detector de Inimigos do meu radar ainda estava focado, então aumentei a área de detecção e abri o mapa para observar a situação da floresta fora do portão principal...

Vermelho. Os pontinhos vermelhos, que significavam inimigos, estavam se aproximando da cidade, o número era tão grande que seria perda de tempo tentar contar.

— Pochi, Tama, vão pegar as suas espadas. Arisa, traz a Lulu para cá. Liza, pegue a tenda que a gente usou e faça uma cama no estabulo.

— Sim, senhor!

— Beleza!

— Ok.

— Já estou indo, senhor.

Assim que terminei de falar, as 4 saíram correndo. Tinha pensado que pelo menos a Arisa teria me perguntado o porquê, no entanto, parecia que ela iria fazer o que pedi sem contestar.

— Aconteceu alguma coisa? — perguntou Iona, surpresa pelas minhas ações repentinas.

— Uma formiga nunca age sozinha. Devem haver mais vindo por aí. Temos que avisar o exército o mais rápido possível...

Fiquei satisfeito com a desculpa que a minha habilidade Fabricação inventou, porém, antes que eu pudesse terminar de falar, um alarme soou do topo de uma das torres de guarda da muralha externa. Devem ter visto as formigas se aproximando.

A dona da pousada e sua filha, Martha, saíram de seus quartos assustadas. Já que a Liza tinha ido embora, a Yuni estava segurando a minha calça no lugar, então pedi para levarem ela para um lugar seguro.

De acordo com o meu mapa, o nível médio da horda de monstros era 3. Significava que eram mais fracas do que um soldado armado do exército do conde, um adulto normal poderia derrotar uma delas. Entretanto, o exoesqueleto e a mandíbula dessas formigas eram muito mais resistentes do que um inseto normal e, para piorar, podiam voar. Por isso que seria difícil para alguém normal lidar com elas.

Pensei em correr para fora da cidade e usar o Tiro de Fogo para torrar todas de uma vez, mas aqueles monstros eram mais rápidos do que imaginei, quando pensei nesse plano, as formigas já tinham chegado na muralha. Parecia que a horda queria passar por cima dos muros, contudo, por algum motivo, deram meia volta no último segundo. Algumas não foram rápidas o suficiente e acabaram batendo em algo. As que evitaram a colisão perderam velocidade no processo, então os soldados conseguiram abatê-las com facilidade.

“O que ‘tá acontecendo? ”

— Parece que a barreira antimonstro está funcional muito bem.

Arisa tinha voltado com a Lulu enquanto eu estava distraído e respondeu à pergunta como se conseguisse ler minha mente.

— Mas eles tinham passado, não é?

—Bem, não é Magia Espacial. Precisaríamos de muito poder magico para manter uma barreira física como essa funcionando o tempo todo.

Mas a barreira do Vale dos Dragões tinha demonstrado um pouco de resistência quando tentei passar... Bem, isso não era importante naquele momento.

— Arisa, se esconda junto com a Lulu dentro da taberna. As paredes de pedra e as arvores devem proteger vocês. Vou deixar a Pochi e a Tama protegendo a entrada, então não se preocupe muito.

Quando terminei de dar essas instruções, as duas de garotinha chegaram com suas espadas. Usei algumas mesas e a tenda que a Liza trouxe para montar uma barricada, assim elas conseguiriam se defender com mais facilidade se as formigas chegassem lá.

— Pochi, Tama, por favor protejam a entrada.

— Sim, senhor!

— Onde você vaiiii?

— Eu e a Liza vamos tentar impedir que os monstros cheguem perto da pousada.

As pessoas que estavam trabalhando fora da cidade começaram a entrar, muitos pareciam estar feridos. Enquanto isso o exército do conde estava entrando em formação na frente dos portões para protegê-los. Zena estava usando sua magia para criar uma barreira em cima dessa multidão, mas parecia que o grande número de pessoa tornava isso muito difícil.

A última pessoa da fila era um homem-cachorro que carregava uma cesta enorme, quando todos passaram os portões começaram a se fechar. Porém, assim como um retardado que tenta embarcar no trem quando as portas estão fechando, o corpo de uma única formiga impediu o fechamento completo.

— É só um monstro! Esmaguem-no com os portões!

De dentro do posto de guarda da muralha, a voz do Sir Thorne surgiu gritando para os soldados não pararem. No entanto, não era mais apenas uma. Nesses poucos segundo que os portões ficaram parados, outra formiga, então outra e outra ficaram entaladas, lentamente abrindo mais e mais a entrada até que as outros atrás delas conseguiram invadir a cidade.

As tropas que tinham acabado de voltar da patrulha começaram a interceptar os monstros. Zena também foi ajudar, seu Martelo de Ar esmagava os que tentavam voar na cidade. Lilio e as outras usavam bestas para derrubar aquelas que escapavam da mágica.

As formigas perceberam que seriam alvos fáceis no ar, então começaram a avançar por terra. O exército do conde tinha vantagem em batalhas terrestres, porém o grande número de inimigos ainda era um problema. Algumas conseguiram passar pelas tropas e forram em direção aos civis, no entanto, eu e a Liza estávamos lá.

— Mestre, deixa que eu cuido disso.

Ela balançou sua lança negra em direção as formigas. Estocada, corte, pancada — apenas um golpe era o suficiente para derrotar um daqueles monstros. Alguns tentaram fugir para outra direção, mas os derrubei usando pedregulhos que achei na rua.

Hm... isso ‘tá fácil demais.” Senti que conseguiria atingir os inimigos que estavam atrás de uma cobertura se treinasse mais um pouco.

Tinha esquecido de observar a situação da Liza por ficar pensando nessas coisas inúteis, pelo visto algumas formigas tinham conseguido se aproximar da posada nesse meio tempo.

— Não vamos deixar vocês entrarem, senhores!

— Entrada proibidaaa!

Pochi e Tama impediram a passagem de várias formigas que iam em direção a pousada. As pessoas lá dentro começaram a gritar quando viram os insetos se aproximando.

— Toma essa, senhor!

Pochi pegou as duas espadas da sua cintura e dilacerou a formiga que estava liderando. Quando fez isso, outras duas tentaram atacá-la pelos lados...

— Vocês baixaram a guarda!

Tama pulou nas costas dela e usou sua espada junto ao escudo para bloquear os ataques.

— Obrigado, Tama!

— Não se preocu... me agradeça maissss!

“Quem ensinou ela a falar assim?... Ah, deve ter sido a Arisa”

Ainda no ar, Tama deu um giro e empalou uma das formigas com sua espada. O recuo fez a Pochi cair de cara no chão, mas ela voltou ao ataque em poucos segundo, dando uma estocada no inseto que tentou atacar seu flanco direito. Os 3 monstros foram mortos em menos de 1 minuto, essa performance fez algumas pessoas dentro da pousada elogiam as pequenas guerreiras.

◊◊◊◊◊◊

Em menos de meia hora, quase todas as formigas da praça tinham sido eliminadas. Tiveram outras situações perigosas como o ataque a pousada e alguns casos estranhos onde os monstros simplesmente paravam de se mover enquanto sangravam pelos olhos e boca. Deve ter sido a Magia Psíquica da Arisa que fez isso. Quando olhei em sua direção, a menina fez um sinal de paz com as mãos.

Mas mais importante, eu tinha visto alguns insetos indo em direção a loja que a Nadi trabalhava. Ela devia ter se escondido no porão, então as chances de algo ruim acontecer eram baias, conduto, decidi ir ajudar só para ter certeza.

— Liza, você consegue se virar sozinha por um tempo?

— Claro que sim! — Como se tentasse enfatizar sua resposta animada, a Liza matou duas formigas com um único balançar da lança.

Comecei a correr em direção a loja enquanto desviava dos monstros que apareciam no meio do caminho. Quando entrei no local, vi que havia alguns monstros, então tirei uma barra de ferro do inventário para esmagá-los. Claro, eu podia simplesmente chutar eles, entretanto seria difícil acertar um inimigo muito baixo. Uma arma branca como uma maça seria melhor para fazer o serviço.

Não quis usar a Pistola Magica pois os cadáveres ficariam com marcas de tiros, o que era incomum naquele mundo, e não queria encher as paredes da loja de buracos. Então, segurei a barra com força e dei um golpe na formiga que foi me atacar.

Habilidade Adquirida: Maça de Uma Mão.

“Olha só, parece que eu ainda não tinha conseguido a habilidade de maça” Não achei que seria uma boa ideia usá-la como minha arma principal, então não coloquei nenhum ponto nela.

Duas formigas estavam em cima da porta que levava ao porão, acabei com as duas assim que as vi. Quando joguei os cadáveres para o lado, percebi que a entrada quase foi destruída. “Nossa, essa foi por pouco. ”

Graças ao meu mapa, pude ver que a Nadi estava bem, mas pensei que seria bom falar um pouco para tentar aliviá-la.

— Nadi, tudo bem por aí?

— S-sim, nenhuma conseguiu entrar até agora!

As formigas parecem ter soltado algum tipo de ácido que deixou uma camada de gosma amarela por toda a escada. Infelizmente eu não tinha nada para neutralizar aquilo.

“Acho que posso jogar algumas moedas de ouro e deixar o ácido derretê-las para formar um caminho, mas acho melhor fazer isso se não tiver nenhuma outra saída. ”

Naquele momento, achei melhor quebrar alguns objetos e tentar cobrir a gosma com eles... No entanto, antes que pudesse começar a fazer isso, uma pequena figura entrou de repente na loja.

— Nadi!

— Chefe!

Um único jovem entrou. Usava uma túnica e calça simples. Seus cabelos verdes estavam amarrados em uma trança bem longa, parecia com aquelas que os personagens de filmes de kung-fu têm. Se eu tivesse que destacar uma característica, seria a forma estranha com que ele falava.

— ■■■ ■■■ ■■... Controle de Vinhas Tsuta Sousa!

Quando o feitiço foi conjurado as plantas da loja começaram a se mover como se tivessem ganhado vida. Os galhos, que se moviam como tentáculos, foram para o fundo do porão e, depois de alguns segundos, voltaram carregando a Nadi.

“Incrível. Agora sim, era esse tipo de mágica que eu queria ver num isekai. ”

— Muito obrigado, senhor Satou! E você também, chefe.

— Será que sou menos importante?

— Claro que não! Estou mesmo muito grata por você ter vindo. — Nadi deu um beijo na minha bochecha e na do menino sem expressão.

— Quem é esse — pergunto o garoto, de forma bem brusca.

— É um cliente que está procurando uma casa para alugar e também a pessoa que acabou de me salvar. Se o senhor Satou não tivesse aparecido, eu provavelmente seria comida pelas formigas antes de você chegar.

Quando ouviu isso ele virou a cabeça para mim e sussurrou: — Obrigado. — Sem muita emoção. Fiquei me perguntando porque estava agindo daquela forma. Porém, quando um pop-up AR apareceu com sua informação, eu não consegui esconder a minha surpresa. Aquele menino pertencia a raça fantasiosa mais famosa de todas — os elfos.

◊◊◊◊◊◊

— Aconteceu alguma coisa, senhor Satou?

— Não, não foi nada, é que essa é a primeira vez que vejo um el... uma pessoa com o cabelo verde.

Quase falei “elfo” mas consegui inventar uma desculpa no último segundo.

Ah, o chefe é um elfo, um espirito da floresta. Não é incrível?

— Um elfo? Eles não deveriam ter orelhas longas?

? Não.

Quando ouviu as minhas palavras, o chefe da loja franziu as sobrancelhas e virou a cabeça como uma criança mal-humorada. Mesmo que suas ações fossem imaturas, o pop-up dizia que aquele era um velhote de 280 anos chamado Yusaratoya Bolenan. Depois foi me explicado que “Bolenan” era o nome da floresta que ele vivia e que servia como sobrenome para clã de elfos que existia lá.

Ah, para com isso, chefe. O senhor Satou deve estar se referindo a aqueles do clã Booch. Eles são a espécie que tem orelhas grande que lembram folhas de bambu, não é isso?

Nadi tentou acalmar o elfo e olhou para mim esperando uma confirmação. Achei melhor concordar com a cabeça para acabar com o problema.

— O primeiro herói, aquele que fundou o Império Saga, chamava aqueles com a orelha longa de “elfos”, então, mesmo depois de mil anos, ainda existem muitas pessoas que confundem eles.

“Entendo, então o primeiro herói cometeu o mesmo erro...”

Aposto que o primeiro herói também foi corrompido por aquela série da “ilha amaldiçoada” e acabou achando que “as pessoas com orelhas longas” eram elfos.

“Hm...? Pera aí, ele criou o império a mil anos atrás? ”

 Não tem como um japonês que viveu a tantos anos atrás conhecer a palavra elfo... Será que o fluxo de tempo era diferente nos dois mundos?

— É por isso que os elfos ficam bravos quando são confundidos com as pessoas com orelhas longas.

— Então é assim, eu não sabia, mas isso não é desculpa. Espero que você me possa me perdoar por ter falado aquilo, senhor.

Nadi deu um sorriso enquanto eu abaixava a cabeça para me desculpar com o gerente da loja.

Hm. Perdoado.

Ah, chefe. Se você falar desse jeito, vai parecer que ainda está bravo. — Depois de dizer isso para o elfo, Nadi levantou o cabelo dele e me mostrou sua orelha. — Olha só. — A única coisa de diferente do normal era o topo um pouco mais esticado.

O gerente saiu de perto dela, contudo, não parecia bravo com aquilo. Vendo aquela cena, me perguntei se eram casados ou se estavam pelo menos namorando. De qualquer forma, a invasão ainda estava acontecendo, então achei melhor voltar para a pousada.

— Bem, Nadi, depois volto aqui para tentar alugar uma casa.

— Tudo bem. Muito obrigado por ter me salvado hoje.

Depois de me despedir dos dois, sai da loja.

◊◊◊◊◊◊

Quando cheguei na pousada, a batalha já havia terminado. Todos os monstros que invadiram foram eliminados e aqueles que defenderam a cidade estavam limpando os cadáveres pela cidade.

— Satou!

A Zena tinha mesmo bons olhos, me achou rapidamente e foi correndo em minha direção. A menina não parecia estar acostumada a correr de vestido já que tropeçou e caiu assim que chegou ao meu lado. Reagia assim que vi aquilo e segurei ela.

— Desculpa...

— ‘Tá tudo bem?

Zena ficou segurando o meu braço por um tempo, foi uma experiência bem agradável. Não me importaria de continuar daquela forma por mais um tempo, contudo, os olhares das guarda-costas pareciam me perfurar, então ajudei ela a se equilibrar e me afastei.

Disseram que não houve nenhuma morte e que ninguém ficou gravemente ferido, mas os sacerdotes já tinham sido chamados para tratar essas pessoas. Zena achou melhor deixar a cura com os profissionais e decidiu se juntar as suas guarda-costas para patrulhar os arredores da cidade.

— É... parece que você não vai ter uma folga tão cedo.

— Fico triste por ter que ir agora, mas Magia de Vento é muito útil para detecção de inimigos. E temos que ir logo, alguns monstros podem ter ido atacar os vilarejos próximos!

Ela explicou que os vilarejos tinham uma defesa contra monstros chamada “barreira de pilares”, no entanto, não eram tão poderosos quando aquela que protegeu as muralhas de Seiryuu.

Zena e suas guarda-costas se juntaram a cavalaria leve do exército antes de sair da cidade. Pelo que ouvi, havia outros esquadrões sendo mobilizados e que seriam enviados como reforço em pouco tempo.

◊◊◊◊◊◊

A Liza começou a me chamar quando cheguei na pousada, me aproximei para ver o que era e vi um homem de armadura parado do lado dela.

— Você é o dono dessa aqui?

— Sim. Meu nome é Satou.

A Liza me passou uma bolsa enquanto eu conversava com o soldado. Quando abri para ver o que tinha dentro, vários núcleos de formigas voadoras gigantes apareceram.

— O governador decidiu comprar todos os núcleos. Então por favor entregue essa bolsa.

— Tudo bem, mas vocês não deveriam se terminar de curar os feridos e arrumar os estragos primeiro?

 Achei estranho ver aquele homem com tanta pressa, então decidi chegar seu status com a tela AR. Pelo visto ele fazia parte da contabilidade do exército do conde.

— Não sou o responsável por isso — disse o soldado, após isso ele arrancou a bolsa da minha mão e começou a ir em direção aos outros soldados.

O cara contou os núcleos ou perguntou meu nome, então eu não fazia ideia de como o pagamento viria. Talvez fosse só paranoia, entretanto achei que aquele soldado poderia estar tentando me enganar.

— Espera um pouco.

— O que foi agora?

Quando chamei sua atenção, o soldado virou a cabeça e começou a olhar de irritado para mim. Simplesmente fiz uma exigência básica para aquele tipo de situação. — Gostaria que você me desse a nota fiscal. Por favor escreva o número de núcleos e a compensação que receberei, junto ao seu nome e afiliação, neste papel.

Eu não precisava daquele dinheiro, já tinha muito guardado, porém, não seria agradável ver outra pessoa roubando os frutos do trabalho duro das meninas do povo-fera.

— O que? Acha que sou um ladrão?

— Nós, comerciantes, somos uma espécie bem cautelosa. Mesmo que você fosse um herói ou a própria reencarnação de cristo, eu ainda iria querer esses documentos assinados, não cofio em acordos verbais.

Pelo visto a Fabricação continuava inventando uma desculpa melhor que a outra.

O homem resmungou um pouco, mas acabou pegando o papel no final. O valor que colocou era menor que o preço de mercado, então mostrei as contas que fiz em outro local e pedi para que arrumasse o “erro de cálculo”.

— Aqui ó, ‘tá feliz? Vendedor chato do caralho.

Ele estava sendo bem rude, contudo, ignorei aquilo e peguei o papel. Aparentemente aquilo poderia ser trocado por dinheiro no escritório do governo.

O soldado estava usando um anel com um selo, mas percebi que não havia um no papel. Todos os documentos que eu tinha visto até o momento, como aquele que assinei quando a lança da Liza foi confiscada, tinham um selo ao lado da assinatura.

— Deixou o carimbo no escritório?

— Só esqueci de colocar!

O homem franziu as sobrancelhas quando falei aquilo, arrancou o documento das minhas mãos e carimbou com toda a força.

— Pronto, posso ir embora agora?

Não consegui encontrar mais nenhum erro, então guardei o papel no bolso. O soldado parecia bravo por não ter conseguido uma graninha extra aquele dia e foi embora enquanto resmungava.

“Bem, aposto que esse vigarista vai perder o emprego por fraude ou corrupção algum dia.”

Habilidade Adquirida: Calculo

Habilidade Adquirida: Coerção

Título Adquirido: Comerciante Novato

Título Adquirido: Comerciante Cinza

Olhei para o meu status e vi as novas habilidades e títulos. “Quando foi que eu coagi alguém? Gostaria de dizer algumas palavras para o responsável por esse sistema de habilidades. ”

◊◊◊◊◊◊

Quando o sol se pôs, as pessoas da cidade já haviam se recuperado do choque. Pelo visto, a formiga que tinha aparecido no pátio da posada tinha conseguido invadir a cidade se escondendo em uma carroça.

Achei estranho que os responsáveis pelo portão não revistaram a parte de dentro, mas, pelo visto, a carroça tinha chegado no final do turno dos vigias, quando as guarda-costas da Zena vieram falar com a gente, então deviam estar muito cansados para fazer uma checagem completa. “Mas isso não é desculpa, eles tinham que ter feito o trabalho direito. ”

— Essas crianças são mesmo incríveis. Nunca imaginei que garotinhas tão pequenas iriam conseguir nos proteger daqueles monstros!

A dona da pousada agradeceu a Pochi e a Tama, que ficaram tímidas ao serem elogiadas. No entanto, aquela que acabou com a maioria das formigas foi a Liza... Bem, ela não era do tipo que iria ficar se achando por conta disso. Pensei que seria legal comprar algum presente para recompensá-la, talvez alguns espetinhos de frango daquela barraca com a bandeira vermelha.

— Aqui está bom?

— Um pouco mais para a direita. Tenho que deixar longe da entrada para que não acumule a poeira que o vento traz.

O marido da dona da pousada carregou uma mesa no pátio até encontrar um lugar ideal para colocá-la. Depois disso ele entro na cozinha pela porta de trás e voltou carregando um monte de comida junto com a Martha.

— Peço desculpa por não poder dar um quarto para essas garotas, já que os outros hospedes irão reclamar, mas temos que agradecer de alguma forma! Pelo menos deixa eu te oferecer a comida deliciosa que o meu marido faz, por conta da casa.

Tinha aquela quiche que eu comi antes entre as comidas que trouxeram, um monte de vegetais cozidos, uma montanha de purê de batata cercado por croquetes e até um animal inteiro assado. De acordo com a tela AR aquilo era um “coelho de orelhas curtas assado”.

— Que cheiro bom.

— É o cheiro da felicidade, senhor!

— Que fomeeee!

— Espera só mais um pouquinho.

As 4 meninas ficaram paradas para não atrapalharem os donos enquanto serviam os pratos. Aquela cena era estranhamente fofa.

— Eu trouxe o que pediu, senhor Satou!

— Obrigado, Yuni.

A menina tinha uma cesta cheia de frutas nas mãos, eu dei uma para ela junto com alguns centavos como agradecimento. Pedi aquilo para a Lulu. A menstruarão já tinha a deixado mal, aquela invasão parecia ter piorado ainda mais a situação. A garota estava ao meu lado com o rosto todo branco.

A Arisa, que estava cuidando dela até o momento, não conseguiu resistir à tentação e foi para a mesa junto com as outras.

Queria saber se existia remédios enjoo naquele mundo. Talveza gente devesse procurar um alquimista ou ir em uma farmácia no distrito oeste depois de todo mundo comer.

“Mas tenho que dizer, essa comida ‘tá boa mesmo. ”


Notas:

1 – Trem de mobs/monstros.

2Aggro seria a agressividade do inimigo, em um MMO, quando alguém chama a atenção de um inimigo, pode se dizer que ele tem o “aggro” do monstro, então o monstro comessará a atacar essa pessoa.

3 – Augmented Reality, em português fica RA, Realidade Aumentada.

 



Comentários