Volume 3
Capítulo 125: Em Busca de uma Cura
A cerimônia de casamento entre Randalf e Leonora foi simples, sem luxos, mas profundamente significativa para ambos. A partir daquele dia, eles embarcaram juntos em uma jornada de fé e esperança, viajando por terras distantes e inexploradas em busca de uma cura para a condição misteriosa de Leonora. Depois de anos viajando pelo mundo, parando em vilarejos, visitando curandeiros, mestres em artes místicas e até mesmo alquimistas renomados, não haviam encontrado cura alguma para a doença de Leonora. Mas a determinação nos olhos de Randalf ainda ardia como uma chama que recusava ser apagada. Apesar das falhas, eles acumularam experiências e habilidades, aprimorando suas destrezas em combate e magia.
O tempo passou, e, agora, com 25 anos, eles chegaram ao árido e escaldante reino de Suna, onde a capital, Nagbala, fervilhava de calor e poeira. Era um lugar implacável, com a luz do sol refletindo sobre a areia, dando a sensação de que o ar estava em chamas.
Naquele dia ensolarado, o ar parecia pesar sobre as cabeças de Randalf e Leonora enquanto caminhavam lado a lado, com as mãos entrelaçadas. Estavam cansados, suas vestes exibiam sinais do desgaste das viagens, e seus olhos, embora cheios de esperança, carregavam a marca de frustrações e tentativas falhas.
Após um longo trajeto, conseguiram marcar um encontro com Eleazar BarHaram, um renomado curandeiro do deserto. Porém, logo antes de serem recebidos, um alvoroço tomou conta do palácio real. Randalf e Leonora observavam com espanto enquanto um criminoso tinha seu corpo exposto ao centro da praça e seu filho, de rosto pálido e expressão de desespero, era submetido a uma punição chamada “expurgo” — um ato cruel e aterrador, que deixou o casal com um gosto amargo e uma sensação de injustiça no peito.
Quando, enfim, o tumulto cessou, foram conduzidos até Eleazar, que os aguardava em uma sala simples, mas decorada com tapetes ricos e cortinas coloridas. Eleazar era um homem de aparência peculiar, com roupas tradicionais do deserto e uma máscara negra que cobria sua boca e nariz, realçando os longos cabelos rosados que pendiam sob seu turbante.
— Vocês devem ser Randalf e Leonora — ele disse, com uma voz grave e calma.
Randalf assentiu, inclinando-se ligeiramente em sinal de respeito.
— Sim, mestre Eleazar. Agradecemos por nos receber — disse ele, puxando algumas anotações de dentro de uma pequena bolsa. — Durante esses anos, registrei tudo sobre a doença de Leonora. Testamos poções, feitiços e até tratamentos espirituais. Nenhum efeito duradouro... Eu até desenvolvi algumas teorias, como a criação de um homúnculo, mas ainda estão longe de serem completas.
Eleazar ouviu tudo atentamente, examinando cada detalhe com um olhar minucioso, como se estudasse cada palavra dita por Randalf.
Após longos três meses conduzindo diversos experimentos, Eleazar balançou a cabeça, suspirando.
— Infelizmente, não tenho a cura que procuram. Já tentei alguns métodos, mas todos falharam... — Ele olhou para Leonora, com um brilho de compreensão e empatia em seus olhos. — Se neste mundo existir alguém capaz de ajudá-la, essa pessoa é Nova Lemyria, a rainha de Catália.
— Lemyria?! — Randalf exclamou, num misto de esperança e frustração. — Tentamos vê-la antes. Ela é conhecida como a maior curandeira do mundo, mas... ela não recebe ninguém. Fomos até lá e imploramos por uma audiência, mas foi em vão.
Eleazar sorriu com um ar misterioso.
— Acalmem-se. Esperem um pouco aqui.
Ele se retirou para os fundos da sala, deixando Randalf e Leonora ansiosos. Momentos depois, Eleazar retornou carregando um pequeno baú antigo, coberto de poeira. Com um gesto cuidadoso, abriu o baú sobre a mesa, revelando uma moeda de cor coral, com um “L” gravado no centro.
Randalf e Leonora se entreolharam, curiosos.
— O que é isso? — indagou Leonora.
— Um passe — explicou Eleazar, com um brilho nostálgico nos olhos. — Há muito tempo, participei de um... evento, junto com Lemyria. Embora o grupo dela tenha vencido, ela me presenteou com essa moeda como gratidão por uma ajuda que prestei a um companheiro da equipe dela. Com essa moeda, vocês conseguirão uma audiência com a rainha.
Randalf olhou para Eleazar, quase incrédulo.
— Quanto ela custa? Eu... eu posso não ter rilds suficientes para pagar algo tão raro.
Eleazar riu, negando com a cabeça.
— Não quero seu dinheiro, Randalf. Quero conhecimento. — Ele olhou diretamente para Randalf, o respeito e a admiração visíveis em seu semblante. — A sua ideia do homúnculo é promissora. Ainda que esteja bastante incipiente... Mas ela pode se tornar a chave para quebrar uma maldição que assola alguém muito próximo de mim... Portanto, leve a moeda. Apenas lembre-se de mim quando for capaz de criar o homúnculo e me procure, para que juntos possamos realizar esse feito.
Randalf apertou a mão de Eleazar, sentindo-se grato.
— Eu prometo. Não vou esquecer.
Com a moeda em mãos e o coração renovado de esperança, Randalf e Leonora deixaram o reino de Suna, partindo rumo a Catália para encontrar Nova Lemyria.
Rufus e Leonora atravessaram os portões do reino de Catália e foram recebidos por um cenário de montanhas distantes, seus cumes despontando ao horizonte, enquanto vinhedos e campos verdes se estendiam pelas encostas suaves. A vila que rodeava o castelo parecia uma pintura, com telhados de cerâmica e ruas de paralelepípedos banhadas pela luz dourada do entardecer. Construções de pedras antigas, adornadas com varandas de ferro forjado e coloridas flores nas janelas, conferiam um ar acolhedor e imponente ao mesmo tempo.
O castelo, com suas torres altivas e muralhas que refletiam o tom do céu, exalava a força e elegância de Catália. Suas estruturas eram ornadas com detalhes em mosaico, arcos largos e colunas esculpidas, transmitindo uma riqueza histórica e cultural. No portão principal, adornado com brasões e bandeiras, os guardas os interceptaram. Ao verem a moeda coral com o símbolo “L”, que Leonora trazia consigo, decidiram acompanhá-los.
Depois de alguns minutos de espera, os guardas abriram o portão principal do castelo e conduziram o casal ao salão do trono. Ao adentrarem o espaço amplo e luxuoso, viram a rainha Lemyria sentada à frente. Conhecida por sua habilidade como curandeira, a rainha segurava a moeda entre os dedos e a girava com destreza, seus olhos observando atentamente o objeto.
Lemyria tinha cabelo longo coral, olhos castanhos e vestia uma armadura prateada, com uma saia longa azul bebê e coral. Ela ergueu o olhar para o casal, examinando-os de cima a baixo com uma expressão avaliadora. Quando falou, sua voz era doce, mas havia nela uma firmeza inegável.
— Não me recordo de ter dado essa moeda a nenhum de vocês dois.
Imediatamente, Randalf e Leonora fizeram uma reverência respeitosa. Randalf, buscando as palavras certas, respondeu com humildade.
— Vossa graça, esta moeda nos foi dada de presente pelo curandeiro Eleazar BarHaram, do reino de Suna.
Lemyria soltou uma risada breve, quase zombeteira.
— Aquele maldito... então ele ainda guardava essa moeda. Muito bem — ela fez um gesto com a mão, indicando para que continuassem. — Agora, me digam, por que vieram até aqui?
Randalf contou a Lemyria sobre a condição de saúde de Leonora, mencionando suas inúmeras tentativas de cura, e lhe mostrou o caderno onde registrava suas anotações e teorias. Lemyria o folheou rapidamente, com olhar afiado, absorvendo cada detalhe, até que fechou o caderno e se voltou para Leonora.
Aproximando-se, a rainha lançou um olhar intenso e firme sobre ela. Os olhos de Lemyria eram perscrutadores, quase desafiadores, mas Leonora não desviou o olhar; sustentou a expressão altiva, não recuando diante da força da curandeira.
— Vejamos na prática como essa doença opera — disse Lemyria, e, sem aviso, ergueu a mão e tocou o rosto de Leonora.
Num instante, a mão de Lemyria começou a apodrecer, a pele desintegrando-se como se queimada por uma maldição. Em segundos, o braço da rainha estava reduzido a nada.
Randalf e Leonora caíram de joelhos, as faces pálidas e os olhos arregalados em um pedido de desculpas.
— Por favor, perdoe-nos, Vossa Graça! — implorou Randalf, desesperado. — Leonora não tem culpa! É algo que acontece sem sua vontade.
Para a surpresa do casal, Lemyria e os guardas ao redor riram. Ao erguerem os olhos, Randalf e Leonora viram que o braço da rainha estava completamente intacto. Lemyria apenas sorriu, quase divertindo-se com a cena.
— Acham mesmo que minha fama como maior curandeira do mundo é infundada? — disse ela, enquanto observava a surpresa nos olhos dos dois. Em seguida, voltou-se para Leonora, a expressão séria. — Qual a sua idade?
— Tenho vinte e cinco anos... — Leonora respondeu, ainda incerta com a linha de questionamento da rainha.
— E sabe lutar? — continuou Lemyria, ainda sondando.
— Treinei bastante, e adquiri muita experiência enfrentando guildas... — Leonora hesitou, mas logo continuou. — Guildas que buscavam... o cristal rubro na testa dele — completou, indicando Randalf com um aceno discreto.
Lemyria sorriu com um brilho de interesse no olhar.
— Entendo. E quanto à sua habilidade em combate, acha-se forte o suficiente para provar?
— Sim! — afirmou Leonora, o olhar determinado. — Randalf é quem domina magia para curas e pesquisa, mas, no combate, eu me destaco. Posso provar, se desejar.
Lemyria riu baixinho e bateu palmas.
— Pois vejamos! — exclamou, enquanto oito soldados armados com lanças se aproximavam, cercando o casal.
Randalf tentou se levantar, mas a voz autoritária de Lemyria o deteve.
— Ei, Flamel, você fica fora desta. Pode ser atacado, se quiser, mas não pode atacar. Essa luta é de sua esposa.
Leonora preparou-se, mantendo os olhos atentos ao movimento dos soldados. Eles avançaram ao seu redor, lanças erguidas, prontos para atacar. O primeiro soldado desferiu uma estocada, e Leonora desviou com uma rapidez impressionante, girando o corpo para evitar o ataque de outro soldado que vinha pela lateral. Ela se movia com leveza e precisão, os pés quase deslizando pelo chão, enquanto esquivava-se dos golpes com agilidade.
Com um movimento concentrado, Leonora levantou a palma da mão e uma esfera de energia começou a brilhar em seus dedos, crescendo rapidamente. Os soldados hesitaram por um momento, mas logo voltaram a atacá-la. Nesse instante, Leonora lançou a esfera de energia no ar, que explodiu em uma onda de energia sobre eles. O metal das armaduras e lanças começou a enferrujar rapidamente, como se décadas tivessem passado em segundos, tornando as peças pesadas e rígidas.
— O que... o que é isso?! — exclamou um dos soldados, tentando mover-se, mas sem sucesso.
A armadura agora enferrujada limitava os movimentos deles, e Leonora aproveitou a vantagem. Com uma sequência de golpes rápidos, incapacitou cada um dos oito soldados, enquanto desviava das poucas tentativas de resistência que ainda faziam. Em poucos minutos, todos estavam caídos ou imobilizados, o peso das armaduras corroídas os prendendo ao chão.
Quando o último soldado caiu, Lemyria começou a bater palmas devagar, um sorriso satisfeito surgindo em seu rosto.
— Muito bem, Leonora. Confesso que foi... divertido.
Randalf respirou fundo, sentindo a tensão do momento enquanto encarava a rainha à sua frente. Ele deu um passo à frente, inclinando-se respeitosamente.
— Vossa graça, depois de tudo o que viu... poderia curar minha esposa?
Sentada em seu trono, Lemyria apoiou o braço no espaldar e descansou a bochecha na mão, seus olhos estreitos avaliando-o. Ela parecia contemplar a ideia, mas sua expressão mantinha um toque de mistério e sagacidade.
— Curar, não sei... — respondeu ela, com uma voz calma e ligeiramente indiferente. — Mas posso tentar.
Randalf e Leonora trocaram olhares felizes e esperançosos, o coração deles batendo mais forte com a possibilidade de uma cura. Contudo, Lemyria logo interrompeu a esperança que começava a florescer nos dois.
— Eu disse que posso... — ela enfatizou, deixando escapar um sorriso irônico. — Não que eu vou. Pelo menos... não sem uma contrapartida.
A decepção passou brevemente pelo rosto de Leonora, mas logo ela se recompôs, aguardando as condições da rainha. Randalf engoliu seco antes de perguntar, tentando manter o tom respeitoso.
— Quanto devemos pagar pelo tratamento?
Lemyria deu uma risada curta, uma risada que soou como uma pequena vitória para ela, enquanto sua expressão se iluminava com uma leve diversão.
— Ah, Flamel... — murmurou ela, com um tom quase condescendente. — Seu dinheiro não me interessa. Eu vendo runas de cura para o mundo todo. O que não me falta é dinheiro.
Leonora inclinou-se um pouco à frente, olhos fixos em Lemyria, buscando entender o que, então, poderia interessar à rainha.
— O que seria, vossa graça? — perguntou Leonora, a voz carregada de uma determinação inabalável, ainda que contida.
Lemyria endireitou-se no trono, seu olhar se tornando intenso e sério. Ela parecia medir cada palavra, sua voz baixando ligeiramente, carregando um peso de importância.
— De tempos em tempos... ocorre um evento importante. Um que eu e minha equipe vencemos há alguns anos. Dentro de algum tempo, um evento similar vai ocorrer novamente — explicou, mantendo o olhar afiado em Leonora. — E quando esse evento vier, precisarei de competidores. Quero que, quando meu chamado vier, você lute por mim... seja uma das minhas representantes nesse evento.
Leonora arregalou os olhos, surpresos, mas logo olhou para Randalf, buscando sua aprovação. Ele lhe deu um leve aceno, um incentivo silencioso. Com a mesma determinação, Leonora voltou-se para a rainha e assentiu.
Lemyria abriu um sorriso satisfeito, quase predador, e levantou-se de seu trono, seus passos ecoando pelo salão de pedra. Ela olhou diretamente para Leonora, avaliando-a mais uma vez.
— Ótimo. Com seus poderes de desintegração, você será muito útil... — disse ela, girando graciosamente e começando a caminhar em direção a uma porta ao lado do trono. — Agora, sigam-me. Vejamos o que podemos fazer para tentar lhe curar.
Os corações de Randalf e Leonora voltaram a bater com força, desta vez por uma mistura de esperança e ansiedade, enquanto seguiam a rainha pelas sombrias passagens do castelo.