Luvas de Ifrit Brasileira

Autor(a): JK Glove


Volume 2

Capítulo 80: Observadores Ocultos

O tempo passou, a relação entre Osken e Arila se estreitou. A Senhora Babacoco via ao longe, surpreendida, Arila rindo ao conversar com Osken. Eles rapidamente namoraram e casaram.

Ao casarem, a Senhora Babacoco convidou Osken a morar em sua casa junto com Arila, a quem ela tratava como filha. O casal tinha o passatempo de deitar na grama e ficar observando as estrelas durante a noite. Em uma dessas noites, Arila pegou na mão de Osken e passou em sua barriga, informando que estava grávida. Ele ficou extremamente feliz e bastante ansioso com a notícia. Logo a criança nasceu e Arila pediu que ele fosse chamado de Otto, pois aquela criança era a única riqueza que ela possuía.

Após o nascimento de Otto, a família vive feliz e o tempo passa. A Senhora Babacoco tratava o garoto como seu neto, Osken era um pai brincalhão enquanto Arila aos poucos aprendia mais sobre como ser uma boa mãe. Embora Arila que já não fosse mais atormentada pelas lembranças de seu tortuoso passado, ela sempre se mantinha vigilante, observando algum eventual sinal de invasor, já que, assim como ela, Otto havia nascido com o selo do dragão, o qual se localizava em seu pé.

Em um certo dia, Osken e Otto decidiram se banhar na fonte termal. O vapor suave subia da fonte termal, misturando-se com a luz dourada do fim de tarde, revigorando as energias de pai e filho. Otto, agora com sete anos, estava brincando na água quente, enquanto seu pai se esforçava para mantê-lo à vista. Osken, com uma toalha amarrada de forma displicente na cintura, observava o filho com um sorriso de satisfação.

De repente, um grito estridente cortou o ar. Arila e a Senhora Babacoco correram, com o coração acelerado. Quando chegaram à fonte, a cena que encontraram as deixou em choque.

Osken segurava Otto com força, mas o menino não era mais um garoto comum. Ele havia se transformado em uma criatura magnífica e assustadora: um pequeno dragão aquático, com guelras pulsantes, escamas azuis cintilantes e asas que brilhavam com uma iridescência etérea. Seu corpo serpenteava como o de uma criatura das profundezas, e ele se debatia, aterrorizado com sua própria mudança.

— Cetus... — sussurrou Arila, lágrimas enchendo seus olhos. Ela levou a mão à boca, tentando conter o tremor que dominava seu corpo.

Otto se debatia, as garras e presas refletindo a luz do entardecer. Ele estava apavorado, sem entender o que havia acontecido com seu corpo. Osken, desesperado, tentava segurar o filho com a ajuda da Senhora Babacoco.

Arila, recuperando um pouco de sua compostura, avançou. Suas mãos começaram a brilhar e se transformar, assumindo a forma de garras dracônicas. Com uma rapidez surpreendente, ela pegou Otto, segurando-o firmemente. Seus olhos, antes suaves, agora estavam cheios de uma determinação fria.

— Otto, pare com isso! — Sua voz era firme e cortante, carregada de uma poderosa aura invisível e intimidadora. O garoto, aterrorizado com a severidade da mãe, começou a retroceder sua transformação involuntariamente, voltando lentamente à sua forma humana.

Arila balançou Otto pelos ombros, a urgência em sua voz clara e penetrante.

— Você nunca, nunca deve se transformar assim novamente. Para a sua segurança e a nossa.

Otto, ainda tremendo de medo, assentiu rapidamente, os olhos arregalados de pavor. Ele não compreendia completamente, mas sabia que havia algo profundamente errado em sua transformação.

A Senhora Babacoco, sempre a figura auxilidora e calmante, interveio.

— Venha, Otto. Vamos para dentro — ela envolveu o garoto em uma toalha e o levou para longe da fonte termal.

Osken, ainda recuperando o fôlego, virou-se para Arila, a voz cheia de frustração.

— Você foi muito dura com ele, Arila!

Ela estava chorando agora, suas lágrimas misturadas com raiva e tristeza.

— Você não entende, Osken. Isso não é uma brincadeira. — Ela respirou fundo, tentando controlar as emoções que borbulhavam dentro dela. — Otto se transformou em uma versão completa do Monarca Cetus. Não há restrição no selo do dragão. O sangue dele é uma maldição ainda pior que o meu.

— Arila, por favor, não use palavras tão duras — Osken tentou acalmar sua esposa.

Mas Arila o interrompeu, sua voz cheia de um desespero contido.

— Se alguém descobrir sobre a transformação de Otto, ele será caçado até os confins do planeta. Ele será um alvo para o resto da vida, tanto da GPA quanto das grandes guildas. O sangue de Otto pode mudar a balança de poder do mundo. Ninguém pode saber dessa informação.

Osken ficou em silêncio, as palavras de Arila pesando sobre ele como uma carga insuportável. Ele sabia que sua esposa estava certa. O que antes parecia ser uma vida tranquila em um vilarejo isolado agora estava em risco.

Sem dizer mais nada, Arila entrou na cabana, deixando o marido sozinho ao lado da fonte. O vapor continuava a subir, mas agora parecia frio e sombrio, refletindo a tensão no ar.

Na manhã seguinte, o sol se levantou sobre Taigyo, lançando uma luz suave e esperançosa sobre a vila. O ar estava fresco e limpo, mas havia uma tensão palpável no ar.

Otto acordou cedo, como Babacoco havia pedido. Ele desceu as escadas lentamente, sentindo-se ansioso e confuso. Sua mente ainda estava cheia de imagens da noite anterior, e ele não conseguia parar de pensar no olhar sério de sua mãe.

Arila estava esperando por ele no lado de fora da cabana. Ela parecia mais calma, mas havia uma gravidade em seus olhos que Otto nunca tinha visto antes. Ela segurava uma pequena bolsa de couro, cheia de runas.

— Bom dia, Otto — disse ela suavemente, tentando esconder a tensão em sua voz. — Hoje, começaremos seu treinamento.

Otto assentiu, ainda sentindo uma pontada de medo.

— O que vamos fazer, mamãe?

Arila se ajoelhou para ficar na altura dos olhos do filho.

— Vamos aprender a controlar sua transformação e a se defender. É importante que você saiba como lidar com seu poder.

Osken observava de uma distância segura, a expressão cheia de preocupação e amor. A Senhora Babacoco apareceu, trazendo uma bandeja com chá e pães frescos.

— Não há melhor forma de começar um dia de treinamento do que com um bom café da manhã — disse ela, sorrindo calorosamente.

Otto sorriu, sentindo-se um pouco mais leve. Ele se sentou ao lado de sua mãe, pronto para enfrentar o que quer que viesse a seguir. Após o café da manhã, Arila conduziu Otto para um pequeno campo aberto, cercado por árvores altas que balançavam suavemente ao vento.

Arila não mediu suas palavras. Contou toda a história da origem do seu poder e como ela foi cobaia em um experimento da GPA. Osken, que via de longe, achou uma loucura contar aquela história para uma criança de sete anos, mas Babacoco acalmou o rapaz. O garoto chorou e ficou nervoso, era muita informação para processar.

— Acalme-se, Otto! — esbravejou Arila. — Estou sendo dura para que aprenda a importância de controlar e esconder o seu poder. Utilize-o apenas para treinar ou em uma situação de extrema urgência, para se salvar.

— Quero que você tente se concentrar e sentir a energia dentro de você — complementou Arila, mantendo a postura rígida. — Quero que transforme apenas as suas mãos, mantenha o resto do corpo inalterado.

Otto se recompôs, fechou os olhos, tentando se acalmar.

— Respire fundo — Arila instruiu suavemente. — Sinta a energia fluindo através de seu corpo. Não tenha medo. Você é mais forte do que pensa.

O garoto respirou profundamente, sentindo a energia começar a se agitar dentro dele. Ele podia sentir a transformação tentando emergir, mas acabou transformando metade do corpo em uma forma dracônica, ao invés de só as mãos.

Arila bateu com um toco de madeira na mão do garoto e pediu para ele tentar de novo. Eles passaram o dia nisso. Otto tentava, mas não conseguia controlar sua transformação. Ele sentia medo e as batidas em sua mão doíam. Ele só queria desistir, achava tudo aquilo inútil. Mas Osken se cansou e interveio. Ele abraçou o garoto, com um sorriso confiante e olhou em seus olhos.

— Vamos tentar dessa vez do jeito do pai. Otto, eu confio em você. Transforme só as mãos, estou aqui com você — disse Osken entrelaçando suas mãos com a do filho.

Desta vez, o menino não estava com medo. Ele sabia que seu pai estava ali para ajudá-lo a controlar.

Arila observava atentamente, pronta para intervir se necessário. Mas, para sua surpresa, Otto conseguiu conter a transformação, mantendo apenas suas mãos em garras dracônicas.

— Você fez um ótimo trabalho, Otto — disse Osken, um sorriso de orgulho se formando em seus lábios. — Você tá começando a ficar mais forte. Agora vá descansar, terminamos por hoje.

O garoto foi correndo feliz para casa, sentindo-se realizado e muito forte. Osken virou-se e caminhou na direção da esposa com um olhar sério.

— Por que terminou o treino? Ainda poderíamos continuar — questionou Arila, emburrada.

— O que foi aquilo que eu vi, Arila? Você só sabia bater no garoto! Acho que esqueceu que ele só tem sete anos — disse Osken, com raiva.

— Eu estou treinando nosso filho. Ele precisa ser forte. Inimigos poderosos chegarão até ele. O que vai fazer se não estiver preparado?

— Arila, ele só tem sete anos. Você tem que entender as limitações da idade e da mente. Com a nossa ajuda, ele vai conseguir controlar a transformação sem violência.

— Não é assim que eu fui treinada.

— E você quer fazer com ele o que fizeram com você! – esbravejou o marido, suas palavras duras foram como flechas na esposa, que reconheceu o erro. — Ele não é uma arma de guerra, é só um garoto. Nosso filho não tá precisando de uma professora, tá precisando da mãe dele – complementou ele, virando-se, no intento de sair do local.

Arila abraçou seu esposo, respirou fundo, sentindo as lágrimas se acumularem novamente.

— Tem razão... Obrigada, pescador!

— Vamos trabalhar juntos nisso. Para o bem de Otto — respondeu Osken, retribuindo o abraço.

Mais tarde, durante a noite, Arila entrou no quarto do garoto, que estava deitado olhando a lua pela janela. Ele viu sua mãe e ficou surpreso.

— Não tá conseguindo dormir, filho?

— Não, mamãe. Hoje foi difícil, minhas mãos doem. Mas amanhã já estarão melhores — falou Otto, olhando para a lua. — Mamãe, desculpa por hoje, eu ainda sou fraco, mas prometo que vou melhorar. Acho que estou começando a enten..,

Arila interrompeu a fala do filho, abraçando-o e chorando.

— Eu que peço perdão, Otto! Fui tola, não queria ter te batido, eu me excedi. Só estou preocupada com sua segurança. Eu te amo tanto, não consigo nem medir em palavras, eu daria a minha vida por você sem hesitar, saiba disso!

O garoto ficou vermelho e feliz com as palavras da mãe, abraçando-a com força, sentindo todo o carinho.

— Filho, hoje você foi sensacional. Amanhã, se conseguir avançar no seu treino, eu prometo que no dia seguinte vamos apenas pescar, eu, você e seu pai — complementou Arila, pegando nas bochechas da criança.

Otto sorriu e concordou com a cabeça. A felicidade do garoto era contangiante, já que pescar era aquilo que ele mais amava fazer. Otto pediu à mãe que dormisse ao seu lado. Ela assim o fez. O garoto sentiu-se envolto de confiança e amor.

Meses passaram enquanto Otto continuava seu treinamento com seus pais. Cada dia o trazia mais perto da compreensão de seus poderes e de sua conexão com Cetus. Entretanto, longe dali, no alto de um penhasco com vista para o vilarejo tranquilo de Taigyo, dois homens encapuzados observavam atentamente em meio a neve que caía e anunciava o início do inverno na região.

Os homens, cobertos por mantos pesados que os protegiam do vento cortante e congelante do penhasco, fixavam seus olhares no vilarejo abaixo em meio a neve. A lua cheia iluminava suas figuras sinistras, projetando sombras longas e ameaçadoras.

 

 

— Depois de tantos anos, finalmente a encontramos — falou um dos homens, que era alto e forte, com uma voz grave e cheia de determinação.

— Sim, mas ela tá casada e com um filho... — o segundo homem, com uma voz mais suave, porém marcada por uma tensão palpável.

— Hugo, não me diga que você amoleceu com o tempo — zombou o homem alto com desdém. — Eu vim aqui para conseguir o que preciso e não voltarei de mãos vazias. Eu nunca retrocedo, já devia saber disso!

— Vamos apenas alterar nossa estratégia. Não quero envolver o filho dela... Eu ainda devo isso a ela — murmurou Hugo, lembrando-se do passado, sua voz ganhando um tom de pesar.

— Cuidado com sua gentileza, Hugo. Isso pode acabar te matando. Neste mundo ou você é presa ou é caçador! Mas pela sua lealdade, farei do seu jeito, contanto que ela realmente consiga fazer aquilo que eu quero.

— Não se preocupe. Como sempre, tudo sairá conforme a sua vontade, Jhon Bash — disse Hugo com o olhar determinado, a silhueta de sua capa desaparecendo entre as sombras das árvores.



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