Luvas de Ifrit Brasileira

Autor(a): JK Glove


Volume 2

Capítulo 79: Cobaia

No dia seguinte, junto com os primeiros raios de sol, Osken ajustou a espada em seu cinto com um suspiro resignado. A floresta próxima ao vilarejo isolado se estendia diante dele. Ao seu lado, Arila caminhava com uma postura impecável, sua lança balançando suavemente ao ritmo de seus passos determinados.

 

 

— Estou feliz por estar aqui com você — disse Osken, tentando quebrar o silêncio entre eles. — Há muito que posso aprender nesta missão.

Arila não respondeu, seus olhos fixos no caminho à frente. Ele tentou um novo ângulo:

— Ouvi dizer que urso polarino são perigosos, mas com suas habilidades, tenho certeza de que podemos enfrentá-los.

— Sim, poderemos — ela respondeu finalmente, a voz fria como o gelo ao redor deles que começava a se formar.

— Por que continua a me tratar tão friamente, Arila? Você mal fala comigo — perguntou ele, sua voz carregada de frustração mal contida.

Ela parou e virou-se para ele, seus olhos frios encontrando os dele.

— Não estou te tratando com frieza — respondeu ela com calma. — Simplesmente não tenho nada a dizer.

Osken sentiu uma pontada de desespero e segurou a mão dela impulsivamente.

— Arila, sei que me conheceu fraco — começou ele, sua voz trêmula com emoção. — Mas eu treinei, fiquei mais forte. Não sou mais o imaturo e fraco que você conheceu. Você me fez melhor nesses seis meses. Eu não vou desistir de você. Ficarei ainda mais forte, até chegar no patamar que você tanto almeja para o seu futuro marido.

Ela o encarou, seu rosto como uma máscara enigmática que não revelava nada do turbilhão que poderia estar acontecendo por dentro. Sem uma palavra, ela se desvencilhou de seu toque e continuou seu caminho.

Osken sentiu-se diminuído pela rejeição silenciosa dela e seguiu viagem sem dizer uma única palavra. Após horas de caminhanda, com o crepúsculo alaranjado já deixando seus últimos brilhos no céu, Arila puxou Osken abruptamente para baixo, colocando um dedo sobre os lábios em um gesto claro para silêncio. Ela apontou para a frente onde vários batedores se moviam furtivamente entre as árvores.

— Veja! Um acampamento de magos batedores. Provavelmente sãoe eles que possuem o urso polarino. Vamos atacar, eu vou na frente — sussurrou ela. — Me dê cobertura e não se precipite.

Mas Osken estava cansado de ser apenas uma sombra aos olhos dela.

“Se continuar assim, ela nunca vai ver minha real força e nunca vai se apaixonar por mim.”, pensou o mago de luz. — Não! Desta vez eu liderarei — disse ele firmemente em seguida.

Antes que ela pudesse protestar, ele avançou e liberou sua técnica Radiant Flash, um clarão cegante que atordoou o mago mais próximo. Com um golpe rápido de sua espada, Osken o derrubou.

— Eu te falei que eu fiquei mais forte — disse ele com um sorriso triunfante.

Mas o sorriso desapareceu quando Arila o empurrou para o chão e uma flecha flamejante passou zunindo onde sua cabeça estava segundos antes.

— Um guerreiro imaturo e tolo é tudo o que eu vejo — rosnou ela, enquanto lançava sua lança em outro mago e suas mãos se transformavam em garras draconianas. — Fique aqui e não cause mais confusão.

Ela se moveu entre os magos como uma tempestade silenciosa, cada golpe seu uma combinação letal de graça e poder mortal. Os magos invasores viam apenas um demônio destroçando-os um a um, mas Osken via uma maga lutando com leveza e movimentos fluidos, como se dançasse. Ela girava e dava acrobacias, acertando pontos vitais, lançando ácido líquido e paralisando os inimigos com suas garras. Ela continuava esses movimentos até entrar no acampamento dos magos.

Um dos oponentes que estava dentro do assentamento, montou em cima do urso polarino, liberando suas correntes e o fazendo de sua montaria. O urso polarino ergueu-se em suas patas traseiras, revelando um colar com várias runas acopladas que o adornava.

Arila enfrentava o último dos magos, o homem que controlava um urso polarino imenso através de runas mágicas. O mago acionou a primeira runa e o urso rugiu, liberando uma chama ardente que brotava de sua boca aberta, mas Arila estava pronta. Com um movimento fluido, ela lançou sua técnica Acid Bomb (Bomba Ácida), suas garras draconianas brilhando com um líquido corrosivo que anulou o fogo.

O mago não desistiu, acionando outra runa e conjurando uma rajada de vento que Arila desviou com a graça de uma acrobata. Ela contra-atacou com outra Acid Bomb, mas um muro de terra ergueu-se para proteger o urso. Arila não hesitou; balançou suas mãos, lançando escamas de dragão das suas garras, atingindo o peitoral do urso e mergulhando o animal em confusão.

O urso, agora em frenesi, começou a atacar indiscriminadamente, acionando as runas do colar aleatoriamente. Quando tentou se aproximar, Arila foi atingida por uma nova rajada de vento que a lançou para longe.

Osken, observando do alto de uma ponte improvisada dentro do acampamento rebelde, sabia que era sua chance de ser útil. Ele correu e saltou na direção do caos abaixo, liberando seu Radiant Flash no ar. O clarão cegou temporariamente o mago e o urso. Enquanto caía, Osken acertou um soco envolto de aura de elemento luz no mago, derrubando-o da montaria.

Arila aproveitou a distração e atacou as patas do urso com sua técnica Paralyzing Claw (Garra Paralisante). Ela girava em um balé mortal, suas garras deixando a fera paralisada. Com um golpe final, ela bateu a cabeça do urso contra o chão, deixando-o inconsciente.

Osken enfrentava agora o mago desmontado com seus punhos. Um soco certeiro acertou no rosto do mago inimigo, que até tentou fugir, mas Arila estava lá para interceptá-lo com um golpe no estômago que o fez cair de joelhos.

— Por que estão aqui? — ela exigiu saber. — O que querem com nosso vilarejo?

O mago riu e revelou uma runa explosiva em seu casaco. Ele se detonou em uma explosão contida. Arila agiu rapidamente com um impulso fervoros, puxando Osken para longe do perigo, como se teletransportasse.

— Obrigado — disse Osken, ainda ofegante.

— Seu golpe foi rápido e eficaz — elogiou Arila, fazendo Osken corar.

Eles vasculharam o acampamento em busca de informações. Osken encontrou uma carta endereçada a um tal Jhon Bash, detalhando planos para capturar Arila. Ao longe, sua companheira perguntou:

— Osken, eu não encontrei nenhuma informação relevante e você?

“Se eu disser a ela sobre essa carta, provavelmente ela vai abandonar o vilarejo e a mim. No que eu tô pensando? Não posso ser egoísta a esse ponto, preciso contar. Mas... essa carta não foi nem enviada, não vai fazer mal se eu a manter em segredo. O que eu faço? Conto ou fico em silêncio?”, pensava Osken aceleradamente, cheio de dúvidas sobre qual decisão deveria tomar.

— Osken, por que não responde? Encontrou algo relevante? — falou Arila ainda longe, aproximando-se dele.

— Desculpa, Arila, não escutei. Não encontrei nada relevante — respondeu Osken, temendo perder a mulher de quem era apaixonado e decidindo manter-se omisso, amassando e descartando a carta ocultamente.

Depois das procuras, concluíram que a base não continha nada importante e, portanto, Arila supôs que os magos estivessem apenas se escondendo na floresta. Com isso em mente, eles decidiram retornar ao vilarejo para relatar suas descobertas, embora Osken mantesse o real motivo daqueles magos estarem lá em segredo.

Sob o manto prateado do luar, Osken e Arila caminhavam de volta ao vilarejo quando as primeiras gotas de chuva começaram a cair. Eles se abrigaram sob uma grande pedra, cercada por árvores e cipós, decidindo esperar ali até o amanhecer. Uma fogueira foi acesa e logo adormeceram.

Arila se contorcia em seu sono, assombrada por um pesadelo vívido de sua infância. No sonho, ela estava presa em um laboratório, onde um cientista de rosto oculto realizava experimentos dolorosos em seu corpo. Seus gritos eram tão intensos que Osken despertou sobressaltado, alarmado ao ver sua companheira debatendo-se e gemendo de dor.

Ela despertou abruptamente, lágrimas escorrendo pelo rosto, ainda presa ao terror de seu pesadelo. Osken a envolveu em seus braços, tentando acalmá-la com palavras suaves, sua voz carregada de ternura e preocupação.

— Tá tudo bem — ele sussurrou, mas Arila ainda tremia, aterrorizada, suplicando em meio às lágrimas para que não a levassem de volta àquele lugar sombrio.

Osken ficou atordoado; sempre a vira como uma guerreira forte e inabalável, mas agora, diante dele, ela se mostrava vulnerável, marcada pelas cicatrizes invisíveis que a Senhora Babacoco havia mencionado.

— Ninguém vai te tirar daqui — ele prometeu. — Este é o seu lar agora.

Ainda abraçados no silêncio da noite, o som distante das cigarras era o único testemunho do que se passava entre eles. O brilho da fogueira projetava sombras dançantes, criando uma atmosfera quase surreal. Após um longo suspiro, Arila finalmente quebrou o silêncio, sua voz baixa e trêmula ao revelar sua verdadeira história.

— Eu sou uma descendente do clã do dragão...

— Clã do Dragão? Nunca ouvi falar... O que isso significa? — perguntou Osken, confuso, franzindo o cenho.

Os olhos de Arila se fixaram nas chamas, como se ela estivesse procurando respostas no passado distante, perdido nas eras. Sua voz adquiriu um tom melancólico, carregada pelo peso das memórias.

— Na época em que o mundo era governado por Arcanos, existiam oito dessas criaturas acima de todas as outras... Eles eram chamados de Dragões Monarcas, cada um representando um elemento: fogo, água, vento, terra, raio, luz, trevas e espaço. Depois que Infhytos foi derrotado, os Monarcas aceitaram o destino dos Arcanos e decidiram tirar a própria vida, recusando-se a se tornarem invokers nas mãos dos humanos.

Ela fez uma pausa, observando as chamas, as brasas parecendo dançar ao ritmo de sua narrativa.

— No entanto, mesmo sem saber o motivo, um grupo de humanos herdou parte do poder desses Monarcas em suas veias, e assim surgiu o Clã do Dragão. Entretanto, os membros deste clã nascem com uma marca rúnica, o selo do dragão, que impede que o poder dos Monarcas se manifeste por completo... Somos como invokers humanos quebradas.

Osken, intrigado, perguntou com um toque de hesitação:

— E onde fica sua marca? Posso vê-la?

Arila olhou para ele, mantendo uma expressão triste e distante.

— Entre os seios.

Osken corou instantaneamente, seu rosto ardendo em embaraço.

— M-melhor não... — gaguejou, nervoso.Arila soltou um suspiro pesado, como se libertasse um peso de dentro de si.

Arila soltou um suspiro profundo, como se um peso invisível estivesse finalmente sendo aliviado. Lentamente, ela começou a contar a parte mais dolorosa de sua história.

— Quando eu tinha 11 anos, a GPA atacou meu vilarejo e levou várias crianças... Mas só aquelas que tinham o selo do dragão. Fomos levados para um laboratório... Lá, eles nos transformaram em cobaias.

Osken ficou pensativo, ainda tentando processar as informações.

— Afinal, o que eles queriam?

— Romper o selo... — Arila fechou os olhos por um momento, sua voz ficando sombria, cheia de dor. — Fomos torurados, humilhados e submetidos a tratamentos desumanos, tudo para fazer com que manifestássemos o poder dos Dragões Monarcas. Eles queriam uma fórmula para criar supersoldados a todo custo.

Osken sentiu uma raiva crescente em seu peito, o calor da fogueira ecoando o fervor em seu coração.

— Malditos... — murmurou entre dentes. — Como puderam fazer isso com crianças? Eu não sabia que a GPA tinha esse lado... Aquelas suas garras... são a manifestação do poder de um Dragão Monarca?

Arila assentiu, seus olhos voltados novamente para a fogueira, imersa nas lembranças.

— No meu sangue corre o poder de Cetus, o Dragão Monarca da Água. Ele controla todo tipo de veneno, o que significa que posso sintetizar qualquer substância tóxica em meu corpo... Quanto mais poder mágico acumulo, mais fortes se tornam os efeitos dos meus venenos.

— Então... os experimentos da GPA funcionaram? Eles conseguem criar livremente supersoldados? — perguntou Osken, hesitante.

— Na verdade... o sucesso dos experimentos foi apenas parcial — Arila respondeu com uma amargura evidente na voz. — Conseguiram liberar parte do poder, mas nada completo. Eu, por exemplo, posso manifestar apenas minhas garras... Nosso corpo simplesmente não aguentaria o poder total de um Dragão Monarca.

Osken a observava atentamente, seus pensamentos mergulhando em preocupação.

— Existem outras pessoas como você? Usadas como armas químicas?

—Dos experimentos realizados, apenas oito de nós foram considerados exitosos por conseguirem romper o selo a um nível satisfatório. Os outros... — Sua voz tremeu levemente. — Ou morreram, ou foram considerados como lixo... Por não terem atingido o nível esperado.

Osken sentiu um aperto no coração, sua voz baixa e suave.

— Sinto muito... Não consigo nem imaginar o quão doloroso isso foi para você...

Arila assentiu, enquanto lágrimas escorriam involuntariamente por seu rosto.

— Sim! Íamos ser cobaias pelo resto da vida, mas um grupo de pessoas nos libertou. Não lembro muito bem dos detalhes, mas eles nos colocaram em botes e nos lançaram ao mar. Acredito que as oito cobaias principais tenham sido levadas para lugares diferentes. Eu acabei na vila onde fomos encontrados pelos pescadores.

Osken sentiu uma mistura de tristeza e determinação crescer dentro de si. Ele apertou gentilmente o ombro de Arila, como se o simples gesto pudesse transmitir todo o apoio que ele queria oferecer.

— Arila, não sei se tenho palavras certas para te consolar agora — disse ele, sua voz suave mas firme —, mas prometo, com toda minha alma, que nunca vou te abandonar. Jamais permitirei que te levem de volta para aquele laboratório.

Arila olhou para Osken, surpresa pela sinceridade que emanava de sua voz e pela força que ela não esperava encontrar ali.

— Obrigada, Osken — murmurou ela. — Pode não parecer, mas essas foram as melhores palavras que eu poderia escutar. E... o que lhe contei é segredo. Somente você e a Senhora Babacoco sabem disso. Por favor, mantenha assim.

Osken assentiu de imediato.

— Fique tranquila. Seu segredo está seguro comigo. — Ele então tentou desfazer o abraço, um tanto tímido, mas Arila segurou sua mão e o puxou de volta para perto dela.

— Por favor, Osken — pediu ela, num sussurro quase frágil —, continue me abraçando. Seu abraço... tem um calor reconfortante.

Um sorriso tímido se espalhou no rosto de Osken, enquanto ele a abraçava novamente, desta vez com mais firmeza. Em sua mente, as palavras da Senhora Babacoco ecoavam com clareza: “É na aceitação das fraquezas que o verdadeiro amor floresce.”

“O quão idiota eu fui. Arila nunca precisou de um homem poderoso em magia ao seu lado... Ela precisava de alguém que fosse poderoso nos sentimentos. Alguém que entendesse suas feridas e a ajudasse a curá-las. Obrigado, Senhora Babacoco, por me ajudar a ver isso.”, pensou Osken, enquanto seu coração se aquecia com uma nova compreensão.

O brilho suave da fogueira dançava nos olhos de Arila, refletindo a tristeza que ela ainda carregava, mas também a força interior que Osken sabia que ela tinha. Ele sentia o coração dela bater junto ao seu, e com isso, uma nova determinação nasceu dentro dele. O silêncio se instalou entre eles, mas não era um silêncio vazio; era um silêncio de compreensão mútua e de promessas não ditas. Osken então fez uma promessa a si mesmo: ele protegeria Arila, e juntos, encontrariam a paz que ela tanto merecia.



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