Volume 2
Capítulo 63: O Queridinho do Major
Nathan saiu da sala do Major lendo os documentos rapidamente e dirigiu-se até as celas, localizadas no subsolo da base. O ambiente era sombrio, com tochas mal iluminando os corredores de pedra fria. Ao chegar, viu dois soldados mexendo em um baú. Aproximando-se com passos firmes, ele perguntou:
— O que estão fazendo, soldados?
— Capitão Nathan! Os dois se assustaram, trocando olhares nervosos, logo depois, bateram continência. — Este é o baú que o General Levi Burgess enviou para a base há alguns dias, contendo algemas de cristais de oricalco para selamento de poderes mágicos e armas rúnicas. Estávamos apenas inspecionando os materiais, para garantir que nenhum item esteja faltando. Temos que assegurar que nada seja extraviado até que o Capitão Levi chegue e leve os prisioneiros capturados.
— Entendido, soldados. — Nathan, desconfiado, assentiu. — Só acho que já conferiram por bastante tempo os itens deste baú. Guardem isso e me levem até os prisioneiros.
Os soldados guardaram o baú e guiaram Nathan pelos corredores sinuosos até as celas. Enquanto caminhavam, o Capitão refletia: “Como eles sabiam que fui promovido a Capitão? Ainda não tive tempo de corrigir a patente no meu uniforme. Tenho certeza de que o Major não espalharia a notícia antes de me contar. Isso é estranho...”
Chegando às celas, Nathan dispensou os soldados, querendo conversar a sós com os prisioneiros. Ele puxou um banquinho de madeira e sentou-se em frente à cela, encarando os dois prisioneiros.
— Carmine Osken e seu filho Carmine Otto. Nas fichas de vocês, não há nada de especial. Contudo, devem ter cometido um crime grave para que o General Levi Burgess tenha ordenado pessoalmente a captura de vocês.
Otto, mesmo sendo criança, respondeu com um olhar desafiador:
— Nosso crime é estarmos vivos. Simples assim.
— Não fale nada, filho. — Osken abraçou o filho, tentando acalmá-lo. — Deixe esse militar maldito para lá.
Nathan, com um sorriso reconfortante, disse:
— Calma. Vim apenas saber se já comeram ou se algum militar lhes fez mal. O Major Guinter recebeu ordens para que estivessem em plena saúde. Portanto, se algum soldado lhes fez algum mal, podem me falar.
— Estamos com fome. Aqueles dois que saíram nos deram apenas restos de comida e ficaram zombando da nossa cara — Otto, com fome, respondeu prontamente.
— Já falei para não falar. Esse homem é nosso inimigo — Osken, desconfiado, repreendeu o filho.
— Não se preocupem, vou pedir para prepararem um bom filé para vocês. Não precisam me considerar um inimigo. De todos os militares daqui, sou o mais próximo do conceito de amigo que vocês podem ter — disse Nathan, tentando ganhar a confiança deles.
— Se eu pudesse considerá-lo um amigo, você já nos teria libertado, ou pelo menos libertado meu filho. Ele é só uma criança — Osken, cético, replicou com deboche.
Nathan, mantendo a calma, suspirou, coçou a cabeça e respondeu:
— Isso eu não posso fazer, mas posso garantir que tenham uma estadia agradável até que o General Levi venha buscá-los em quinze dias. Agora, vou agilizar o prato que prometi. Mais tarde, volto para ver como estão. Outra coisa, se precisarem de algo, peçam aos guardas para me chamarem. Sou o Capitão Nathan Guts.
— Nathan Guts, o queridinho do Major? — debochou Otto, com um sorriso malicioso.
— Cuidado com a forma como fala. — Nathan, irritado, virou-se para Otto. — Um conselho: não se debocha dos outros, especialmente daqueles que você deve considerar amigos.
— Também tenho um conselho para você, Capitão. Cuidado com o que os amigos oferecem na festa de despedida. Nesse tipo de evento, não é bom beber nada alcoólico — retrucou Osken, também com um tom irônico.
Nathan, alarmado, perguntou em voz alta:
— O que quer dizer com isso, prisioneiro? Fale!
— É o que posso dizer por um prato de filé. Nos tire daqui e talvez eu possa lhe dar mais alguns conselhos valiosos — respondeu Osken, tentando barganhar.
— Vocês estão muito desafiadores comigo. Talvez eu deva repensar nossa “amizade”.
— Calma, Capitão. Foi só um conselho — retrucou Osken, percebendo a seriedade de Nathan.
Saindo das celas, Nathan estava confuso e pensativo. O Capitão percebeu um clima estranho na base; soldados cochichavam e trocavam olhares furtivos. Havia uma sensação no ar, uma tensão palpável que indicava que algo estava prestes a acontecer.
No dia anterior à sua viagem para o novo posto militar, Nathan foi surpreendido pelos soldados com uma festa de despedida em sua honra. A sala principal da base estava cheia de risadas e músicas, enquanto o cheiro de comida e bebida permeava o ar. As mesas estavam cobertas de iguarias e bebidas, e os soldados estavam animados, brindando e compartilhando histórias.
“Uma noite de folga... Acho que o Major não vai gostar dessa ideia”, pensou Nathan, preocupado com a reação do seu superior.
A barulheira atraiu a atenção do Major Guinter, que desceu até o salão com uma expressão curiosa e irritada.
— Que baderna é essa, soldados? — rugiu ele com a voz firme.
O soldado Tyr, um dos mais próximos de Nathan, respondeu com um sorriso amigável:
— Major, estamos comemorando a saída de Nathan. Amanhã ele não estará mais conosco, então decidimos fazer essa festa surpresa. Esperamos que não se incomode. Pelo contrário, gostaríamos que se juntasse a nós.
Guinter estreitou os olhos, mas não conseguiu esconder um leve sorriso.
— Uma festa? Vocês estão ficando moles, soldados?
— Major, faça uma exceção apenas hoje. Estamos falando do Nathan. Não faz mal uma única noite podermos comer e beber em homenagem ao nosso querido Capitão. Inclusive, sabemos que o senhor adora hidromel. Preparamos um tonel inteiro para satisfazer sua sede de leão. Tyr replicou astutamente, sem perder o humor, cutucando o braço do Major com seu cotovelo.
— Hidromel? Guinter hesitou, mas a tentação era grande. Hidromel era sua fraqueza. — Bom, uma noite em homenagem ao Capitão não vai fazer mal. Mas não se acostumem! Agora tragam o tonel de hidromel — disse o Major, tentando manter a autoridade, mas com a voz mais baixa e quase envergonhada.
Os soldados explodiram em comemoração enquanto traziam o grande barril de hidromel. Guinter o pegou com entusiasmo e levou-o para sua sala. Nathan, por sua vez, sentia-se aliviado e feliz com a homenagem.
“Eu estava desconfiado à toa. Os soldados estavam estranhos porque planejavam essa festa surpresa. Deveria me desculpar por ficar pensando besteira enquanto eles se esforçavam para me homenagear.”. refletiu ele, com um sorriso.
Enquanto Nathan aproveitava o momento com seus amigos, um dos soldados se aproximou, oferecendo-lhe um copo de bebida alcoolica. No momento em que Nathan pegou o copo, as palavras de Osken ecoaram em sua mente. Ele recusou educadamente, mas o soldado insistiu. Nathan, porém, manteve-se firme.
Durante a comemoração, a insistência em oferecer bebidas alcoólicas a Nathan continuava. Ele lembrava-se do aviso de Osken e recusava educadamente cada oferta. De repente, enquanto Nathan ria de uma piada, um soldado tropeçou e acidentalmente jogou a bebida de seu copo em direção à boca de Nathan. Rápido como um raio, Nathan tampou a boca com a mão. O soldado atrapalhado desculpou-se, mas Nathan notou que os outros soldados se entreolhavam nervosos.
Ele precisava relatar suas suspeitas a Guinter, mas não conseguia encontrar o Major em lugar nenhum. Ao questionar os soldados, ninguém sabia dizer onde ele estava. A ausência de Tyr e alguns outros soldados também não passou despercebida.
Nathan decidiu fingir um mal-estar e disse que ia ao banheiro aos seus amigos. Dois soldados prontamente se ofereceram para acompanhá-lo. Desconfiado, Nathan pensou: “Eles querem me vigiar. Algo está muito errado.”
Ao entrarem no banheiro, Nathan aproximou-se dos dois soldados com um gesto amigável.
— Pessoal, estou muito feliz com a homenagem. Vocês são verdadeiros amigos. Vou sentir falta de vocês.
Quando se aproximou para abraçá-los, Nathan transformou-se rapidamente em sua forma híbrida, agarrando o pescoço dos dois soldados e sufocando-os até desmaiarem. Ele saiu do banheiro silenciosamente e dirigiu-se às celas.
Chegando lá, Nathan encontrou Osken e Otto, ainda presos. Ele os encarou com urgência.
— Onde está o Major Guinter? O que os soldados fizeram com ele? — perguntou Nathan, com os olhos fixos nos prisioneiros.
Osken sorriu de forma irônica.
— Se está aqui, quer dizer que seguiu meu conselho.
— Não tenho tempo para piadinhas. Onde está o Major?
Osken ergueu as sobrancelhas, ainda com um tom provocativo.
— Eu já disse. Se quiser mais conselhos, nos liberte.
Nathan rosnou, transformando-se novamente em sua forma híbrida e quebrando as grades da cela com suas garras afiadas. Os prisioneiros saíram, surpresos com a força do Capitão.
— Fiz minha parte do acordo. Agora é a vez de vocês – exigiu Nathan.
Osken assentiu.
— Os soldados levaram o Major desacordado para um lago congelado próximo. Se você for rápido, ainda poderá alcançá-los. Agora, quebre as algemas inibidoras de magia.
— Vocês continuam algemados. Não confio em vocês — Nathan recusou.
— Ei, você disse que ia nos libertar! Se nos deixar assim, é só uma questão de tempo até que sejamos novamente capturados — Otto, desesperado, protestou.
— Quem disse que vou deixar vocês aqui? — Nathan foi categórico. — Vocês dois vêm comigo. Quero ter certeza de que não estão mentindo. Vamos! Eu conheço esse lugar melhor que qualquer um.
Resmungando, Osken e Otto seguiram Nathan enquanto ele os guiava silenciosamente para fora da base. O trio conseguiu escapar da base sem serem notados. Do lado de fora, o frio cortante e o vento gelado os envolviam enquanto corriam pelo gelo em direção ao lago congelado. Durante o percurso, Nathan aproveitou a oportunidade para obter mais informações.
— Antes de chegarmos ao lago, me contem tudo o que sabem. Como conseguiram essas informações?
Osken começou a explicar, enquanto corriam pelas terras geladas.
— Após receberem o baú com os equipamentos rúnicos e as algemas inibidoras de magia, os soldados começaram a se reunir na sala das celas, planejando um motim contra o Major. Eles não aguentavam mais os treinamentos extremos dele. Então decidiram matá-lo antes que morressem nos treinamentos. Vasculharam o gabinete do Major e descobriram sua promoção. Planejaram uma festa surpresa como uma desculpa, sabendo que ele abriria uma exceção para celebrar a transferência do “queridinho”. Adulteraram a bebida para que você e o Major dormissem.
— Por que eu também? — Nathan ficou em choque. — Tinham inveja da minha relação com o Major?
— Não, eles gostam de você. Queriam que você apenas dormisse, pois sabiam que você impediria o plano deles de levar o Major algemado e desacordado até o lago, para matá-lo nas profundezas congeladas.
— Precisamos nos apressar — murmurou Nathan ao sentir o peso da responsabilidade em seus ombros.
Chegando às proximidades do lago, eles se esconderam atrás de uma rocha coberta de gelo. Observavam Tyr e sete outros soldados jogando o corpo de Guinter nas águas geladas. Antes que pudessem reagir, um oitavo soldado, segurando uma escopeta rúnica, apareceu por trás deles, pegando-os de surpresa.
— Vejam o que encontrei por aqui, pessoal. Exatamente como você tinha dito, Tyr – gritou o soldado, com um sorriso de escárnio.
Tyr fez um sinal com a mão, chamando Nathan para se aproximar. O Capitão obedeceu, enquanto Osken e Otto, ainda algemados, permaneciam com armas apontadas para suas cabeças. Quando estavam próximos, Tyr falou com um tom de tristeza.
— Por que tinha que vir, Nathan? Não queremos matá-lo. Você é um cara legal. Vamos te dar uma chance. Apenas volte para a base e siga seu destino.
— Vocês enlouqueceram? — Nathan balançou a cabeça, incrédulo. — Estão cometendo um motim e assassinando um Major. Isso é um crime gravíssimo, passível de pena de morte.
— Depende... Se ninguém souber, não há crime — Tyr tentou justificar.
— Tyr, pense melhor. Vocês não são assassinos. O Major é uma boa pessoa. Ele só quer fazer de vocês soldados melhores, assim como fez comigo.
— Nathan, nem todos são como você. — Tyr suspirou, lágrimas rolando pelo rosto. — Nós prezamos mais nossas vidas do que força ou ascensão militar. Só queremos um trabalho tranquilo. Você vai embora, mas nós ficamos, fugindo da morte todos os dias. Ninguém aguenta mais. Esta é nossa única chance de sobreviver —gritou ele, retirando todo o sentimento que guardava dentro do peito.
— Essas justificativas fajutas não me convencem. Tyr, deixe-me entrar livremente na água para resgatar o Major Guinter ou farei isso contra a sua vontade. Como vai preferir? — declarou Nathan, mantendo a voz firme.
— Desculpa, Capitão, mas não podemos voltar atrás. Agora é matar ou morrer — respondeu Tyr, com a voz trêmula.
Com um movimento rápido, Tyr sacou uma pistola de dentro de seu casaco e disparou contra o peito de Nathan.
O Capitão Nathan caiu no chão, sangrando, enquanto Tyr completava:
— Essas balas são reforçadas com runas de dureza. Elas atravessam sua pele espessa de tamanduá. A culpa é sua, você se meteu em algo que não deveria.
Quando Tyr tentou recarregar a arma com outra runa, Nathan usou sua língua para desarmá-lo. Levantando-se rapidamente, ele usou suas garras para cortar o pescoço de Tyr, que morreu rapidamente. Os demais soldados abriram fogo, acertando algumas balas no Capitão, mas isso não o impediu de pular na água e mergulhar até o fundo do lago, deixando um rastro de sangue por onde nadava.
Lá embaixo, ele encontrou Guinter acordado, mas extremamente calmo, como se soubesse que alguém viria resgatá-lo. Nathan, com suas últimas forças, quebrou as algemas inibidoras de magia que prendiam Guinter com suas garras. O Major, agora livre, assumiu sua forma híbrida e, segurando Nathan com seu braço esquerdo, nadou rapidamente até a superfície, saltando por cima do lago congelado.
Na margem, Guinter colocou Nathan no chão. Os soldados restantes tremeram de medo e se prepararam para atirar, acoplando runas em suas armas. Guinter, sem hesitar, usou sua técnica “King’s Roar”, desnorteando os inimigos com seu poderoso rugido. Aproveitando o momento, o transmorfo correu com suas quatro patas, atacando os soldados um a um, como um leão caçando gazelas.
O soldado que estava próximo a Osken e Otto correu em pânico, disparando para trás, mas nenhum tiro acertou Guinter. O transmorfo aproximou-se dos prisioneiros e perguntou:
— Deem um bom motivo para eu não os matar.
— Vos-Vossa Leo-Leolência, estamos do mesmo la-lado — gaguejou Otto, desesperado ao ver aquele militar gigante em sua frente.
— Fomos nós que avisamos o Capitão Nathan sobre o motim dos soldados. — Osken trouxe o filho para próximo do seu corpo e olhou ferozmente para Guinter, sem sentir intimiado. — Major, foi uma troca. Ajudamos Nathan a resgatá-lo e ele nos ajuda a fugir. Confirme a história com ele e nos libere.
Guinter olhou para eles com desdém.
— Vou deixá-los viver, por enquanto. Meu foco agora é matar todos os soldados daquela base. Vou estraçalhar um a um, com muita calma.
— Vossa Leolência! — Otto, ainda temendo pela vida, apontou para Nathan caído no chão. — Acho que não é o momento para isso. O Capitão está perdendo muito sangue e desmaiou.
— O quê? — Guinter virou-se bruscamente. — Capitão Nathan! – gritou ele, pegando o subordinado em seus braços.
— Os soldados usaram balas reforçadas com runas de dureza. Ele precisa de atendimento médico urgente — explicou Osken rapidamente, olhando os ferimentos de Nathan, que continuacva desacordado nos braços do Major.
— Sabe como curá-lo? — Guinter, desesperado, perguntou.
— Não. Mas a cidade mais próxima é Longclaw, a cerca de seis quilômetros a leste. Ele precisa chegar lá rápido.
— É muito longe, ele não vai aguentar. — Guinter pausou e refletiu por um momento. — Não preciso ir até Longclaw para encontrar alguém que possa ajudar — murmurou o transmorfo, sendo iluminado por uma possível solução.
—Vossa Leolência, poderia aproveitar o momento para nos libertar dessas algemas? Queremos fugir antes que os soldados nos encontrem — Otto, ainda algemado, implorou.
— Quem disse que vou deixá-los aqui? Vocês vêm comigo! Não sei o que posso enfrentar, especialmente tendo que proteger Nathan. — Guinter olhou friamente para os prisioneiros. — Sigam-me ou se preparem para ser devorados vivos. O que preferem?
Osken e Otto trocaram olhares resignados.
— Já que insiste, podemos acompanha-lo sem problemas, Vossa Leolência — falou Otto, com o medo saltando os olhos.
— Vamos com você, Major — murmurou Osken, cerrando os punhos de irritação.
Guinter, com Nathan em seus braços e os prisioneiros a reboque, começou a adentrar na floresta gélida ao redor. O Major corria com determinação, levando Nathan nos braços. Já Osken, levava seu filho nas costas, tentando acompanhar o ritmo frenético do transmorfo do leão.
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