Volume 2
Capítulo 47: Em busca do traidor
No interior da fábrica subterrânea da família Otogi, Uji havia tomado a frente de Rydia para responder sobre o novo contrato.
— Quanto a isso... Antes de tomar uma decisão, preciso discutir um assunto com o pessoal da guilda. Apenas aguarde um pouco —pediu Uji, seu semblante era sério e firme.
Joe assentiu com a cabeça, enquanto os quatro membros da guilda se reuniam um pouco afastados. A equipe se entreolhava, ponderando sobre a proposta de Joe Otogi e esperando Uji iniciar o debate. No entanto, o silêncio foi interrompido por gritos de dor que ecoavam da parte superior da casa.
Todos subiram rapidamente para ver o que estava acontecendo e encontraram Baan sofrendo no quarto. Ele estava ardendo em febre, o símbolo rúnico de suas costas brilhava intensamente e Catlyn aplicava compressas de água morna em sua testa na tentativa de aliviar seu sofrimento.
Kreik ficou perplexo ao ver Baan naquela situação, contudo, ao ver o restante dos membros da guilda, cerrando os punhos e rangendo os dentes em um claro sinal de raiva e impotência, decidiu manter-se em silêncio.
— Vamos pessoal, Baan vai ficar bem. Nós ainda temos termos de uma proposta de contrato para discutir — disse Uji aos companheiros presentes de guilda.
Os quatro membros da guilda saíram para o jardim exterior e iniciaram uma conversa. Antes que Uji pudesse iniciar, Kreik, visivelmente preocupado com Baan, perguntou:
— Por que Baan tá tão mal assim? Vocês me disseram que a capacidade de cura de um portador é mais rápida do que a de uma pessoa comum. Não faz sentido ele estar sofrendo dessa maneira. Podem me explicar?
Uji suspirou e respondeu com um olhar triste:
— Baan era muito forte. Segundo ele, seu nível de poder era semelhante ao de um General da GPA. Contudo, anos atrás, ele enfrentou um mago poderoso da classe conjurador que lançou uma maldição sobre ele.
— Que tipo de maldição?
— Normalmente, usar grandes quantidades de poder mágico além dos próprios limites aumenta as capacidades e o nível de poder do mago. No entanto, a maldição que Baan sofreu age de forma contrária. Sempre que ele extrapola seus limites, seu poder é selado, reduzindo suas capacidades mágicas. Se um dia ele perder todo o seu poder mágico, seu corpo definhará e ele morrerá.
— Além disso — Joabe complementou — sempre que o selo no poder mágico de Baan avança, ele sente dores intensas e febre, pois seu corpo tenta rejeitar o selo, mas sem sucesso. Foi por isso que ele não participou da nossa missão em Lakala. Na missão anterior, quando obtivemos a informação sobre a rota das luvas de Ifrit, enfrentamos uma batalha intensa e o selo avançou. Ele pediu que recuperássemos a invoker para que seu sacrifício não fosse em vão e nomeou Uji como líder temporário.
— Foi por isso que o encontramos no hospital em Madrad... — Kreik franziu o cenho, tentando compreender a gravidade da situação. — E por que não perseguimos esse mago conjurador para tentar reverter a maldição? — perguntou o mago ruivo.
— Infelizmente, isso não é possível. — Uji balançou a cabeça negativamente e cruzou os braços. — Pouco depois de lançar a maldição, o mago morreu. Mesmo não estando mais neste mundo, os efeitos da maldição persistem. Eu te falei na locomotiva. Maldições post mortem.
— Então não há nada que possamos fazer para ajudá-lo? Deve haver alguma forma! — exclamou Kreik, frustrado.
— Aparentemente, não existe uma cura — respondeu Uji com um olhar determinado — Mas, se houver uma forma de curá-lo, nós a encontraremos. Pode ter certeza, Kreik. Eu te prometo, Baan ainda terá seu corpo livre dessa maldição.
Kreik assentiu, concordando com a cabeça. Aproveitando o momento, Rydia interveio:
— Agora, vamos voltar à questão do contrato. Espero que ninguém aqui esteja pensando em aceitar. Enfrentar a guilda Sabertooth seria suicídio, especialmente com Baan nesse estado.
— Eu discordo — murmurou Joabe, cerrando os punhos ao lembrar de sua derrota na locomotiva. — A vontade de Baan desde o começo sempre foi aceitar esse contrato. Não podemos fugir. Se queremos chegar ao topo, precisamos nos arriscar e enfrentar magos mais poderosos.
— Joabe, nosso objetivo inicial era outro contrato, que agora nem está mais válido. Este novo contrato é muito arriscado — retrucou Rydia.
— Acho que devemos votar — sugeriu Joabe. — Eu voto a favor de aceitarmos o contrato. O dinheiro será interessante e quero ficar mais forte. É uma ótima oportunidade para subirmos de ranking.
Rydia cruzou os braços e respondeu:
— Concordo com a votação. Mas eu voto contra. Este contrato não ajudará em nada em nosso ranking. Não esqueçam, é um contrato informal, não registrado em uma taverna, então não será contabilizado. Vamos esperar que Moara e Baan se recuperem, e então podemos nos arriscar em um contrato mais interessante.
— Isso se conseguirmos um contrato mais interessante, Rydia. Você lembra do que a Keya disse? Tá cada vez mais difícil conseguir missões para uma guilda de ranking “E”. — Joabe caminhava entre os amigos, gesticulando com os braços, explicando seu ponto de vista com veemência. — Normalmente, os contratantes preferem alguém de maior nível. Este caso é uma exceção. Eles estão desesperados por qualquer guilda que aceite o contrato — acrescentou ele, determinado a enfrentar a Sabertooth.
Rydia franziu o cenho, preocupada com a segurança de todos.
— E por que eles estão desesperados, Joabe? — questionou, tomando a dianteira na conversa, tentando argumentar. — Uji, antes de votar, pense bem. Esses caras iam enganar uma guilda para raptar uma princesa. Já imaginaram se o contrato ainda estivesse válido? Nós seríamos essa guilda! Neste momento, estaríamos mortos ou marcados como criminosos em todos os Reinos Livres. Vocês entendem a gravidade disso? Não vale a pena lutar por eles e enfrentar a Sabertooth diretamente, seria suicídio!
— Rydia e Joabe, entendemos os votos e opiniões de vocês dois — Uji interveio para acalmar a situação. — Agora, quero saber a opinião do Kreik.
Kreik ponderou por um momento antes de responder:
— Concordo que, em condições normais, este contrato não é vantajoso. A Rydia tem razão nesse ponto. Contudo, não podemos simplesmente virar as costas para essas pessoas. Precisamos enfrentar a Sabertooth e acabar com a tirania de Bolívar Brock. Eu voto a favor de aceitarmos o contrato.
— Isso! Boa, Kreik — disse Joabe, entusiasmado.
— Enlouqueceu, Kreik? — Rydia olhou incrédula para ele. — Não somos missionários para sair por aí fazendo boas ações por altruísmo. Somos uma guilda. Agimos por dinheiro e vantagens. Os problemas dos outros não são nossa responsabilidade.
Kreik olhou firme para a sua amiga e respondeu com determinação:
— Desculpe, Rydia. Entendo seu ponto de vista, mas quero lutar contra eles e acabar com essa maldade. Graças à ajuda de vocês, cheguei até aqui, derrotei aquele Major e recuperei algo que tinha perdido há muito tempo: um futuro. Agora, precisamos fazer o mesmo por esse povo. Vamos entregar-lhes um novo futuro. É nisso que acredito!
Rydia suspirou e se virou para Uji.
— E você, Uji? — perguntou ela, resignada, já prevendo a resposta do samurai.
— Acho que já sabe. — Uji sorriu levemente. — Principalmente depois desse discurso do novato. Vamos aceitar o contrato. Chegou a hora de colocarmos aquele leão para dormir.
Os membros da guilda retornaram para dentro da casa e sentaram-se à mesa próxima da escada. Lá, aceitaram o contrato, mas Rydia propôs um pagamento de noventa mil rilds pelos serviços. Joe, considerou o valor muito caro para o nível exigido pelo trabalho, além disso, ele não tinha esse dinheiro todo, seu pensamento inicial era algo em torno de seis mil rilds.
— Ei, seis mil? Tá de sacanagem! O marquês vai casar com uma princesa e será um dos homens mais ricos do reino. E ainda assim, querem pagar apenas essa mixaria? Enfrentar uma guilda de ranking “C” varia entre trinta e cinquenta mil rilds, no mínimo — disse Rydia, irritada.
Joe considerou a proposta por um momento antes de responder:
— Não posso me comprometer com um dinheiro que ainda não temos em mãos. Mesmo com o Decreto de Marquês, o rei pode mudar de ideia e impedir o casamento. Tudo o que temos agora são oito mil rilds. É o que posso pagar. Aqui tem metade do dinheiro como adiantamento — disse Joe, jogando um saco de moedas para Rydia.
Os membros da guilda se entreolharam. Rydia pegou o saco de moedas e verbalizou:
— Aceitamos com uma condição. Se falharmos, o adiantamento é nosso. Se conseguirmos, há duas possibilidades. Caso Trace não se case com a princesa, você nos dará apenas os quatro mil rilds restantes. Contudo, se ele conseguir o matrimônio, você intervirá junto a um dos Grandes Nobres e nos pagará mais noventa e quatro mil rilds. Temos um acordo?
Joe ponderou por um momento antes de responder:
— Tá mais caro que a proposta inicial... Mas acredito que, pelo risco enfrentado e sendo um pagamento condicional, vale a pena. Temos um acordo. Se Trace se casar com a princesa, vamos nos comprometer a convencer os Grande Nobres a pagar essa quantia.
Eles selaram a parceria com um aperto de mãos e todos foram se acomodar para dormir e descansar.
Ainda na madrugada, Uji acordou Kreik e lhe entregou um manto. O jovem ruivo o vestiu e seguiu para a fábrica subterrânea dos Otogi. Lá, encontrou Uji, Joabe, Rydia, Trace, Joe, Taylor, Joshua e Javier, todos vestidos com mantos e encapuzados. Confuso, Kreik perguntou:
— Qual é o motivo dessa reunião e por que os mantos?
— Para nossa segurança. Não esqueçam, ninguém pode saber que estamos morando nesta casa. Portanto, criamos um caminho subterrâneo que liga a fábrica a uma das ruas da cidade. Vamos passar por essa rota, sair em um esconderijo perto da entrada da cidade e, depois, nos reunir na casa de Frederico, um dos nossos três principais aliados. Lá, tentaremos identificar quem é o traidor e planejar uma forma de recuperar o Decreto Imperial — explicou Joe Otogi.
— Tem certeza de que o traidor é um desses três? — perguntou Kreik.
— Além da minha família, apenas Frederico, Yep e Woley sabiam da viagem de Trace à Capital. Embora nenhum deles soubesse que se tratava de um Decreto Imperial — respondeu Joe.
O grupo avançou pelo caminho subterrâneo e saiu no local pretendido, depois entrou na cidade. Durante o percurso até a casa de Frederico, Joshua e Javier se aproximaram de seu pai.
— Papai, podemos chamar o Otto? — perguntou Joshua.
— Sim, vão com seu avô e cuidado para não serem identificados — respondeu Joe.
— Quem é Otto? — perguntou Uji, curioso.
— É um garoto da idade dos meninos. Seu pai era um dos funcionários da fábrica, mas acabou morrendo nas mãos de Bolívar. Desde então, ele vive em um orfanato local. É o melhor amigo de Joshua e Javier. Ele é um bom garoto, mas com muitos traumas — explicou Joe.
Uji olhou para Kreik e disse:
— Kreik, vá com eles. Garanta a segurança de Taylor e dos garotos.
O grupo se dividiu. Taylor, Joshua, Javier e Kreik seguiram para o orfanato, enquanto o restante foi para a casa de Frederico. Ao chegarem ao orfanato, Joshua colocou as mãos em formato de concha ao redor da boca e imitou o som de um pássaro. De dentro do orfanato, um som semelhante ecoou de volta.
— Ele tá vindo — disse Joshua, fazendo um sinal de “OK” com os dedos.
Ao longe, um garoto apareceu correndo. Seu cabelo azul escuro balançava enquanto ele se aproximava. Com pele pálida, olhos castanhos, cerca de 11 anos de idade, ele vestia uma camisa azul com colete preto e um sobretudo azul. Calças marrons e um cinto completavam seu traje. Em suas mãos, ele segurava um manto marrom com capuz, que vestiu enquanto corria na direção de Joshua e Javier.
Os garotos fizeram um toque de mãos especial, algo restrito aos melhores amigos. Otto então cumprimentou Taylor e olhou curioso para Kreik.
— Quem é esse outro rapaz ruivo?
— Este é Kreik. Ele é amigo do nosso pai e do Trace — Javier respondeu com um sorriso.
Com Otto inserido, o grupo seguiu em frente, determinado a chegar na casa do Fererico.
O grupo de Rydia caminhava pela cidade sob a luz suave do fim da tarde, suas sombras se estendendo longamente nas pedras da rua. A cidade estava envolta em um murmúrio constante, com vendedores ambulantes chamando atenção para suas mercadorias e crianças brincando alegremente nas calçadas. Ao chegarem à casa de Frederico, eles bateram na porta de forma sincronizada, com três toques rápidos seguidos por um intervalo e mais dois toques.
Um homem de meia-idade abriu a porta, seu olhar cauteloso relaxando ao ver os visitantes. Ele os convidou a entrar com um aceno.
— Entrem, por favor. — disse ele, gesticulando com a mão.
Dentro da casa, um ambiente acolhedor e rústico os aguardava. As paredes eram adornadas com tapeçarias antigas, e o chão de madeira rangia levemente sob seus pés. No centro da sala, várias cadeiras estavam dispostas em um formato circular, prontas para a reunião. Os membros da guilda se acomodaram, observando os três homens sentados em frente a eles.
Frederico era um homem de cabelos curtos e pretos, com uma expressão séria. Ele usava uma camisa branca e calças marrons com suspensórios, combinadas com botas marrons que já tinham visto melhores dias. Ao lado dele estava Yep, um homem com cabelo azul médio que caía até o pescoço. Ele vestia uma camisa laranja com detalhes marrons e ombreiras de bronze, complementadas por calças marrons e botas pretas. O terceiro homem, Whole, era careca e tinha uma barba branca volumosa. Seu traje azul escuro com detalhes marrons parecia formal, quase militar, e ele também vestia calças marrons e botas pretas.
Joe começou a apresentação, seu tom era firme, mas amigável.
— Senhores, estes são Uji, Rydia e Joabe. Eles são membros da guilda que está nos ajudando, Crossed Bones — disse Joe, gesticulando para seus companheiros. — Ainda tem outro, um ruivo que virá com meus filhos, ele se chama Kreik.
Após as apresentações, Joe passou a explicar os eventos recentes, desde a luta na locomotiva até a proposta de contrato, omitindo, no entanto, o título de Marquês de Trace e a possível existência de um traidor entre os três homens.
Pouco depois, o grupo de Kreik chegou à casa de Frederico. Joe se levantou para recebê-los e logo sugeriu que Joshua, Javier e Otto brincassem lá fora.
— Kreik, gostaria que você acompanhasse os garotos para garantir que não se machuquem ou que algum inimigo não os surpreenda — pediu Uji.
O mago ruivo assentiu, enquanto ele se afastava, Rydia assumiu a dianteira da conversa, seus olhos azuis fixos nos três homens à sua frente.
— Vamos direto ao ponto — disse ela, sua voz firme. — Sei que estão cientes de que Trace foi à Capital para pegar uma encomenda. Embora a Sabertooth tenha interferido e roubado o conteúdo, temos um novo plano. Conseguimos documentos essenciais que podem incriminar Bolívar, e precisamos entregá-los a um emissário de um dos três grandes nobres. O encontro será amanhã, neste mesmo horário.
— O QUE? — gritaram os três, embasbacados.