Volume 1
Capítulo 27: Pressa e imaturidade
Ryujiro e Mayumi ficaram boquiabertos, seus olhos arregalados de surpresa e medo. Malik, com um movimento rápido e decidido, desferiu uma joelhada violenta no estômago de Mayumi. Ela caiu de joelhos, sua respiração ofegante e o rosto contorcido de dor.
— Maninha! — Ryujiro gritou, sua visão girando enquanto ele era levantado do chão.
Com um movimento poderoso, Malik agarrou Ryujiro pelo pescoço com sua tromba e o arremessou pelo ar. Então, ele chutou Mayumi, fazendo-a voar pelo ar e colidir com seu irmão. Os dois giraram descontroladamente enquanto o Coronel saltava, sua forma gigantesca projetando uma sombra ameaçadora sobre eles. Ryujiro, em seu desespero, só conseguia pensar:
“Nunca imaginei que um Coronel fosse tão formidável. Desculpem, pai, desculpem, mãe. Não consegui proteger minha irmãzinha. Droga!”
“É agora que vamos morrer? No final, só sujei o legado da minha família. Perdão, meus pais. Vou terminar sendo apenas uma fracassada.”, pensava Mayumi, seus pensamentos cheios de desespero.
Enquanto giravam no ar, os irmãos seguraram as mãos um do outro. Fecharam os olhos, esperando o impacto final. Malik, porém, desativou sua forma híbrida no último momento. Ele os alcançou, e, com uma suavidade surpreendente, abraçou-os, segurando-os com firmeza. Ele os puxou para perto, apoiando as cabeças dos irmãos em seus ombros e segurando suas nucas com uma gentileza inesperada.
— Parabéns, Tenentes. Vocês passaram. Estão oficialmente na 10ª Divisão — Malik declarou, sua voz suave contrastando com a tensão da batalha.
Ryujiro e Mayumi abriram os olhos, lágrimas de alívio rolando por seus rostos. Eles se seguraram, tentando entender o que estava acontecendo. Malik os soltou suavemente, segurando suas cinturas para que não caíssem ao chão. Ao tocar o solo, eles se equilibraram, ainda atordoados.
— Coronel, não entendi. Nós perdemos, por que fomos aprovados? — perguntou Mayumi, sua voz trêmula de confusão.
— Cala a boca, Mayumi! Vai que meu golpe afetou o juízo dele e ele endoidou. Apenas sorria e aceite o convite — sussurrou Ryujiro, sorrindo forçadamente, embora sua voz tremesse.
— Falando sério. De onde você tira essas conclusões malucas? — retrucou Mayumi, irritada, mas um pequeno sorriso curvava seus lábios.
— Hahaha! Eu não enlouqueci, eu garanto. Não diminuam o mérito de vocês. Lutaram bravamente. Merecem respeito. Merecem fazer parte da nossa divisão — Malik falou, sua voz agora cheia de sinceridade e aprovação.
— Senhor, perdoe as tolices do meu irmão. Mas ainda estou sem entender — insistiu Mayumi, buscando respostas.
— Nossa divisão é de recrutamento, ou seja, somos responsáveis pela inscrição e treinamento dos novatos. Neste sentido, somente podem participar dessa divisão pessoas fortes e de caráter, pessoas que possam servir de exemplo para a nova geração. Quando soube que seu avô seria nosso novo General e que ele fez questão de que vocês ingressassem nessa divisão, fiquei com sérias dúvidas se vocês eram merecedores ou apenas beneficiados pelo parentesco — Malik explicou, sua voz calma, mas firme.
— Então, pediu ao vovô que fôssemos testados — Mayumi finalmente compreendeu, suas sobrancelhas se arquearam em reconhecimento.
— Exato. Quando propus a ele esse desafio com vocês, ele gargalhou e disse que eu não pegasse leve.
— Isso é típico daquele velho preguiçoso — comentou Ryujiro, sua sombrancelha tremendo de irritação. — Esse velho tá se achando, mas eu vou me vingar quando eu ver a vovó. Podem anotar.
— Cala a boca, Ryujiro! Deixa o Coronel concluir.
— Foi mal Coronel, pode continuar — disse Ryujiro, com as mãos segurando a nuca, em uma postura relaxada.
Malik suspirou com a mão direita na cintura e declarou:
— Vou ser sincero, ao vê-los inicialmente, não achava que iam passar, mas ao longo da luta, gostei do que vi, tanto nos punhos quanto no coração.
Os dois ficaram corados, um sorriso tímido surgiu em seus rostos. Ryujiro, aproveitando a oportunidade, perguntou:
— Coronel Malik, como gostou do que viu se fomos derrotados brutalmente? Você nem usou os braços. Eu e a maninha até pensávamos que íamos morrer.
— Ora, um Tenente nunca derrotará um Coronel, não importa o quanto tente. Mas aquele golpe de vocês... Se eu não tivesse adotado minha forma híbrida, teria levado uns bons machucados. Tive que usar as mãos para defender aquele golpe. Ele é bem poderoso, principalmente depois do incremento de poder mágico feito pela sua irmã.
— Eu te disse, maninha, somos poderosos — disse Ryujiro, olhando para sua irmã com um sorriso orgulhoso.
— Hahaha. Realmente vocês têm um potencial enorme. Inclusive consta em seus registros que fizeram a forja básica com pouca idade — Malik comentou.
— Isso mesmo. Embora a maioria tenha a capacidade de criar seu equipamento de forja entre 14 ou 15 anos, eu consegui com 9 anos e minha maninha com 10. Mas não se preocupe, mesmo eu sendo mais forte, ela ainda é boa, Coronel — Ryujiro vangloriou-se, estufando o peito com orgulho e colocando a mão no queixo de forma dramática.
— Prepotente como sempre — murmurou Mayumi, revirando os olhos.
— Aliás, Coronel, já que gostou da nossa atuação, não gostaria de nos promover para a patente de Capitão? — Ryujiro sugeriu, batendo levemente com o cotovelo no braço de Malik com um sorriso travesso.
— Ryujiro, não fale isso! — gritou a irmã, puxando o irmão pelo colarinho. — Desculpe, Coronel Malik, mas a doença mental dele já está fazendo efeito novamente — ironizou Mayumi, sorrindo e puxando a orelha do irmão.
— Promoção? Vocês, na situação em que estão, nunca serão Capitães. — Malik respondeu com um sorriso enigmático.
— O quê? Senhor, não faz sentido. Você mesmo disse que temos muito potencial! — questionou Mayumi, confusa, enquanto Ryujiro murmurava algo incompreensível, frustrado.
— Ele está brincando, maninha. Fala aí, Coronel, que era brincadeira. A Mayumi caiu nessa porque ela é ingênua. Eu, com toda a minha inteligência, logo saquei que era pegadinha — tentou Ryujiro, sorrindo nervosamente.
— Não estou brincando. Entenda, ter potencial não significa estar pronto. Um diamante só mostra seu verdadeiro valor quando devidamente lapidado. Vocês só lutaram bem porque estavam em dupla, mas em uma luta individual, seriam massacrados sem chance — explicou Malik, assumindo um tom mais sério.
— Está exagerando, Coronel. Minha forja é extremamente poderosa. Seu poder destrutivo te fez até usar as mãos e acionar a forma híbrida — Ryujiro disse, cruzando os braços, seu ego ferido.
— Tenente Ryujiro, seu equipamento de forja baseia-se nas Leis da Termodinâmica — explicou o Coronel, sua voz séria. — A primeira lei diz que a energia não pode ser criada nem destruída, apenas transformada de uma forma em outra — Já a segunda lei afirma que é impossível transformar todo o calor em trabalho. Em outras palavras, sempre haverá perdas quando convertemos energia — No momento da conversão, parte dela se dissipa, perdendo-se no universo.
— Onde está querendo chegar, Coronel? Nunca vi a técnica do meu irmão por este ângulo — questionou Mayumi, intrigada.
— Tenente Mayumi, pode me explicar o motivo de ser impossível criar um motor que gere energia infinita?
— Claro! — respondeu Mayumi, animada. — Imagine que você tem uma vela mágica que nunca se apaga. Ela pode fornecer energia para acender outras velas, aquecer água ou até mesmo mover uma roda. Mas aqui está o truque: — Sempre que usamos essa energia, parte dela se dissipa, como fumaça que se espalha no ar. — Por isso, mesmo com uma vela inesgotável, não podemos criar um motor que gere energia infinita.
— Exato. O poder mágico não deixa de ser um tipo de energia — continuou o Coronel. — Convertemos nossa energia espiritual, aquilo que nos dá vida, em energia externa, e, logicamente, parte dela é dissipada. — Daí começa a técnica do Tenente. — Ao sofrer dano ou repelir algum ataque mágico, parte da energia mágica dissipada é absorvida pela sua maça. — Ela vai acumulando força até atingir o limite, quando muda de cor e lança um ataque devastador.
— É isso mesmo, Coronel. Mas não entendi qual é o problema da minha forja — perguntou Ryujiro, confuso.
— Considerando que sua maça absorve a energia dissipada do dano que você sofre ou repele — explicou Malik. — Isso significa que você precisa levar muito dano antes de poder lançar um ataque realmente devastador. — Em uma batalha contra um oponente muito poderoso, você pode ser derrotado antes mesmo de carregar completamente sua maça. — E, se conseguir carregar, precisa rezar para que esse golpe finalize o inimigo. — Sua técnica é poderosa, mas carece de versatilidade.
— Nunca pensei nisso. Faz sentido. — Ryujiro admitiu, socando o chão em frustração.
“Nossa, ele conseguiu fazer toda essa análise em uma única luta. Incrível o poder e o intelecto de um Coronel.”, pensou Mayumi, impressionada.
— Agora é você, Tenente Mayumi — continuou o Coronel. — Sua técnica é o inverso. Extremamente versátil, mas não muito poderosa. Você tem duas flechas: uma de suporte, na cor branca, que transfere seu poder mágico a um aliado, o que te deixa vulnerável. Já a outra, a dourada, você escolhe um alvo e ela consegue transpassar qualquer obstáculo que se colocar na frente do alvo. Além disso, ela vai dobrando a força e o tamanho para cada obstáculo transpassado.
— É isso mesmo — assentiu Mayumi.
— Então, o que você acha que é o maior defeito da sua técnica? — perguntou o Coronel.
— Porque eu preciso encontrar diversos obstáculos para que as flechas ganhem dobras de poder? — respondeu a Tenente.
— Não, essa condição é interessante, porque sempre existem obstáculos na luta — explicou Malik. — Além disso, você poderia criar seus próprios obstáculos para garantir sucessivas dobras de poder, coisa que não faz e eu não entendo o porquê. — Contudo, o maior defeito é que você só pode lançar uma única flecha por vez. O que torna bem fácil de desviar. Uma vez que desvia, vai ter que montar uma nova estratégia para gerar novos obstáculos e potencializar o poder da sua flecha.
— Criar meus obstáculos e lançar mais de uma flecha — murmurou Mayumi, cerrando os punhos e reconhecendo a fragilidade de sua habilidade. — Isso é verdade... Tenho que pensar em várias estratégias para lançar uma flecha poderosa. Mas quando desviam, fico vulnerável, dependendo de outra pessoa para conter o inimigo enquanto penso em outra estratégia para lançar flechas mais poderosas.
— As técnicas de vocês são complementares e funcionam bem em equipe, mas em lutas individuais, apresentam desafios significativos. Vocês sabem por que isso aconteceu? — Malik perguntou, observando-os atentamente.
— Não, senhor — responderam os dois, abatidos.
— Porque vocês são prodígios — Malik disse, com um sorriso que misturava admiração e incentivo.
— Não entendemos, senhor — os dois responderam, ainda mais confusos.
— Vocês desenvolveram seus equipamentos de forja muito cedo. Isso mostra que vocês têm um talento natural e habilidades excepcionais na magia. No entanto, quando criaram suas técnicas, não tinham a maturidade mental nem a experiência de batalha necessárias para prever todas as fraquezas e limitações — Malik explanou, com um tom de voz que denotava paciência e compreensão.
— Você tá certo, Coronel. Queríamos impressionar nossa família e acabamos apressando as coisas — Mayumi disse, pensativa, enquanto Ryujiro permanecia calado, a vergonha estampada em seu rosto.
— A vitória e o reconhecimento não são garantidos para quem chega primeiro, mas para quem aplica a melhor técnica e obtém os melhores resultados. Não deixem a pressão da expectativa dos outros ou o peso do nome de suas famílias ditar o ritmo de vocês. Mantenham a calma e sigam seu próprio ritmo. Adquiram conhecimento, maturidade e experiência. Quando estiverem prontos, evoluam suas técnicas para o nível especialista, corrigindo os defeitos. Mayumi, trabalhe para poder lançar mais flechas e melhorar sua ofensiva criando seus próprios obstáculos. Ryujiro, encontre formas de absorver magia dissipada diretamente na origem, evitando a necessidade de ser golepado no processo — Malik aconselhou, seus olhos cheios de confiança nos jovens.
— Obrigado, Coronel. Faremos isso — disseram os irmãos em uníssono, seus olhares agora cheios de determinação renovada.
Em seguida, cada um retirou do interior de sua farda um caderno de anotações e uma caneta. Eles começaram a anotar informações importantes sobre a luta e os conselhos do Coronel.
— Que bom que aceitaram meus conselhos com humildade. Agora, vamos descansar, porque o avô de vocês chegará apenas daqui a alguns dias na cidade de Meryportos. Vamos para lá guardar a chegada do famoso General Sundiata Gintaro, o Relâmpago do Oeste — disse o Coronel, sua voz ecoando pelo pátio de treinamento.
— Ok! — responderam os dois Tenentes em uníssono.
— Outra coisa: ao chegarmos em Meryportos, vamos começar a treinar com os potencializadores de aura — continuou o Coronel, sem olhar para trás, caminhando na direção da saída do pátio.
Os irmãos se entreolharam, confusos, e Ryujiro foi o primeiro a expressar sua perplexidade:
— Potencializadores de aura? O que é isso? Nunca ouvi falar!
Mayumi, complementando, balançou a cabeça lentamente:
— O que eu conheço são apenas as cinco classes de magos: elementalistas, transformos, forjadores, conjuradores e dominadores. Agora, potencializadores de aura... Isso é novidade.
O Coronel parou e se virou ligeiramente, um sorriso enigmático brincando em seus lábios:
— Relaxem, meus jovens. Há muito sobre este mundo que vocês ainda não conhecem, e alguns conceitos podem parecer confusos agora. Apenas apreciem a jornada e aguardem o momento apropriado. Em Meryportos, vou explicar sobre isso. Enquanto isso, vamos fazer uma pausa para o café — ele concluiu, acenando para que os seguissem.
Os três começaram a caminhar em direção ao refeitório. Os Tenentes diminuíram o passo, e Ryujiro cochichou no ouvido de sua irmã:
— Ei, maninha, se esse cara tem todo esse poder sendo Coronel, já imaginou o quão forte é o vovô sendo General?
Mayumi olhou para o irmão, pensativa, e respondeu:
— Realmente... O vovô não parece ser tão forte. Mas se ele foi nomeado General, mesmo estando aposentado, é porque deve ser muito mais forte que o Coronel Malik. Muito mais forte do que podemos imaginar.
Ryujiro balançou a cabeça, cético:
— Não consigo imaginar aquele velho sendo tão forte assim. Ele parece mais uma tampinha cabeçuda.
De repente, o Coronel Malik soltou uma gargalhada estrondosa, sem motivo aparente.
— O que foi, Coronel? — perguntou Mayumi, visivelmente confusa.
— Não é nada, apenas lembrei de uma piada. Esqueçam — murmurou Malik, tentando conter os risos, mas seu rosto estava levemente envergonhado.