Last Downfall Brasileira

Autor(a): VALHALLA


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 6: O Protagonista Testa as Habilidades

Guilherme decidiu explorar as possibilidades do Fichário Do Jogador, antes de tomar qualquer decisão.

Se sentou na beira do córrego e colocou os pés dentro da água, era relaxante, parecia um ofurô com sais minerais. Segurou a pedra com a mão direita.

Tocou na barra para ativar sua habilidade.

— O que vai fazer? — perguntou a pedra.

— Vou estudar essa ficha.

Até que o fichário do jogador era uma ficha simples, formada por pontos e habilidades, e ainda tinha o menu de escolha dividido entre interrogações e cadeados fechados, isso foi o que mais chamou a atenção dos olhos ávidos por poder do empolgado rapaz.

Bem… isso será molezinha pra mim.

 Primeiro vou focar no que posso fazer.

Os números e os cadeados eram os destaques, e depois de tocá-los, nada aconteceu, então entendeu, que por hora, eram inalteráveis.

Mas por que?

Nível baixo… hum!

Deve ser isso.

Focou a atenção nas letras representante de cada numeração: I, C, D, A, F, R.

O que é isso?

Se não tô enganado, isso sem dúvida são meus atributos.

I: inteligência.

C: carisma.

D: destreza.

A: agilidade.

F: força.

R: resistência.

Por causa da classe sábia minha inteligência é elevada, mas em contra partida a minha resistência e força é de dá dó. Pelo menos os pontos de carisma também são bons, com isso é certo que arrumo uma namorada.

Rsrsrs.

Seguindo o mesmo padrão, M é mana e V é vigor.

Hum…

Mas não vejo nenhuma outra referência.

Como esses pontos vão servir para alguma coisa?

Já sei, vou experimentar o nível.

Ele tocou na palavra nível.

Apareceu um cadeado fechado, e logo desapareceu. Depois não teve nenhuma outra reação.

Hummm…

O cadeado significa o que é bloqueado para mim.

Faz sentido, já que nos jogos o nível só pode ser alterado depois de uma evolução.

Mas todos os outros itens com cadeado, também estão bloqueados por hora ou é definitivo?

Se fosse apostar, o meu nome, classe e raça são definitivos. Agora, o especial é certo que tem um propósito; mas qual?

— Ei, pedra, o que significa a barra especial nessa ficha?

— Desculpe, herói, não sei. Como disse antes, não tenho familiaridade com suas memórias e é longe do meu saber sobre as atuais regras desse mundo.

Droga!

O coração de Guilherme começou a bater forte, que olhou cismado ao redor, como se alguém pudesse aparecer do nada, como se algum daqueles lobos da noite anterior fosse mostrar a cara feia, mas era apenas ansiedade.

Para o alívio do rapaz, na ficha tinha os pontos iniciais para serem distribuídos, número “20” e “10”, isso conhecia bem, e com profunda saudade.

Ao tocar primeiro no 20, a barra Inteligência, Carisma, destreza, agilidade, força e resistência se destacaram como à um farol. Foi de brilhar os olhos.

Tocou então no 10 e dessa vez foi a barra da mana e vigor que se acenderam. Tocou na numeração referente a mana e um quadro se abriu, e depois de tentar algumas idiotices, descobriu que poderia escrever usando a ponta do dedo.

Ele escreveu 2. Foi então que o número 2 de mana mudou para 4, ao mesmo tempo que o 10 alterou para 8.

Oh!

Que irado, então é assim que funciona.

Mas como vou dividir?

Tirando inteligência e carisma, todos os outros pontos são uma vergonha.

Aff, o que tô falando?

Mesmo com esses pontos consegui vencer os lobos.

Eh…

Vá com calma foguetinho…

O maldito loiro de fármacia, Liel, varreu o chão com a minha cara.

Droga!

Como vou fazer?

Mana e vigor até que foi fácil para ele decidir. Tinha 10 pontos para dividir entre os dois. Optou por colocar 5 pontos em cada. Agora o problema de verdade seriam os atributos principais, já que tinha 20 pontos para dividir entre todos eles. 

Guilherme pegou um galho seco, era bem mais grosso que um taco de sinuca, mas estava podre. Tentou quebrar usando só as mãos e não conseguiu.

Hum… 3 de força, né?

Repetiu o mesmo processo que usou para alterar mana e vigor, e com isso aumentou a força em 1 ponto e ainda não conseguiu quebrar o galho.

Por um momento ficou nervoso.

Aumentou mais uma vez: usou 3 e com o 1 anterior, somado com os 3 pontos iniciais, ficou um total de 7 pontos. Tentou outra vez quebrar o galho, e com um pouco de dificuldade, conseguiu rachar a bendita madeira podre ao meio.

Foi por isso que aquele loiro de merda acabou comigo.

Isso mostra como sou fraco.

Ufa… nossa, que perigo passei com aqueles lobos, fio da navalha, se não fosse a gosma ácida.

Obrigado, santa lagartinha.

Guilherme decidiu acrescentar mais 1 ponto na força. Aumentou 3 na velocidade: porque acima de uma boa luta, correr era a melhor forma de resolver os problemas.

Aumentou 5 na resistência: ainda que tenha reencarnado num corpo estranho e resistente, os socos do Liel acabaram com ele, e não queria sentir essa dor outra vez.

Aumentou 2 na inteligência e 3 no carisma: apesar dessa pontuação já ser alta, eram seus atributos fortes, e Guilherme era o tipo de jogador de RPG que acreditava que era mais efetivo focar no aspecto positivo de cada personagem. Além disso, carisma alto significava uma coisa; um vasto harém.

No fim da distribuição de pontos, a numeração dos atributos voltaram ao normal mantendo as alterações. A pontuação 20 e 10 foram zeradas e um cadeado surgiu no lugar.

Então a operação de pontos dos tributos acabou, interessante.

Será que toda vez que subir de nível vou ganhar mais pontos?

Será que serão os mesmos ou vão aumentar?

É… tenho que evoluir para saber.

Vai ser moleza!

Agora vou tentar o menu de escolha.

Mas é claro!

Vou começar pelo meu poder mágico.

Ao tocar na barra referente à magia, um quadro com uma lista de opções apareceu.

Tocou na opção claridade para testar e em seguida a palavra confirmar apareceu.

Julgando por aquela enorme quantidade de opções, só posso escolher uma.

É isso, mas qual?

A luz sempre é forte; Licht massacrou o Julius; Kisaru era legal paka… oooh, alô, alô?

Rsrsr.

Hum…

Mas escuridão também é foda, sombras é irado, droga, não sei o que escolher.

Pera, pera… oh.

TREVAS!

Sempre nos mangás, animes e novels os personagens com o atributo das trevas são os mais poderosos, muitas vezes mais que o protagonista.

Esses fodões só são derrotados pela forçação de barra do roteiro.

Judal, Celty, Teach, Zeref, Naraku, Apocalymon, Alone… a lista é tão vasta.

Pera… sou o protagonista, o herói… hum?

E se o meu poder for as trevas?

hum…

Protagonismo + trevas = fooooooooda pra caralho!

É isso, também sou dark, beres, malvadão.

Isso!

Clicou nas trevas, a palavra confirmar apareceu, e então iria aprovar a escolha.

— Não faça isso — interrompeu a pedra. — O que pensa que vai fazer?

— Meu poder mágico será trevas.

— Isso significa que todas suas habilidades serão baseadas em trevas. Valhalla não terá misericórdia. Sem contar, que sua estrada será voltada para a escuridão, má sorte.

— Você quer dizer destino? Isso é baboseira! Sou o protagonista desse mundo. Sou destinado a vencer! Também, é certo que ao despertar os poderes das trevas, vou me tornar o herói mais poderoso. Tri Trevosos!

— Não faça isso, eu imploro

— Fica quieta, pedra. Eu vou fazer o que quiser, quem manda sou eu. Sei o que estou fazendo, estudei muito sobre isso na Terra.

— Vou adivinhar, foram os tais manuais de treinamento, as benditas novels da Terra que afirmaram uma insanidade dessa. É um grande erro!

— Ora, cadê o papo que não ia falar nada para não influenciar nas minhas escolhas? Eu sou o herói, e vou escolher as trevas, seremos heróis darks!

Guilherme mandou para as cucuias os avisos da sua besta e tocou em confirmar. As trevas se concretizaram como o poder mágico certificada com um cadeado.

Nossa, essa pedra vai mesmo ficar me torrando a paciência?

Bem… tá bom, agora é a hora boa.

As habilidades.

Pera… que irado!

Na aba, ao lado da habilidade de sábio, antes preenchida com interrogações, agora tinha a palavra trevas.

Ele decidiu começar pelas habilidades da classe sábia. Havia apenas uma habilidade na barra passiva: mestre da ficha.

Ao tocar nela, um quadro de informação surgiu na sua frente.

Ah… então é por causa dela que posso mexer no meu fichário do jogador.

Será que vou conseguir ler todos os escritos também?

Hum…

É muito útil.

Mas não pode ser só isso.

Guilherme tocou na barra da habilidade da classe sábia e outro quadro de informações apareceu.

Hum…

Eu já esperava novas habilidades através da evolução.

Mas isso de requisitos é novidade.

O que significa? Quais requisitos?

Não adianta perguntar para a pedra, ela não vai saber.

Vai ter que ser na prática.

Certo!

Tocou em confirmar. Então, logo de cara percebeu que na barra de habilidades da classe sábia foi acrescentada uma nova habilidade passiva: Mestre da Arte (2). Tocou nela.

Tocou em confirmar.

Duas novas abas, antes preenchidas com interrogações, foram alteradas para “artes/mana” e “arte/vigor”. Outro quadro de informação surgiu.

O que será esse troço?

Só consigo imaginar uma barra semelhante nas fichas de RPG tradicionais, que seria subclasse.

Deve ser isso.

Guilherme tocou na barra escolher e um quadro com múltiplas escolhas surgiu na sua frente.

Então é isso, essa habilidade me permite ter mais de uma arte.

Muito bom, seja o que for que isso significa, não mudará o classudo ditado popular:

Quanto mais, melhor!

Pera… hã?

Isso tudo são os conhecimentos banais da terra.

O que vou fazer com a porra da dança?

Talvez Liel não tivesse me espancado se tivesse construído uma boa cadeira para ele.

Que droga.

Cadê a magia, os poderes especiais, as bolas de fogo e as rajadas de gelo?

Cozinheiro?

Se ainda vinhesse com um chute poderoso como o do Sanji.

Fala sério!

Pelo menos é nível 1, talvez vai acrescentar mais escolhas com a minha evolução.

Guilherme escolheu a opção química: na época que frequentou o colégio na Terra, essa matéria era uma das suas preferidas, e acreditava que os fundamentos dessa ciência poderiam ser úteis.

Foi acrescentado na barra arte/mana a arte química. Então ele percebeu que o número 2 da habilidade mestre da arte foi alterado para 1.

Ah, entendi!

Era a quantidade de artes que posso ter.

Isso!

Tocou outra vez nela, e o quadro de escolha voltou a aparecer.

Putz…

Que merda.

Não tenho escapatória dessa lista de supermercado.

Preciso de algo para poder me defender, hum, pera…

A lâmina seria ligada a espadas?

Acho que é.

Pode ser legal.

Tá bom, todo bom isekai tem um espadachim boladão.

Vou nessa então!

Tocou na opção lâmina e apareceu um novo quadro de escolha.

Puta merda!

— Ei, ei, pedra, maldita, o que há de errado com esse menu de escolhas? Só tem as baboseiras da Terra. Opa, pera um momento… na Terra existia espada de duas mãos e katanas, e tantas outras. Isso é furada.

— Nos treinos com as tais novels você não usava espadas? Já tocou numa? Sabe qual é o peso do fio de uma lâmina?

— Tá bravinha comigo, é isso? Eu mereço: uma pedra sentimental. A ironia não vai ajudar nenhum de nós dois. Esqueceu quem eu sou nessa história?

— Desculpe, herói. Mas não há nada de errado com a habilidade. Ela vai se adaptar ao seu conhecimento, já expliquei; como são suas próprias memórias, não há o que reclamar.

E fica cada vez melhor.

Para derrotar os outros heróis vou precisar de um combo forte, isso é claro.

Mas não me restam opções na autodefesa para combinar com química.

Há tantas coisas que quero saber, mas ainda não tenho como descobrir as respostas.

Mas baseado no meu poder mágico, trevas, só posso esperar que ao subir de nível, outras opções mais sinistras irão aparecer.

E ainda tenho que explorar suas habilidades.

Bem…

O vovô era nordestino, e no sertão o facão cantava.

Isso!

Guilherme escolheu a opção de facão.

Depois de confirmar, na barra arte/vigor foi acrescentado a arte mestre do facão. A numeração da habilidade mestre da arte foi zerada.

Agora ele decidiu focar nas duas artes para compreender suas funcionalidades. Tocou primeiro na barra química e surgiu um quadro com explicações.

Depois tocou na barra mestre do facão.

Até agora, para Guilherme foi fácil mexer no fichário do jogador, era verdade que muita coisa ele não fazia ideia de como iria funcionar, no entanto, na visão geral poderia se virar bem.

E ainda faltava o ponto que mais o deixava ansioso, as habilidades do poder mágico trevas.

Eu sei que é nela que tá o pote de mel.

Tocou na barra de habilidades trevas.

Hã?

É o mesmo lance da habilidade da classe sábia.

Bem… vamos lá, é essa que eu quero…

Né?

Tocou em confirmar, mas não houve nenhuma alteração.

O que?

Fui tapeado!

Aff… que bosta.

Esse poder vai ser só um enfeite?

Não é possível!

Apesar da decepção, ao finalizar a ordem do Fichário Do Jogador, ele sentiu uma inesperada e absurda satisfação que o surpreendeu.

Era um jogador que não se deixava encantar facilmente. Orgulhava-se de ter os pés bem firmes no chão e uma mentalidade realista.

Só que não dá para ignorar que ficou chocado quando viu tantas opções inúteis no seu menu de escolha, mas ainda assim estava no controle e isso era positivo.

Mas uma sensação ruim o incomodava. Tinha a certeza de que algo sairia errado. Havia aprendido, em sua vida instável na Terra, que era bom desconfiar quando tudo corria bem.

Realizou a análise do FICHÁRIO DO JOGADOR com relativa facilidade, mas, em algum momento, devia ter cometido qualquer erro, pois sempre foi incapaz de realizações perfeitas. Portanto, era melhor não comemorar o triunfo, ainda, não ainda.

Aquela ficha, havia alguma coisa nela, difícil de definir. Mesmo antes de ouvir as explicações da pedra ou descobrir qualquer coisa a respeito, ele sentiu uma atração quase mística, como se aquele emaranhado de números e letras fosse um planeta e o rapaz motivado, um simples corpo obedecendo à lei da gravidade.

— Acabou de analisar sua habilidade? — perguntou a pedra.

— Fichário do jogador.

— O que?

— É o nome que dei para essa habilidade.

— Para as ovelhas, um nome, e gordas serão.

— É bem isso.

Agora só falta testar as habilidades ativas, apesar de que sei que não irão funcionar.

Por causa desses pontos miseráveis.

Miserável!

Essa palavra vai me perseguir até quando?

Droga!

— Pedra, como faço para usar minhas habilidades ativas?

— Muito bom, você entende o significado de ativas e passivas.

— Foram as novels e os manuais de treinamento, maldita, não são tão inúteis quanto você pensa. Mas você, pedregulho, como sabe a diferença se disse que não conhecia os conceitos de RPG da Terra?

— Ah… vou explicar… é… ora, herói, o conceito de energia física e energia espiritual é o mesmo em todas as realidades.

— Hum, tá certo. Anda, diz como vou ativar essa joça?

— A realidade desse mundo segue a lei do nome primordial. É só invocar o comando relacionado com a magia desejada.

Hum…

É o nome da habilidade?

— Só há duas formas de se conseguir poder: uma é através do treinamento árduo até dominar o nome primordial de uma técnica — continuou a pedra —, a outra é através da classe sábia, que são capazes de lerem o íntimo do conhecimento.

É isso mesmo.

Posso ativar uma habilidade através do seu nome.

— Por isso a classe sábia é perigosa?

— Exato. É comum os sábios serem executados antes de despertarem todo o potencial.

— Não faz sentido. Com todo esse potencial, o certo seria que essa classe fosse adorada. Um sábio teria que ser desejado por qualquer organização. Seria praticamente uma celebridade.

— O que? Herói, eu sei que é você que faz as escolhas da nossa aventura — a pedra falou firme. — Mas não importa o que você acha que sabe, me prometa que vai manter sua classe em segredo.

— Certo, certo… não precisa engrossar.

Só posso testar, né?

Tenho que usar a ativação.

Deixa eu ver, hum, já sei!

Ah… saquei!

O que…

Não é isso.

Minha magia é trevas... porque tá escrito conhecimentos gerais?

Nossa, assim pareço um zelador, um faz tudo.

O quadro da magia desapareceu.

— Pedra, o que significa isso? Minha magia é trevas. Tava escrito no quadro de ativação magia: conhecimentos gerais. Por acaso você pensa que vou salvar o mundo consertando os encanamentos. Veja bem, não tenho nenhum irmão chamado Luigi, não me vem com essa.

— Você não entendeu suas próprias habilidades. O poder mágico é a origem de sua energia, por isso é tão arriscado esse caminho. Magia é a base de seus conhecimentos, e mais uma vez, como manteve suas memórias, esse é o resultado.

Pocaria…

Manter as memórias tão me custando caro demais.

Ele ativou a habilidade mais uma vez.

Tenho que estudar isso direito.

Poderá custar minha  vida.

Ele tocou no cadeado.

Hum… é para isso que servem os pontos dos atributos.

Puta merda, preciso de 25 de inteligência para dominar a técnica.

Tô fudido!!!

O custo é 50 de mana.

Haaa!

É isso, tô ferrado… não tenho pontos nem para peidar.

Preciso evoluir rápido.

Pelo menos posso testar as passivas, de princípio, é o mesmo meio de funcionamento.

Deixa eu ver.

Guilherme olhou à sua volta, tinha grama, tinha as pedras do leito do córrego e um tanto de outros materiais, mas no fim só precisava de pouco para testar essa habilidade.

Então ele juntou um punhado de água na palma da mão.

Um quadro de informação surgiu diante de seus olhos.

O que é isso de característica: calmante?

Hum… é por isso que me sinto tão bem com os pés dentro dessa água.

Droga, mas por quê?

Se eu tivesse um vidrinho iria levar um pouco.

Aff!

Alguns segundos e a caixa de informação desapareceu.

Guilherme voltou a encher a palma da mão com água, e desta vez colocou um ramo de grama junto. Não podia esquecer das aulas de química: substância composta.

Hum… um cadeado.

Por quê?

Tocou nele.

Que bosta!

Aff… para avaliar duas substâncias de uma vez preciso do nível dois dessa habilidade.

Ew!

É… pelo menos agora sei que as minhas habilidades podem ser evoluídas.

— O que achou do Fichário do Jogador?

— Poderia ser bem melhor. Nem vou mencionar que tô muito ferrado, e ainda vou voltar para a escola e terei que evoluir rápido — disse Guilherme desanimado.

— Não será difícil, eu acredito em você. Vamos viajar pelo mundo, não faltará oportunidades para a evolução.

— Correr por um mundo desconhecido avaliando água e lutando com gravetos é loucura.

— Medo? Os heróis não sentem medo.

— Medo? Não seja idiota, pedra. Eu não conheço essa palavra. É apenas precaução, sou eu que vou morrer, sem contar com a dor daquela surr… esquece!

— Nesse caso, quer ficar aqui, nesse córrego vivendo de água?

— também não né, sei muito bem que isso não adiantaria de nada. Vamos devagar, um passo de cada vez, certo?

— Eu sou uma pedra, só posso te acompanhar. Para onde vamos primeiro?

— Vamos ao vilarejo que encontrei ontem. Lá poderemos conseguir informações. Você tem sorte por não ter nariz, pedra.

— Por que?

— O lugar fede a fezes! — Guilherme coçou o nariz. — Não vá estranhar se ouvir alguém reclamar. Não vai ser por minha causa.

— Por que alguém iria reclamar de um herói fedendo a fezes? 

— Deixa pra lá, é coisa da Terra, você não entenderia. Vamos começar a nossa aventura… huááá!

O rapaz se sentiu estúpido, forçou-se a desviar o olhar.

Na sua mente aquele vilarejo era um turbilhão de sentimentos negativos, violência, escravidão e fezes.

Após lavar o rosto e se afastar do córrego, Guilherme recuperou um pouco da altivez, até que não conseguiu concentrar-se em mais nada além de seguir seu caminho, sem poder se afastar das marcas nos troncos das árvores, que havia feito no dia anterior, como os pequenos sinais da surra que levou.

Viu um punhado de terra revirada e a primeira coisa que pensou foi em bosta de vacas. 

Argh!

Não paro de pensar em fezes.

Não vou superar isso.

Tudo culpa daqueles malditos.

Droga!

◈◈◈◈◈◈

Quando Guilherme e a pedra já estavam quase alcançando o vilarejo, eles pararam num arbusto para observar o lugar.

— Vou entrar no vilarejo para conseguir informações, eu já tive péssimas experiências nesse lugar, por isso, não diga uma palavra, certo, pedra?

— Não se preocupe, só você pode me ouvir.

— Isso também não poderia me contar antes? Vou falar uma coisa, hein, você é osso de costela.

Guilherme logo notou que não havia muita movimentação no vilarejo, e como não avistou os guardas com os machados duplos e os escravos estavam preocupados demais com o chicote do feitor para notar qualquer coisa, aproveitou para avançar.

Andou devagar entre as choupanas. Duas vezes precisou se esconder debaixo de carroças.

Ao acreditar que o pior já havia passado, Guilherme se enganou redondamente.

Ele enfrentou o mais simples desafio de todos, ao se esgueirar por uma choupana que lembrava uma panificadora, e de imediato o cheiro dos pães quentes e macios retorceu suas estranhas, já que a fome mostrou as garras.

A boca dele encheu com saliva, mas se manteve forte e seguiu adiante. É verdade que poderia comprar um dos pães, tinha moedas para isso, mesmo não sabendo do valor real. Ainda assim, no estado em que estava, não poderia fazer nada, corria grande risco de ser comparado outra vez com um escravo.

Então encontrou uma choupana mais preservada e alinhada, nela havia uma placa escrita: alfaiataria.

Bom… uma das prioridades é trocar essas roupas.

Deixar de parecer com um escravo.

Nem é tanto isso, não aguento mais a inhaca de merda grudada em mim.

 É arriscado, mas não tenho escolha.

Depois que um trio de moradores saiu da alfaiataria, houve alguma movimentação e quando teve a certeza que o lugar estava vazio de clientes, Guilherme se esgueirou para dentro da loja.

Dentro do lugar, havia apenas um homem magro e sem barba, alto e de cabelo preto bem aparado, na boca segurava alguns alfinetes enquanto retalhava uma manta de couro.

Ele trabalhava sozinho e as suas roupas não tinham nada de mais, mas eram bem cuidadas.

O homem lançou um olhar gelado para Guilherme e fechou a cara numa torta careta, cuspiu os alfinetes e então disse:

— Pode ir dando meia volta e sair por onde entrou, minha loja não é lugar para escravos, ainda mais encardidos. Pelas barbas dos cervos de três chifres, que futum horrível, parece o cheiro de uma latrina.

— Não sou escravo.

— Esse cheiro horroroso, é de você, escravo? Vou chamar a guarda.

Guilherme viu estendido um conjunto com camisa branca, calças marrons e um protetor de ombro e pescoço, eram simples, ideais para camponeses. No seu atual estado, iria servir perfeitamente, sendo que o melhor, custava apenas 2 moedas de cobre.

— Não sou escravo. — Guilherme pegou a algibeira e a sacudiu. — Veja, tenho dinheiro, quero comprar aquele conjunto de roupas.

— Eu notei isso. Dinheiro, quer comprar aquele conjunto. São 5 moedas de cobre!

— Espera, não, são duas moedas, está escrito.

— Pensei que estava sendo tão claro. São negócios. Aquele preço é para homens livres. Para escravos fugitivos, o preço é 5 moedas de cobre. Isso, ou vou chamar a guarda. Os pontas vermelhas vão te pendurar pelas bolas!

— Dê o que o homem quer, podemos encontrar outra solução. Guarda é perigo — alertou a pedra.

Guilherme encontrou uma bolsa curta de aventureiro em cima de uma cadeira, estava bem surrada, mas não estava rasgada. Em outro canto tinha um pergaminho rasgado de papel e um lápis de carvão.

— Negócios? Hum, tá bem — Guilherme concordou. — Na verdade, faço então uma proposta: se você incluir também aquela bolsa velha, o pedaço de papel e o lápis, e também informações. Eu pago 8 moedas de cobre.

— Oh, não seja atrevido. Você vai deixar essa algibeira aqui e vai sair sem nada, e eu não chamo os pontas vermelhas. Que tal essa proposta, escravo?

— Ora, ora, que coisa — disse Guilherme pegando tudo que queria. — Você acha que um escravo fugitivo irá se entregar sem colocar esse lugar abaixo, e me diga: o que os pontas vermelhas vão achar do seu envolvimento com escravos fugitivos? Suas bolas vão aguentar seu peso?

— Minhas b-bolas? — O homem soluçou. — Envolvimento?

— Sim, é só eu afirmar que conspiramos para minha fuga e que tudo deu errado por sua ganância, tenho as moedas de cobre como prova, o que irá acontecer?

— O que você quer saber, escrav-o m-miserável. — Ele foi atingido por uma crise incontrolável de soluços.

— Já falei, não sou escravo!

◈◈◈◈◈◈

Escrevendo no bloco de notas os pontos que não podia esquecer, Guilherme estava numa estrada que levava para a cidade chamada de Carrasco Bonito.

O nome desse vilarejo era Folha-Seca. Carrasco Bonito era a cidade mais próxima onde havia uma guilda dos heróis; isso ele descobriu com o costureiro solucento. Também descobriu que estava no Império Tusso do Norte.

O sistema monetário era universal: 1 moeda de bronze vale 1 moeda de bronze; 1 moeda de prata vale 100 moedas de bronze; 1 moeda de ouro vale 1000 de prata. 100 moedas de ouro valem um traço de esmeralda; só que esse valor era tão inalcançável que o pobre costureiro travou ao imaginar. 

Ele ainda tinha muito o que perguntar, mas os soluços do pobre homem ficaram incontroláveis, então Guilherme se deu por satisfeito com o que descobriu.

— Herói… — chamou a pedra —, você lidou muito bem com aquele costureiro.

— Pode crer que sim. Você esqueceu que homens como ele teme perder o que já possuem.

— Como sabe disso?

Na terra eu era como ele…

— Eu só sei, droga…  

— Mas você tinha razão, o tolo ganancioso não consegue se afastar de seu ouro.

— Meio que isso. — Guilherme levantou o pergaminho de notas. — Certo, terminei minhas anotações.

— O que você anotou? 

— Nada de mais, só algumas observações, não se preocupa.

Guilherme enrolou e guardou o pergaminho de notas na bolsa, ajeitou melhor as roupas no corpo; elas eram meio que grandes, mas pelo menos não voltaria a ser confundido com um escravo e o melhor: não estava fedendo a fezes.

Só me sobrou 1 moedas de cobre depois daquela bisnaga polvilhada com farelo doce, não era açúcar, mas com a fome que estava, comeria se fosse sal.

Que pindaíba brava!

Mas foi um dinheiro bem gasto, agora é saber o que vou poder fazer, bem… só vou saber quando chegar em Carrasco Bonito.

Que os jogos comecem… GG… aventura!

Guilherme conseguiu comover um carroceiro com uma história de um saco de grãos furado e uma tia sem pé. Com isso arranjou uma carona até a próxima cidade.

 

....

◈◈◈◈◈◈

O Rastro das Feras

No bosque sombrio e silencioso, a movimentação de um lobo quebrou o silêncio ao redor da árvore onde Guilherme enfrentou a matilha, no lugar ainda havia vestígios da luta.

O animal vagou pelo lugar farejando e só parou quando suas narinas já haviam detectado o rastro da presa e ladrou estremecido ao olhar para trás.

O grande lobo que lhe despertou o pavor exibiu os dentes, furioso. Ele levantou a cabeça e abaixo de um dos olhos havia uma ferida em carne viva, parecia que a qualquer momento o globo ocular fosse cair como ao estourar uma jabuticaba.

A fera medonha lançou um uivo poderoso.

Lobos começaram a avançar nas sombras. A matilha estava enfurecida.

...



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