Volume 1 – Arco 1
Capítulo 20.5: A Jornada do Aventureiro
O som dos gritos dos comerciantes chamando os clientes, na principal rua do comércio de Carrasco Bonito, Rua das Baratas, lembrava os gritos de guerra dos soldados num campo de batalha.
Aquela avenida seguia e terminava na praça vizinha da Guilda dos Heróis.
O ritmo do comércio era bem movimentado com a compra e a venda das mais diversas mercadorias, até de pessoas. O lugar não era diferente de outros centros de valores e nada deixava a dever às grandes casas de negociações ou feiras de escravos do Império Tusso do Norte.
Mas nada conseguia abafar a sensação ruim daquele lugar, o clima de barbárie.
Caso os ânimos mudassem, caso um comerciante suspeitasse de roubo, caso um cliente achasse que foi lesado… caso as diversas casas de apostas dessem o sinal, era certo que as pessoas iriam se transformar em bestas furiosas; de qualquer forma, o desconforto emocional já irrompeu no coração de Liel por outro motivo, deixando seu corpo inquieto e inseguro mesmo num lugar com grande agitação.
Na verdade, não era nada daquilo que fazia com que o corpo do jovem aventureiro viesse a estremecer como se estivesse diante de um formidável adversário.
Eram as péssimas lembranças da Guilda dos Heróis.
Liel sempre regrou sua vida através da honra e coragem. Mas, desde o confronto contra o escravo mentiroso, toda a vergonha que passou, os tais méritos tornaram-se dolorosos para ele. Era como se alguma parte dele fosse arrancada naquele dia.
Sua confiança enfraqueceu durante a horrível batalha de narrativas, e o espírito aventureiro não mais enxergava um futuro de fortunas e glórias, mas o reinado da falsidade no mundo dos homens livres. A morte da honra. O fim da era dos heróis.
Eu não posso aceitar isso, Liel pensava enquanto caminhava junto dos companheiros, Ramsdale e Clint, pela Rua das Baratas, Nat, meu caminho é justo?
Levou alguns dias para o seu corpo se recuperar do ataque de Leon, o tanque do grupo Gaviões Prateados.
Ao retornar para a guilda, ele tinha a esperança de que, com a primeira missão do grupo manoplas, seu espírito de luta voltasse ao normal. No entanto, quanto mais se aproximava do grande prédio de mármore, mais difícil era controlar os tremores do corpo, que eram cada vez mais fortes, mais sombrios.
— Liel, você não precisa ser teimoso até o fim — disse Ramsdale. — Quase todas as cidades desse império têm uma Guilda dos Heróis. A nossa primeira missão pode ser em outra região.
Na ocasião que Liel confrontou o escravo mentiroso, o esperto arqueiro não soube como lidar com a situação, mesmo sendo o cérebro do bando, e agora não conseguia encontrar palavras para o mal-estar do companheiro, que devia estar transbordando pelos poros dele. Suspirando, deu um tapa no ombro do amigo e começou a mexer nas flechas em sua aljava, para tentar encontrar nelas alguma palavra que naquele momento não tinha na boca.
Mas seu olhar acabou caindo de forma inevitável nas explosões ansiosas do líder do grupo, acabando com o pouco de concentração que lhe restava. Esfregou a ponta do dedo na ponta de metal de umas das flechas cortando-a, muito rápido, enfiou o dedo na boca e fitou o companheiro.
Liel contorceu a face, só que não era nada como uma careta, era uma expressão um pouco mais leve, será que um dia o passado iria morrer de verdade? Pensou.
— Mas como vamos mudar de cidade se você não consegue lidar com as suas flechas sem cortar um dos dedos — disse o loiro, com solicitude. — A honra do nosso grupo foi manchada nessa cidade. Nessa cidade o Grande Urso caiu de joelhos e conseguiu se erguer para a glória. Não vamos para outra cidade porque é aqui que vamos mostrar o nosso valor, na terra onde o herói lutou e venceu.
— Velhota, esses bichos que estão assando na brasa são os língua-verdes? — Clint perguntou para uma senhora que girava uma dúzia de lagartos no espeto sobre o fogo, numa barraca bem decorada. Ele encostou sua arma, uma maça lisa, na barraca, de forma que parecia não querer deixar o lugar tão cedo.
— Oh, sim! O cheiro é inconfundível. São apenas duas moedas de cobre cada.
— É… — Clint se deliciou com o aroma. — Dizem que a carne é branca e macia como os peixes do grande mar salgado. — A boca dele encheu de saliva, e depois de engolir, disse: — Talvez eu tenha fome.
— Se nunca comeu e tem fome, é o seu dia de sorte, jovem, estão todos frescos. — A dona da barraca abanou mais a brasa, intensificando o delicioso cheiro.
— Talvez tenha um verme devorador de carne na barriga — disse Ramsdale. — Você quase acabou com o estoque de comida da hospedagem. Já está com fome outra vez?
— Talvez… — considerou Clint. — Mas a fome não é importante… quero dizer, o que as pessoas desejam quando são livres? Como posso recusar essa carne tão deliciosa?
Liel olhou os companheiros discutirem, depois dirigiu a atenção para a praça que já estava perto, e logo depois dela a Guilda dos Heróis, enquanto percorria os dedos pelo cabelo loiro, que haviam sido cortados em fio reto na altura da nuca.
— Bem… — disse ele, com relutância — dê algumas moedas para ele, Ramsdale.
O rapaz de cabelo verde, até enfiou a mão na algibeira que tinha escondido por dentro das roupas, mas deteve-se, antes de pegar as moedas.
— Dessa forma os nossos recursos não vão durar. Devo lembrar que são poucos.
— Já faz dois anos que a gente não sente fome de verdade — disse Liel, olhando o companheiro com simpatia. — Ainda lembra como era?
Sendo que na infância, a dupla de amigos havia passado por grandes dificuldades, por isso, agora, existiam desejos que não podiam ser ignorados.
— Os equipamentos que ganhamos do comerciante de escravos nos poupou boas moedas. — Liel hesitou um pouco e acrescentou: — Ainda que fosse o contrário, se um homem livre sente fome, não há economias para isso.
Ramsdale fechou e abriu os olhos duas vezes, e refletiu por uma fração de segundo. Depois entregou um punhado de moedas de cobre para Clint.
— Obrigado, Ramsdale. Eu sempre quis comer esses bichos. — O rapaz descabelado se alegrou. — Mas vocês não vão comer também?
— Eu não quero! — exclamou o arqueiro, enquanto o feliz companheiro contava as moedas. — Com o que comi de manhã, estou bem satisfeito, cheio como um barril de vinho.
— Clint, vamos na frente — Liel puxou o passo. — Quando você terminar, vá nos encontrar na Guilda dos Heróis.
— Certo! — O descabelado se virou para a senhora da barraca. — Coloque mais alguns no fogo, velhota. Olha, também quero aquele com a ponta do rabo queimada.
Depois do assunto resolvido com o companheiro, Liel e Ramsdale continuaram a subir a rua do comércio em direção do objetivo deles, uma missão para apagar de vez a má fama criada por causa do miserável escravo mentiroso.
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Liel estava pensativo, enquanto caminhava para a Guilda dos Heróis.
Ele gostaria de poder recusar-se a comentar, mas que desculpa poderia dar?
Se tivesse ligado para as estranhas atitudes do Clint, naquela barraca de comida, não teria condições de manter o grupo unido, ainda mais depois da grande confusão que criou na Guilda dos Heróis dias atrás.
Por ser o líder, precisava olhar para todos os companheiros, independente se eram novos ou antigos, e desejava o melhor para todos.
Ele se agarrou nesse pretexto, no entanto, essa lógica não melhorou em nada a situação, sendo que a verdade era que não sabia nada sobre aquele descabelado, além de uma fome ensandecida, será que eu cometi um erro aceitando aquele cara para o nosso grupo? Perguntava-se continuamente durante a caminhada para a guilda.
— Ei, Ramsdale, o que você acha que tem de errado com o Clint? Ele parece que nunca viu comida. Eu errei ao deixá-lo entrar para o nosso grupo?
— Do que está falando? Foi você que mandou dar as moedas para ele — declarou o arqueiro sacudindo os ombros com indiferença. — Dizer isso depois daquele discurso sobre a fome, é inconcludente até mesmo para uma cabeça dura. Além do mais, ainda não sei muito bem o que pensar. Talvez tenha alguma ideia quando sairmos da guilda.
— É... agora isso é inútil. Só estou evitando pensar na vergonha que passei naquele lugar.
Ramsdale não retrucou, como seria o normal, mas havia um motivo.
O movimento de pessoas na Rua das Baratas retardou-os, mas nada de incomum apareceu para distraí-los do foco. Ao passarem por uma viela que se perdia entre casas adentro, porém, o arqueiro diminuiu o passo até parar de frente para a boca do lugar.
Ele olhou para a profunda escuridão, estava sentindo alguma coisa. Suas orelhas tremeram, e o corpo foi afligido por um forte calafrio.
— Cabeça de couve, o que foi? — Liel chamou, depois que percebeu que o companheiro havia parado para olhar a viela.
Ramsdale piscou os olhos.
— Não é nada! — Ele voltou a andar. — Tive a sensação que tinha alguma coisa nos observando.
— Certo! Também tive, mas é comum numa cidade infestada de ratos como essa. Vamos apertar o passo, senão os abutres vão pegar as melhores missões.
— Tem razão, só que… — Ramsdale havia sentido uma presença poderosa, mas como logo desapareceu, se contentou que fosse apenas uma ligeira impressão ruim.
Os dois companheiros continuaram o caminho para a guilda, dessa forma, deixando a viela para trás.
Só que na escuridão profunda daquele beco, houve uma baforada de ar, que depois da intensa inspiração, o efeito da expiração foi capaz de criar uma densa nuvem de vapor quente.
— Interessante! — Uma voz grossa quebrou o silêncio daquele lugar entregue às trevas. — Encontrou companheiros astutos. Como vai lidar com isso?
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A Trilha do Descabelado
Clint apanhou mais um espetinho de lagarto língua-verde na grelha da senhora, se eu continuar a comer essas delícias da velhota, ele pensou com bom humor, vou terminar inchado como um sapo-balão.
Mas se não as comesse, por certo, o descabelado terminaria por ficar com a barriga roncando e salivando durante o resto do dia, o que seria pior, perguntou-se, barriga inchada ou parecer com um lobo raivoso?
Boca salivando espuma branca, nem pensar! Decidiu, pegando outro espetinho da grelha. De qualquer maneira, poderia digerir bem toda essa carne durante a missão que os companheiros iriam pegar na Guilda dos Heróis, com as moedas da recompensa vou poder comer mais desses espetos, ele sorriu, tenho que gravar onde fica a barraca da velhota para voltar depois.
Deu uma olhada no movimento na rua. Percebeu que havia passado bastante tempo, o que significava que acabou a sua alegria. Agarrou os seus espetos, pagou a senhora e foi embora subindo a rua na direção da Guilda dos heróis.
— Eu abro a minha banca todos os dias, não se esqueça. Espero que possa voltar mais vezes — avisou a dona da barraca, aos sorrisos, contando as moedas. — Que jovem gentil.
Caminhando rápido, Clint passou a saborear seus espetinhos devagar para que durasse mais. Ainda restavam três. Enfim, bem-disposto por causa da barriga cheia, abocanhou uma pata inteira, tão distraído, que não notou que estava passando na frente de uma viela sombria.
— Os bons modos nunca foram uma característica forte da tribo cabelo-duro — comentou uma sombria figura parada na boca da viela. — Têm três espetinhos, e não irá me oferecer nenhum?
O sangue de Clint gelou de forma instantânea.
— O que… — ele falou, trêmulo por avistar aquela imensa criatura — como me achou?
A figura misteriosa era alta e imponente, com uma presença que inspirava respeito e pavor. Seus ombros largos e braços musculosos davam a impressão de que poderia enfrentar qualquer desafio com facilidade. Vestindo um albornoz negro com grande capuz que escondia por completo o rosto, sendo impossível dizer quem era ou o que pretendia.
Qualquer impressão que aquilo se tratasse de uma terrível criatura não seria exagero.
Seria difícil para qualquer um identificar a coisa que ocultava a identidade na escuridão, mas Clint reconheceria aquela voz em qualquer situação, mesmo com o mundo desabando sob seus pés.
— Primeiro, me dê um desses espetos, não quero ficar salivando. Vejo que não traz nenhuma bebida, bhahhh… como comprou carne e não arrumou nada para empurrar para dentro? Não aprendeu nada, garoto? Vou ter que ficar sem cerveja para acompanhar.
Clint serviu-lhe os dois espetos que ainda estavam intactos.
— Pode ficar com os dois, já estou cheio — disse o descabelado, fazendo uma cara assustada. — Eu posso ir buscar cerveja em algum lugar.
— Os dois, hum, tudo bem. Fico muito feliz.
A figura pegou os dois espetos. A mão que se revelou para agarrar a comida, apesar de ser humana, era enorme e lembrava uma bigorna de tão firme. Ele enfiou um espeto dentro da escuridão do capuz, e depois de dois segundos, o espeto saiu liso. Fez o mesmo com o outro.
— Não importa o país, a carne do lagarto língua-verde ainda é a melhor, deliciosa e macia. Pode esquecer a cerveja. Acredito que só queria uma oportunidade para fugir de mim. Caso não te conhecesse, acharia que não tá muito feliz em reencontrar um velho amigo.
Clint ficou branco, mas conseguiu se controlar e entrou na viela. Era evidente que havia uma história complicada com aquela criatura sombria. Cambaleando por causa das pernas bambas, se ajoelhou aos pés da figura, colocou sua maça lisa de lado e abaixou a cabeça em sinal de respeito, toda a cabeleira caiu para frente, assim, ficou parecido com um vaso de samambaia.
— Que embalo, hem? — comentou a misteriosa criatura.
— Peço perdão por minha atitude vergonhosa. — A voz de Clint saiu da boca num tom trêmulo e fraco.
— Acredito que ficou com medo de mim. Conseguiu esquecer da antiga vida tão fácil. Dessa forma não irá sobreviver no meio dos homens livres.
— Quem é você? Minha consciência? — perguntou Clint, com um lampejo de raiva. — Não me dê sermões. Quantas vezes você já viu alguém escapar do inferno? Preciso aproveitar ao máximo. Com certeza vai demorar um bom tempo até que eu veja outra jaula.
— Será? Pode ter certeza? É melhor ir com calma, amigão — disse a figura, liberando da escuridão do capuz uma baforada de calor. — Você não vai querer passar mal logo no nosso primeiro reencontro.
Clint sabia que se aquela criatura o quisesse morto já estaria sem a cabeça antes da primeira mordida nos lagartos língua-verde. Toda a Rua das Baratas estaria em ruína. Talvez estivesse arrependido de aceitar a ajuda que havia recebido quando já era tarde demais para voltar atrás.
— Eu sou um grande tolo? — perguntou abaixando ainda mais a cabeça.
— Claro! A terra dos homens livres é encantadora, Clint, mas é cara demais.
A partir daquele momento, a situação tomou a atmosfera irreal de um sonho agoniante.
O pulsar acelerado do coração do rapaz descabelado confundiu-se com o bater do coração de um animal encurralado, até que ele mesmo não conseguiu distinguir um do outro.
A figura balançava o braço esquerdo e o levantava para o alto, posicionando o corpo para trás, fazendo com que a sua altura dobrasse de tamanho e o Albornoz parecesse muito pequeno.
— Não existem palavras para medir o tamanho da minha dívida. O campeão da arena da morte, o grande sapo, você me libertou daquelas areias banhadas em sangue — desabafou Clint, já naquela altura, comovido. — Não estou com medo, só não quero voltar.
— Dívidas precisam ser pagas, garoto. Eu devia ao seu pai. Prometi ao meu amigo que o filho dele teria uma escolha — concordou a figura. — Agora, sua dívida para comigo, ainda chegará o dia de se pagar. Por hora, é suficiente para mim, que você não se esqueça de quem é e de onde veio.
Clint havia bebido mais do néctar da terra dos homens livres do que poderia se orgulhar, e o sapo achou uma ótima ideia que ele tomasse consciência disso.
Os pensamentos do encurvado rapaz divagavam, mas não estava sonhando acordado. Seus sentidos estavam alerta. Ele percebia o movimento das ávidas pessoas vagando na rua do comércio, cada um dos comentários sobre o estranho garoto cabeludo ajoelhado numa viela escura.
Então se espantou quando a lembrança daquele filho do escravo assassinado lhe veio à mente. O garoto preso na jaula e com o olhar cheio de ódio. Os pelos do seu corpo se arrepiaram, será que ele sabe o que fiz? Pensou, não pode me condenar, para sobreviver temos que fazer escolhas; eu só escolhi o lado vencedor.
Após passar a mão pelo rosto e jogar para trás a vasta cabeleira, agarrou sua maça e se levantou, limpou os joelhos, e só então perguntou:
— Se não veio atrás de mim, o que quer aqui? Vai destruir a cidade? Devo fugir?
— E deixaria tudo que conquistou para trás?
Clint não tinha nada, além das roupas e do equipamento, mas lembrou dos novos companheiros, e não soube o que responder.
— Bhahhh… nem eu sei, só fui convocado para essa cidade. Mas acredito que não será para nada drástico, caso contrário, o clima nesse lugar seria outro. Vou encontrar uma companheira na Guilda da Caveira para descobrir qual é a missão. Tenta imaginar o tamanho da minha surpresa quando te vi vagando pelas ruas, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
— Você me viu? Quando?
— Tá muito tenso, garoto, o que fez, ou deixou de fazer é problema seu. É um homem livre. — O campeão baforou outra bufada de ar quente. — Vi os amigos novos que fez, eles têm boa intuição.
— É… — O rapaz descabelado suspirou — o que quer com eles?
— Nada, nada. — A figura começou a rir.
Deixou-se cair na mística daquele momento, puxado para baixo como se estivesse numa profunda lagoa. Tentando se livrar, olhou para o céu além da estreita passagem criada entre as paredes da viela, e viu o sol. Através dos pensamentos, traçou uma linha que não podia ultrapassar. Por isso devia dar o fora dali rápido.
Depois de alguns minutos, olhou para a grande figura e disse, da forma mais amistosa que podia:
— Eu devo tudo a você, mas não posso dizer que é uma alegria em lhe ver. Quando quiser que pague a dívida, me encontre e vou honrar o nome do meu pai. Mas agora, tenho que ir, e como disse antes, fiz bons companheiros e não quero perdê-los.
O sapo balançou a cabeça de forma negativa, onde apenas o capuz do albornoz se moveu, como também, a sua escuridão escondeu do rapaz a face triste e dolorosa do seu dono.
— Muito bem… obrigado pelos espetos.
A negra figura caminhou para dentro da viela e desapareceu na escuridão. Mas antes que sua presença pudesse desaparecer por completo, das sombras emergiram palavras:
— Garoto, a liberdade tem um preço, e você terá que ser responsável por ela. Você pode andar entre eles, ser como eles, mas suas mãos estão manchadas de sangue. Nunca esqueça o que foi capaz de fazer para sobreviver. Boa sorte!
Clint ficou parado, não posso te agradecer tanto assim, seus pensamentos estavam em ebulição, não ainda!
Então suspirou.
De forma alguma passou por sua cabeça sentir medo. Conhecia aquela criatura há tanto tempo e sabia que, mesmo no fim, ele jamais quebraria uma promessa. Ainda assim, nada desde que conseguiu escapar da arena da morte, o Coliseu de Prata, parecia real, de qualquer maneira.
Não podia se abalar com a nova vida, porque estava vivendo o sonho de muitos amigos mortos.
Mas as últimas palavras foram sufocadas por sentimento de culpa e vontades egoístas. Ele jamais imaginou que o passado ainda pudesse ter um efeito tão negativo, ainda mais depois de tudo que fez para continuar vivo.
Só que as palavras do Sapo eram verdadeiras, e ele se esquecia de quem era, se esquecia da antiga vida cada vez mais, à medida que mergulhava numa nova.
Usando a água de um bebedouro de animal, Clint lavou o rosto, e só então, começou a subir a Rua das Baratas na direção da Guilda dos Heróis.
...