Volume 1 – Arco 1
Capítulo 22: Interlúdio 1 – A história de Indiah (1)
Durante muitos séculos no extremo leste do continente, vivera um povo de coleta e caça. Eles viviam em paz entre as diferentes tribos que formavam aquele povo e com a natureza. Ligados aos sinais do tempo, agradecidos pelos frutos que coletavam e sempre celebravam o sucesso na caça. A sua principal divindade era a deusa Harmonia que regia o pacífico modo de vida daqueles homens e mulheres que assim gostavam de viver e eram felizes por isso.
Dizer que nunca ocorreram disputas, brigas ou até mesmo mortes, seria um exagero, no entanto, aquele povo entendia que uma solução pacífica era a melhor maneira para se resolver um conflito.
Ao Norte daquelas terras fazendo limite com as montanhas brancas morava um dos muitos povos da tribo. A Última Tribo. Aproveitando o fato de viverem em uma das mais verdes florestas do continente, aquele povo construía suas casas de madeira na copa das altas arvores da região. De lá, desciam por cipós ou escadas improvisadas. Normalmente retornavam aos seus lares somente para dormir já que passavam a maior parte do tempo no solo, todos como uma grade família. Homens e mulheres, não importava se eram crianças, adultos ou velhos, não faziam distinção.
E foi nesse ambiente de paz e simplicidade que nascera Indiah. A sua pele morena era encoberta por uma longa cabeleira escura que chegava até sua cintura. Seus olhos eram como duas grandes gemas, que de tão negras era como se engolissem toda a luz que refletia em sua direção. Nada a diferenciava das demais jovens que viviam naquele lugar, mas seu pai, este insistia em dizer que ela era herdeira do coração mais puro e de um inconfundível olhar inocente que jamais existira. Estas características a tornava bela e não era algo ostentador, ao contrário era algo sutil e contagiante.
Seu pai, como a maioria dos homens, era caçador e a sua mãe, artesã. Dele a jovem aprendeu a habilidade de usar a lança e o arco e flecha, e dela aprendeu a trabalhar o barro e a cozinhar.
Aos catorze anos a jovem já se preparava para casar. Tradicionalmente a família de um jovem caçador iria escolhê-la. E assim ela se casaria, apreenderia a amar, a dividir, a compartilhar e seria ainda mais feliz. Tal como sua mãe era, assim como todas em sua vila, da forma que a tradição ensinava.
A noite Indiah dormia ansiosa e entre as frestas do teto da cabana em que vivia com seus pais, ela contemplava o céu estrelado e sonhava pelo seu futuro marido. Pelo homem a quem dedicaria um grande amor. Ela ainda não havia sido escolhida, não sabia quem era seu pretendente, mas sentia que logo o conheceria.
Observava as estrelas e conversava com elas enquanto sua mente viajava num sonho de fantasias e idealizações. E fora numa noite destas, durante suas preces que uma estrela cadente cintilou rapidamente e pode ser vista por entre as frestas do teto da cabana.
Indiah arregalou os olhos. “Meu pedido será realizado?” Pensou exaltada. Entretanto para a sua surpresa mais uma estrela cintilou pelo céu noturno. E mais outra, e mais algumas. Logo parecia que o céu estava desabando e um grande pavor tomou conta da garota, seu desespero se tornou ainda maior quando uma nuvem que começou a atrapalhar a sua respiração.
Ela se levantou, foi aos tropeços e tossindo em direção a porta de madeira da cabana. Ao abri-la percebeu que talvez fosse melhor que o céu estivesse caindo. O fogo não somente tomava conta de sua cabana, mas de toda aldeia. Arvores guardiãs milenares ardiam em chamas, a madeira crepitava como se gritasse de dor, o sangue escorria na forma de fumaça se misturando a outras fazendo uma longa poça cinzenta nos céus cobrindo a lua e as estrelas.
— Mãe! Pai! Onde estão vocês?
Indiah olhava para baixo e o seu povo corria desesperadamente. Mulheres carregavam suas crianças em busca de abrigo enquanto os homens buscavam suas lanças e arcos e seguiam em direção oposta.
As estrelas cadentes, na verdade uma chuva de flechas incendiárias continuava a cair sobre o solo da tribo. Casas queimadas, pessoas atingidas caiam no solo agonizando de dor, outras tombavam sem vida em meio ao tumulto. Era um caos generalizado.
Assim que desceu da árvore a garota se viu completamente desorientada, paralisada pelo medo, ela se abraçou e enquanto seus olhos se encheram de lágrimas. Por um instante ela pensou que tudo aquilo não passava de um pesadelo, um terrível e indesejado sonho, talvez o pior de todos. Aquilo não poderia estar acontecendo.
Para onde olhava, tudo que podia testemunhar com seus grandes olhos era dor e desespero. Uma mãe correndo com uma criança pequena no colo era atingida pelas costas, tombando no chão, ela se arrastava para proteger a criança indefesa com o próprio corpo. Um homem parou para tentar ajudá-los, mas foi morto por uma flecha certeira.
Ao longe via-se uma longa faixa de luz avermelhada no horizonte que rasgava a noite aproximando-se cada vez mais. Eram inúmeras tochas, sinal de um de um grande exército marchando.
No meio do tumulto, Indiah foi jogada ao chão. Enquanto se recuperava a jovem mal pode escutar no meio daquele caos um enorme galho chamuscado se soltando da arvore sob a qual ela estava abaixo. O galho caía em sua direção.
Então a jovem gritou. E tudo ficou escuro.