Lana – Uma Aventura de Fantasia Medieval Brasileira

Autor(a): Breno Dornelles Lima

Revisão: Matheus Esteves


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 20: Duelo

O capitão do campo de concentração tinha um palpite de que Lana regressaria para a sua casa no bosque, assim o homem e seus dois oficiais encontraram as garotas no local esperado durante o entardecer daquele dia.

— Então você realmente voltou para o buraco de onde saiu? — desdenhou o capitão enquanto balançava a cabeça negativamente.

Lana com a cabeça baixa apenas olhava em silêncio enquanto Aline, dando um passo atrás, tremia de medo.

— É o capitão do campo de concentração! — gritou a menina.

— Para mim está mais do que claro de que você não é uma garota qualquer. Por um segundo até estava torcendo para não encontrá-la aqui. Foi tolice sua achar que não a procuraríamos neste local!

— Não estou fugindo, tão pouco me escondendo — respondeu Lana.

— Então esta é a sua cúmplice? — disse o capitão apontando para Aline, que sentiu o sangue gelar no mesmo instante. — É uma pena que ela tenha que compartilhar do mesmo castigo que você. Ela é nova, mas eu não posso tolerar o que aconteceu no meu campo!

— Apenas tente encostar nela — ameaçou Lana cerrando os dentes com força.

Assim que o capitão deu um passo à frente os assistentes automaticamente se preparam para sacar seus sabres, no entanto foram impedidos.

— Isto é um duelo e vocês estão proibidos de interferir. É algo que eu posso resolver sozinho — disse o líder avançando mais um passo e desembainhando a sua arma.

Os dois homens confusos com aquele tipo de ordem apenas obedeceram. Para eles seria muito mais prático capturar as fugitivas, não havia necessidade alguma para duelar.

— Aline eu quero que se afaste, mas não tenha medo. Eu não vou perder desta vez!

— Espera Lana, o que você quer dizer com “desta vez”?

As pernas de Aline tremiam, seu coração batia acelerado. Ela pensou consigo mesma de que jamais se acostumaria com aquela sensação e então recuou.

A ruiva finalmente deu um passo à frente, e também desembainhou sua arma. O capitão não pode deixar de notar de que havia algo incomum na ponta do florete.

— O que é isso? Vai querer mesmo duelar utilizando um brinquedo? — falou o capitão surpreso, enquanto seus assistentes riam ao notar a situação da garota.

Ela nada respondeu.

Diante deles o sol observava de testemunha o início do duelo antes que ele mesmo perecesse. E contra o astro era visto apenas a silhueta e dois guerreiros em pose de combate. E os dois se encaravam, olho no olho. Assim como deve ser nos duelos, mas por alguns segundos, talvez se sentindo incomodado pela esfera metálica que cobria a ponta do florete, o capitão desviou seu olhar para a espada. Foi questão de segundos, talvez menos do que isso, mas o fato é que assim que se deu conta, Lana seguia em sua direção numa veloz estocada.

Por muito pouco o capitão conseguiu esquivar-se da arma girando o seu corpo para o lado e numa agilidade ainda mais espantosa Lana emendou um golpe vertical que foi detido por reflexo. O capitão levantou desajeitadamente o sabre para conter a trajetória do florete que vinha de cima para baixo. Para a surpresa de todos, o metal do florete era extremamente fino e flexível e entortou agindo exatamente como um chicote. A sua ponta adicionada ao peso da esfera acertou em cheio o rosto do capitão, que cambaleou para trás atordoado pelo golpe.

Em sua face era nítida a marca deixada pela arma, em especial na sua boca, que sangrava. Enquanto levava a mão esquerda ao ferimento, o capitão olhava admirado para sua adversária.

“Esta é diferente!” pensou ele. “É como um chicote? Ótimo, já sei como lidar com isso. Não corta e não perfura. Não tem como desferir um golpe mortal! ”

Lana se aproximava lentamente, quase que de forma imperceptível, seus pés se arrastavam ligeiramente para frente diminuindo a distância do seu inimigo. Abalado ele não calculava o quão próximo ela se encontrava. Apenas via na sua frente o florete com seu aço levemente curvado para baixo com a ponta manchada com o seu sangue.

A ruiva arremeteu nova estocada e o capitão também avançou. Com um contragolpe o homem conseguiu conter a investida de Lana que habilmente girou seu punho e fez sua lâmina deslizar sobre a arma inimiga. Já ciente do que estava por vir o capitão aparou a ponta do florete com a mão esquerda.

Em seguida ele usou a força de seu corpo para empurrar a sua adversária contra o solo. A jovem, no entanto, evitou sua queda cambaleando para trás sem que em momento algum alterasse o seu semblante.

Mesmo desequilibrada, ela deu um rápido golpe tentando conter o avanço do capitão que atacava com firmeza. Mais dois golpes foram dados e igualmente aparados.

Então ambos deram o assalto por terminado. Empate! Os duelistas em pé, em guarda novamente se encaravam para um novo turno aonde suas lâminas novamente iriam se confrontar.

Lana avançou mais uma vez com incrível agilidade. Para a admiração de todos os presentes, a arma atingiu o peito do capitão e se descrita a cena em câmera lenta era possível ver Lana se admirando com o êxito do golpe e com a ineficácia do mesmo. O capitão ignorou totalmente a investida, ele se deixou atingir propositalmente, o couro do seu uniforme foi suficiente para atenuar o choque do impacto. Ao mesmo tempo em que recebia o golpe de sua inimiga, a sua lâmina seguia em direção oposta rasgando o braço direito da jovem.

Havia uma expressão de surpresa no rosto de Lana que encarava a alguns centímetros a ponta do sabre que somente não causou ferimento mais grave devido ao formato curvo da lâmina.

— Não! — gritou Aline.

Ao final do assalto Lana se afastou do inimigo e apesar do braço ferido, ela permanecia ainda em pose de luta. Agia como se nada tivesse lhe acontecido.

— Agora estamos empatados — falou tranquilamente o capitão avançando lentamente em direção de seu oponente, golpeando o ar para limpar o sangue que escorria do sabre.

Lana tomou fôlego, mudou sua postura de combate, ficou praticamente de lado para o inimigo, a mão esquerda recuada na altura da cintura, a coluna ereta, perna e braço direto à frente. O sangue escorria pelo seu antebraço que estava levemente retraído.

“Eu não irei recuar por nada neste mundo! Nem mesmo que tivesse o meu braço decepado! Jamais iria dar esse sabor ao inimigo, principalmente para ele!” — pensava Lana.

E decidido a encerrar o duelo o capitão deu uma repentina e furiosa estocada, como estava de lado, a garota tentou esquivar-se lateralmente do golpe curvando a sua coluna o máximo que pode para frente, o sabre cruzou o ar rasgando as suas costas ao mesmo tempo em que ela estendia o braço direito num golpe rápido em direção ao rosto do capitão.

Prevendo esta situação o homem aparou o florete com sua mão esquerda e caso tivesse se atrasado por alguns segundos a arma lhe teria cegado um olho. Enquanto segurava com firmeza o corpo sem fio da arma, a esfera de aço resvalava em sua pálpebra.

Lana acusou sentir o golpe, mas manteve a postura, para o capitão restava agora retornar a lâmina e assim terminar de mutilar as costas desprotegida da garota e obter a sua vitória, mas antes que pudesse desferir tal golpe, o tempo congelou, era como se houvesse tempo suficiente para o homem deliberar sobre o seu próximo ato e naquela fração de segundos ele sentiu o peso do florete aumentar e abismado notou a mão direita de sua adversária pressionando seu pescoço.

 

— Eu venci! — decretou Lana.

 

Nesse momento a luta congelou e nenhum movimento a mais foi acrescentado. O capitão suava frio e olhava para a mão da jovem, mas nada enxergava, sentia apenas um objeto frio e pontiagudo pressionando sua garganta que sangrava levemente. Era a pequena e discreta faca artesanal sem cabo recebida de Aline.

No momento em que o capitão havia defendido a estocada, a jovem havia largado a arma e com o impulso restante mirou a garganta do homem.

— É muito tentador dar cabo de sua vida aqui, mas trocarei a minha vingança por algo muito maior. O que me diz? — sussurrou Lana.

— Acha mesmo que vou negociar com você?

— Você não tem escolha, a sua vida me pertence. Estou te dando uma chance de viver — retrucou a jovem, aumentado a pressão da faca no pescoço do homem.

— Pois bem. Estou ouvindo. — Ele respondeu contrariado.

— Retornaremos ao campo e você vai libertar todos os prisioneiros.

— Não seja idiota! Não farei isso e mesmo que o fizesse, em questão de dias, todos seriam recapturados!

— Então você não tem nada a perder.

Tanto Aline quanto os soldados assistiam apreensivos a espera de um desfecho.

— Largue a sua espada e ordene aos seus homens que façam o mesmo. Sabe que após te matar ainda tenho condições de matar seus dois soldados, ainda mais se eles não forem tão bons quanto você.

O homem hesitou por alguns instantes, olhou para seus dois oficiais e uma profunda vergonha tomou seu semblante e então deixou a arma cair no solo.

— É uma vergonha ser derrotado por uma garota. Estou morto de qualquer jeito — afirmou o homem ajoelhando-se em seguida. — Pode dar cabo da minha vida aqui mesmo, mas não irei te ajudar a libertar os prisioneiros.

— Não capitão! Derrotado ou não, a vida do senhor é valiosa! — disse um dos soldados largando a arma no chão.

— Não seja tolo, prefiro que vinguem a minha morte a permitir que ela use minha vida em troca dos prisioneiros.

Nesse momento se fez ouvir ao longe o som de um de cavalo se aproximando. Cavalgava rapidamente, logo todos ficaram receosos.

— Ei você! Quero que amarre o seu companheiro e em seguida o seu capitão! — ordenou Lana.

E assim foi feito. Após amarrar os punhos e as pernas do último soldado, Lana sentou-se para descansar enquanto Aline fazia um curativo em suas costas e no braço ferido.

O sol finalmente se foi quando o cavaleiro chegou e Lana se levantou para recepcionar o próximo oponente.

— O que vai fazer? Temos que ir embora! Você está toda machucada! — gritava Aline desesperada tentando impedir em vão a amiga de se levantar.

Lana nada respondeu. Apenas pegou o sabre do capitão e foi em direção da estrada. Aline tentou agarrá-la pela cintura, as lágrimas e o choro a impediam que dissesse qualquer coisa, mas a sua intenção era clara. A ruiva pousou a mão na cabeça da amiga, e então com um olhar confiante e ao mesmo tempo sereno, de uma forma a Aline jamais tinha visto antes, disse:

— Fique atrás de mim, vai dar tudo certo.

Sem alternativa Aline obedeceu e choramingando recuou. Lana tomou sua posição no meio da estrada, seu florete na cintura, a faquinha estrategicamente escondida e com o sabre em punho.

Seu braço direito e suas costas ardiam, sentia fome e cansaço, mas naquele ponto ela já havia provado que a sua obstinação era maior que qualquer dor ou ferimento que lhe fosse infligida.

E assim o vulto foi se aproximando cada vez mais. Lana cerrou os olhos, ficou em pose de combate pronta para abater o cavaleiro ainda em seu cavalo.

No entanto assim que se aproximou o homem diminui drasticamente sua velocidade ao perceber quem o encarava no meio da estrada, ele parou e disse:

— Vejo que cheguei tarde para oferecer a minha ajuda!

— Tarde demais para ajudá-los? — perguntou Lana.

— Não! Talvez ainda esteja em tempo de ceder a minha lâmina a sua causa! — disse o cavaleiro descendo de sua montaria.

Era Rafael que acabava de chegar.



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