Lana – Uma Aventura de Fantasia Medieval Brasileira

Autor(a): Breno Dornelles Lima

Revisão: Matheus Esteves


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 19: Lar

Depois de deixarem o monge para trás, após o encontro com os viajantes pela estrada e após cruzarem o bosque, Lana e Aline finalmente concluíram seu objetivo.

As duas garotas chegaram a tarde no que restara da antiga casa de Lana. Nada ficou de pé, até mesmo a pequena horta havia sucumbido as chamas que se espalharam em torno do local, somente o pequeno poço que ficava alguns metros mais à frente permanecia intacto.

Pensativa Lana caminhava devagar, seu olhar era um misto de saudades e desilusão. Visivelmente entristecida a garota entrou no que um dia foi o seu lar. Aline logo atrás apenas observava a desolação do local.

Estava tudo carbonizado, portas, paredes e móveis. Lana se ajoelhou no que antes era um quarto e do chão pegou um punhado de pó. As chamas não fizeram distinção alguma do que consumiram, inclusive do corpo de sua falecida mãe.

Apesar da imensa tristeza que tomava a alma da jovem, lágrima alguma rolou por sua face. Em seu coração o ódio e a revolta eram os sentimentos que moviam o seu ser. Ela queria encontrar seu pai, mas não era esperança, otimismo ou algum tipo de fé que a fazia seguir em frente. Assim como sua casa que foi incendiada, ela queimava em amargura e desgosto. Se pudesse ser vista, muitos diriam que uma chama fria e azulada a consumia como se fosse uma aura de mau agouro e desgraça.

A jovem permaneceu ali em silêncio por um longo período. Quase não havia o que ser feito. Quase, pois com a adaga que lhe foi confiada por Rafael, Lana foi até a mata e pegou dois pedaços de madeira, trabalhou nelas até que ficassem planas e com alguns pedaços de trapos atou-os firmemente. Ali improvisou uma cruz e na colina logo a frente, conforme prometeu ao monge fez do local o túmulo de sua mãe.

Quando desceu a garota dirigiu-se novamente para os restos de sua antiga casa e no que seria a sala, parou e agachou-se por um instante como se procurasse por algo.

— Aline, me ajude aqui, por favor! — exclamou Lana para amiga que até então se limitava a observar tudo em silêncio.

Após limpar uma parte do chão, algumas frestas ficaram visíveis ao redor de uma pedra de forma retangular. Numa das extremidades Lana fincou a adaga e começou a forçar a lâmina como se fosse uma alavanca.

— Quando a pedra se levantar eu quero que você a empurre para o lado! — falou Lana com dificuldade enquanto fazia força para suspender a pesada rocha.

— Tá!

Por algumas vezes a lâmina escorregava e assustava Aline que temia se ferir, mas após alguns minutos de força e insistência, finalmente pedra começou a dar sinais de que se moveria.

— Vai! — gritou Lana enquanto num último esforço conseguiu levantar a pedra.

O aço da adaga partiu com o esforço, e Lana caíra sentada para trás enquanto Aline toda desajeitada conseguiu empurrar um pouco a pedra para o lado, revelando ser uma espécie de tampa.

Um pouco confusa com o tombo a ruiva fitou inconformada a adaga que estava em suas mãos, agora fragmentada.

— Que porcaria! — balançou a cabeça e atirou o objeto sem utilidade no meio da mata.

— Estamos sem arma novamente! — exclamou Aline.

— Acalme-se. Agora me ajude aqui com esta pedra — respondeu a amiga enquanto fazia força para mover a pesada tampa para o lado.

Após exaustivos minutos finalmente as duas tiveram êxito, pois a rocha movida revelou um buraco não muito profundo e dentro dele havia alguns objetos.

— O que é isso? — apontou Aline para algo enrolado por um longo pano vermelho.

Lana ignorou a amiga. Neste momento estava com sua atenção totalmente voltada para o objeto em questão. Seus olhos brilhavam de emoção e com muito cuidado ela retirou-o do buraco. Deitou-o sobre o seu colo, desatou com certa facilidade os nós que serviam de lacre e começou a desenrolar os trapos que envolviam o objeto.

Assim que vislumbrou a empunhadura dourada, Aline automaticamente deu um sorriso, seus olhos se arregalaram e ela ficou mais admirada conforme a fina bainha negra era revelada.

— Uma espada! — disse Aline surpresa.

— É um florete — corrigiu Lana ainda com os olhos vidrados no objeto.

— Que linda!

— É uma relíquia de família — explicou Lana enquanto ia aos poucos retirando a espada de sua bainha que refletia um forte e fino brilho metálico.

A empunhadura não era muito longa, era dourada e possuía uma textura simulando diversos fios de ouro que se entrelaçavam para compor a parte que o esgrimista utiliza para segurar a arma. O copo, que servia de protetor do punho, também era dourado e adornado com diversas texturas, e sobre elas dois brasões complementavam a peça, uma meia lua e uma rosa. Já a lâmina era extremamente fina e não era muito longa.

Quase que inconscientemente a mão direita de Aline tocou a lâmina e para sua surpresa percebeu que a arma não tinha fio algum, então com seus olhos perseguiu a extremidade da espada e notou uma minúscula esfera de metal cobrindo o que seria a ponta do florete.

— Não corta? — perguntou inconformada.

Lana levantou-se empunhou a arma em pose de luta e disse:

— Este florete nunca teve fio. É uma arma utilizada exclusivamente para perfurar.

— Mas tem uma bola na ponta!

— Sim. Infelizmente a arma foi inutilizada nos tempos de paz e passou a ser um objeto de valor simbólico e decorativo — explicou Lana simulando alguns golpes enquanto a lâmina fazia uma leve curva para baixo devido ao peso da esfera em sua ponta.

— Então é uma arma inútil! — sentou-se desolada Aline, insatisfeita após ter feito tamanho esforço para pegar um pedaço de metal que para ela tinha pouca serventia.

— Não é bem assim.

— Como não? Você tem uma espada que não corta e que não fura!

— Por enquanto isso será o suficiente.

Diante da situação Aline correu no meio da mata em busca do punhal partido, na sua cabeça aquilo que Lana arremessara era muito mais mortal do que a atual espada retirada de seu local secreto. “Se é que aquilo poderia ser chamado de espada! ” Resmungava a menina em seus pensamentos.

Depois de alguns minutos finalmente Lana guardou a espada em sua bainha, e com o cinto que acompanhava a arma prendeu a sua cintura e caminhou novamente em direção à colina. Quando chegou ao topo ajoelhou-se em frente à cruz e disse em tom sereno:

— Mãe. Lamento que não possa dar um descanso mais digno para a senhora. Fui privado até mesmo das suas cinzas que agora misturadas aos restos de nosso antigo lar seguem com o vento em direção da floresta. — Lana tomou fôlego e continuou com um meio sorriso em sua face. — Talvez seja melhor assim. Eu vou acreditar que livre daquela doença maldita a sua alma descansa aonde quer que esteja, assim as como suas cinzas que vagam tranquilamente em meio a natureza.

Entardecia e Aline insistia em procurar o punhal quebrado sem sucesso algum. Fora o som da mata remexida, ouvia-se ao fundo o vento que soprava com suavidade e ocasionalmente um ou outro pássaro ao longe.

— A senhora sabe que eu estaria ao seu lado agora, mas eu preciso saber, eu preciso encontrar o pai. Se não fosse por isso… ah, tem também a Aline — disse Lana voltando o olhar para sua amiga que estava lá em baixo no meio da mata. — Eu Preciso cuidar dela, embora as vezes eu acredite que é ela quem está cuidando de mim. Sabe, eu acredito que numa tarde de sol a senhora adoraria servir alguns doces e um chá bem gostoso para ela. Tenho certeza que Aline passaria o dia todo nos contando uma porção de histórias que não faço a menor ideia de onde surgem, mas infelizmente isso não vai acontecer… para ser sincera talvez eu não retorne para vê-la, mas eu prometo pela espada de nossa família que agora eu empunho de que eu encontrarei o pai e protegeria a Aline. Eu juro!

Minutos passaram e o entardecer anunciava o fim de mais um dia. Lana descera da colina enquanto Aline sentada num toco de madeira esperava pela amiga. Quando se encontraram Aline levantou-se e enfim disse:

— Vamos?

— Ainda não! Tenho um último assunto para resolver — disse Lana em tom sério apontando com o rosto para a estrada.

Seguindo o olhar da amiga, Aline avistou de longe três vultos caminhando pela trilha. Em sua reação natural ela pegou a amiga pelo braço e gritou:

— Vamos!

— Não! — Lana respirou fundo e olhou nos olhos de sua amiga e completou. — É chegada a hora de conquistarmos o nosso futuro, a nossa liberdade!

E após alguns minutos o capitão e seus dois oficiais chegaram aos restos da casa.



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