Ladrão de Poderes Brasileira

Autor(a): Crowley


Volume 2

Capítulo 79: Familiar

O vento violento batendo contra o seu rosto, os cabelos voando descontroladamente, a armadura tremendo, querendo se desprender do proprietário temporário.

A velocidade de queda só aumentava. Atravessou as nuvens em segundos, os pontos verdes crescendo e a pele do rosto de San sendo pressionada.

A sua mente funcionava a milhão, as ideias vindo em velocidade surpreendentes, e o medo entorpecendo tudo.

Concentrando no seu interior, moveu os pontos do seu cérebro, passando o corpo e ligando temporariamente no coração, utilizando um dos poderes copiado.

Desde os dias iniciais de San na academia, vislumbrou muitos poderes, e adotando o hábito de tentar apertar as mãos das pessoas, copiou uma quantia considerável.

O resultado: Habilidades das mais diversas guardadas, só esperando serem utilizadas, e essa é a hora de uma delas, conhecida por levitação.

Confirmando já estar ligado no coração, San ativou, já esperando a sua velocidade diminuir.  Nos instantes seguintes, o sorriso no seu rosto diminui, até o ponto de desaparecer.

“Por que não tá funcionando?” O desespero tomou conta, arregalando os olhos e os deixando secos. O chão se aproximava, em menos de um minuto iria voltar ao solo, e a velocidade continuava a mesma, até aumentando.

Movendo a essência dentro do seu corpo, fez a levitação mudar, a obrigar a funcionar, e nada. De novo e de novo, implorava para dar certo.

Nessa hora, a sua mente igual um carro em alta velocidade, percebeu o motivo: tinha o poder copiado, a questão, era controlar e ativar corretamente.

Os pelos da nuca de San arrepiaram, espalhando ao corpo inteiro. Já se sentindo experiente em usar seus poderes, achou conseguir usar qualquer copiado, só confiando nos seus instintos e talento natural. Um grande erro.

Fechando os olhos, recordou da vez que viu o poder na primeira vez. Um garoto voando no refeitório, as mãos atrás da cabeça e sorrindo enquanto conversava alegremente.

Repetindo o gesto, esticou-se e sorriu, um nervoso. Circulando a essência, adivinhou ser necessário tranquilidade, um estado livre das preocupações.

Acalmando sua respiração, forçou-se a relaxar, esquecer a sua situação ruim. Na sua mente, uma imagem veio: San mais jovem, o seu melhor amigo loiro ao seu lado, ambos machucados e sentado em um sofá confortável.

Pegando curativos em uma caixa, sua mãe, os cabelos vermelhos presos, segurando panos e cobrindo as crianças, dando um sorriso feliz, gentil.

De olhos fechados, San só deixou a essência circular, e notando a falta do som do vento, abriu os olhos. Galhos verdes cobriam a sua visão, o céu já escuro e o topo das árvores distantes.

Virando o rosto para baixo, a centímetros do chão, tava suspenso no ar, e imediatamente, soltou um suspiro de alívio, permitindo desativar sua levitação e cair gentilmente.

Ao invés de levantar, permaneceu deitado, aproveitando a tranquilidade, sorrindo e deixando a tensão do seu corpo se dissipar.

— Sua amiga provavelmente está em perigo. — A voz de Sacro atingiu seus ouvidos, o alertando.

— Sabe, meu amigo, ter um familiar é uma experiência complexa, e a águia quer um parceiro forte. Eu ir me juntar na luta só tornaria as coisas complicadas. — Desprendeu a fivela do seu peito, soltou o peitoral longe.

***

A floresta ao seu redor já perdeu as cores, sobrando uma escuridão pequena. A respiração de Liz era acelerada, seu rosto mostrava preocupação e os lábios rachados.

Vagando sozinha na floresta, aguardando a oportunidade prometida pelo seu parceiro, havia avistado um ponto subindo no ar, para em segundos, sumir do seu campo de visão.

Curiosa, Liz só caminhou, pensando qual seria a estratégia do seu amigo, até de repente, duas sombras caírem do céu. A principal diferença sendo uma delas reduzindo a velocidade, pousando perto, e a outra caindo descontroladamente.

“Ele não fez isso.” Esse era o único pensamento na sua cabeça. Já passaram dois minutos, e o primeiro instinto de Liz dizia para correr procurar seu companheiro, checar a sua condição, talvez os restos espatifados.

Balançando a cabeça fortemente, negava essa possibilidade. San era muitas coisas, violento, ousado, imprudente, explosivo e esse é só o começo, porém, descuidado frente ao perigo não era.

“A águia deve estar ferida, essa é a minha oportunidade, vou aproveitar bem, e quando nos vermos novamente, vou ter um familiar.” Seguindo em frente, forçou os seus pensamentos a focarem no problema à frente.

Em poucos passos, com as árvores a rodeando e galhos quebrados, a águia mancava. A sua asa queimada, o seu rosto se contorcendo ao move-lá.

— Humano maluco, espero nunca mais o ver. — O monstro resmungava, reclamando baixo.

Respirando fundo, a vampira, com a espada prateada e reta em mãos, observava, já escolhendo sua estratégia. Movendo o pé, pisou em um galho perto, revelando sua posição.

A águia virou o rosto rapidamente, os olhos semicerrados. Liz poderia aproveitar o estado debilitado da fera e desferir um ataque surpresa, possivelmente a derrotando. Contudo, tornaria o monstro seu familiar, e faria provando ser merecedora.

Ambos se encaravam, corpos preparados, e em um movimento, a vampira pisou fortemente na terra, impulsionando-se à frente. Facilmente cortou a distância.

Estendendo a espada, apunhalou o inimigo. A águia pulou para trás e, incapaz de controlar seus movimentos no ar, passou quebrando galhos nas suas costas.

Utilizando das suas capacidades físicas superiores de vampiro, Liz o acompanhou no solo, os seus olhos captando a velocidade e já prevendo a queda, acelerou o passo, e parando de repente, firmou os pés no chão, erguendo a espada a cabeça.

Acertando na trajetória, seu oponente vinha feito um raio, as asas abertas, uma torta, desequilibrando. As garras nas patas a frente, e se chocaram, criando uma explosão ao seu redor, espalhando as folhas.

Com grande esforço, Liz aguentou contra a investida e, um passo à frente, cortou para baixo. Em um impasse, a águia posicionou a parte ferida na frente de si, tomando na asa o ferimento.

Pousando no chão, o monstro grande ergueu uma das suas patas, desferindo um chute na barriga. Liz defendeu habilmente, já atacando novamente, sendo impedida pelas mesmas garras.

Irritada, e vendo uma oportunidade, a águia desferiu uma rajada de ataques, de direções inesperadas. Nunca tendo chegado nessa parte, Liz foi acertada, porém, a armadura a protegeu da maioria dos golpes, só amassando.

A luta tava demorada, e quando defendeu novamente, a águia ao invés de desferir um novo golpe, estendeu a sua cabeça, mordendo a lâmina.

Surpresa, Liz demorou a reagir, e nesse curto espaço de tempo, fazendo força na boca, a águia partiu a espada ao meio, deixando cair no chão e abrindo a boca em um tipo de sorriso animalesco confuso.

Seguindo os seus instintos, recuou. Já tendo previsto isso, a fera pulou em frente, e em um golpe carregado, acertou a barriga da vampira. A força a jogou longe, voando e batendo contra um tronco.

Caindo no chão, sua mente zunia, e recobrando seus instintos, notou sua mão tocando em algo líquido. Girando seu corpo, de barriga pra cima, uma corte grande abaixo do peito, abrindo a placa de metal e revelando o sangue caindo.

Analisando a si própria, soltou um suspiro de alívio. O ferimento foi profundo, mas não ao ponto de suas tripas saírem, e isso era relaxante. Para um vampiro, sua regeneração dava conta disso, só deveria evitar as partes críticas, como o coração ou cabeça.

Apoiando a mão na madeira, levantou, sobrando um rastro de sangue. De onde veio, o monstro a observava, vindo lentamente. Na sua visão, Liz via pontos vermelhos no corpo dele, espalhados na cabeça, peito e nas costas.

Essas eram as fraquezas do seu inimigo, uma das habilidades de Liz revelava isso. Entretanto, deveria evitar especialmente desferir ataques nas fraquezas, senão, poderia talvez matar o seu oponente.

Sua regeneração já auxiliava, e estendendo a mão, um corte no seu dedo trouxe sangue, formando uma espada puramente vermelha, o formato igual à usada momentos atrás.

“Preciso evitar usar meu sangue desnecessariamente, já perdi uma parte e formar uma espada gasta uma boa quantidade. Também devo levar em conta o meu plano.” Desanimada de ter essas preocupações, avistou o monstro, vindo calmamente caminhando.

Respirando fundo, Liz entrou em posição, sabendo ter o tempo contado, e a luta acabaria daqui a pouco. A águia pulou em frente, estendendo a asa boa, utilizando de arma, apontou no pescoço.

Em uma alta velocidade, qualquer coisa pode virar uma arma, e nas mãos de um monstro, isso é fácil. Inclinando o corpo, Liz abaixou seu corpo, e desviando por pouco, fazendo o cabelo voar no seu rosto.

Voltando ao normal, alcançou o monstro e atacou a asa, sendo impedida por uma garra. Só que dessa vez, a espada repelida mudou, voltou a forma líquida e mudou de posição, atravessando as aberturas, apunhalou o peito da fera.

Surpresa, abaixou a cabeça vendo o que aconteceu. Largando a arma, fechou o punho firmemente, desferindo um soco no meio da cara do monstro, a jogando metros a distância.

Os sentidos do monstro tava lento, sua consciência lenta e vacilante. Liz correu em frente, e vendo o estado do seu inimigo, sorriu revelando suas presas.

Abrindo a mão, apertou uma parte do seu anel, revelando uma pequena lâmina. Passando os dedos da sua mão inteira, pequenos cortes surgiram, e deles, o sangue saiu.

Rapidamente, o sangue voou em frente, ao redor da fera, tomou forma, prendendo no seu corpo, virando uma corrente grossa, presas a árvore e chão ao redor.

O rosto de Liz perdeu a cor, se assemelhando a um cadáver de tão pálida. Os movimentos do seu corpo desacelerando e o cansaço vindo, junto a um frio nos seus ossos.

Vendo o que acontecia, a águia forçou seu corpo a sair da situação, no entanto, estava fraca demais, e precisaria de tempo.

Liz abriu uma pequena bolsa no seu cinto, tirando um recipiente de metal amassado. Confirmando estar inteiro e o líquido dentro estar intacto, deu um passo em frente.

A águia resistia, os olhos assustados, incapaz de fugir pela primeira vez. Liz pisou no seu peito, restringindo seus movimentos. Abrindo a boca do maldito, despejou metade do líquido verde.

Fechando a boca à força, a águia foi forçada a engolir. Seus olhos perderam o foco, nublados. Liz, do lado, tomou coragem e tomou o restante do frasco, seus olhos semelhantes à fera.

Ambos não emitiram som algum, mas seus corpos convulsionaram, tremendo e a respiração parando subitamente, para retornar segundos depois.

Nas costas de Liz, queimava, soltando fumaça. A pele descascava, e debaixo, veio uma marca escura, uma tatuagem de asas cobrindo as costas.

Em um susto, abriu os olhos, respirando pesadamente, suava frio. Olhando ao redor, a águia havia sumido, suas correntes já evaporado há tempos.

Prestes a se desesperar, um sinal na sua cabeça veio, e virando, em cima de um galho, a águia esperava, sentada elegantemente, a cabeça erguida orgulhosamente.

O monstro soltou um suspiro cansado, dando uma risada curta.

— É, realmente mostrou seu valor, o seu futuro será interessante. Meu nome é Levante.

Um alívio tomou conta de Liz, caindo de joelho na terra, sorrindo descontroladamente, escondia as lágrimas no seu rosto.

Encostado em um tronco, San vestindo a camisa da escola observava, de forma tranquila e relaxada.

Pretendendo permanecer assim por mais tempo, a vampira virou a cabeça na sua direção instintivamente. Erguendo uma sobrancelha, pensou: “Me sentiu?”

Liz forçou os joelhos a levantar, e um novo tipo de alívio veio, esse era diferente, forte.

— Parabéns, sempre soube. Sabe, vai ser divertido, os dois familiares vão ser amigos. Dá pra testar…

Antes de terminar a frase, Liz veio e o abraçou, rindo e relaxando. Ficando quieto, San só deixou.

Garmir aguardava sentado embaixo de Levante, paciente. Virando a cabeça confuso, recebia as emoções de San. “Isso é bom, faz tempos desde a última vez.”

Nesse ambiente pacífico, não perceberam outro ser os observando, usando da vegetação para cobrir seu corpo grande e peludo. Os olhos amarelos brilhavam na escuridão, e sob a lua crescendo no céu, suprimiu uma vontade de uivar.

Terminado de ver, recuou. Suas garras assustadoramente afiadas deixando uma marca em uma árvore.



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