Ladrão de Poderes Brasileira

Autor(a): Crowley


Volume 2

Capítulo 74: Na Cidade

O som de madeira estalando preenchia a caverna, a luz da fogueira afastava as sombras, permitindo San ver direito. Ambas as garotas ficavam quietas, perdidas em pensamentos, e seu amigo ferido, dormindo profundamente.

Imóvel, San continuou deitado, lembrando do pesadelo. Era normal o de ser agarrado pelas mãos e sufocado, mas o segundo, a máscara em um corpo de sombras e enlouquecendo, era novo.

Forçando sua mente a trabalhar, buscava nas memórias o que aconteceu ao aceitar a sugestão da voz misteriosa, só lembrava de dizer sim e quando piscou os olhos, estava ferido e a essência esgotada.

O nervosismo cresceu, o medo do desconhecido o dominando, a chance de ter seu corpo tomado e simplesmente achar estar dormindo o incomodava imensamente.

Mordendo a língua, mudou seu foco em assuntos diferentes, se prosseguir tentando encontrar uma razão no seu estado atual, iria enlouquecer.

“O lobisomem veio do nada. Até daria para supor que os lobos faziam parte da sua alcateia, entretanto, foram mortos por ele. Procurava algo? Ou só passou e notou o cheiro de possíveis presas? Não, eu senti a sua localização, ia direto em Jason e Bella, como se soubesse onde tavam, é possível?” As perguntas vinham, e as repostas nubladas.

Cansado disso, forçou seu corpo a levantar. Uma dor tomou conta de cada parte, os joelhos tremendo, a cabeça girando, o peito ardendo e dores o cobrindo. Demorando, Liz e Bella o viram, e a vampira serviu de apoio, sentando na frente da fogueira.

Vendo o estado das duas, confirmou estarem bem fisicamente. Bella pressionava os joelhos no rosto, contemplando o fogo, distraída. Liz passava a mão nos cortes já curados do seu braço.

Supondo ser noite, San deu uma olhada rápida ao seu braço, e conteve o espanto no seu rosto. As veias continuavam lá, escuras e grandes.

Na hora, seus pensamentos corriam, imaginando ser um estado permanente, ter o braço corrompido, talvez trazendo consequências desconhecidas.

Para a sua sorte, o relógio, com sua incrível função de criar uma transmissão capaz de somente San ouvir, falou:

— Tranquilo, as veias tão voltando ao normal, só tá demorando.

Escondendo o suspiro de alívio, preferiu responder depois, no momento, falar na direção do relógio seria estranho.

Uma quantia de tempo desconhecida passaram, quietos, o fogo ondulando e aquecendo o grupo, até o silêncio ser quebrado por uma voz debilitada.

— Que expressões são essas, alguém morreu?

Simultaneamente, viraram o rosto a Jason, deitado no chão e revelando um pequeno sorriso, cansado e fraco.

Bella e Liz correram ver sua condição, fazendo perguntas de dores e o seu estado. San só via de longe, sabendo ser inútil ali.

Em minutos, o vampiro foi liberado e colocado perto do fogo, ao lado de San.

— Então, podem me explicar o que aconteceu?

Os olhares foram jogados na ponta, esperando. San escolheu as palavras cuidadosamente, do início ao fim.

— Enquanto estávamos caçando os lobos, uma presença nova surgiu na neblina, matando os nossos alvos. Chutei ser só um predador, fácil de resolver. Errei, e quando percebi, ele ia para os dois.

— Por que um lobisomem estaria aqui? — Bella perguntou primeiro.

— Vai saber, normalmente andam em alcateias, esse caçava sozinho.

Processando a informação, Liz o encarou nos olhos.

— Conseguiu o espantar, sozinho, como?

Já esperando essa pergunta, respondeu preparado.

— Usei a névoa de cobertura e lutamos. Admito, cheguei perto da morte inúmeras vezes, e me machuquei consideravelmente. No entanto, o feri o suficiente.

Enquanto ambos aceitavam a resposta, Liz mantinha a curiosidade.

— O feriu essa quantidade em segundos?

— É, lutei de forma imprudente, só planejando o machucar e paguei os erros.

— Entendo, e o seu braço? Por que tá assim?

Respirando fundo, disse.

— Uma consequência da minha arma bestial, vai passar. — A vendo abrir a boca e já indo perguntar novamente, decidiu mudar o rumo da conversa. — Salvou seu irmão, parabéns, nunca imaginei ser possível utilizar do seu sangue assim.

Paralisada, parou prestes a falar, e Jason a encarou incrédulo.

— Tá brincando, é sério isso Liz?

Desviando a cabeça, concordou.

— Enlouqueceu? Poderia ter morrido! O pai te lembrou tantas vezes de nunca fazer essa idiotice.

Irritada, virou a cabeça e falou:

— Você ia morrer! Eu vi seu peito aberto, o coração batendo e parando. Me desculpe se escolhi me arriscar em salvar meu irmão.

Jason soltou uma rajada de tosse, pesadas e de doer a garganta. Bella correu o ajudar trazendo água. Recuperando, falou:

— Valeu, mas sabe que arriscou a vida deles também.

Erguendo uma sobrancelha, San ficou curioso. “Liz usando do seu sangue salvando Jason poderia por a minha vida em risco?”

— Dá pra explicar? — perguntou notando o rosto de Liz escurecendo.

— Vampiros, quando ficam sem sangue, enlouquecem, viram monstros irracionais, indo atrás do primeiro ser vivo à vista.

Engolindo em seco, San descobriu que brincou com a sorte bastante para um dia só.

— Tanto faz.

Uma voz veio do fundo, e os rostos se viraram para ela, Bella, seus olhos brilhando em determinação.

— Confio em Liz, e me arriscaria novamente para salvar qualquer um aqui.

“Isso é… legal. Eu tava incluído nessa?” Relutante de perguntar, San só ignorou, apreciando o gesto.

Com um silêncio estranho tomando conta do ambiente, San lembrou das brigas com Leo. Depois de fazerem as pazes, o amigo sempre falava algo estranho, quebrando o gelo.

Tendo uma ideia, hesitou, e falou:

— Meu sangue tem um bom sabor?

Jason fez uma cara confusa. Bella, de surpresa. Liz, desviou o rosto. “Fiz certo? Eu dava risada nessas ocasiões.”

Jason juntava as peças, e vendo a reação da irmã e a pergunta do amigo, entendeu. Na hora, riu alto, chegando a doer os ferimentos e quase desprendendo as plantas cobrindo.

— Vamo lá maninha, era bom?

Contendo a vergonha, demorou e relutantemente, disse:

— Impressionantemente, o sabor é incrível.

Jason continuou rindo, e Liz, irritada, foi ao seu lado brigar e cutucar os ferimentos. “Piada entre vampiros?” San fingia uma risada, atraindo Bella e os sons ecoando na caverna.

Acabando essa pequena briga entre irmãos, Bella aproveitou a tranquilidade e falou:

— San, eu troquei seus curativos, aquele pano era horrível. Nisso, procurei ferimentos diversos.

Hesitando, a garota enrolava o dedo no cabelo verde. A amiga vendo isso e igualmente curiosa, falou:

— De onde veio tantas cicatrizes no seu corpo?

Pego de surpresa, pensou em contar uma mentira, contudo, deu de ombros, tanto faz essa informação.

— Na juventude, fazia vários tipos de trabalho. Arriscados e pagando pouco, me ferrei e fiquei perto da morte tantas vezes.

Balançando a cabeça, Liz pretendia perguntar das cicatrizes de balas na barriga, mas Bella falou antes de um assunto diferente:

— E o seu colar? É uma identificação militar, já serviu?

Lembrando de repente, tirou de dentro da sua roupa. Uma identificação preta, incluindo a corrente, feito de duranium, metal extremamente resistente.

Somente os militares de alta patente ganham um assim, devido suas missões perigosas, em caso dos corpos ficarem irreconhecíveis, esse pequeno pedaço de metal os identifica.

— Minha mãe serviu, deixou pra mim depois de morrer. — Seu rosto revelava um sorriso tranquilo.

Encarando o colar, ainda desconhecia esse lado da sua mãe, nunca revelado ou comentado. Mantinha a placa de identificação consigo toda hora, ler as informações gravadas o tranquilizava.

— Tá legal, última pergunta. — Jason falou ao seu lado. — Me diz, essa cicatriz embaixo do seu olho, de onde veio?

Tocando no seu rosto, San sorriu.

— Nos meus dezesseis anos, trabalhando de entregador para o meu chefe Eugene, aconteceu um acidente, e fiquei no meio de um tiroteio.

Os rostos do grupo revelavam surpresos, curiosos da vida agitada do amigo.

— Eu tentei fugir, infelizmente, um tiro atravessou um cara e os estilhaços vieram bem no meu rosto. Demorou bastante até me recuperar, por sorte, só um deixou uma cicatriz.

“Esse é um dos motivos por eu ter parado de trabalhar pro Eugene, arriscado demais.” De repente, tomou conta de estar repetindo os mesmos erros do passado.

Dando de ombros, só aceitou. Sua vingança dependia disso, ficar na academia e arrumar uma oportunidade de finalizar Laurem.

Horas passaram, e finalmente amanheceu. O som de pássaros cantando entrando na caverna e recuperados parcialmente, começariam a voltar.

Levantando, San mancava, uma dor enorme no seu corpo, espalhada em cada parte. Concentrando brevemente, sentiu sua essência, esgotada.

Quanto mais roubava poderes e os absorvia, sua essência aumentava, isso era bom, só na parte de recarregar que demorava bastante.

Antes de partirem, as garotas juntaram galhos na floresta e formaram uma maca improvisada, posicionando Jason em cima, o carregam.

Na entrada da caverna, San deu os parabéns a Bella. Completamente escondido a porta, plantas cresceram e tamparam.

Andando na floresta grande, o sol batia em San, tirando suas forças e obrigando a descansar continuamente. Nessa hora, sentia uma pequena inveja de Jason, deitado e de boas, contando piadas no meio do caminho.

Liz também precisou descansar, a fome crescia, o sangue já tendo sido digerido. San mantinha distância, a sensação foi boa, porém, tinha medo de se viciar nisso, o entorpecimento e sono fácil.

Bella era a melhor, liderando a equipe, carregando os equipamentos e cuidando dos arredores. Na metade do caminho, um som de arbustos se mexendo alertou o grupo.

Parando na hora, Liz sacou a espada e Bella puxou o arco, a uma considerável distância. San, encostado em uma árvore, sorria.

Em segundos, o causador do som, saiu, pulando em uma incrível velocidade. Seu pelo escuro arrepiado, as presas afiadas à mostra e um calor preenchendo o ambiente.

San deu um passo em frente e abandonou sua cabeça.

— Finalmente, tava demorando Garmir.

O grupo relaxou, um novo membro entrou, e completamente descansado e capaz de lutar. O cão do inferno virou a cabeça freneticamente, procurando sinais de perigo.

— A fera que te machucou, está aqui ainda? — Falou mentalmente.

— Qual é, a espantei faz tempo, agora só me ajuda a voltar pra cidade e te dou um pedaço de carne.

Retomando a caminhada, San ficou realmente tentado a subir em cima de Garmir. O cão do inferno já era grande, e sua constituição forte, aguentaria uma carga.

Cada vez mais perto e prestes a tentar, recebeu uma encarada, e recuou. “Deve ter sentido. Outro dia eu tento.”

Em uma hora, retornaram à cidade. Vendo o enorme portão, os carros junto a pessoas entrando ou saindo.

No primeiro passo dentro, o grupo recebeu olhares assustados, e sussurros cresceram, curiosos do perigo enfrentado. Só os ignorando, prosseguiram e caminharam para a academia ou hospital.

Para a sua sorte, um carro veio rapidamente, uma van grande para comportar todos. Abrindo a porta, uma mulher alegou ser dos mercenários, e os convidou dar uma carona.

Se olhando, consideravam. San, com seus pés doendo, disse:

— Finalmente, obrigado.

Abrindo a porta, entrou e sentou no banco macio, finalmente tendo um momento de descanso. O restante vendo isso, seguiram o exemplo e puseram Jason dentro.

A uma velocidade alta, os deixaram na frente do hospital. Quando San ia descer, escutou uma voz vindo da frente:

— Senhor Lunaris, devido a ser um rank C, podemos o tratar na base dos mercenários, será de graça e podemos conversar sobre a missão.

“Isso é mentira, independente do rank, os mercenários não dão tratamento, só são uma organização de distribuição das missões.” Tendo recuperado sua capacidade de raciocinar direito a tempos, leu nas entrelinhas.

“Querem um relatório, sabem de alguma coisa.” Abrindo um sorriso, fingiu ignorância.

— Coisa boa, vamos?

Seus amigos encaravam incrédulos, contudo, San só sorria, e disse que se veriam na academia.

Fechando a porta, o carro voltou a sua movimentação, San e Garmir esperavam. Chegando no local, abriram a porta, e San se viu na frente da base dos mercenários.

Pulando na calçada, quase caiu. Entrando no prédio grande, recebeu olhares de todo lado. Nem era dos seus ferimentos ou o cão do inferno ao lado, e sim por causa dos guardas o seguindo.

Passando uma porta, deu de cara em um corredor longo, repleto de portas de metal. Parando em uma, o orientaram entrar.

Obedecendo, mandou Garmir o esperar e girou a maçaneta, vendo um escritório grande. Uma mesa de madeira no meio, estantes de livros enchendo as paredes, um tapete cinza macio e atrás da mesa, um homem sentado.

Jovem, nos seus vinte e cinco anos. Os cabelos loiros bagunçados, a camisa amarrotada e o olhar afiado caindo sob San.

— Bom dia, sou Lucas, o chefe dos mercenários, e gostaria de fazer umas perguntas.

“De novo isso.” Sentando na cadeira da frente, disse:

— Achei que ia receber um tratamento.

— É claro, e irá, só me responda umas perguntas antes. — Analisava cada parte de San, os machucados e seu estado.

— Vamo logo então, tenho uns assuntos a resolver.

A sessão de perguntas começou, Lucas focava na missão, relatando ter recebido informações de um monstro muito perigoso ter aparecido e sumido.

San respondeu honestamente, revelou do lobisomem e o enfrentou, o afugentando, é claro, escondendo a parte de ter sido dominado por uma máscara.

Tendo acabado, Lucas falou:

— Curioso, sempre tem um problema nas suas missões, na sua última cidade foi igual.

— Azar eu digo.

Lucas tava sério, até demais, e San engoliu em seco.

— Bem, na sua última cidade, depois desses acontecimentos estranhos, uma horda marchou em direção a ela, destruindo-a.

“Tá suspeitando de mim? Qual é, sou completamente inocente, só relatei que a cidade ia ser atacada e realmente, foi um tempo depois.”

— E quanto a esse braço? — Apontou as veias saltando e escuras.

Suprimindo o nervosismo de ser reconhecido, explicou:

— Efeito colateral, sabe como é.

Quieto, Lucas ponderava a veracidade da informação.

— Tô liberado?

— Claro. — Sorriu o dispensando.

Indo embora, Lucas fez uma última pergunta.

— Quase ia me esquecendo. A missão no cemitério, sabe do coveiro? O senhor sumiu.

Escondendo o tremor, respondeu:

— Vai saber, o cara era estranho.

Passando a porta, o mandaram em uma sala separada, onde um médico o esperava.

Tirando o seu equipamento, sob o toque de cura, sentiu sua energia voltar, seu corpo em um estado aceitável, e finalizando, olhou na direção do ferimento do lobisomem.

Arregalando os olhos, gritou:

— Mas que merda é essa?!



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