Volume 1
Capítulo 36: Os Piores Dias Da Vida
Ninhos, lugares onde monstros constroem suas bases, se protegem, caçam e aumentam sua espécie. Ninguém quer entrar em um; até num grupo grande e forte é arriscado.
Se um é achado perto de uma cidade, os mercenários juntam seus melhores membros, os soldados do exército e invadem, porque sabem que, a qualquer hora, podem receber um ataque de volta.
Infelizmente, San e seu time entraram em um, e sua única esperança de fuga é serem os mercenários da cidade notarem o desaparecimento e enviarem pessoas qualificadas.
As horas iniciais se resumiram a um inferno: gritos e mortes a todo lado, sem um minuto de paz. A cada minuto, um Pelostridor passava e pegava uma nova vítima.
Gus propôs uma fuga, abrirem a rocha de algum jeito e mandarem Clay. A habilidade de camuflagem o esconderia e poderia fugir, voltando à cidade, assim alertando a todos.
No início, Clay era contra. Se desse errado, morreria na hora; fizesse um som sequer, morreria. Entretanto, Gus foi firme, praticamente o ordenando a isso, senão…
Os outros membros permaneceram quietos; em uma situação dessas, ajudar o amigo é uma preocupação mínima. Sobre ameaças e pressão, aceitou.
San era capaz de interferir e talvez impedir, apoiar o lado de Clay. No entanto, mesmo odiando-se por pensar assim, se a camuflagem funcionasse, San, o que copiou, conseguiria fugir; só manteve o silêncio.
Ficando no lado da rocha servindo de porta, cheio de rachaduras, arranhões e fissuras, permitindo ter uma breve visão, esperou. Por um bom tempo, só continuou parado, tenso e agitado.
Então aconteceu: um dos monstros apareceu. Empurrando com dificuldade, abriu uma chance de fuga.
Na hora, usou o máximo de velocidade possível e já camuflando ao redor. Porém, faltando apenas o pé, o Pelostridor o agarrou com sua mão peluda e nojenta.
Assustado, demorou a reagir. Ao perceber, desesperou-se e deu chutes no monstro ou o socou. De nada adiantou, e a passagem fechou novamente, o levando pra longe.
Ficaram mais assustados do que já estavam, petrificados. San foi o primeiro a ir em frente e colocar um dos olhos na fissura, vendo o que aconteceria. Os companheiros imitaram a ação.
Os monstros pulavam animados, em um tipo de dança tribal; riam de forma grotesca e salivavam. Quatro se aproximaram de Clay, gritando e debatendo, rasgaram sua roupa, em seguida, asseguraram nos membros, e puxaram.
Os gritos eram enormes, suplicando ajuda. San se considerava difícil de sentir nojo de atos violentos; já viu tanto que achou ser especialista. Mas quando viu os membros separando do corpo, nem ele aguentou; vomitou no chão.
Os parceiros já haviam começado, só adicionando choro. San se forçou a ver, procurando fraquezas ou rotas de fuga.
Apesar disso, Pelostridors eram aleatórios, faziam o que quisessem a hora que quisessem. Mudando o foco, pensou em modos de utilizar seus poderes e fugir. Todas as ideias foram descartadas na hora; seria suicídio com o número de inimigos.
“Posso arrumar uma distração, me camuflar e fugir.” Era uma ideia tentadora, sair desse pesadelo e voltar à sua vida relativamente pacífica. Porém, abandonar seus companheiros o irritava; não queria ser esse tipo de pessoa. “Melhor deixar de lado por enquanto, nem sei se consigo usar a habilidade direito."
Passando horas, acalmaram. A fogueira enorme apagada, os Pelostridors se afastaram a uma área desconhecida e somente luzes fracas das tochas sobraram.
Ouviram passos pesados ecoando. O líder dos monstros caminhou e parou em uma das celas. Ao abri-la facilmente, revelou um grupo de gente vestindo trapos, e somente o medo era visto em seus rostos.
Estendendo a mão, agarrou todos, saindo e rindo, aprofundando-se na caverna.
Já sendo meia-noite, San deixava sua mente acordada, com medo de algo o matar. Contudo, seus olhos obrigavam a fechar, exaustos pelo dia horrível tido. Deixando, adormeceu no canto.
Horas após, acordou com gritos o rodeando. Levantando na hora, o primeiro instinto: pôr as mãos na cintura, tentando sacar a espada, vendo o seu erro. Olhou em volta, acostumado à escuridão.
Gina gritava e o contorcia os braços. Na hora, chegou perto e tampou sua boca. Debatendo-se e esperneando, ninguém o ajudou a conte-lá. Abrindo os olhos, mesmo na escuridão, viu San, acalmando-a um pouco.
Segundos depois, um Pelostridor surgiu, segurando uma tocha e procurando a origem do som, na frente das suas celas, tremeram.
O monstro parou por um momento, cheirando o ar. Sem encontrar o culpado, retornou.
— D-desculpe, tive um pesadelo.
— Quase nos matou, sua vadia! — Gus falou, assegurando-se de sussurrar.
Ela entristeceu ao ponto de chorar de novo. A confortando, San disse:
— Tudo bem, é normal.
Samanta nem se esforçou a falar, sua determinação morreu há tempos e voltou a dormir. San tentou, em vão, seu sono sumiu por conta desse incidente. Indo ao lado de Gina, que também perdeu o sono.
Gus insistia em empurrar a enorme rocha e independente de ter uma força elevada, sempre se movia apenas centímetros, nada para uma rota de fuga.
— Tamo ferrado. — sussurrou Gina a San.
Fracamente, respondeu:
— Pois é, vamos dar um jeito.
— Sabe, era amiga do Clay desde que me tornei uma mercenária. Trabalhamos juntos desde o início. — Sua voz era baixa, e segurava o choro. — Tenho medo de acontecer comigo.
— Gina, vamos sair daqui, vão vir nos ajudar.
— Ah, San. Já to nesse ramo há anos, se vierem, irá demorar. Ou nem vão perceber.
— Com o desaparecimento de tantos de nós, duvido.
— Espero que esteja certo, tenho pessoas a voltar.
Gina voltou a dormir. Sozinho, San andou até Samanta, acordada.
— Ideias?
Demorando a responder, sua voz se tornou rouca e fraca.
— Estamos desarmados, cansados mentalmente e sinceramente, com medo. Por mim, nada.
Relutante, falou:
— Você tá bem?
— Sério? Acabei de perder um amigo. Estamos presos e vamos morrer, me pergunta isso?
— … Foi mal.
Odiando, se aproximou de Gus, empurrando a rocha e suando.
— Progresso?
Ignorando a pergunta, continuou, nem desviando o olhar.
Horas passaram, quando já amanhecia, Pelostridors iam de cela em cela, abrindo uma a uma. Alcançando a deles, jogaram uma cabeça de cavalo decepada.
O grupo se reuniu em volta, pensando no que fazer. Já prevendo o resultado, San falou:
— Acho que essa é a comida.
— Tá brincando né? Come tu. — Gus falou com nojo.
Indo em frente, San sacou a faca da sua bota, sua única arma restante, e cortou pedaços finos de carne. Distribuiu as garotas e guardou de volta.
Dando uma mordida, sentiu vontade de vomitar novamente. O gosto era péssimo, claro, por que carne crua seria gostoso? Comeu, precisava de energia. Nem mastigando direito, engoliu boa parte.
Acabando, Gus falou numa voz de ordem:
— Me dá a faca.
Abaixando os ombros, cansado, respondeu:
— Espero que esteja brincando, porque se pensa que vai os matar com isso, dou os parabéns pela confiança.
— Pelo menos vou tentar, ao invés de esperar aqui a minha morte.
— É a minha última faca, e gosto dela.
— Garoto, não me desafia, tô loco pra bater em alguém.
Suspirando cansado, San falou:
— Gus, é sério, tô cansado de ti, fica se achando aí, dando uma de líder e maioral. Na verdade, é um covarde de merda, odeia ser questionado e se irrita. Então, vai se fode.
— Engraçado, eu também me cansei de ti, um muleque convencido. Fique sabendo, só está vivo…
Antes de terminar, a passagem abriu por um Pelostridor. Entrou a passos pesados e foi ao primeiro visto, Gus.
Já sabendo o que o aguardava, se jogou no monstro, o empurrando até fora da cela. Utilizando dos seus poderes e força, socou inúmeras vezes seu captor. Prestes a matá-lo, outros surgiram, o derrubando e atacando.
Dando um tempo, o agarraram nos ombros e levaram até a fogueira recém-acesa. Arrancando a armadura, jogaram no chão e em ordem, agarraram um membro.
San dessa vez olhou numa curiosidade macabra, perguntando se seriam capazes de quebrar os ossos resistentes.
Puxaram, e ao invés de perder uma parte, só gritou e teve a pele rasgada. Independente da força, tava normal. Irritados, o largaram e se viraram ao líder, que só dava risada.
Pegando o braço de Gus, o levantou e deu uma mordida. Gritando a plenos pulmões, socou o chefe dos monstros, sem dar o mínimo de dano. Soltando-o, analisou o membro, a pele em carne viva e sangue pingando, surpreendeu.
Rindo alto e grunhindo, fez barulhos estranhos saírem da boca, se tornando um tipo de fala.
— Humano duro… Machucar dentes… — Sua voz era como um quadro sendo arranhado, doía os ouvidos.
A centímetros do rosto de Gus, riu de novo e disse:
— … Pode, embora, ir… escolher… Servos, tesouro…
Os parceiros não conseguiam ver, porém, mostraram um lugar cheio de tesouros, armaduras, peças de metal caro, até armas bestiais.
Ouvindo isso, alegraram-se na hora, na esperança de fugir. Ansiosos na possibilidade, chegaram a gritar de alegria.
No entanto, os olhos de Gus brilhavam, ansiando cada item guardado, se imaginando os usando.
— Escolha…
Observando sua cela, abriu um sorriso e foi direto à pilha de tesouros. Equipou uma armadura dourada, um machado bestial, estancou o ferimento do braço e encheu os bolsos de itens valiosos.
Os monstros riam da cena, animados. As garotas gritavam, implorando desesperadamente, mas nada adiantou. Pegou tudo que queria e correu.
O pé na saída, um grito se espalhou, fazendo todos os monstros tirarem os sorrisos, até Gus parou no meio do caminho e virou o rosto.
Em uma fresta da cela, rodeado de escuridão, um par de olhos vermelhos brilhavam furiosamente, olhando diretamente ao humano fugitivo.
— GUS!! Eu juro, quando eu sair daqui, vou te matar. Isso é uma promessa.
Abrindo um sorriso, disse:
— Há! Boa sorte, garoto.
Afastando rapidamente, saiu. Gina chorava alto, Samanta, tentando impedir, se juntou à parceira. San sentou no chão, roendo as unhas, pensando em formas de sair dali. Isso prosseguiu por horas, até um Pelostridor rolar a pedra.
Diferente das outras vezes, onde pegou qualquer um aleatoriamente, encarou os membros, até parar em Gina. Assegurou seu braço e a arrastou até a saída.
Cansado de tanta violência e morte. Levantou e atacou o monstro, acertando um soco no meio do rosto. Aproveitando a surpresa da besta, acertou a barriga e chutou no meio das pernas.
A deixando cair no chão, soltou um grito enorme. Em segundos, quatro vieram. Se comunicando entre si, apontaram a San e Gina. Sorrindo, entraram na cela.
San chutou na barriga do primeiro, partindo no próximo, deu uma cotovelada no nariz. Indo dar um chute no outro, acertou a parede. O lugar era pequeno para brigas.
Apontando o dedo, ia soltar um tiro de energia, acabar tudo.
Antes de disparar, os Pelostridors atacaram, animalescos, golpeando em cada parte e em ângulos variados. Gina tentou ajudar, só pra ser jogada. Até ativou sua habilidade, em vão.
Samanta tinha a habilidade de ajudar San, porém, sentou em um canto, os olhos vazios, parada e murmurando delírios. Havia desistido.
San ia disparar seu poder, no entanto, vários apareceram, somando em oito. Nem entraram, só chutaram e bateram, o espancando no chão.
Esgotou todas as suas forças, e só viu Gina sendo levada. Seu físico se machucou demais, não aguentando, só deixou o cansaço o dominar.
Acordando em um pulo, sentiu dores completamente novas. O rosto machucado e ensanguentado, cortes espalhados, nariz entortado, dores no peito inimagináveis, mal respirando.
Sentando em extrema dificuldade, procurou Samanta no seu canto. Seu corpo jogado no chão e uma faca no peito, a de San. Segurando um grito, perguntou a Sacro:
— O que houve? Quanto tempo fiquei dormindo? Qual o meu estado?
— Após ficar inconsciente, sua colega pegou a faca na bota e se matou. Está inconsciente o dia inteiro; agora já é uma da manhã, e o seu estado está péssimo: clavícula, três costelas perto do pulmão e nariz quebrados, tornozelo bastante ferido. Esses são os piores, recomendo usar a habilidade de regeneração copiada, senão pode desmaiar facilmente, ou pior.
Acenando com a cabeça, ativou o poder de regeneração, lembrando-se de Gina sendo pega. Lentamente, seu peito ficou menos ruim. Doía, e a respiração era fraca, mas puxava ar melhor.
Cansado, San mancou até Samanta e fechou seus olhos, retirou a faca, guardando de volta na bota. Subitamente, a raiva espalhou, cerrando os punhos e derramando sangue no chão. Só de lembrar Gus, o fez querer quebrar tudo.
Estando sozinho, escolheu sair dali. Se virando para a rocha, encheu o peito e gritou, bem alto e com vontade.
Em minutos, um Pelostridor apareceu, abriu uma fresta e avistou o humano irritante. Entrando por completo, ia dar um jeito nele.
Nessa hora, San sacou a faca indo em direção à sua garganta. O monstro desviou facilmente; o machucado no tornozelo deixou-o lento. Sendo empurrado ao chão, riram da sua cara. “Só pode tá brincando, não consigo nem matar isso? Me recuso.”
Querendo se divertir um pouco, o monstro deu um chute em San; aguentando o primeiro, manteve-se deitado. No segundo, deixou de novo, dessa vez, segurou o tornozelo e cravou a faca no calcanhar, o derrubando.
Aproveitando que o impediu de levantar, usou as mãos para se mover e chegou no seu pescoço, o cortando, proibindo de gritar por ajuda.
Furioso, tirou a faca e cravou de novo, fez isso inúmeras vezes, até sua raiva diminuir. Mesmo com a opção de usar o poder, iria guardar essência.
De pé e mancando, foi até a porta da cela e saiu. A qualquer hora poderia vir um segundo. Por nunca experimentar duas habilidades simultaneamente, desativou a regeneração e ativou a camuflagem.
Demorou um tempo, contudo, fez seu corpo mudar conforme o ambiente.
Na fogueira apagada, as bestas dormiam no chão. Mancando longe, achou seu objetivo, a pilha de tesouros. Infelizmente, o chefe das bestas dormia em cima, impossibilitando de pegar grande parte dos itens.
Seus olhos vagaram durante até encontrar o que queria. Indo a passos silenciosos, pegou uma espada curvada e embainhada que conhecia bem; sua cimitarra tava inteira ainda. Pegando, mudou de cor, adaptando.
Por um momento, considerou libertar os outros. O problema era mover a rocha; somente a força comum de um humano seria impossível.
Encarando os monstros dormindo, pensou seriamente em os matar um a um. Entretanto, teve de descartar a ideia; se um acordasse, morreria na hora.
Atrás da saída, percorreu caminhos aleatórios, buracos nas paredes e Pelostridors dormindo. Passando uma saliência da caverna, um arrepio o atingiu, seguido de um som de choro, era muito semelhante ao de um humano.
Indo atrás, entrou em um buraco grande; cerca de doze mulheres jogadas por aí, feridas e mal tinham algo para se cobrir.
Sem entender nada, perguntou a Sacro:
— Por que não fogem? A passagem tá livre.
— Olhe bem. — Sacro respondeu.
Analisando as mulheres, todas continuavam vivas, mas suas barrigas enormes.
— Merda.
Uma sessão de náusea e enjoo o dominou. Saindo dali, encontrou a origem do choro. Gina, jogada em um canto, ferida e sua barriga grande.
“Isso é impossível, faz horas desde a última vez que a vi, deve ser alguém parecido.” Se negando, aproximou-se e viu o rosto. Mesmo ferido, lágrimas caindo e sujeira, era ela.
— Gina?
Tomando um susto, olhou os lados, confusa, perguntou baixo:
— San? É você?
Desativando temporariamente a camuflagem, ela pôde o ver, soltando um sorriso, tentou o abraçar, porém, seu corpo tava cansado demais.
— Que bom que saiu.
— O que aconteceu?
Só de lembrar, começou a chorar. Virando a Sacro, San perguntou:
— Como?
— A raça desses monstros reproduz em uma velocidade extraordinária. Ela deve dar à luz há alguns dias.
Apertando o punho com força, disse:
— Vamos, eu te levo daqui.
Nem tentando, balançou a cabeça.
— San, tem de me matar.
— O quê? Vamos embora!
— Do que adianta? Sair daqui vai ser difícil, e pra piorar, quando eu der à luz, morrerei, eu vi as outras.
— Está certa. — Sacro interrompeu. — No nascimento, rasgam a barriga da mãe, rastejando. É doloroso e demorado.
— Tem que ter uma forma. Por favor, Sacro, eu imploro!
— Me desculpe.
Sua mente pensava em ideias de impedir isso, nem importava de a levar ferida, se arriscaria.
— Precisa me matar, eu não quero que nasça essa coisa. Eu imploro.
Extremamente hesitante, sacou a faca. Nem uma ideia veio em mente, Sacro falava ocasionalmente, o incentivando. A centímetros do seu peito, parou.
— Ela vai sofrer.
— Tenho uma teoria.
— Fala logo.
— Acerte o cérebro, isso talvez a mate imediatamente.
A lâmina apontada na sua cabeça, tentou por um longo tempo, tomando um pouco de coragem e prestes a cravar, ela disse num sorriso:
— Obrigado.
Morreu segundos depois; a teoria estava errada, sentiam dor. O poder dele sempre trazia dor, independentemente do jeito da morte. Suas veias tornaram negras e os olhos inteiramente brancos. San ganhou um poder novo, conseguia o notar.
Se recuperando, virou a cabeça ao redor, todas sofriam. “Espero estar fazendo o certo.”
Em cada uma, as livrou do pesadelo, infelizmente, dando uma última dose de sofrimento.