Infinity World Brasileira

Autor(a): Infinity World


Volume 1

Capítulo 14: Onde a Água Espera

O sol estava alto, derramando luz quente sobre o rio. As pedras submersas reluziam sob a água clara, e pequenos pontos brilhantes se moviam junto à corrente, piscando como se fossem fragmentos de vidro.

O garoto observava as ondas se formando ao redor das rochas maiores, quebrando e se refazendo sem parar. O ar tinha um cheiro de barro úmido misturado ao frescor da água corrente, mas o calor pesava sobre seus ombros. A camisa branca colava nas costas, e um fio de suor escorria pela têmpora até sumir na poeira que manchava seu rosto.

Sentado na beira do barranco, com as pernas balançando sobre a margem, ele segurava a vara de pesca de qualquer jeito. A linha afundava na corrente e se perdia no reflexo do sol, imóvel. Nenhum puxão, nenhuma vibração. A superfície permanecia calma, com apenas o leve balanço da água mexendo a ponta da vara. Parecia que nada, lá no fundo, sequer notava sua presença.

O garoto desviou o olhar do rio e espiou para o lado. O velho estava sentado ao seu lado, vestindo uma capa vermelha gasta nas bordas. O vento leve fazia a barra balançar devagar, mas o resto do corpo dele não se movia. As mãos seguravam firme a vara de pesca, e a postura era ereta.

Tentou enxergar seu rosto, mas a luz do sol batia por trás, deixando tudo embaçado e brilhante demais para distinguir os traços. Só conseguia ver o contorno escuro da cabeça e dos ombros, como se o velho fosse um recorte contra o céu.

O som constante da água correndo se misturava ao canto distante dos pássaros, criando um fundo tão monótono que o garoto sentia as pálpebras pesarem. Ele mexeu o pé na margem, chutando uma pedra para dentro do rio, só para ouvir o ploc da água quebrando. Ainda assim, nada mudava. Soltou um suspiro longo, quase um bocejo, e olhou para o velho com impaciência.

— Vovô, pescar é chato — o tom carregava mais tédio do que reclamação. — Não entendo como ficar parado com um pedaço de corda na água pode me deixar mais forte.

A resposta do velho não veio de imediato. Moveu apenas o canto da boca num sorriso quase imperceptível. Quando falou, sua voz veio lenta, sem pressa de chegar.

— Pessoas são como as correntezas de um rio… Presta atenção.

A vara de pesca foi balançada sem jeito, a ponta batendo na água com descuido. Em seguida, o menino apoiou-a entre os joelhos e cruzou os braços, claramente aborrecido.

— Mas como assim, vô? — perguntou, franzindo a testa.

Sem pressa, o ancião manteve o olhar fixo no rio, ignorando a pergunta do neto por alguns instantes.

— Um rio parece simples: água correndo pra frente. Mas lá dentro… — o velho moveu a mão espalmada pelo ar, afastando os dedos devagar como se abrisse o leito imaginário diante dele — …tem muito mais acontecendo. Na superfície, a água corre rápido, bate nas pedras. Lá embaixo, tem corrente puxando pro lado, redemoinho escondido. Cada parte reage ao que tá ao redor: chuva, vento, pedras, outros rios que se juntam. E o que parece calmo, às vezes, é onde tá a força de verdade.

O menino enrugou o nariz e, distraído, estalou o dedo contra uma formiga que subia pela madeira da vara de pesca, acompanhando o inseto até cair na terra.

— Tá… mas se a gente é igual a um rio, quer dizer que a gente só vai na direção que ele manda? Não tem escolha?

Um sorriso discreto surgiu enquanto ajeitava a linha, deixando-a deslizar com cuidado pela corrente.

— Ser levado não é a mesma coisa que ser derrotado. O rio não escolhe como a gente escolhe… mas ele muda o mundo por onde passa. E nós também podemos — puxou a linha só um pouco, sentindo o leve tremor da corrente. — Não é só empurrar tudo pela frente que te faz forte. É saber onde a corrente ajuda, onde ela atrapalha, e usar isso.

Com um movimento impaciente do pé, o garoto fez rolar uma pedrinha solta até a beira e a lançou na água, onde ela afundou rápido, deixando um círculo pequeno que logo se perdeu na corrente.

— E como pescar vai me ensinar isso?

O velho levantou os olhos, observando o céu claro. Uma nuvem solitária avançava lenta, quebrando o azul limpo, e ele a seguiu em silêncio até que começasse a se desfazer.

— Quando você pesca, aprende a ver o que não aparece. Não é só jogar o anzol com força. É colocar no lugar certo, esperar o peixe estar pronto. É segurar a mão quando o impulso é puxar na hora errada. Uma força que não tá no braço, tá na paciência.

O menino apertou os olhos e piscou várias vezes, a testa franzida, tentando acompanhar as palavras do avô sem ter certeza se realmente as compreendia.

— E se a corrente te levar pra uma cachoeira?

Saiu-lhe um suspiro leve, ainda assim a voz do velho permaneceu tranquila, sem perder a suavidade.

— Aí você nada contra. Tem hora que a gente tem que lutar, abrir caminho. Mas o rio que só se joga contra as pedras se gasta rápido. O que continua é aquele que sabe quando guardar energia, quando mudar o rumo.

Por alguns segundos, os olhos do menino pararam no avô antes de voltarem para a correnteza que passava sem pressa diante deles.

— Então… força é paciência?

— Paciência é parte dela. Outra é prestar atenção nas pequenas mudanças e se adaptar. Também é persistência… como o rio que gasta anos pra furar uma pedra. Você não é só a corrente onde tá agora; suas decisões mexem com o caminho de outras águas.

— Mas eu quero ficar forte logo… não daqui mil anos.

O velho deu uma risada curta.

— Você tá confundindo ser rápido com ser forte. A força que vai te manter inteiro lá na frente não vem de explosões, vem do que você faz todo dia.

Ficou com os olhos presos na água corrente, atento de um jeito novo. Não era mais só o brilho da superfície que via, mas o movimento mais fundo, as sombras que passavam rápidas e o traço do rio que parecia ganhar outro sentido diante dele.

— E se eu quiser mudar o rio todo?

— Aí você começa pequeno. Coloca uma pedra no lugar certo, planta uma árvore na margem. Devagar, o rio muda o caminho. As mudanças de verdade vêm da insistência certa, não de um grito.

Um peixe pequeno saltou adiante, quebrando a superfície por um instante. O garoto seguiu o movimento com os olhos, prendeu o ar e olhou para a ponta da vara. Sentiu um leve puxão. Não mexeu. Esperou mais um. Só então puxou com calma. Um peixinho brilhou ao sol quando saiu da água, debatendo-se.

— Viu, Greg? Não foi força bruta. Foi esperar a hora certa — um sorriso enviesado surgiu no rosto do velho, discreto, mas cheio de significado.

O riso dos dois ainda ecoava leve, misturado ao som da água corrente. O peixe, preso ao anzol, se debatia com força, espirrando gotas para todos os lados. Algumas atingiram o rosto do menino, e por um instante ele apenas riu — mas logo a sensação mudou. Não era frescor. As gotas queimavam como ferro em brasa contra a pele.

Um choque percorreu todo o corpo do garoto, arrancando-lhe o fôlego. A visão se fragmentou, as cores se dissolvendo em borrões que queimavam os olhos. Tentou gritar por ajuda, mas da garganta só saíram fracos gemidos, desesperados. O riso que ainda ecoava na memória morreu no peito, substituído por um aperto sufocante que parecia esmagar os pulmões. Cada músculo ardia, cada osso rangia sob uma pressão esmagadora.

O ambiente perdeu toda a cor, derretendo-se em um vazio absoluto, uma ausência de luz e forma que engolia tudo ao redor. O menino arqueou o corpo, incapaz de agir ou respirar direito, e sentiu a impotência profunda de quem não pode fazer nada além de chorar. Olhou para o avô, buscando um refúgio, uma mão amiga… mas só conseguiu enxergar seu sorriso, cada vez mais distante, desvanecendo-se na imensidão do nada.

No meio da agonia, uma voz cortou o vazio:

— Greg! Acorda!

O som veio como um grito rasgado, cheio de desespero. A escuridão tremeu e, no instante seguinte, uma gota quente deslizou em sua testa. Não era água do rio — era suor.

Greg abriu os olhos com esforço, e a cena diante dele o fez arregalar a visão. Acima, Suu-Yuky segurava com os braços trêmulos uma pilha de pedras e vigas despencadas. O corpo dele estava arqueado, os dentes cerrados de esforço, as veias saltando pelo pescoço. Era a única coisa entre ele e a morte esmagadora.

— Não me deixa sozinho, seu idiota! Faz alguma coisa! — a voz saiu trêmula, carregada de pânico e urgência, quase se desfazendo no ar.

Greg tentou mover o braço, mas uma dor absurda percorreu-lhe cada nervo. O corpo não respondia, pesado como chumbo, rasgado por dentro. O peito queimava. A única coisa que conseguiu soltar foi um gemido fraco, sufocado pelo pó que enchia o ar.

De repente, o chão abaixo deles rangeu, um estalo seco ecoou. Suu-Yuky arregalou os olhos.

— Merda!

Não houve tempo para nada. O piso cedeu num estrondo, e os dois despencaram junto com pedras e vigas, engolidos pelo buraco que se abria.

A queda foi um turbilhão de pó e ferro despedaçado. Greg tentou, em puro instinto, alcançar o coldre preso à cintura, os dedos buscando o revolver de gancho. Mas a dor explodiu de novo, cruel. O braço parou no ar, inútil.

Entre os escombros que despencavam como chuva, Suu-Yuky o alcançou. Num movimento desesperado, envolveu Greg com os braços, prensando-o contra o peito. O corpo dele virou escudo, protegendo a cabeça dele do impacto iminente.

Ao redor era só queda, ruído e escuridão.

A água os engoliu como um abraço pesado, fria e densa. Na queda, fecharam os olhos, sentindo o ar escapar e o corpo ser arrastado para baixo, enquanto os escombros os perseguiam, batendo nas costas e nos ombros com força. O impacto esperado nunca veio.

Suu-Yuky abriu os olhos submerso. A água brilhava suavemente, refletindo fragmentos de luz que escorriam pelas paredes em cascatas, descendo em véus finos que pareciam cristalizar no ar antes de se dissolver novamente.

Ao redor, o espaço se revelava vasto e curvo, com pilares de pedra que surgiam das profundezas. A força e a quietude da água, combinadas com a arquitetura antiga, conferiam à câmara um ar quase sagrado.

Segurando Greg com firmeza, Suu-Yuky nadou com esforço. A água deslizava pelas paredes rochosas em quedas verticais contínuas, caindo em ondas suaves que circulavam pelo espaço, criando remoinhos leves que dificultavam cada braçada. A superfície parecia distante e cada movimento para alcançá-la era um teste de força e resistência.

Finalmente, Suu-Yuky emergiu, arrastando Greg consigo, e encontrou a borda. Apoiado nas pedras lisas e molhadas, respirou fundo, sentindo a água escorrer pelas costas, enquanto mantinha o amigo firme contra o peito.

Suu-Yuky pressionava o peito de Greg com firmeza, chamando seu nome entre respirações curtas.

— Greg! Acorda! — sua voz soava tensa, mas carregada de esperança.

Uma mão se moveu lentamente. Greg abriu os olhos, semicerrados, com um sorriso fraco.

— Estou…. estou acordado... — murmurou, a voz falhando. — Pega... na bolsa...

Ofegante, Suu-Yuky vasculhou rapidamente até encontrar um frasco familiar. O líquido rosa, conhecido e precioso, fez seu coração disparar. Greg havia lhe dado aquilo antes, e agora a lembrança trouxe uma pontada de confiança. Com cuidado, ele ajudou o amigo a beber, sentindo a reação imediata.

O calor começou a se espalhar, os cortes e hematomas fechando pouco a pouco. A dor cedeu, substituída por uma sensação de força devolvida. Greg se apoiou no chão, recuperando o fôlego.

— Droga... precisava mesmo disso agora — resmungou ele, passando a mão pelo rosto, olhando o frasco vazio. — E essa era a última... essas poções são difíceis de conseguir.

— Estamos vivos. Isso é o que importa — Suu-Yuky deu de ombros, tentando sorrir.

Greg olhou para ele, com gratidão misturada à dor.

— Valeu, cara. Mas não precisa se arriscar mais. Eu não fazia ideia de que Donavan tinha esse tipo de poder. O mais sensato agora é recuar, pensar em uma nova abordagem... eu posso tentar sozinho.

Suu-Yuky sacudiu a cabeça, firme.

— Esquece isso. Não há mais volta, e eu não vou te abandonar. A gente passa por isso junto.

Greg respirou fundo, sentindo o ar pesado nos pulmões. Observou cada detalhe do companheiro: os músculos ainda tensos, o cabelo molhado colado à testa, os olhos firmes e determinados. Cada respiração de Suu-Yuky parecia carregar força e urgência, e Greg tentou absorver aquilo, buscando entender o que passava pela cabeça dele naquele instante.

— Tá certo... mas sabe que você não precisava se expor tanto.

— Não é questão de querer ou não. É que agora temos contas a acertar. E a hora de agir é agora. — respondeu Suu-Yuky, com convicção. Em seguida estendeu a mão para Greg, firme e decidida. — Levanta. Vamos nos preparar.

Greg respirou fundo e aceitou a mão estendida. Suu-Yuky segurou firme, apoiando o peso dele enquanto o erguia lentamente. A água escorria ainda das roupas e cabelos de ambos, pingando sobre o chão irregular da câmara, formando pequenas ondas ao redor. Greg se equilibrou com esforço, sentindo o corpo dolorido responder a cada gesto, enquanto Suu-Yuky mantinha firme o olhar, atento a cada passo.

O silêncio pairou na água e nas paredes úmidas, interrompido apenas pelo gotejar constante e pelo eco suave da câmara. Os dois permaneceram assim por alguns instantes, respirando com cuidado, enquanto recuperavam a postura e a consciência da situação ao redor.

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