O Inferno de Pandora Brasileira

Volume 0

Capítulo 2: Segunda Sinfonia

A luz da lua fria brilhava no jardim silencioso de uma mansão enorme. As árvores balançavam e a fonte no meio do jardim criava um som relaxante. Mas, havia um outro som vindo que reverberava através dos corredores, tentando a todo custo sair pelas janelas e lutar contra o silêncio da noite. Era um som suave e agradável que vinha de um instrumento de cordas que estava na sala de jantar da mansão. 

No cômodo, haviam grandes pilares e uma enorme mesa de madeira maciça no centro que estava lotada de membros da elite da região, reunidos em um enorme banquete. 

À frente da grande mesa, havia um pequeno palco e nele, estava um grupo de músicos. Dentre eles, estava uma linda garota de olhos escuros usando um vestido branco com uma cinta banhada a ouro. No seu pescoço, havia  um colar de rubi e ao seu lado, estava uma enorme harpa. 

Essa garota era Pandora. Agora com seus dezessete anos, seu cabelo estava maior e seu corpo mais desenvolvido.  

Então, pôde ser ouvida a primeira badalada do relógio.

Ela estava vestida como uma nobre, mas em seu rosto havia uma máscara feita com barras de ferro, que se assemelhava às focinheira utilizadas pelos cães de guarda, simbolizando e a fazendo lembrar da sua posição social.

Enquanto eles comiam, bebiam e gargalhavam, Pandora dedilhava as cordas de sua harpa e recebia chicotadas de um soldado que era responsável por fazer com que a banda continuasse a fazer uma boa performance. 

— Haha! Isso sim  que é um banquete, Ícaro, meu caro amigo! — gritou um dos nobres que estava embriagado.

— Fico feliz que tenham gostado. Nossas escravas trabalharam bastante para deixar tudo perfeito.

— Sem dúvidas… Mas enfim, como vão os negócios?

— Muito bem, há alguns dias fui me encontrar com o monarca. Consegui uma parceria comercial para poder fabricar armas para o exército — disse Ícaro, gargalhando e tomando mais um copo de vinho. — E como vai a produção na sua vinicultura? 

— Graças aos deuses está indo muito bem. Teremos lucro suficiente para ter fartura e beber o ano inteiro! Hahaha! 

Pandora observava a conversa de longe com uma expressão séria e com um enorme vazio nos seus olhos, mas não parava de dedilhar as cordas da sua harpa nem por um segundo sequer. 

— Soldado, mande-os tocarem uma música mais animada, hoje é dia de comemoração!

— Vocês ouviram! Façam o que o lorde ordenou!

Ao gritar, o soldado chicoteou Pandora, fazendo ela mudar de música. Os outros músicos, vendo ela sendo chicoteada, a acompanharam para não receberem o mesmo tratamento.

Algumas horas se passaram e o banquete finalmente acabou. Os convidados partiram e Pandora finalmente pôde descansar.

Mas quando ela olhou para suas mãos, percebeu que estavam sangrando por causa do atrito com as cordas da harpa durante horas. Ela foi para o seu quarto, entrou no banheiro, tirou suas roupas e a máscara de metal e as colocou em um cesto. Suas costas estavam marcadas pelas chicotadas e sangrando.

Ela estava triste e desanimada. Entrou na banheira, se deitou e apoiou a cabeça na borda. Com o vapor da água quente, uma lágrima solitária caiu silenciosamente dos seus olhos escuros e frios enquanto o azul da água se tornava cada vez mais vermelho.

Porém, mesmo chorando, sua feição ainda era de indiferença, tão vazia como a escuridão da noite.

†

— Bom diaaaa, Senhorita Pandora! 

— Hmm… — resmungou Pandora, enquanto abria os olhos — Já é de manhã?

— Já sim, levanta aí! Precisamos terminar nossas tarefas de hoje para podermos ver as estrelas à noite.

Pandora, que estava deitada, sentou-se na cama e esfregou os olhos. Ao abri-los, viu Júlia, uma garota de quatorze anos de cabelos loiros e olhos castanhos.

Elas dividem o mesmo quarto desde que Júlia foi comprada como escrava há dois anos.

— Mas por que isso de repente?

— Eu ouvi o ricaço estrangeiro dizendo no banquete de ontem que, no calendário da Mesopotâmia, diz que todo ano tem uma chuva de estrelas nessa época! — disse ela, colocando a mão em seu queixo e levantando as sobrancelhas várias vezes. — E segundo ele… Isso vai acontecer hoje à noite.

— Chuva de estrelas? O que é isso?

— Não faço ideia, mas a gente vai ver! — disse Julia, com uma expressão convencida.

Pandora olhou para Júlia como se todas as expectativas que ela criou tivessem ido para o lixo.

— Hmm… — suspirou, com certa melancolia. — Tá bom…

— “Hmmm…Tá bom” — Júlia repetiu em tom de provocação e fazendo careta. — Deixa de desânimo, mulher! Se levanta e troca de roupa, a gente tem muito trabalho pra fazer.

Após ouvir isso, ainda sentada na cama, Pandora virou seu rosto em direção à Júlia, que estava do lado de sua cama e encarou profundamente seus olhos por alguns segundos.

— O que foi? Tem alguma coisa errada com meu rosto?

Pandora continuou calada e a encarando como um felino faz a sua presa, esperando o momento certo para dar o bote. 

— Ei! Pode parar com esse silêncio melancólico? Esse desânimo vai me contaminar também!

Pandora deu um pulo da cama e caiu por cima de Júlia, apertando as suas bochechas. 

Júlia começou a gritar e ao mesmo tempo rir enquanto Pandora continuava a sua sessão de tortura.

— Você tem andado muito rebelde, Tampinha — disse Pandora, enquanto soltava as bochechas dela.

Claramente, o tamanho não era bem o forte de Júlia. Desde que ela e Pandora se tornaram colegas de quarto, ela ganhou este apelido devido a sua baixa estatura da época e mesmo após ela crescer um pouco com o passar do tempo, Pandora continuou a chamando por esse apelido.

Júlia se assustava com a ideia de continuar do mesmo tamanho, mesmo sabendo que ela só era menor por causa da diferença de idade, mas claro, Pandora não perdoava uma oportunidade de irritar aquela que atrapalhava o seu sono profundo todos os dias.

— Já disse pra não me chamar desse jeito! — respondeu Júlia, com a cara emburrada e com as bochechas vermelhas.

Enquanto ouvia os murmúrios da garota, Pandora saiu de cima de Júlia e foi em direção ao seu guarda roupa.

— Nhaa, deixa de ser chata!

— Isso não é justo. Você fica me chamando de Tampinha só porque eu sou mais baixa do que você, mas você se esquece que eu sou três primaveras mais nova que você —  disse Júlia, fazendo uma expressão presunçosa. — Um dia eu vou crescer e ficar bem maior que você!

Pandora pegou o seu uniforme de dentro do armário enquanto tirava o pijama branco que estava vestindo e começou a colocar a peça de roupa.

 — Ah, minha querida, se depender disso, pode começar a aceitar sua altura… Mais do que isso você não cresce! — disse Pandora, enquanto colocava a mão sobre sua boca e a encarava com um olhar provocativo.

 — Vo-Você destruiu minhas esperanças… — respondeu Júlia, colocando as mãos no peito e caindo de joelhos sobre o chão.

 — Ah, não é pra tanto. Pelo menos, eu posso continuar te chamando de Tampinha.

 — E eu já disse pra parar!

Pandora começou a rir.

De repente, a porta do quarto se abriu. Uma garota de cabelos curtos e avermelhados entrou. A garota era aquela que um dia já havia sido filha do antigo vizinho da família de Pandora.

— Vocês duas estão demorando muito! Tô esperando já faz meia hora! — disse Kay

— Bom dia para você também, Senhorita Kay.

Pandora riu de canto, tentando disfarçar enquanto terminava de vestir o seu uniforme.

— Muito engraçadinha você, hein… “Pouca Sombra”?!

— Eiii! —  gritou Júlia. 

— A gente já está indo —  disse Pandora.

— Mas por que demoraram tanto?

— A Pandora não queria acordar, então eu tive que gritar no ouvido dela. 

Kay deu um suspiro.

— Certo, estou esperando vocês no jardim. Mas pelos deuses, não demorem — disse Kay, enquanto colocava a mão em sua testa.

—— Tá ceeertoo! —  Pandora e Júlia gritaram juntas, dando “Tchau” com as mãos.  

Kay saiu do quarto e fechou a porta.

— Ela tá meio estressada hoje, né?

— Pois é… — respondeu Pandora, dando uma breve risada. — Ela deve ter acordado com o pé esquerdo.

— Pelo menos ela acordou com o próprio pé, diferente de você, que foi na base do grito.

Pandora olhou novamente para os olhos de Júlia, franzindo a testa. E novamente como um felino, pulou sobre ela apertando suas bochechas e fazendo cócegas em sua barriga.

†

As duas foram ao jardim e encontraram-se com Kay, que estava voltando do armazém com uma bolsa cheia de ferramentas.

Pandora e Kay ficaram responsáveis por aparar as árvores, enquanto Júlia regava as plantas ao lado da fonte que fica no centro do enorme jardim.

— Todas foram chamadas para limpar a mansão hoje, o que tá acontecendo? Vai ter mais um jantar com os nobres da região?

— Parece que o Heitor está voltando para a mansão. — respondeu Kay.

— Já? Dessa vez foi mais rápido que o normal…

— Ele deve estar trazendo mais escravas. O lorde Icaro mandou as cozinheiras prepararem um banquete para ele, da mesma forma que aconteceu quando a gente chegou…

— Pelo visto, terá mais de nós esse ano… — respondeu Pandora, enquanto suspirava. — Já fazia mais de dois anos que ele não trazia mais ninguém.

Pandora  olhou para Júlia, que estava um pouco distante delas e perguntou:

— Por que será que eles só trazem garotas?

— Acho que é por medo de uma rebelião, por isso eles só trazem garotas traumatizadas… O trauma impede que elas tomem atitudes violentas e as trazem tão novas para que cresçam aqui e se acostumem mais fácil. Igual fizeram com a gente. É sempre a mesma coisa.

— E pra onde vão os homens? Eu lembro de quando nos colocaram na carruagem… Tinha homens e mulheres lá dentro.

— Eles devem ir para a fábrica de armas do Lorde Ícaro. Lá, eles precisam de trabalho pesado. Também devem ter mais soldados do que aqui, para caso precisem conter uma revolução.

— Você acha que não tem como fugir daqui?

— Acho que se alguém tentar fugir, eles irão caçar essa pessoa e sabe-se lá o que irá acontecer com ela. Prefiro não pagar para ver.

Pandora olhou para o rosto de Kay, baixou a cabeça e suspirou.

Nesse mesmo momento, os portões enormes do jardim foram abertos e várias carruagens entram nos terrenos da propriedade. Pandora, Kay e Júlia viram a entrada da enorme escolta de longe.

A escolta de oito carruagens parou ao lado da fonte central do Jardim. Heitor desceu da carruagem que estava na dianteira e foi recebido pelos soldados que faziam a guarda da mansão.

— Precisamos ir! — disse Kay, ao ver a movimentação.

—— Uhum! — Pandora e Júlia responderam, em sincronia, acenando com a cabeça.

Depois de guardar as ferramentas, as mulheres correram para a mansão pelas portas do fundo. Lá dentro, todas as escravas, incluindo Pandora, Kay e Júlia, formaram uma fila ao lado da parede, mantendo uma distância de um metro uma da outra e encarando o centro do corredor.

A arquitetura da mansão exalava elegância, com grandes pilares adornados com detalhes em ouro e velas espalhadas por todos os cômodos. Na entrada do salão principal, haviam duas rotas, uma à direita e outra à esquerda, e uma majestosa escada no centro que conduzia ao andar de cima.

Um silêncio sepulcral se instalou até que foi rompido pelo som da porta do salão sendo aberta pelos soldados para permitir a entrada de Heitor. Ele adentrou seguido por três soldados, cada um conduzindo uma fila de oito garotas acorrentadas, enquanto mais cinco soldados faziam a escolta pelo fundo.

Todas as outras escravas estavam olhando aquela cena com um aperto no peito enquanto a tristeza tomava conta dos seus rostos. Mas, nenhuma delas podia expressar qualquer emoção, caso fizessem, seriam castigadas. Então, um olhar frio e vazio era a única coisa que elas podiam dar para as recém chegadas. Era como um aviso prévio para as deixarem cientes da realidade daquela mansão, mas ao mesmo tempo, funcionava como um lamento... Um ”sinto muito” tão silencioso quanto a morte.

Um homem de cabelos grisalhos e sobrepeso desceu lentamente as escadas, degrau por degrau. Uma pequena garota de cabelos longos e castanhos formando dois rabos de cavalo acompanhava-o ao lado.

— Heitor, meu grande amigo! Seja bem-vindo de volta! —  saudou-o Lorde Ícaro, diante dos olhares atentos de todos, exceto Kay, que evitava encará-los diretamente nos olhos.

— É um prazer te ver de novo, Lorde Ícaro — respondeu Heitor, enquanto ajoelhava-se perante ele.

Todos observavam a cena, mas, com exceção de Kay, todas evitavam olhar fixamente nos olhos dos dois.

Ícaro avaliou as escravas acorrentadas e proferiu:

— Vejo que a missão foi produtiva. Como sempre, você deu o seu melhor. Vamos celebrar seu retorno com um grande banquete. Traga seus melhores soldados com você.

— Sim, senhor! Soldados, levem-nas para seus novos dormitórios. Hoje teremos uma noite de fartura! — gritou Heitor.

Os homens aplaudiram entusiasmados em comemoração ao banquete, enquanto as outras escravas permaneceram em silêncio, incluindo as recém-chegadas que estavam profundamente traumatizadas após terem testemunhado cenas terríveis envolvendo suas famílias. Muitas delas também haviam sido abusadas sexualmente pelos soldados durante a jornada para a mansão, apesar de não terem o aval de Ícaro.

As escravas foram conduzidas para seus novos alojamentos enquanto os soldados se dirigiram à sala de jantar.

†

Depois que os homens se retiraram para o banquete, as escravas que não estavam designadas para servir os soldados foram autorizadas a descansar. Já era tarde da noite e a fadiga era visível em seus rostos exaustos.

Pandora dirigiu-se a seu quarto, mas, ao chegar lá, percebeu que Júlia não estava presente. Ela foi até seu guarda-roupa e retirou o livro que sua mãe havia colocado em sua bolsa no dia em que foram separadas.

Pandora sentou-se em sua cama e leu por alguns minutos. Ao concluir sua leitura diária do livro, recordou-se do convite de Júlia.

Será que ela se esqueceu do nosso compromisso de hoje à noite? 

Após refletir e chegar a conclusão de que isso não era do feitio de Júlia, Pandora saiu procura da garota.

Mais cedo, Júlia foi chamada de última hora para servir Ícaro e os soldados no banquete. 

Ela estava colocando a comida em um prato e o arrumando para deixa-lo com uma apresentação bonita. 

Ao terminar seus afazeres na cozinha, Júlia dirigiu-se à grande mesa onde soldados conversavam e bebiam vinho. Na extremidade da mesa, Ícaro e Heitor estavam sentados lado a lado. Enquanto todos desfrutavam da refeição, Ícaro solicitou às escravas que preparassem um prato especial para ele e Heitor.

Júlia entregou o prato especial para Heitor, enquanto outra escrava serviu à Ícaro.

Eles saborearam a refeição enquanto as horas passavam e a conversa fluía. Quando o banquete chegou ao fim, Júlia foi dispensada e dirigiu-se à sala de dispensa para relaxar e respirar um pouco de ar fresco. Ao sair, foi surpreendida por Heitor, que segurou sua mão.

— Ei! Foi você que me serviu hoje à noite, não foi? — gritou Heitor, enquanto franzia a testa e apertava fortemente o pulso de Júlia.

— Sim, senhor! — respondeu rapidamente Júlia, com um tom de voz apavorado.

— Por que deixou a minha comida salgada? Por acaso queria me matar? 

Heitor apertou ainda mais forte o pulso de Júlia. 

Pandora, que estava procurando por Júlia, passou pelo corredor naquele exato momento, mas ao ver a situação, ela se escondeu e permaneceu observando de longe.

— Não, senhor! — ela respondeu franzindo a testa por causa da dor latejante no seu pulso, enquanto Heitor pressionava  tão forte que evitava a passagem de sangue pelo seu braço, deixando-o com uma coloração roxa e o restante da sua mão dormente. — Me perdoe, eu nunca desejaria algo assim para o senhor.

A garota implorava por perdão incessantemente, até que as lágrimas começaram a rolar pelo seu rosto.

Ele finalmente soltou o pulso dela, mas então, sem aviso prévio, agarrou seus cabelos e bateu sua cabeça na parede três vezes. Júlia perdeu a consciência e seu ferimento na testa começou a sangrar.

— Humpf! Preste mais atenção da próxima vez…

Heitor saiu pelo outro lado do corredor, e Pandora, ao perceber sua partida, correu para socorrer Júlia. Com cuidado, a ergueu nos braços, ainda desacordada e continuou a caminhar.

Nobres desgraçados…

Algumas horas se passaram até que Júlia finalmente recuperou a consciência. O ferimento em sua testa havia estancado, e agora as duas estavam sentadas na sacada do último andar da mansão. Júlia virou-se para o lado e viu Pandora ao seu lado.

— Olha só, acordou, hein.

— O que aconteceu? Por que eu estou aqui?

—  Aquele desgraçado bateu em você… E como você estava tão animada para ver a chuva de estrelas, eu te trouxe até aqui.

Ao se lembrar da chuva de estrelas, ela deu um salto do banco de onde ela estava deitada.

— Ahhh! — gritou Júlia, surpresa. — Já começou?? Não acredito que eu perdi!

— Não se preocupe, ainda não começou… Seja lá o que for — respondeu Pandora, enquanto dava uma risadinha.

— Ufa! Eu não sei o que eu faria com aquele desgraçado se ele tivesse me feito perder isso… Deve ser a coisa mais linda do mundo!

— Você não sabe nem o que é essa tal chuva de estrelas, como pode dizer que é lindo?

— Não sei, mas algo me diz que eu preciso muito ver — Júlia abriu um sorriso singelo e olhou para a imensidão do céu noturno.

— Você gosta mesmo de olhar as estrelas, não é?

— Mais do que qualquer coisa, olhar para o céu me faz perceber que não sou nada diante dessa imensidão... — Júlia suspirou. — Mas, mesmo assim, ainda somos livres para escrever nossa própria história e perseguir nossos sonhos. Pelo menos, é assim que deveria ser, não é?

As duas ficaram em silêncio. Afinal, eram escravas, incapazes de traçar seus próprios caminhos. Ambas sabiam disso, mas nenhuma queria acabar com a esperança da outra. Mas, no fundo, seus corações já haviam aceitado a cruel realidade.

— Mas e você, Pandora? Qual é o seu maior sonho? 

—  M-Meu maior sonho? O meu sonho é p-

Pandora foi interrompida por um brilho enorme rasgando o céu de uma ponta à outra.

Os olhos das duas brilharam de emoção.

E então, o universo desabou sobre a terra. Milhares de estrelas cadentes começaram a riscar o céu noturno. Uma verdadeira e linda chuva de estrelas.

— Começou! —  gritou Júlia.

—  É lindo!

As estrelas cadentes cintilavam como fadas dançando no céu noturno, iluminando a escuridão com seus traços brilhantes. Júlia sentiu um aperto no coração, lembrando de todas as noites que passou olhando para o céu, sonhando com a liberdade. Mas agora, com Pandora ao seu lado, ela se sentia menos sozinha, e o espetáculo celestial parecia ser apenas para elas duas.

Presenciando tal evento após tanto tempo nessa mansão… Uma lágrima de felicidade escapou e escorreu pelo rosto de Júlia.

— Talvez não seja tão ruim assim estar viva — disse Júlia, sorrindo, enquanto seus olhos transbordavam. Era como se uma barragem de lágrimas guardadas há anos, houvesse se rompido. 

— É como se o universo estivesse nos dando uma segunda chance, não é? — disse Pandora, sorrindo para Júlia.

— Sim, parece que estamos recebendo uma mensagem. Que ainda há esperança. Que ainda há algo para nós lá fora — respondeu Júlia, com os olhos fixos no céu.

Pandora chegou mais perto, a abraçou e estendendo o seu dedo mindinho, disse:

— Eu prometo que farei de tudo para realizar seu sonho, tá bom?

Júlia consentiu balançando a cabeça e juntou seu dedo ao dela, firmando a promessa.

Elas ficaram ali, em silêncio, observando a chuva de estrelas cadentes, deixando suas mentes vagarem por sonhos e possibilidades. E pela primeira vez em muito tempo, sentiram-se vivas e cheias de esperança.