Volume 1
Capítulo 68: Ephebos
Taikuri fica mal-humorado pela desconfiança, mas se mantém calmo, ele olha para Winton e diz para o conselheiro:
— Eu entendo a desconfiança de vocês, então vejo que a minha retirada dessa discussão seja melhor para que alinhem melhor os planos e o acordo com o tratado da unificação, pois esse é o assunto principal e a prioridade desse encontro amigável.
Romanze se levanta com Taikuri e caminham até a saída. Antes de saírem, o conselheiro questiona com ar vitorioso:
— Não tem “defesa” para as minhas acusações?
Sem olhar para trás Taikuri responde:
— Minha experiência diz claramente que não importa minha resposta, sua “suspeita” continuará firme contra seres como eu, espero que a suspeita com um item inimigo seja igual, pois, se for, garanto que verificarão a fundo o perigo que “possam” estar correndo.
Os dois saem emburrados e, deixando o castelo, Romanze abraça Taikuri e diz:
— Se acalme, já sabíamos que seria assim, foi até menos irritante do que nós imaginávamos.
— Foi porque saímos de lá antes de piorar. Como eles podem ter tanta suspeita sobre nós? Que passagens secretas são essas que ele falou?
— Não sei...
— Não citamos nada do gênero, eles são loucos!
— Vamos deixar com Winton, ele vai resolver, vai dar tudo certo, lembra-se do grupo da oca?
— Por mim eu teria colocado fogo naquela oca, gentalha de seres humanos.
— Isso faria você ficar mais tranquilo?
— Sim, e relaxado... Você fala como se não tivesse feito nada! Você enfeitiçou a água deles para que todos tivessem diarreia.
— Eles não aceitaram os conselhos do Winton, meu papel aqui é “defendê-lo”.
Taikuri ri e se aproxima de beijar Romanze.
— E eu? Você vai me defender?
— Sempre...
— Você me entendeu...
— Vamos logo para a comunidade gay, lá teremos mais paz e menos olhares hostis.
— Como você sabe que eu ia para lá?
— Somos conectados, sabemos tudo um do outro.
— Que lindo... Você está enfeitiçado? Por que esse charme todo?
— Viu por que não posso ser galanteador como você? Você sempre zomba.
— Desculpa esfarrapada! Pândego! Eu não estou zombando...
— Vamos logo.
Por ter a capacidade de localizar outros Descendentes de Ivo, Romanze e Taikuri acham facilmente uma grande taverna com uma grande concentração deles no estabelecimento, tanto entre clientes quanto funcionários.
— Ephebos?
— Nome peculiar.
Ephebos é uma grande taverna como um grande casarão bem fortificado e bem chamativo, com decoração característica do reino e com alguns traços da Floresta de Pando, entre esses, desenhos das árvores e vasos com flores que são mais comuns em Pando.
O lugar é bem amplo e traz um diferencial para o reino, como mesas comuns e cadeiras, pois a maioria dos lugares e casas usam mesas baixas, para que todos se sentem no chão em cima de uma almofada; mesmo assim as cadeiras de Ephebos são bem confortáveis tendo algumas de balanço, que atraem o público mais velho.
A maioria das tavernas do Grande Continente traz um ambiente desarrumado e com grande foco em bebidas ardentes ou só em comida, Ephebos se diferencia por ser mais limpa, arrumada, bem decorada e possui foco tanto em comida quanto em bebidas, no geral, além de uma variedade de doces que chama muito a atenção dos mais jovens do reino especialmente da grande escola próxima.
Romanze e Taikuri estranham por uma taverna ser uma construção bem fortificada, pois, mesmo sendo de aparência comum e simples, dá para se notar a grossura das portas, paredes e pilastras. Eles também sentem propriedade mágica, uma espécie de proteção muito usada em templos e em fortes de guerra.
— Essa proteção deve ser por eles serem gays.
— Sim, dá para ver ali em um dos lados que eles já foram atacados, imagino que seja o ódio contra os nossos “irmãos”.
— “Irmãos”?
— Sim, o dono desse lugar veio de Pando, é bom que usemos os mesmos termos que os dele para ter mais afinidade.
Romanze olha feio para Taikuri e diz:
— Tome cuidado com essa afinidade.
— Gostei... Romanze está bravo porque mencionei ter afinidade com outro? Espero ser punido por isso...
— “Pândego”!
Os dois entram em Ephebos e logo são bem recebidos pelos empregados, que também são gays; ao sentir que seus clientes são como eles, o atendimento é mais acolhedor.
— Por favor, sejam bem-vindos a Ephebos, vocês estão juntos?
Romanze responde com grosseria, pegando forte na cintura de Taikuri.
— Não dá para ver que estamos juntos?
Taikuri estranha a reação e, para não haver desentendimento, o moço responde:
— Desculpe, é raro ver casais assim pelo reino.
Eles são encaminhados até uma mesa em uma ala mais atrativa no segundo andar, com vista para toda a parte inferior da taverna; ao se sentar, Taikuri comenta:
— Pare de encenar que você é ciumento, você é péssimo em teatro, já esqueceu?
— Não é assim que você gosta que eu seja?
— “Que seja” sim, mas fingir ser? Não! Fica sem graça.
Taikuri percebe um cheiro diferente do resto do reino e, respirando fundo, diz:
— Esse cheiro, parece melhor do que o do castelo.
Romanze demora um pouco para notar, mas percebe uma leve diferença.
— Sim, o perfume... Mas a diferença é pequena.
— Sim, essa fragrância parece mais pura e “floral”.
— Como assim?
— Não sei dizer, mas, tendo ela como referência, agora eu sinto que os aromas do reino em outros lugares são iguais, e só aqui é diferente...
Antes que seja entregue o cardápio, um homem se aproxima dos dois e comenta alegremente.
— Que prazer enorme conhecer novos irmãos, me permita acompanhá-los na refeição?
— E você é?
O homem senta-se à mesa e se apresenta.
— Eu sou Chin Priapos, o dono de Ephebos. Gostaram da decoração? Uni a cultura daqui com a de Pando.
Chin Priapos é um homem, aurem, idade por volta de quarenta anos, pele e olhos claros, cabelos curtos e pretos, estatura média e gordo. Ele usa vestes comuns do reino, como panos longos, confortáveis e de boa qualidade.
Mesmo assim ele não aparenta ser alguém comum, por debaixo dá para se notar que ele usa uma armadura fina com metal e couro. Chin é simpático, atento e com um ar intelectual, falando com boa educação e com bons modos, sempre olha diretamente e articula com o corpo, o que demostra real animação e empatia.
Romanze e Taikuri não são facilmente seduzidos por empatia ou alta classe, eles simpatizam mais com Chin por ele ser gay.
— Ficou boa... Você fez tudo sozinho?
— Não, eu vim e recrutei outros irmãos para fazer esse belo “refúgio”, é sempre bom ter um lugar para se contar em momentos de hostilidade.
— Deve ser complicado ter um lugar assim perto de escola e casas comuns.
— Muitos foram contra no início, mas hoje em dia já toleram melhor.
— “Tolerar”... Nos que deveríamos estar tolerando esses idiotas.
— Por favor, vamos falar só de coisas boas, também tenho aborrecimentos, mas temos que ser superiores e humildes para que haja paz.
— Se você diz...
— Vejo que vieram de Pronuntio, ouvi falar sobre essa bela ilha, vocês pretendem voltar ou a missão de vocês requer mudança?
— Estamos há um bom tempo longe de casa, mas não somos apegados com o lugar, se for necessário mudar, nós mudaremos, até pensamos em ir para Pando.
— É um ótimo lugar, mas, por ver que são especialistas em batalha, peço que continuem sua jornada e missão pelo Grande Continente.
— Por que diz isso?
— Sinto que são dotados de grandes poderes e conhecimentos, isso guardado seria um desperdício, é bom sair e ajudar a “movimentar” mais o mundo.
— Mover para o bem, você diz?
— Sim, sei que vocês estão aqui com um diplomata, e que já passaram por vários lugares, é uma missão importante.
— Está sabendo demais para um dono de taverna.
— Não me entendam mal, mas é uma taverna, o centro de todas as notícias.
— Verdade...
— E por ser de Pando, temos que saber onde estamos e quem se aproxima... Por favor, me contem um pouco dessa viagem de vocês. Encontraram outros de nós?
Chin recomenda comidas típicas da cultura de Edo, oferecendo também bebidas e sobremesas bem generosas. Romanze olha um dos temperos e questiona com amargura:
— Aspergillus?
— Sim, é um ótimo molho do Antigo Mundo.
— Achei bem salgado.
— Temos outros se quiser.
O lugar, por não ser uma típica taverna, traz um ambiente tranquilo e bem exótico, em alguns momentos são tocados instrumentos musicais sem canto e sem ser muito alto, para relaxar.
Romanze até percebe que tem magia no som, mas uma mágica simples e que serve só para relaxamento, Chin percebe o dom deles de detectar e analisar magias com mais facilidade do que outros e comenta.
— Esse encanto é bom para a digestão também, assim os fregueses podem pedir mais.
— Esperto.
Taikuri e Romanze passam a tarde com Chin, conversando sobre Pronuntio, Edo, Pando e os lugares que passaram até chegar ao reino de Edo, é gerada uma boa amizade entre eles, pois Chin também revela mais de si e da sua história.
— Sim, eu escolhi construir a taverna próxima da escola para vigiar. Saber como estão a educação e os ensinamentos da nova geração, além de ser mais fácil de defender se tiver algum ataque.
— Ataque? Esse reino está crescendo muito, acha possível?
— Sim, por isso mesmo eu acho que ele será atacado. O reino está ganhando destaque e, sem nenhuma aliança no Grande Continente, pode ser um alvo fácil.
— Sim, mas você acha possível desafiar alguém que está ficando grande?
— Pelos menores não, mas eu acredito que o... Como vocês chamaram? “Futrespurco”? O Império o terá como inimigo se não se curvar a ele.
— Pelo que você nos contou, a sua experiência em batalhas é grande, por que não se uniu ao reino dessa forma? Ajudaria mais do que fazer uma taverna.
— Sim, eu tentei, mas existe um “receio” por eu ser gay, eles temem que Pando possa usar informações para tomar o reino ou converter sua população.
— Se fosse para ter medo de tudo, então era melhor se manter pequeno.
— Infelizmente nossa fama não é boa, existe muito ódio e desconfiança, precisamos ser cautelosos e provar o contrário do que muitos pensam sobre nós.
— Eu acho isso injusto, inocentes terem que correr para provar que são bons, enquanto isso, grandes inimigos se movem, fazendo o que bem entendem.
— Sim, eu concordo com isso; quando esses inimigos são pegos e seus crimes revelados, ainda somos nós, gays, os culpados... Também acho injusto, mas é a forma que é feita.
— Queríamos ser “bons” assim como você, mas não temos vocação para isso.
— Será? Vocês me parecem ser muitos bons, ainda mais para quem diz que odeia os humanos.
— Odiamos, é uma raça insignificante.
— Vocês dizem da boca para fora, em Pando tinha alguns como vocês, falam que odeiam como proteção do amor ou afeição que têm, pois suas ações não correspondem com o ódio.
— Não fale besteiras, assim iremos detestar os aurem também.
Chin ri e se desculpa.
— Não, não, por favor, minha raça já é pouco vista, imagine se houver rancor em cima dela também?
— Verdade, é raro eu ver aurem...
Depois de falar um pouco sobre as raças mais predominantes no Grande Continente, Chin volta o assunto a Winton.
— Esse diplomata, Winton, ele me parece ser um humano bom, vocês estão aqui o protegendo, já é um bom sinal.
— Por obrigação! Ele é chato e muito ingênuo, é bondoso demais, se doa muito sem necessidade. Logo ele verá que não terá grandes resultados e cairá em depressão ou se aliará a algo ruim.
— Vocês deveriam estar otimistas. Vejam os lugares que vocês já foram com ele, vocês disseram que nem todos os lugares foram receptivos e mesmo assim ele conseguiu reverter asituação.
— Sim, ele tem boa espiritualidade, realmente um bom diplomata.
— Assim eu acredito que seja mais fácil os “ruins” se converterem à causa boa dele, do que o contrário.
— Essa é a ideia do plano... Mas um homem não pode mudar o mundo...
Chin ri meio envergonhado e diz:
— Me desculpe, é que essa frase foi muito usada em Pando, eu mesmo já a usei...
— Então você concorda?
— Não mais... O líder de Pando disse para mim... “Um homem não muda o mundo, mas uma ideia e vontade sim, e um homem é o suficiente para carregá-la e levá-la”.
Taikuri e Romanze sentem a admiração e inspiração que esse líder é para Chin e para Pando, Chin comenta mais alguns pontos, e logo eles decidem ir. Chin fica muito agradecido efala:
— Espero que consigam completar logo a missão de vocês, e, se precisarem de qualquer coisa, podem vir aqui. Ephebos é o refúgio para todas as horas.
— Ficamos gratos pelo dia, Chin.
— Fico feliz de ver mais como nós aqui no reino, e ter boas notícias de que o reino pode ter uma aliança boa, que irá favorecer muitos do Grande Continente.
Taikuri e Romanze veem mais da taverna antes de sair e olham belas armas em exposição, velhos arcos, balestras e adagas. Romanze nota que um arco não parece tão velho e sente magia nele.
— Olhe! Parece ser um item mágico.
— Sim, verdade... Justo, nossos irmãos precisam de algo para se defender.
Eles voltam para a parte dos visitantes, Tokonoma, satisfeitos pelo dia e esquecem a desavença que tiveram no castelo.