Volume 1
Capítulo 64: Joe Roe II
Júlio tem uma intuição dada pela magia, que o conectou aos guardas e aborda:
— Senhor, um momento... Euclásio comentou sobre a “alimentação”, e preciso ver o prisioneiro que sabe mais detalhes disso para dar uma “lição” nele, do jeito que os irmãos Nonuplets gostam.
— Entendi... É na sala dezoito, mas não se divirta sozinho.
— Pode deixar!
“Tive sorte, esses homens são fracos contra encantamentos. Assassinos são normalmente ambidestros, e a mudança de sentidos não é tão efetiva contra eles, e ainda peguei dicas em seus pensamentos.”
Júlio começa a sentir o grande uso de energia e se concentra em se manter estável.
“Magias de danos consomem mais que as comuns, preciso tentar usar aquelas com as quais eu sou mais familiarizado, para não perder muita energia.”
Júlio continua seu caminho, centrado em seu objetivo, sendo cauteloso e torcendo para não ser descoberto. Ainda no caminho da cela dezoito, ele usa seu poder para não ser notado e entrar nela sem ser visto por ninguém.
“Sinto energia nessa cela, é uma das que servem como contenção mágica, isso pode ser sinal de perigo!”
Ao entrar, Júlio é atacado pelo prisioneiro, ele se defende, mas é envolvido pela corrente que prende as mãos do homem que o ataca. Júlio bate no seu agressor, que o joga contra a parede, com raiva.
— Agora mandam um novato para me castigar, acham que fiquei fraco com o tempo?
— Não... Espere...
O homem ataca com socos, mas, por estar fraco e desnutrido, ele perde rápido o disputa com Júlio, que não usa nada agressivo e direciona sua técnica de luta e força para se defender e se soltar. O homem tenta uma investida, mas Júlio pacificamente o para.
— Por favor! Se acalme.
— Malditos imperianos!
Júlio usa magia para tentar acalmar o homem, que estranha.
— É um truque?
O homem se afasta com medo de que Júlio esteja enganando-o. Júlio se aproxima e com magia doa parte de sua energia para o homem.
“A corrente que ele usa é mágica e junto a ela eu senti seus sentimentos e emoções, ele sofre muito além de perdas de entes amados. Meu coração chora com o dele, esse encantamento de percepção, que usei quando iniciei minha investigação, é intenso ao se deparar com alguém com tanta dor no corpo, mente e na alma... Meus sentimentos a sua dor... O homem de mil cicatrizes, Juno Daemon.”
Juno Daemon é um homem, aparentemente humano, negro, velho, alto, com aparência fraca e magra, mas com indícios que foi um homem forte e viril, há várias cicatrizes em todo o seu corpo, tendo maior quantia delas nas costas, ele é careca, de olhos escuros e de presença forte.
Está usando só um calção grande, rasgado e limpo, correntes presas em seus pés e mãos e algumas feridas em seu peito, mostrando que foi torturado recentemente. Juno abaixa a guarda, se senta em sua cama e se espanta ao ver que os olhos de Júlio começam a lacrimejar.
— O que está acontecendo?
Juno identifica a magia benéfica que Júlio está usado para melhorar seu estado físico e mágico, no espanto ele diz.
— Libriano?
Júlio perde a consciência por uns segundos e cai, Juno não o deixa cair no chão, segurando-o, e conclui o raciocínio.
— Não é... Mas por um instante eu acreditei no sonho dos aldeões de que viria um Electi salvar a todos... Quem é você, rapaz?
Ainda se recuperando Júlio responde.
— Joe Roe...
— Você é aliado de Libryans?
Júlio respira fundo e se reanima concentrando em sua energia e o gasto dela, ele se levanta e vai até a porta da cela para verificar se está seguro.
— Sei que é difícil acreditar em um estranho, mas preciso que o senhor seja sincero e me conte tudo que sabe sobre o Império de Cristal...
Juno o interrompe, avançando e batendo em seu rosto.
— Não os chame assim!
Júlio fica sem reação e questiona, sem entender.
— Como? Como assim?
— Com ar de adoração! Não faça isso! Você come regularmente a comida deles?
— Sim...
— Pare com isso imediatamente! Esses vermes usam toxinas e magia para persuadir e seduzir a mente e o coração mortal.
— Por favor, me explique melhor.
— Rapaz, porque você acha que o Império tem tantos seguindo suas vontades e poucos espiões escapando? E todos que escapam só conseguem levar consigo poucas informações... Sim, eles não matam seus espiões, eles os convertem.
Júlio fica chocado e perplexo com a revelação. Consegue então fazer algumas associações e entende melhor o plano do Império. Júlio conclui e entende alguns pontos que já ouviu e dos quais desconfiava em Sodorra.
“Por isso nosso humor mudou desde que chegamos a Sodorra, eu achei que foi por causa da morte de Chay em Mascul... Por isso não há muita burocracia e nem um exército de mestres de poderes recrutando os novatos... Então, quando eles perdem espiões, é no sentido de não conseguirem convertê-los! Agora faz sentido muitos espiões sumirem, traírem suas próprias causas ou... Não! Não pode ser! Espero que Doug e os outros saibam disso, espero que eles consigam escapar desse destino.”
— Tem como reverter?
Juno senta-se novamente em sua cama e responde:
— Não sei dizer ao certo, sei como barrar a evolução dela no corpo... Até onde eu sei, essa arte maligna desperta e aflora o que os mortais têm de pior, quanto menos qualidade do caráter, mais rápido e mais forte esse “poder” age. É assim que muitos largam suas missões e entram fielmente nos objetivos dos imperianos.
— Imperianos?
— Um grupo que conheci os chama assim: “Imperianos” são aqueles sem vontade própria, gados servindo a uma vontade, sem ao menos questionar se querem ou não, ou se aquilo é benéfico ou não.
Júlio se aproxima de Juno e senta-se no chão como forma de respeitá-lo, ficando em uma altura mais baixa que a dele.
— Isso é terrível, essa informação nunca saiu de Sodorra?
— Seu espanto responde isso, meu jovem...
“Não percebi que chamei Império de Cristal no lugar de futrespurco como estou acostumado, deve ser uma forma de irmos aceitando o Império como nosso guia e divindade... Isso me esclarece e abre um alerta a mais.”
— Não se engane, rapaz, essa arte suja não está só na comida, mas na água, roupas e até no ar que se respira, tudo isso para atingir todos os tipos e perfis de guerreiros, assassinos, heróis e até magos.
— Eles não usam isso nos aldeões?
— Não, só nos que servem para guerra direta, os outros já têm medo de agirem contra os imperianos e seguem sem pensar em revidar. O Império não gastaria recursos para manter todos “contentes” em servir e dar seu sangue por eles, ele prefere ver a dor do povo e saber que ele está causando esse impacto. Todos aqui acabam se tornando sádicos ou sanguinolentos em ver não só a dor física, mas também a mental...
Depois de uma breve explicação de como Júlio pode evitar e neutralizar os efeitos da técnica usada pelo Império, ele aproveita a oportunidade para tirar mais dúvidas.
— Por que o senhor achou que eu era de Libryans, ou o Electi de Libra?
— Libryans é o único reino que deixa claro suas intenções, e uma delas é acabar com a tirania do Império, infelizmente, uma guerra entre os dois seria catastrófica e muito arriscada, mesmo assim, eu acredito que tenha alguns integrantes e fiéis a Libryans infiltrados no Império ou esperando oportunidade para atacar.
— O senhor já esteve em Libryans?
— Não, eu vim direto do Antigo Mundo, em resumo: o meu barco foi capturado e todos nós fomos escravizados ou mortos...
— Lamento por isso...
— Inconvenientes do destino que o Império causa... Referente ao “Libriano”, eu ouvi de alguns aldeões aqui que acreditam que um Antigo Electi virá salvar a todos.
— Por que eles acham isso?
— Porque eles dizem que um antigo Electi veio fazer mal ao Grande Continente e a Arbidabliu, assim eles veem que outro virá para salvar.
— Um equilíbrio...
— Isso, mas não acredito muito nisso... Apesar de que faria sentido o Império ter algum poder Electi ao seu lado.
— Talvez “A Relíquia”?
— Não, no pouco tempo que estive aqui, eu vi a elite de Sodorra preocupada em achá-la, e eles suspeitam que Libryans já a possui... Mas eu sinto que o Império está caindo aos poucos...
— Será?
— Mais inimigos e vinganças estão surgindo devida às guerras que o Império travou! As escolhas ruins e imorais que o Império continua seguindo estão fazendo com que suas alianças fiquem enfraquecidas e duvidosas, até que seus próprios integrantes saiam independentes, se tornando outras bandeiras.
— Eu precisava dessa confirmação sobre “A Relíquia”... Isso é uma boa notícia...
— Espero que sim... Outro motivo por que eles me mantêm preso é o que eu sei sobre o Antigo Mundo.
— O Império está querendo avançar para as ilhas do Antigo Mundo?
— Sim! Por isso ele tem que ser detido antes disso. Conte para todos sobre as alas ocultas, onde ele e seus homens sujos e imperianos fazem suas atrocidades e horrores contra outros serem vivos... Existe um templo profanado que estão usando como lar de toda a sua fome doentia, suja e pecaminosa. Você precisa sair daqui e contar para todos os líderes o que você sabe, para que eles se unam e ajam o quanto antes!
Juno fica triste e nervoso ao relembrar de coisas terríveis que ele viu, sentiu e teme que aconteça com a maioria das pessoas do mundo. Júlio usa sua magia para acalmá-lo e volta a conversar mais pausadamente.
— Por favor, senhor, se acalme... Nós vamos nos unir e acabar com todo o mal, não se preocupe!
— Há também alas criadas pelos aldeões para que eles se escondam, mas essas alas não os ajudam a fugir, só a se defenderem de algum ataque ou ocultar aqueles que estejam sendo caçados...
— Um bom plano até...
— O estranho é que esse plano veio de fora, veio de um lugar chamado... Pano. Pando! Isso, “Floresta de Pando”.
Ao ouvir sobre Pando, Júlio fica refletivo.
“Será que o clã de Pando está ajudando os inocentes de Sodorra ou está junto a alguém da aliança?”.
— O senhor tem certeza?
— Não totalmente, mas dizem que sim! Poucos aqui sabem ou falam sobre essa floresta, mas me parece ser um bom lugar...
A exaustão atinge Juno, que se deita em sua cama.
— Eu estou... Cansado... Fraco...
Júlio fica pensativo e reflexivo por uns instantes, mas, antes de concluir seu raciocínio, com tudo que ouviu, ele tem um pressentimento forte de perigo, ele ouve um barulho na porta da cela, mas ao olhar não vê nada de estranho.
“O que foi isso? Os encantos e poderes que estou usando e mantendo ativos estão me alertando de algo... Eu sinto algo poderoso...”.
Júlio fica confuso e logo é surpreendido por Juno, que o ataca. Ele segura em seu pescoço e as correntes que o prendem se soltam magicamente e começam a prender o corpo de Júlio. Para se defender, Júlio usa sua energia para se soltar das correntes e bater em Juno, para que o solte.
— Pare!
“Não entendo... Ele estava fraco! Nada do que eu estou fazendo está surtindo efeito! Como isso é possível?”.
Júlio perde a consciência e volta à lucidez algumas vezes durante um longe tempo, ficando com pouca capacidade mental. Seu raciocínio está fraco, mas, depois de algum tempo, ele identifica tudo como uma armadilha e resolve entrar em transe, fortalecendo seu poder e encantos ativos; rapidamente ele entende.
“Juno não pode estar sendo controlado, esse poder tão rápido e dessa forma não é uma ilusão... Eu estou em uma Orbis Absolute!”
No transe, Júlio consegue anular o ataque e restaura pouco a pouco seu poder mental, até perceber que está mais que minutos nessa disputa; cansado disso, ele direciona seu poder e grita:
— Revele-se! Covarde!
Ao abrir os olhos, Júlio ainda se vê na mesma situação, mas as correntes que o prendem estão apertando, ao ponto se machucá-lo, perto de destruir seu corpo.
“Doug, eu prometi, não vou morrer aqui em Sodorra!”.
Com mais esforço, Júlio solta uma de suas mãos que a qual crava seus dedos na cabeça de Juno, o poder de Júlio passa pelos seus dedos até Juno que aos poucos se transforma em energia pura.
— Liberte-me!
A energia estoura, destruindo tudo na cela sem afetar Júlio, em instantes ele se vê em uma cela vazia e transparente. Ao olhar ao redor, ele vê como se estivesse no espaço fora de Arbidabliu, além dos céus em um lugar caótico, com corpos celestes se colidindo, muita poeira estelar, tempestades cósmicas ao fundo e raios ao longe se concentrando.
— Um mestre de maldição!
Nesse cenário Júlio está em um pequeno cubo transparente, na mão de um homem que usa uma armadura de Guerreiro Caos com cinco chifres em seu elmo.
“Os chifres mostram o nível de poder do Guerreiro Caos e do mestre de poder que está por baixo...”.
Os olhos da armadura brilham, e ele diz com desprezo:
— Um Descendente de Ivo... Nojento!
O Caos balança o cubo, fazendo Júlio bater nas paredes, com magia ele amortece um pouco o dano, mas com o tempo ferimentos graves começam a surgir, e, em uma medida desesperada, ele grita.
— Só isso? O Império frutrespurco não vale o título!
Caos para de sacudir o cubo, aproxima-o perto de seu rosto e diz bravo.
— “Frutrespurco”? Esse é mais um linguajar da sua raça?
— Você é um daqueles imperianos que Juno contou?
Caos aperta seus dedos no cubo, fazendo trincar e diz.
— Sua vida está em minhas mãos, criatura nojenta!
— Sim! Sim... Desculpe-me... Você me pegou, e devo implorar pela minha vida?
— Idiota! Essas vão ser suas últimas palavras?
— Não...
“Obrigado, Soraya, por me ajudar a fazer um feitiço de proteção antigo, mesmo nós não sabendo se ia funcionar ou não, esse é o momento para saber!”.
Fora do Orbis Absolute, uma pintura se torna visível nas costas de Júlio, que diz “Aquele que nasceu de Deus o protege, e o Maligno não o atinge.”, as letras ganham lume dourado fraco, mas, dentro da Orbis, o corpo inteiro de Júlio brilha um dourado forte, deixando Caos surpreso.
— Como ele fez isso?
Caos espreme o cubo, destruindo-o, e chega até Júlio, mas não consegue feri-lo; na raiva ele usa as duas mãos para tentar matá-lo.
— Eu vou matar você!