Volume 4
Capítulo 4: Aqueles que sabem de algo
1
Suponhamos que um dia eu pegue um microfone e diga: "Hoje o dia será ensolarado". Alguém que me ouviu pode pensar: "Acho que o Oreki Houtarou-kun está testando seu microfone". Mas outra pessoa pode pensar: "Oreki Houtarou-kun está afirmando amplamente que hoje será ensolarado". Independentemente da dedução válida, independentemente da dedução que corresponda à verdade, só se pode dizer que é uma questão de sorte. Para aumentar as chances disso, seria necessário reunir o máximo possível de dados detalhados, mas normalmente seria absolutamente impossível esperar que essas informações caíssem em nossas mãos. Além disso, mesmo que se conseguisse coletar dados com detalhes minuciosos, tudo o que se conseguiria seria uma maior possibilidade de coincidência entre a verdade e a teoria, e nada mais.
Era primeiro de novembro. Somente Chitanda e eu estávamos presentes na sala do clube. No outono, depois da aula, era aquele momento em que a ociosidade corre solta, quando não se pensa nas ocorrências perigosas e perturbadoras do mundo, como incêndios criminosos, roubos, notas falsas e assassinatos. Com meu princípio de conservação de energia, o fato de eu falar sem parar e de forma indignada apenas para defender um ponto de vista não é característico de mim e pode ser atribuído à tentativa de Chitanda de me elogiar por meu papel no incidente de Hyouka.
Pelas palavras dela, era como se eu tivesse dentro de mim algum tipo de habilidade especial para deduzir a verdade o tempo todo. Não me importo de ser menosprezado e ridicularizado, mas não posso ignorar o fato de ser muito elogiado. Eu acrescentei.
— Para concluir, não me importo que me chame de sortudo, mas, por favor, pare de me fazer parecer uma pessoa incrível.
Conhecendo minha personalidade extremamente gentil e reticente, Chitanda ficou surpresa com minha rara explosão e seus olhos se arregalaram. Mas, em pouco tempo, ela assentiu e sorriu gentilmente, como se entendesse meus sentimentos.
— Você é tão modesto, Oreki-san!
Não, ela não entendeu nada.
Já se passou quase meio ano desde que entramos na Escola de Ensino Médio Kamiyama. Desde então, a curiosidade de Chitanda encontrou o anormal no cenário cotidiano com apenas um olhar. Certamente é verdade que estive envolvido em ajudar Chitanda a entender as razões por trás dessas anormalidades. Seria mentira dizer que não fiz nada pelo incidente Hyouka e pelo incidente Empress (Incidente do filme). Além disso, sem o conhecimento de Chitanda, fiz um pequeno trabalho nos bastidores do incidente com Juumoji.
Mas seria melhor esclarecer as coisas agora.
— Chitanda, os veteranos disseram algumas palavras sábias.
— O quê eles disseram?
— "A teoria e a pomada aderem a qualquer coisa." É certo que a pomada não adere exatamente em todas as superfícies, mas isso não tem nada a ver com o assunto em questão.
Eu disse seriamente, mas por alguma razão Chitanda elegantemente escondeu a boca com a mão e deu uma risadinha. Ela se virou para mim, pois eu estava um pouco desanimado.
— Oreki-san ocasionalmente diz frases que nunca são usadas.
... É isso mesmo? Eu não tinha notado.
Mas essa não é a questão aqui — eu queria responder, mas Chitanda continuou com um sorriso no rosto.
— Não sei por que você gostaria de usar essa frase, mas... Ah, entendi. Vamos supor que o motivo pelo qual você conseguiu encontrar a verdade tantas vezes não foi talento, mas sorte.
— Mas você não chamaria de talento a capacidade de raciocinar sobre teorias ou a capacidade de aplicar um reboco para preencher a lacuna entre as pistas? Mesmo que uma semente semeada dê frutos devido à sorte, não valeria a pena considerá-la se a semente não tivesse sido semeada em primeiro lugar.
(N/SLAG: Reboco e Pomada têm a mesma pronúncia em japonês.)
Cruzei os braços e gemi. De fato, havia razão por trás de seu argumento.
Mas eu não admitiria a derrota tão facilmente.
— Então, está dizendo que sou especialista em rebocar?
— Isso está errado?
Ao sorriso gentil de Chitanda, respondi com o sorriso mais tranquilo que consegui.
— Sim, às vezes eu mesmo não tenho noção da lógica por trás de minhas teorias.
Minha declaração foi imediatamente contestada.
— Isso porque você não usa o raciocínio comum.
Isso é mais ou menos verdade, mas... Eu me senti um pouco desanimado por ser identificado repetidamente com essa característica.
Mas mantive minha posição com firmeza.
— Então, que tal isso, Chitanda. Pense em algum tipo de situação. Vou provar que não dá para criar uma teoria para qualquer coisa tão facilmente.
Eu nunca desafiei ninguém antes, mas não posso desistir agora, já que minha vida está em jogo. Os grandes olhos de Chitanda se arregalaram ainda mais. Baseado nas minhas observações dela até agora, isso se devia principalmente à sua imensa curiosidade sobre o jogo que eu propus, em vez de por achar a situação engraçada.
— Isso parece divertido! Então... com o que deveríamos começar?
Foi quando seus olhos começaram a vagar, procurando uma pergunta.
O alto-falante fixado no topo do quadro-negro, usado para anúncios em toda a escola, crepitou, ganhando vida. Nossos olhos se voltaram para ele ao mesmo tempo.
Sem qualquer introdução, o anúncio começou.
— Qualquer pessoa que, no dia 31 de outubro, tenha feito compras na Koubundou, em frente à estação, e que saiba de alguma coisa, deve se apresentar imediatamente ao Shibazaki na sala da diretoria.
Ela foi dita um pouco rapidamente. O anúncio foi então interrompido sem hesitação.
Deixamos de olhar para o alto-falante ao mesmo tempo.
— Gostaria de saber do que se trata.
— Não faço ideia.
Eu disse, enquanto percebia que a boca de Chitanda estava começando a se abrir e sua cabeça estava ligeiramente inclinada. Achei que ela parecia feliz com alguma coisa e previ o que ela diria em seguida. Como esperado, ela falou em um tom animado.
— Vamos usar esse anúncio! Por favor, crie uma teoria sobre o que foi esse anúncio de agora!
Hm.
Assenti arrogantemente.
— Tudo bem, aceito seu desafio.
Vou lhe mostrar como sou uma pessoa indigna de confiança!
2
— Vamos anotar para não nos esquecermos.
Assim que terminei minha frase, Chitanda tirou um caderno de sua bolsa. Ela então pegou uma caneta esferográfica projetada para parecer uma caneta-tinteiro e virou o caderno para uma página em branco.
— Qualquer pessoa que, no dia 31 de outubro, tenha feito compras na Koubundou, em frente à estação, e que saiba de alguma coisa, deve se apresentar imediatamente ao Shibazaki na sala da diretoria.
A memória de Chitanda era assustadora. Esse foi provavelmente o anúncio, palavra por palavra. Depois de escrevê-lo com sua caligrafia elegante, que poderia ser usada como modelo de caligrafia, Chitanda pousou a caneta, enquanto eu olhava para o papel e cruzava os braços.
— Primeiro, preciso saber o que tudo significa. Você sabe o que é "Koubundou"?
Chitanda assentiu com a cabeça.
— O anúncio mencionou que fica em frente à estação, mas, para ser mais preciso, fica a uma pequena distância da estação. É uma pequena loja de artigos de papelaria administrada por um casal de idosos e que está lá há muito tempo.
— Você já esteve lá antes?
— Sim, mas apenas uma vez.
Estava pensando em minha própria pergunta e percebi que não tenho ido a uma papelaria recentemente, pois hoje em dia é mais fácil comprar artigos de papelaria em uma livraria ou loja de conveniência. No entanto, ainda haveria lojas especializadas na venda de artigos de papelaria, suponho.
— Ela vende algum material de escritório especial, como pincéis caros ou aquela folha estranha que a Ibara usa para desenhar mangás?
— Esse seria um tom de tela... Mas não, é uma loja muito pequena, portanto não teria produtos tão incomuns. A North Elementary fica próxima, portanto, vende tudo o que um aluno do ensino fundamental precisa.
Entendo.
Olhei novamente para as palavras no caderno.
— O Shibazaki é professor aqui?
Chitanda deu uma risadinha.
— Oreki-san, você sempre foi ruim com nomes? Shibazaki-sensei é o diretor daqui.
Ah, agora me lembro de ter ouvido esse nome na cerimônia de abertura. Havia um diretor quase sem cabelo e outro com uma abundância de cabelos brancos, mas não sei qual deles é o Shibazaki. Bem, acho que isso realmente não importa.
Certo, agora não deve haver mais palavras desconhecidas. "Se eu tenho que fazer, que seja rápido". Eu concordo com essa filosofia de vida ociosa, mas esse é um desafio importante. Preciso colocar um pouco de energia nisso.
Examinei o caderno por mais dez segundos, depois abri a boca lentamente.
— Primeiro…
— Primeiro?
— Sabemos que Shibazaki está tentando chamar um aluno.
Um sorriso forçado se formou no rosto de Chitanda, como se ela estivesse tentando rir de uma piada chata.
— Sim, também consigo entender isso.
Suas palavras pareciam indicar que ela estava tentando ser paciente, por isso justifiquei minha meticulosidade.
— Isso é uma competição. Tenho que ser cuidadoso com isso — eu continuei. — Vamos chamar essa pessoa de "Aluno X".
— Isso parece uma investigação real!
— Neste momento, não sabemos se o Aluno X se refere a um ou vários alunos.
Se vários alunos estivessem sendo chamados, a pessoa que fez o anúncio teria dito "Todos que fizeram compras na Koubundou" ou "Aqueles que fizeram compras na Koubundou", mas esse é um argumento bastante fraco.
Mas minha próxima dedução não pode ser posta em dúvida.
— Shibazaki provavelmente pretende dar orientações educativas ao Aluno X. Em outras palavras, ele vai repreendê-lo por algum motivo.
Ao ouvir isso, Chitanda inclinou a cabeça e olhou fixamente para as palavras no caderno. Depois de um tempo, ela olhou para cima e inclinou a cabeça mais uma vez em dúvida.
— Por que você diz isso?
Respondi com confiança.
— Porque um aluno só será chamado à sala do diretor por algo ruim, com base em minha experiência.
— Oreki-san... você está realmente levando isso a sério?
— Eu não estava tão sério desde que entrei nesta escola. Você pode até dizer que esta é a primeira vez que estou falando tão sério.
Chitanda ficou em silêncio, então acrescentei.
— Além disso, se ele quisesse elogiá-los, não usaria uma frase como "Qualquer pessoa que tenha feito compras na Koubundou e que saiba alguma coisa", que pode se referir a algo bom ou ruim. Ele seria mais direto em relação a isso. Nenhum aluno se sentiria bem sendo chamado dessa forma, inclusive eu. Da forma como ele disse, qualquer pessoa que soubesse de algo poderia ter medo demais para ir.
— Isso parece correto.
Ela concordou, hm. Mas eu estava meio brincando quando disse isso.
Hora de seguir em frente.
Eu perseguia os pensamentos em minha cabeça e os colocava em ordem.
— Ao dizer "Koubundou em frente à estação", isso indica que a Koubundou não é uma loja muito conhecida.
— Bem, você também não sabia disso.
— Sim, mas X deveria conhecer Koubundou. Não há necessidade de dizer intencionalmente a frase "em frente à estação".
No entanto, Chitanda respondeu prontamente.
— Isso se deve ao fato de haver três lojas com o nome Koubundou na cidade de Kamiyama. Além da papelaria em frente à estação, há também uma loja que vende equipamentos para altares budistas perto da área comercial da Escola Kamiyama, bem como uma livraria perto da rodovia.
É assim mesmo.
O que mais, pensei enquanto cruzava os braços, abaixava o queixo e olhava novamente para as palavras. Um som de gemido preencheu o fundo da minha garganta.
Como seria um anúncio normal da escola? Obviamente, ele deveria indicar claramente o nome do aluno que está sendo chamado, mas o que mais está faltando? Enquanto pensava nesse sentido, tive um lampejo de inspiração.
— Seja qual for o motivo pelo qual esse aluno está sendo chamado, é urgente. Shibazaki está com pressa.
Usando uma caneta esferográfica, Chitanda apontou para a palavra "imediatamente" na transcrição.
— Ele disse "imediatamente".
— Não, eles sempre dizem isso quando chamam alguém. Não foi isso que eu quis dizer.
Continuei enquanto Chitanda olhava perplexa.
— Há um formato padrão para anúncios escolares, mas esse foi feito de forma diferente, então sabemos que eles estão com pressa.
— Huh…
— Digamos que você queira me chamar para a sala de aula 1-A. Como você diria isso?
Chitanda pensou um pouco, depois aproximou a mão da boca e limpou a garganta.
— Entendo. Seria algo assim: "Oreki Houtarou-san, da Classe 1-B, por favor, procure Chitanda Eru na Sala de Aula 1-A imediatamente".
— Isso é tudo? Não houve nenhum outro anúncio hoje além do anterior? Tente se lembrar de como eles foram.
Chitanda fechou a boca com força e pensou por um momento. A julgar pela contínua inclinação de sua cabeça, eu esperava que ela demorasse um pouco para entender, então divulguei a resposta, achando que deveria me apressar.
— Eu diria assim: "Chitanda Eru da Classe 1-A, por favor, procure Oreki Houtarou na Sala de Aula 1-B imediatamente."
— Qual a diferença?
— "Repito. Chitanda Eru da sala 1-A, por favor, procure Oreki Houtarou na sala 1-B imediatamente."
Um suspiro escapou da boca de Chitanda.
— Não se trata apenas de anúncios escolares. A maioria dos anúncios desse tipo costuma ser repetida, pois há uma grande chance de não serem percebidos se forem ditos apenas uma vez. No entanto, esse anúncio foi lido apenas uma vez. Como isso difere do formato usual, podemos dizer que eles estão com pressa.
Chitanda acenou com a cabeça, indicando que aceitava totalmente esse raciocínio.
Depois de dizer que o locutor estava com pressa, continuei tendo a estranha sensação de que as peças de xadrez estavam caindo uma após a outra. Em vez de descobrir o que aquela sensação estranha significava, segui o fluxo e continuei com minha dedução.
— E não é uma pressa qualquer. Podemos dizer que se trata de uma emergência
— Como assim?
De repente, percebi que Chitanda e eu estávamos inclinados demais para a frente. Sentindo a proximidade daqueles olhos enormes, recuei e me acomodei.
— Porque esse anúncio foi feito depois da aula.
Chitanda, que estava inclinada para a frente, fez beicinho de insatisfação.
— Não pule as etapas em seu raciocínio.
— Pular! Que toque adorável!
— Oreki-san!
Hmm, isso não deu certo. Chitanda agora estava olhando para mim com os olhos arregalados.
Bem, minha intenção não era exatamente pular o raciocínio. Apenas achei que esqueceria os pontos em que pensei se não apresentasse primeiro a conclusão. De qualquer forma, eu provavelmente deveria prosseguir com a explicação do meu raciocínio em vez de explicar meu padrão de fala. Imitando Chitanda, limpei minha garganta.
— Isso não faz sentido? Independentemente das circunstâncias, é ineficiente fazer um anúncio depois da aula. A Escola Kamiyama tem muitos clubes, mas nem todos os alunos permanecem na escola e dedicam sua energia às atividades dos clubes. Há um número considerável de alunos que vão para casa imediatamente após a escola. Um anúncio normal deve ser feito em um momento em que se presuma que todos os alunos estejam presentes, como no intervalo do almoço, ou antes, e depois do recreio. Mas eles ainda fizeram o anúncio, depois da escola, porque…
Parei de falar e pensei um pouco.
— Primeiramente, o motivo pelo qual o aluno foi chamado ocorreu depois da aula. Além disso, é tão importante que eles não podem esperar até amanhã para fazer isso. Para exagerar, Shibazaki fez o anúncio, apostando na possibilidade de que X ainda não tivesse ido para casa.
Enquanto falava, percebi que minha expressão havia se enrijecido. Chitanda estava sorrindo por estar gostando do jogo, mas seu sorriso havia desaparecido, enquanto seus olhos agora estavam cheios de seriedade.
Chitanda falou com uma voz suave.
— Oreki-san... Isso tem cheiro de quina, não é?
(N/SLAG: A frase "cheira a peixe" em japonês é きな臭い. きな significa quina e 臭い significa fedorento. O erro de Chitanda foi que ela dividiu a frase em duas partes.)
Quina?
— Chitanda, a frase comum é "cheira mal".
— Eh? Não posso dizer que tem cheiro de quina? É a planta da qual a quinina é feita
— O conselho linguístico ficará furioso se você sair por aí misturando frases como essa.
Eu ri disso com uma piada no estilo Satoshi, mas, na verdade, estava pensando o mesmo que Chitanda. Esse jogo parecia estar se encaminhando para uma direção sinistra.
Enquanto pensava sobre isso, surgiu outro ponto estranho.
— Próxima dedução. Shibazaki não quer tornar público o que ele quer falar com X. Não podemos dizer se isso é apenas por enquanto ou se nunca será conhecido publicamente.
— Por que ele não disse o motivo pelo qual X foi chamado?
Essa é certamente uma maneira de ver as coisas. Mas aqui estava uma chance para eu me exibir.
— Isso é verdade, mas há outra maneira de explicar isso com mais clareza.
Como os traços faciais de Chitanda eram mais suaves, ao contrário dos de Ibara, seu olhar não era tão intenso, mas ainda assim com uma força que parecia poder cortar papel. No entanto, joguei água fria em sua empolgação.
— Você não encontrará nada apenas olhando para a palavra. Ou melhor, há algo, embora não pareça.
— Não, eu não entendo.
Acenei para Chitanda, que havia levantado a cabeça
— Shibazaki é o diretor da escola. Haveria um em cada escola de ensino médio do país, mas a orientação educacional seria tarefa do Departamento de Aconselhamento Estudantil, mesmo na Escola Kamiyama.
— Isso é verdade. Morishita-sensei geralmente faz esse tipo de anúncio.
— O Departamento de Orientação ao Aluno teria sua própria sala de aconselhamento, certo?
— Sim, fica no segundo andar do prédio principal
Chitanda seguiu espontaneamente, provavelmente tentando acelerar a discussão. Ao me deixar levar por essa reação, comecei a falar um pouco mais rápido.
— Mas X foi chamado pelo diretor da escola, Shibazaki, para a sala da diretoria. Isso não é um ato que excede sua autoridade? O diretor da escola, que deveria estar encarregado da administração da escola, ignorou o Departamento de Orientação ao Aluno e chamou o aluno para ir diretamente a ele. Isso significa que o problema é grande o suficiente para que eles precisem mantê-lo classificado em um nível administrativo.
Pelo menos, poderia ser. Todo o Departamento de Orientação ao Aluno poderia ter entrado em colapso coletivo devido a uma intoxicação alimentar ou algo do gênero, mas podemos ignorar esses casos especiais. Afinal de contas, se começarmos a considerar que os envolvidos no incidente foram atingidos por coincidências impensáveis ou que tinham um comportamento excêntrico, podemos também declarar que os aliens estão de alguma forma conectados. Seria melhor presumir que todos nesse caso fossem seres humanos normais.
Fechei temporariamente minha boca.
No silêncio que se seguiu, Chitanda acenou com a cabeça algumas vezes, provavelmente refletindo sobre a discussão até então. Depois de um tempo, ela olhou em meus olhos.
Com uma voz abafada, Chitanda murmurou.
— Se assumirmos que sua teoria está correta, isso significaria que X-san está envolvido em algo muito ruim…
— É melhor que você diga isso claramente.
— Então…
Eu assenti.
— A conclusão tirada das outras deduções até agora: X está envolvido em um crime.
3
X está envolvido em um crime.
Ri da improbabilidade de minhas próprias palavras e recuperei a compostura.
É isso mesmo, o que estou fazendo com a Chitanda agora é apenas um jogo. Minha teoria não precisa ser verdadeira e, de qualquer forma, eu não concordei em fazer isso para provar que minhas deduções nem sempre correspondem à realidade? Acho que vou ter cuidado.
Talvez percebendo que minhas emoções haviam se acalmado, Chitanda também parecia estar mais relaxada. Com uma voz calma, ela perguntou.
— Então, que crime seria esse?
Estendi minha mão para impedir Chitanda.
— Espere. Antes disso, tenho uma dedução adicional. Supondo que todas as teorias até agora tenham sido válidas, não há policiais nesta escola, portanto, há uma grande chance de que um funcionário relacionado esteja aqui.
— Uma organização ligada à polícia?
— Há muitos deles, como o Departamento de Investigação Especial da Promotoria Pública Distrital e a Agência Nacional de Impostos. A grande chance de alguém de uma dessas organizações estar aqui se deve a algo que mencionamos anteriormente... Você sabe o que é isso?
O olhar de Chitanda caiu no chão enquanto ela se perguntava sobre isso por um tempo, mas acabou desistindo e balançou a cabeça. Ao ver isso, assenti levemente.
— Acredito que foi quase no final de nossa discussão sobre chamar alguém depois da escola. Não importa como você veja, não é lógico fazer um anúncio depois da escola, quando muitos alunos já foram para casa. Mas mesmo assim eles fizeram o anúncio, então, como mencionado anteriormente, foi porque o motivo do anúncio aconteceu depois da escola.
Descruzei meus braços e apontei para a frase no caderno.
— No entanto, se houve um crime, ele ocorreu no dia 31 de outubro. Bem, o anúncio foi feito hoje, agora mesmo, e às pressas. Isso pode significar que os investigadores acabaram de fazer a solicitação.
— Mas eles também poderiam ter feito a solicitação por telefone.
— Isso pode ser verdade, mas seria seguro assumir que os investigadores querem prender X. Para fazer isso, eles precisariam vir aqui pessoalmente.
— Prender…
Chitanda murmurou com uma expressão ansiosa no rosto. Será que ela acabou de recuperar suas emoções depois de ter se acalmado há alguns momentos? Certamente não seria impossível para Chitanda…
Chitanda perguntou com aquela expressão preocupada.
— Oreki-san, quer dizer que você acha que X-san é responsável pelo crime?
Não consegui entender o propósito dessa pergunta.
— O que você quer dizer com "responsável"?
— Você acha que X-san não é uma vítima ou uma testemunha, mas alguém envolvido com o culpado?
Entendo
Eu respondi imediatamente.
— Isso mesmo.
…….
— Se não for esse o caso, Shibazaki não precisaria ficar tão nervoso. Ele poderia ter feito o anúncio no dia seguinte, quando todos estavam presentes, certo?
Chitanda assentiu com relutância.
Certo, vamos ao ponto crucial do mistério. Assim como nós dois tínhamos olhado para os alto-falantes ao mesmo tempo, olhamos para o caderno em uníssono.
— Então, que crime é esse?
— Que crime exatamente X, que "em 31 de outubro, fez compras na Koubundou em frente à estação e sabe de alguma coisa", cometeu? O que você acha, Chitanda? Alguma coisa vem à mente?
Chitanda colocou o dedo indicador no lábio e respondeu imediatamente.
— Infelizmente, devo dizer que o primeiro que me vem à mente é o furto em loja.
Por quem ou por que ela está se sentindo triste?
— Ou… outra possibilidade é que esse crime foi cometido em um lugar completamente diferente, e os investigadores souberam que alguém que se encaixava na descrição do culpado estava fazendo compras em Koubundou. Com base nesse depoimento, eles vieram aqui para fazer uma busca. Nesse caso, o crime poderia ser... praticamente qualquer coisa.
Hmm, uma teoria bastante interessante, considerando o pouco tempo que ela teve.
Entretanto, balancei a cabeça.
— Além do furto em loja, nenhum dos outros é possível.
— Por que não?
— Se considerarmos sua teoria como verdadeira, os investigadores saberiam as características específicas de X. Com essas informações, seria estranho para Shibazaki chamar alguém que "fez compras na Koubundou e sabe alguma coisa". Como o incidente ocorreu em Koubundou, podemos presumir que X parecia estar fazendo compras…
Ao dizer isso, senti que algo estava fora do lugar.
Ao tentar identificar a origem desse sentimento, fechei a boca de repente. Percebendo meu semblante, Chitanda também esperou em silêncio.
Esse anúncio foi uma mensagem para que o culpado se entregasse? Não, isso não parece certo
— Teoria: Os investigadores não sabem nada sobre X.
— Foi isso que você disse, certo?
— Mas eles acreditam que o X se revelará após o anúncio.
É isso, essa é a parte que está fora do lugar.
Se eu fosse o culpado e ouvisse esse anúncio, estaria pensando da seguinte forma: "Os investigadores ainda não sabem que eu fiz isso! Talvez eu consiga me safar desse jeito!" Eu não apareceria na frente de Shibazaki dizendo que fiz isso.
Que tipo de circunstâncias faria com que o culpado se entregasse depois de ouvir esse anúncio?
Cocei levemente a cabeça. Apoiei o queixo em minhas mãos e olhei para o caderno.
Se alguém sentisse remorso por seu crime, poderia se entregar. Mas, nesse caso, X já teria sido pego. Não haveria necessidade do anúncio de hoje. O que isso significa?
— Hmm……
Um som escapou de minha boca.
— Você pensou em algo?
Não respondi, mas olhei para o meu relógio. Era um produto excepcional com mostrador analógico e digital, além de função de calendário, mas esses tipos de relógios não são raros hoje em dia.
— Entendo.
— O quê?
— Vamos deixar de lado a questão do crime que X cometeu por enquanto. Mas vamos supor que X tenha se arrependido do que fez e tenha se desculpado por isso. Em uma carta.
Chitanda arregalou os olhos diante do súbito salto lógico. Com uma voz elevada, ela perguntou.
— P-Por que você diz isso? Você realmente entendeu isso no anúncio de agora?
Respondi com minha própria pergunta.
— Chitanda, que dia é hoje?
Chitanda foi pega de surpresa, mas não hesitou por muito tempo.
— É primeiro de novembro.
Eu estava ciente de que era primeiro de novembro, tendo acabado de confirmar isso em meu relógio.
Em seguida, apontei para as palavras no caderno.
— Então, ontem não foi 31 de outubro?
Chitanda inclinou a cabeça.
— Sim, é verdade, mas…
— Você não notou? Eu não tinha percebido até agora, mas você não acha isso estranho? Por que Shibazaki não disse "ontem, em Koubundou, em frente à estação"?
Chitanda engasgou de surpresa.
— Agora que você mencionou isso, parece não ser natural.
— Por que ele diria "31 de outubro", em vez de "ontem"? Isso porque ele tinha um roteiro à sua frente que continha as palavras "31 de outubro", e ele simplesmente o leu.
— Agora, e quanto ao roteiro? Por que os investigadores sabiam que X estava envolvido, mas não sabiam nada sobre ele? Por que eles acreditaram que X apareceria se fizessem o anúncio? Em outras palavras, por que eles acham que X se arrepende do que fez?
Respirei fundo e parei por um tempo.
— Porque X escreveu uma carta a Koubundou pedindo desculpas pelo que fez. A carta seria mais ou menos assim: "Sinto muito, mas no dia 31 de outubro, fiz compras em sua loja e cometi um crime". Seria inaceitável que um estudante do ensino médio simplesmente pedisse desculpas, então provavelmente a conversa continuou assim: "Eu pagarei os danos, então, por favor, aceite isso e aquilo".
— Os proprietários da Koubundou levaram essa carta à polícia. A polícia, ou alguma unidade de investigação semelhante, foi até a Escola Kamiyama com a carta. Isso aconteceu há pouco tempo. E então Shibazaki, com pressa, fez o anúncio enquanto lia a carta. Ao olhar o texto, ele disse: "Em 31 de outubro, fiz compras na Koubundou, em frente à estação, e sei lá o quê"...
— Espere um pouco!
Uma voz aguda se manifestou.
— De acordo com sua teoria, X-san queria se desculpar com Koubundou, mas não queria envolver a polícia, se possível, certo?
Dar a carta de desculpas não era apenas para demonstrar remorso, mas também para resolver as coisas com calma. Eu assenti.
— Se fosse esse o caso, eles não teriam admitido que eram alunos da Kamiyama High School em sua carta. Se fosse esse o caso, eles não teriam admitido que eram alunos da Escola de Ensino Médio Kamiyama em sua carta. É estranho que a polícia saiba disso. Por outro lado, se não souberem, teriam que solicitar anúncios de todas as escolas de ensino médio da cidade de Kamiyama, e Shibazaki-sensei não teria sido tão apressado em seu anúncio. Se houver a possibilidade de X estar em outra escola, ele se sentirá mais à vontade.
Estou vendo. Ela foi muito perspicaz. Fiquei pensando por um tempo.
— A polícia provavelmente perguntou aos proprietários da Koubundou se eles tinham alguma ideia de quem havia feito isso. Os proprietários responderam que provavelmente se tratava de um estudante da Escola Kamiyama.
— Mas como eles sabiam?
— Seria óbvio se X estivesse usando seu uniforme. Além disso, como hoje em dia é possível comprar artigos de papelaria em lojas de conveniência, não acho que haveria uma grande multidão de pessoas em Koubundou. Ainda, se X tivesse feito algo chamativo na hora, os proprietários naturalmente se lembrariam disso.
— Alguma coisa chamativa?
Fechei minha boca.
Essa parte pode ser a chave para descobrir exatamente qual crime X cometeu. Para organizar meu pensamento, falei em voz alta.
— X fez algo para se destacar. Mas isso, por si só, não foi um crime. Ele então cometeu um crime. Mas foi algo que os proprietários não teriam notado imediatamente se não fosse pela carta. X se arrependeu do que fez. Foi um crime deplorável. E o que eles fizeram foi suficiente para chamar a atenção dos investigadores. O crime que X cometeu foi…
Olhei de relance para Chitanda. Sua garganta branca se movia enquanto ela engolia com apreensão.
Eu falei.
— O crime foi em uma escala maior do que um pequeno furto.
— E isso é?
É hora de continuar.
Desviei o olhar da garganta de Chitanda e olhei para a parte do bilhete que dizia: "Qualquer pessoa que, em 31 de outubro, tenha feito compras na Koubundou em frente à estação e saiba de alguma coisa".
X estava comprando algo. Isso já foi estabelecido.
Ao mesmo tempo, ele estava fazendo algo chamativo e também estava cometendo um crime.
A Koubundou vende equipamentos para alunos do ensino fundamental, portanto, eles provavelmente não têm nada de valor.
Isso me lembra que os jornais estavam repletos de notícias perturbadoras de crimes, como de costume. Houve incêndios criminosos, roubos, assassinatos e…
Suspirei profundamente.
— Sério...
— Sério?
Um estudante do ensino médio entrou na loja que vende artigos de papelaria para alunos do ensino fundamental em seu tempo livre. Ele colocou um item barato no balcão com certa hesitação e tirou uma nota de 10.000 ienes, chamando assim a atenção para si.
— X usou uma nota falsa de 10.000 ienes para pagar suas mercadorias.
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— Mas!
Chitanda, que havia ficado em silêncio e não se mexeu nem um centímetro depois de minhas palavras, de repente falou. Ela então começou a falar sem parar, pois seu feitiço de silêncio havia sido quebrado com aquela única palavra.
— Mas, mas mas isso é impossível! Não é realista! Não tem lógica! Isso é um fracasso! Uma catástrofe!
Vendo o vigor extremo de Chitanda e sentindo que ela poderia pular de seu assento e me estrangular, recuei minha cadeira e me afastei.
Parei Chitanda com um gesto de mão, enquanto pensava que isso provavelmente era semelhante a acalmar um touro violento.
— Ch-Chitanda, por favor, acalme-se. Ah, é isso mesmo! Acabei de me lembrar! Isso é apenas um jogo, certo? Você não conseguirá nada com isso se for tão séria.
— Mas é impossível!
Hmm. Ela usou a palavra "impossível", em vez de "inacreditável"?
Eu estreitei meus olhos e perguntei a Chitanda.
— O que você quer dizer com impossível?
Chitanda tinha as duas mãos sobre a mesa e estava inclinada sobre ela, mas voltou à sua posição original e tossiu levemente, como se estivesse envergonhada por suas próprias ações. Ela fez sua expressão habitual e falou.
— As notas falsas que foram usadas são de 10.000 ienes. Você concluiu que X-san usou uma nota de 10.000 ienes com base nessa notícia, certo?
Eu assenti.
— Mas não há como X-san, um estudante do ensino médio, colocar as mãos em uma! Ou, mesmo que tivessem, deveriam poder trocá-la!
— Como assim?
Na verdade, isso foi muito lento da minha parte. Não tenho ideia de por que fiz essa pergunta a Chitanda. O rosto de Chitanda mostrou um lampejo de irritação, mas ela continuou.
— Como X-san, um estudante do ensino médio que não vende nada, conseguiu a nota falsa?
Respondi sem pensar muito.
— De um caixa eletrônico, suponho.
— Não é fácil falsificar notas suficientemente boas para enganar um caixa eletrônico ou um banco! E se eles fossem tão boas, seria incomum que X-san percebesse.
— Talvez ele o tenha recebido como troco?
Depois de dizer isso, fechei a boca, surpreso com minha própria estupidez. Tive a sorte de a Ibara não estar aqui. Quem sabe as coisas ruins que ela diria sobre mim? Como Chitanda não era Ibara, ela olhou para mim e sorriu em vez de me criticar.
— Exatamente. Parece que você percebeu. Uma nota de 10.000 ienes não pode ser dada como troco. Além da moeda comemorativa, a nota de 10.000 ienes é a maior nota do nosso país.
Finalmente entendi por que fiz essa pergunta a Chitanda.
Como X conseguiu essa nota falsa para poder usá-la? Uma nota falsa é aquela produzida por uma fonte não licenciada e feita para ser usada em lojas. Quando isso acontece, o dinheiro não deve ser entregue aos clientes e, mesmo que seja passado entre as lojas, ele acabará indo para o banco. É aí que ele para.
Com as sobrancelhas franzidas, assenti com a cabeça em alguns graus.
— Bem, entendo o que você está tentando dizer. Mesmo que o pai de X tivesse um negócio, recebesse uma nota falsa e a desse a X como mesada…
Satisfeita, Chitanda assentiu.
— X-san teria contado ao pai dele. Ele teria pedido ao pai para trocar a nota.
A Escola Kamiyama proíbe que seus alunos trabalhem em meio período, mas mesmo que X o fizesse, isso não mudaria nada. Se X recebeu o pagamento por meio de transferência bancária, não há possibilidade de eles sequer tocarem na nota falsa. Por outro lado, se X recebeu o dinheiro fisicamente, ele deveria ter podido solicitar uma troca, já que o empregador não é excessivamente injusto. Assim como a possibilidade de o Departamento de Orientação ao Aluno entrar em colapso coletivo devido a uma intoxicação alimentar, eu realmente não considerei o caso de o empregador ou o pai de X ser tão cruel a ponto de rejeitar essa solicitação, porque isso seria muito absurdo.
Então, agora…
— Talvez eles tenham pegado?
— Pegado? Você quer dizer que a nota falsa foi deixada na estrada?
— Os falsificadores podem ter se desfeito dela para se livrar das evidências, por exemplo.
Era uma teoria bastante absurda, mas apenas em sua base, e eu não me importava muito com isso.
No entanto, Chitanda balançou a cabeça.
— Isso também seria improvável.
Eu estava prestes a perguntar por que, quando percebi algo estranho.
Supondo que X tenha ido à escola nos dois dias, ele teria entregue o bilhete a Koubundou em algum momento entre o final do dia letivo de ontem e o início das aulas de hoje. Mesmo que ele não tenha feito isso, o prazo para a entrega do bilhete seria de ontem de manhã até o anúncio de hoje. O tempo necessário para ambos os casos é muito curto.
X se sentiu culpado enquanto usava a nota falsa. Caso contrário, ele provavelmente não teria se arrependido de seu crime e pedido desculpas tão rapidamente. Certamente não seria possível para alguém que usa uma nota falsa que acabou de pegar de um casal de idosos para ganhar alguns trocados.
— Hmm. O método de obter a nota, hm…
— Se você não descobrir isso, toda a sua teoria será como uma torre construída sobre a areia.
— Ei, você mencionou que eu digo frases raramente usadas, mas você não é igual?
Mesmo rindo disso, tenho que apreciar o foco de Chitanda. Pode ser algo pequeno, mas, como dizem, um pequeno vazamento pode afundar um grande navio. Como X conseguiu a nota falsa e por que precisou usá-la?
Ou a teoria que construí está completamente errada, como Chitanda está dizendo?
Um murmúrio escapou de meus lábios.
— 10.000 ienes, né.
Definitivamente, essa não é uma quantia tão grande de dinheiro que as pessoas sonhariam com ela. Mas, por outro lado, também é uma quantia que alguém se arrependeria de perder.
... Entendo. É uma quantia da qual só se abriria mão com dolorosa relutância. Cruzei meus braços.
— Chitanda, você gosta de dinheiro?
Chitanda ficou um pouco confusa com a pergunta, mas mesmo assim respondeu.
— Sim, acho que sim. Devo dizer que gosto mais do que odeio.
— Você se sentiria incomodada por jogar fora 10.000 ienes?
— Acho que não.
Como se esse fosse um assunto importante, Chitanda se aproximou e acrescentou solenemente.
— Mas somente se não fosse de uma fonte ilegítima.
Você com certeza está protegida, Chitanda. As pessoas já mataram por menos, até mesmo no Japão.
Mas, mesmo pensando nisso, pude entender o que Chitanda estava dizendo. Se os 10.000 ienes fossem meus por direito, eu definitivamente não gostaria de perdê-los. Se eu o perdesse acidentalmente, eu até limparia os bueiros da cidade na tentativa de encontrá-lo. Mas se fosse "dinheiro ilegítimo" ou, em outras palavras, se fosse dinheiro que tivesse sido pego, roubado ou ganho em jogos de azar, eu provavelmente o daria como dinheiro fácil. Como se costuma dizer, "ganhos mal obtidos são logo gastos".
Essa pode ser a única razão pela qual X se sentiu culpado e ainda assim usou a nota falsa. Ele não queria desperdiçar seu próprio dinheiro. Nesse caso, esses 10.000 ienes não vieram de uma fonte ilegítima. Além disso, X não é um falsificador ou cúmplice de um. Se esse for o caso…
— Como eu pensava, X recebeu a nota de alguém.
Chitanda, que estava olhando para o caderno, olhou para cima.
— E ele recebeu como dinheiro legítimo. Se ele não o recebeu como salário ou subsídio, então só há uma possibilidade... Ele foi devolvido a ele em troca de dinheiro que haviam emprestado anteriormente.
— Tenho certeza de que X se sentiu incomodado ao perceber que o dinheiro recebido era falso. Ele provavelmente pensou algo como "O dinheiro era meu, então por que isso aconteceu?" De qualquer forma, não se pode culpa-lo por se sentir culpado ao querer usá-lo em uma loja administrada por um casal de idosos.
Quando terminei, Chitanda colocou o punho perto da boca e pensou um pouco. Por fim, ela abaixou o punho e assentiu, mas de repente balançou a cabeça ao pensar em algo.
— Mas isso não muda nada! X-san ainda deveria ter sido capaz de trocar a nota falsa!
Respondi com calma.
— É mesmo? A nota falsa é como o Coringa em Old Maid. Ninguém quer estar segurando-o. Nesse caso, eu diria que essa situação se encaixa.
"Yo X, aqui está o dinheiro que peguei emprestado de você no outro dia."
"Ah, Y-senpai? Muito obrigado. Mas você poderia ter devolvido o dinheiro mais tarde."
"Eram 10.000 ienes, certo? Aqui."
"Obrigado."
— Mas, para a surpresa deles, era falso.
Chitanda nem sequer sorriu para minha atuação solo. Sentindo-me constrangido, continuei.
— Y, a quem X emprestou o dinheiro, era alguém de posição social mais elevada. É por isso que eles não puderam se opor quando Y lhes devolveu uma falsificação. X poderia ter percebido logo após receber o dinheiro, mas Y poderia facilmente fingir ignorância. Assim, X conseguiu a nota falsa nessas circunstâncias.
Cruzei minhas pernas e continuei.
— Ainda havia a questão de saber se X é uma única pessoa ou um grupo de pessoas, mas, com base em tudo isso, podemos dizer que X é apenas uma pessoa. Seria muito pouco natural que dois ou três estudantes do ensino médio comprassem juntos artigos de papelaria baratos com uma nota de 10.000 ienes.
Chitanda ainda permaneceu em silêncio, o que me fez pensar se ela realmente estava ouvindo.
Ainda há mais um ponto que deve ser examinado, pensei enquanto falava.
— E quanto ao Y?
— Y conseguiu a nota falsa. Talvez ele a tenha obtido de um Z mais alto na escala social. Mas, em algum momento, ele teria que retornar ao falsificador, a uma loja ou ao banco, como previsto. Podemos agrupar todas as pessoas acima de Y em Y também, e então temos a pergunta: Quem é Y? Um vendedor sem nenhum escrúpulo? Os próprios falsificadores?
— Na bagunça causada pelas notas falsas, a única saída foi recorrer a um estudante solitário do ensino médio que caiu em um impulso repentino. A polícia se envolveu com X para rastrear a origem da nota.
Suspirei profundamente e dei de ombros em tom de brincadeira.
— Isso conclui minha dedução.
Notei que Chitanda estava profundamente sentada em sua cadeira, o que era bastante estranho. Suas palmas estavam apoiadas nos joelhos, suas costas estavam retas e ela tinha uma expressão vazia no rosto. Ela provavelmente ficou chocada com a conclusão ou cansada do jogo.
Mas, mesmo assim, gastei todo esse tempo e esforço conversando e ela não diz uma palavra? Que maldade. Deixei Chitanda em seu silêncio melancólico e olhei pela janela para a cidade de Kamiyama, onde a cor do outono começava a aparecer. Como a estação de Kamiyama fica em algum lugar por ali, Koubundou também deve estar nessa área, certo?
O murmúrio de Chitanda chegou aos meus olhos enquanto eu estava ali.
— Qualquer pessoa que, no dia 31 de outubro, tenha feito compras na Koubundou, em frente à estação, e que saiba de alguma coisa, por favor, apresente-se imediatamente a Shibazaki na sala da equipe.
Ela então falou seriamente enquanto eu me virava.
— Certamente percorremos um longo caminho desde então.
— Sim…
Sorri e me estiquei.
— Então, é fim de jogo.
Chitanda ergueu as sobrancelhas ao ouvir a palavra jogo. O foco voltou para seus olhos.
A cabeça de Chitanda se inclinou ligeiramente.
— Oreki-san.
— O quê? Este é apenas um jogo, você não precisa levá-lo a sério.
— Não, não é isso, mas se isso fosse um jogo, tenho a sensação de que você o iniciou para provar algo… O que foi mesmo?
Ah.
Agora que estou pensando nisso, eu queria fazer algo assim.
Também inclinei minha cabeça, mais ou menos no mesmo ângulo que a de Chitanda. Depois da escola, na sala de aula de Geografia, duas pessoas deram de ombros juntas.
— O que foi isso?
— Eu me pergunto.
— Se você não consegue se lembrar, não há motivo para que eu o faça.
— Então, que tal tentarmos deduzir o que foi isso?
Os lábios de Chitanda haviam se afrouxado e, embora seus grandes olhos estivessem cheios de seriedade, pude ver que ela estava sorrindo. Ah, tanto faz. Dei o maior sorriso que consegui e falei.
— Oh, me dê um tempo.
No dia seguinte.
Ao folhear a terceira página dos jornais, este artigo chamou minha atenção.
"Preso por Posse de Dinheiro Falso"
O subtítulo dizia.
"Membro de gangue de 23 anos é o primeiro a ser preso em uma série de incidentes, informa a polícia de Kamiyama."
Acredito que começamos esse jogo ontem por causa de uma expressão. Chitanda e eu nos esquecemos completamente dela, pois estávamos muito ocupados com o jogo, mas agora me lembro do que era.
Isso foi "Um cavalo vem de uma cabaça", certo?
(N/SLAG: Expressão japonesa que significa chegar a uma conclusão precipitada.)
... Sim, acho que sim.
Bem, para que a memória corresponda à verdade, é preciso muito mais do que pura sorte, suponho.