Volume 1

Capítulo 4: Revelações

 

Dias se passaram desde o interrogatório com os dois policiais, e até então mais nenhum nome foi queimado por Frederico.

Preocupado, pois nem mesmo pedidos de entrega de jornal eu estava recebendo, fui para o mundo humano, para ver o que estava acontecendo com ele.

Caso tivesse desistido de seu grande objetivo, encerraria o nosso pacto ali mesmo — e encerraria esta obra, com um final broxante…

Porém, quando surgi ao seu lado, seus olhos se encheram de vida ao me ver. Lentamente, uma alegria contagiante se formava em seu interior.

— Narrador! Como é bom vê-lo! Estava pensando em você agorinha mesmo…

Infelizmente, Frederico dizia a verdade. E a ideia que ele tinha para mim… era tudo que eu queria evitar fazer nesta história. 

Bom, vejamos como ele iria apresentá-la. Até lá, farei-me de desentendido.

— Oh! Sério? Cheguei em uma boa hora então.

— Na melhor possível. — O seminarista esfregou as mãos em cobiça. — Me diz aí, Narrador. Dentre os serviços que você faz, assassinato e descoberta de nomes estão inclusos?

Uma pergunta seca e direta, hein? Estaria mentindo se eu dissesse que não. — Conquanto você pague o valor que eu definir, sim.

Seus olhos arregalaram em felicidade. — Perfeito! Então me diga uma coisa… — Lá vem. — Quanto você cobra para matar ou conseguir os nomes completos de dois policiais que estão na minha cola? Recentemente, tenho tido problemas com a polícia, sabe…

Kikiki, como sabia que ele estava desesperado, lancei um preço que deixou Frederico de cabelo em pé. — Se queres ver os dois mortos, cobrar-te-ei 10 milhões de reais. Mas, se queres seus nomes, 1 milhão de reais.

— O quê?! Tudo isso?!?!?! — Mas é claro. Se eu te entregasse tudo de mão beijada, não haveria risco, e sem risco a história que estava contando ficaria chata. — Não foi esse o valor que pensei quando arquitetei esse plano que estou seguindo…

— Hã? Como assim? — Eu legitimamente não fazia ideia do que ele estava falando.

— É simples, veja, está tudo ligado com o motivo de eu ter parado de queimar nomes e de pedir jornais a você. Pense comigo, a polícia não iria achar estranho se, logo após meu interrogatório, mais nenhum desaparecimento ocorresse e ninguém suspeito aparecesse para me entregar jornal?

— Bom, sim. Diria até que as suspeitas em você aumentariam.

— Exato. Irei me aproveitar disso para que uma certa ocasião ocorra… Só que tem um problema.

— Mesmo? E o que seria?

— As fofocas, as notícias que estavam circulando pelo seminário, todas só falam de mim. Isso estava me incomodando a ponto de cogitar a contratar os seus serviços. Mas o preço… foi bem maior do que eu pensei.

— Lamento, protagonista, mas não acho que alguém faria o que você me pediu, por menos.

— Já li matérias de jornal de gente que fez isso por beeeem menos, acredite. E… do que você me chamou?

De repente, um vento forte passou por uma janela aberta no quarto de Frederico, fazendo com que algumas persianas em frente dela começassem a estalar.

— Aff… todo dia isso — lamentou, dirigindo-se até a fonte do barulho.

Quando o seminarista estava prestes a fechar o vidro, assim erradicando todo o problema, algo chamou a sua atenção.

No outro lado dos portões, na rua, havia uma pessoa dentro de um carro, com uma câmera fotográfica apontando para ele.

Ao perceber que havia sido flagrada, essa pessoa misteriosa largou o aparelho fotográfico, pôs as mãos no volante e partiu com o carro, enquanto o vidro do automóvel ainda se levantava.

Estava escuro, mas, graças à iluminação dos postes de luz, Frederico pôde notar que nosso ser emblemático possuía um cabelo longo e um bigodão de respeito.

O seminarista riu, pois sabia quem ele era. Seu plano finalmente havia começado a andar.

— A ocasião que eu tanto esperava chegou! — vangloriou-se e, então, virou-se para mim. — Se a morte e o nome completo de dois policiais é aquele valor, então diga-me, Narrador, qual o preço da morte e do nome completo de apenas um policial?

Aonde ele quer chegar com isso? — 5 milhões a morte e 500 mil o nome completo.

— Pois bem. Como deve imaginar, não tenho todo o dinheiro necessário para contratar o serviço de assassinato de um policial. Porém, para conseguir o nome completo de um… darei um jeito de arranjar o necessário para contratar esse serviço.

— O quê?! Como???

Mais uma vez fui pego na linha sensacional de raciocínio lógico de Frederico.

Desde o começo, o preço que eu havia estipulado servia como um obstáculo para incentivá-lo a pensar por conta própria. Mas, no fim, ele se tornou o seu principal objetivo para o sucesso de seu plano.

Sem obter uma resposta para a minha pergunta, apenas um sorriso enigmático, Frederico alegou estar se sentindo cansado e acabou indo dormir.

No dia seguinte, foi chamado para a sala do diretor, e lá ele se apresentou.

— Gostaria de falar comigo, diretor Rubens?

— Claro. Por favor, sente-se. — Com uma expressão séria em seu rosto, apontou para uma cadeira à sua frente.

— Pois bem. — Frederico fez o que lhe foi pedido. — No que posso útil para vossa ilustríssima pessoa?

— Primeiramente, poderia parar com isso?

— “Isso” o quê?

— Com essa babação de ovo toda.

O seminarista levemente se assustou. Nunca o tinha visto usar aquele palavreado, tampouco se sentir incomodado com a forma que ele o tratava.

— Mas… eu não estava…

— Tá, tá, tanto faz. O motivo para eu ter te chamado aqui é esse aqui. — Rubens colocou um aparelho muito peculiar sobre a mesa entre os dois. — Sabe o que é isso?

— Hmm, não faço a mínima ideia, senhor.

— Isto é um gravador, Frederico. Coloquei ele embaixo da minha mesa antes daqueles policiais virem até a minha sala e gravei toda aquela conversa que vocês tiveram.

O seminarista arregalou os olhos e, indignado, bateu a mão na mesa. — Mas é crime gravar conversa alheia sem o consentimento dos envolvidos, diretor! Ainda mais de um interrogatório policial! Não poderia ter feito isso!

— Ora! Não seja petulante, garoto! Fiz apenas o necessário para manter a reputação e integridade do meu seminário! Ou o que sobrou dele… Desde a descoberta daquela rede interna de abuso, que acontecia bem debaixo do meu nariz, não posso deixar que outro escândalo aconteça. É meu dever proteger o nome desta instituição.

Frederico mordeu os lábios, angustiado pelo fato de ter acontecido algo que ele nunca imaginaria poder acontecer.

O clima estava tenso, os dois haviam elevado o tom. Parecia que sairiam na mão a qualquer instante, se não fosse um toc-toc na porta.

— Com licença, Rubenzinho~ Posso entrar? — perguntou uma doce voz feminina.

O diretor ficou sem jeito por um momento. Olhou para Frederico, depois mudou sua expressão da água para o vinho e disse: — Claro, fique à vontade!

A porta se abriu e dela saiu uma linda mulher — um mulherão, como muitos que a vissem diriam — segurando uma bandeja com duas xícaras.

— Ai, da secretaria dava para ouvir os dois berrando, então trouxe um pouco de chá de camomila para acalmar o ânimo de vocês.

— Ah, maravilha! Atenciosa como sempre, Dona Rita~  — declarou o diretor.

“Dona”? Perdoem-me, mas de dona ela tinha nada. De cara, podia-se notar que Rita até era uma mulher mais velha, madura, mas de corpo…

Bom, como poderia dizer isso sem ser rude… deixava qualquer jovem-adulta no chinelo. Rita tinha um longo cabelo ruivo amarrado por um prendedor de prata com uma esmeralda encrustada nele, seios fartos e um gingado de modelo.

Ela desfilou de salto alto até Frederico e o entregou uma xícara de chá. Ao se abaixar, ele acidentalmente olhou para seu decote.

Não o culpava por isso. Rita vestia uma roupa social curta. Não curta a ponto de alguns poderem confundí-la com uma meretriz, mas curta o suficiente para ser considerada indecente, ainda mais no lugar onde trabalhava.

Mas não a julguem, não era uma roupa vulgar, toda escancarada, mas uma roupa sutil, um colírio para os olhos, como muitos diriam. 

Todo seu look — composto por brincos de diamante, anel de cobre e um cordão de ouro com seu nome nele — parecia dizer “olhe-me”, mas Frederico, após seu pequeno deslize, resistia, pedindo a Deus para lhe afastar da tentação. Pobre homem, celibato deveria ser algo difícil mesmo…

— Aqui, está o seu, chefinho~ — Após uma piscadela e um sorrisinho, a mulher colocou a xícara de chá sobre a mesa, ao lado de um telefone fixo.

— Ah, sim, muito obrigado. — O diretor soltou um sorriso sapeca e a olhou fundo nos olhos, com um olhar carinhoso, de flerte talvez.

Os dois se encararam por um tempo e, então, ela se retirou da sala. Frederico deu um gole no chá. 

— Isso é uma delícia — soltou, para romper o silêncio, e colocou a xícara sobre a mesa do diretor.

— De fato… — Ele sequer havia encostado na sua bebida… — Digo! Continuando…

— Sem pressa, vai na paz. — Revirou os olhos.

O diretor limpou a garganta e tirou aquela cara de bobo apaixonado de seu rosto, deixando-a mais séria. 

— Garoto, há um boato circulando que diz que um Honda Civic prata vem rondando o seminário e vigiando o dormitório dos seminaristas à noite. Depois de escutar o conteúdo daquela gravação, a conversa que você teve, gostaria de saber: existe algum envolvimento seu nisso?

Curiosamente, essa pergunta deixou Frederico animado em seu interior. Lutava consigo mesmo para não soltar um sorriso e deixar isso transparecer em seu rosto.

Por alguma razão que desconheço, mediante a ações tão contraditórias, optou por mentir. — Absolutamente não. Quer dizer, por que teria? Estou sendo acusado injustamente por algo que não fiz.

O diretor ajeitou a sua postura na cadeira e apoiou os cotovelos na mesa. Entrelaçou os dedos e colocou o queixo em cima dele, lançando um olhar sério para o seminarista. — Hmmm… É mesmo?

— Juro em nome do Senhor! Se escutou com atenção aquela conversa, então sabe que o que falei é a mais pura verdade!

— Afff… assim você me complicada. — O Diretor se inclinou para trás em sua cadeira. — Porque, de tudo que eu ouvi, nada fez com que eu acreditasse em você.

— Ora, mas isso é absurdo! Diga-me, diretor, o que preciso fazer para conseguir sua confiança?

— Acho… que nada. Garoto, arrume suas coisas e na portaria ligue para os seus responsáveis virem te buscar. Estarei te expulsando do meu seminário. Seu nome já está manchado, não quero que um dia ele suje o desta instituição.

— Ridículo! Você não pode fazer isso comigo! — Irritado, Frederico se levantou. — Pense bem, estará expulsando o melhor aluno daqui. Eu sou o melhor dentre as salas! Sou eu quem tira as maiores notas! A coordenação toda espera grandes coisas de mim!

— E daí? — O diretor deu um corte seco. — Creio que você esteja confundindo as coisas. O seminário não é sobre notas, mas sobre comportamento, fé e religião. Coisas que vejo que você não tem. Por não apresentar essas três virtudes, posso muito bem te expulsar.

Frederico levou pro pessoal tal fala e protestou: — Isso não vai ficar assim! Não vou deixar barato! Irei recorrer à Justiça se for preciso!

— Ai, tá, tá… Faça o que bem quiser, estou cansado de suas ladainhas. Você vai querer sair daqui com o mínimo de decência ou quer que eu chame os seguranças do seminário para te escoltar para fora? 

Frederico não respondeu. Permaneceu em silêncio fazendo uma cara feia para ele.

— Muito bem, você que escolheu isso.

O diretor tirou o telefone do gancho. Quando o colocou na orelha, o seminarista começou a falar:

— E-espera, espera! Você… não pode fazer isso…

— E por que não? — zombou Rubens, enquanto apertava as teclas do painel.

Com a pergunta, Frederico permitiu-se soltar um sorriso diabólico e parar de atuar. Ajeitou-se na cadeira, cruzando as pernas, e lançou um olhar carregado de intenção assassina para o seu diretor.

— Porque a dedução dos policiais está certa. Eu de fato sou o responsável pelo desaparecimento daqueles alunos e professores.

Rubens pareceu assustado ao ver aquela mudança repentina de comportamento acompanhada daquela fala. Todo aquele desespero de antes havia sumido, deixando para trás uma frieza mortal. Sua verdadeira natureza havia sido revelada.

De repente, entre os dois, tudo que restou foi um silêncio mórbido.

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