Volume 1
Capítulo 15: Programa de Televisão
Após os ânimos se acalmarem, todos acompanharam o velho padre até a cozinha da igreja. Lá, o bispo preparou um chá de camomila e o serviu para os demais presentes no local.
Por fim, juntou-se a Frederico e sua equipe, que estavam reunidos em frente ao dono da emissora, para ouvir o que ele tinha para dizer.
Percebendo seu nervosismo, confortou-o: — No seu tempo.
— Não, não, está tudo bem… — O velho enfim deu um gole em sua xícara de chá. — O jovem Reverendo Senhor Padre que me confrontou abriu meus olhos. Devo aceitar os meus erros do passado e tentar corrigi-los no momento presente. Então… antes de mais nada, gostaria de afirmar que as acusações que fizeram contra mim são verdadeiras.
Os cavalheiros ficaram surpresos, mas Frederico e Agostinho não, pois eles estavam confiantes nas informações que haviam recebido.
— Mas a polícia nunca teve provas concretas… exceto o Mártir. — O padre observou com melancolia o líquido em sua xícara e continuou: — Tudo começou certo dia, quando alguém fez uma ligação anônima para o meu celular privado, dizendo que tinha fotos e vídeos incriminadores meus e que as divulgaria, caso não fizesse o que ele iria me pedir.
“Eu, obviamente, fiquei irritado, né. Perguntei quem era, como havia conseguido o meu número, mas não obtive resposta, apenas um silêncio aterrorizante.
“Falei que aquilo tudo não passava de um trote de mal gosto, que iria recorrer à Justiça e que iria desligar a chamada.
“Porém, antes de eu efetivamente fazer isso, recebi um sinal de notificação do meu celular. Pelos anexos que apareceram na tela, pude perceber que aquela pessoa não estava mentindo.
“Fiquei extremamente chocado quando ela me informou que aquilo tudo não passava de uma cópia.
“Logo, perguntei a esse ser misterioso o que ele queria de mim, o que queria que eu fizesse, e me foi instruído a tocar um vídeo durante o telejornal mais importante da minha emissora e só tirá-lo quando tudo estivesse acabado.
“Naquele momento, não sabia o que seria o “tudo acabado”, por mais que o tivesse questionado a respeito. Tudo que recebi foi um arquivo de vídeo e uma chamada encerrada.
“O resto, imagino que saibam o que deve ter acontecido: eu fiz o que foi ordenado, e só então percebi que havia caído nas garras do Mártir.”
Engenhoso esse Falso Mártir. Gostaria de saber mais a respeito de como ele havia conseguido tais provas e dados sigilosos para organizar esse plano…
Talvez, Agostinho, Frederico e os demais membros do grupo também compartilhavam desse mesmo interesse meu.
Com seus rostos sérios e serenos por causa da história que lhes foi contada, o bispo foi o primeiro a questioná-lo:
— Então… suponho que seja por isso que Vossa Reverência andava armado com uma faca de bolso. Não consigo imaginar o medo que sentiu, e deve estar sentindo, esses dias…
— Precisamente, Vossa Excelência Reverendíssima. E peço desculpas por tê-la usado contra ti. Estou profundamente arrependido por isso e por todos os crimes que cometi…
Logo, Agostinho se levantou, aproximou-se dele e colocou a mão em seu ombro. Com um rosto misericordioso e uma alma piedosa, o bispo perdoou o padre, assim gerando comoção entre os membros de sua equipe e desgosto por parte de nosso protagonista.
“Um criminoso aponta uma arma para você, ameaça a sua vida, e você o perdoa, pois ele se diz arrependido pelo que fez?! Isso é um absurdo! Essa é a maior prova de como a minha religião anda errada nesses últimos tempos. Pecadores estão recebendo carinho na cabeça em vez de serem repreendidos!”, refletiu.
Os olhos do velho brilharam com o perdão. Em meio a agradecimentos repetidos, tentou agarrar a mão do bispo para beijá-la, mas Agostinho a afastou a tempo.
— Não é para tanto, Vossa Reverência… — Ele coçou a cabeça, envergonhado. — Posso tê-lo perdoado, mas devo lembrá-lo que as pessoas que sofreram com suas ações no passado talvez não tenham. E isso ainda trará consequências para o seu presente e futuro, independente do quanto mude.
— Ce-certo… — O velho recuperou a postura, mas com um olhar cabisbaixo em seu rosto. — E… como posso arrumar isso?
— Não pode; alguns erros são irreversíveis. Em situações assim, o único a quem Vossa Reverência deve almejar o perdão é Deus. E para conseguir isso, terá que mostrar a Ele, através de ações, que seu arrependimento não é apenas da boca fora.
O padre caiu de joelhos no mesmo instante e começou a chorar. Em meio a soluços, perguntou: — E-e, po-por favor, Vo-vossa Excelência Reverendíssima, o-o que devo fazer? Po-por onde posso começar?
— Abraçando as oportunidades que Deus lhe dá para seguir o caminho do bem, como essa que tenho para lhe oferecer: gostaria de contar com a sua colaboração em uma tentativa de capturar esse… Falso Mártir.
— “Falso Mártir”?!?! — o velho e Frederico, surpresos, gritaram em uníssono.
Obviamente, nosso protagonista já sabia de sua existência — afinal ele era o verdadeiro — porém o bispo e sua equipe não tinham ciência do seu conhecimento a respeito disso. Por isso, o falso choque com essa “descoberta”.
— Hm? Achei que havia deixado isso óbvio para Vossa Reverência no café da manhã de hoje — comentou Agostinho, dirigindo-se a Frederico. — Se suspeito de ti como o verdadeiro Mártir, então só podemos estar indo atrás de um impostor.
Nosso protagonista abaixou a cabeça, como se tivesse assumido derrota, e com uma falsa modéstia no olhar direcionada ao bispo, respondeu: — De fato. Deveria ter prestado mais atenção em seus dizeres…
— Hã? Como é?! — Mais perdido que cego em tiroteio, o velho freneticamente olhava para os dois.
— Nada demais. — Com um sorriso inocente, Agostinho se voltou para o aleijado e o ajudou a se levantar. — O que importa mesmo agora é se Vossa Reverência aceita ou não a minha proposta.
— Ah… Ah, sim! Sim, pode contar com a minha colaboração!
O bispo se mostrou verdadeiramente alegre. — Ótimo! Então creio que Vossa Reverência não vá mais se incomodar se eu lhe fizer mais algumas perguntas…
Logo, Agostinho questionou se o padre ainda tinha o telefone da pessoa que o ligou, e o velho negou, dizendo que o número era privado e que a polícia havia apreendido o celular dele.
Perguntou, então, se existia outro meio de comunicação em que esse estranho pudesse entrar em contato com ele, e o dono da emissora respondeu que havia um telefone em sua emissora, mas que era restrito e não era só ele que usava.
Por fim, o bispo refletiu por um momento. — Hmmm… — E anunciou ter um plano, mas que era perigoso e precisava da emissora para poder funcionar.
— Mas é claro! Pode contar com ela — declarou o velho.
— Maravilha! — comemorou Agostinho. — Vou precisar também de alguns horarinhos da sua programação para um novo programa ao vivo. Estava pensando em um voltado mais para fé e religião, onde os telespectadores poderiam interagir com o apresentador, através de um número de telefone escancarado na tela.
— Hã… certo. Por quê?
A ideia era simples. A partir de observações do bispo, acreditava-se que o Falso Mártir nada mais era do que um fã do verdadeiro.
Então, se colocassem um apresentador que vivia falando mal dele, eventualmente o culpado se irritaria e apareceria para bater boca com ele.
— Eu entendo — assentiu Alonso —, mas quem garante que o Falso Mártir simplesmente não mate o apresentador e siga com sua vida?
— Ninguém — afirmou Agostinho. — Eu… apenas tenho um pressentimento que essa pessoa que estamos tentando capturar não fará isso, uma vez que acredito que esse impostor siga o mesmo código de conduta do verdadeiro. Ou seja, matar apenas pecadores e pessoas que tentam o impedir. E um religioso que apresenta um programa não é um nem outro.
Os cavalheiros se entreolharam, nervosos com essa declaração. Eles iriam mesmo executar um plano sem uma base sólida, apenas com “achismos”?
— Com todo respeito, Vossa Excelência Reverendíssima, mas isso é loucura! — disparou Soryu. — Não podemos jogar nossas vidas foras assim!
— Eu sei, companheiro. No entanto não temos outra alternativa. Me sentiria terrivelmente preocupado com quem fosse a isca, o apresentador, então por isso eu…
— … Me ofereço para esse papel! — Os olhos de todos da sala se voltaram para Frederico.
Agostinho apenas suspirou. — Eu agradeço o seu sacrifício, Vossa Reverência. Porém ele não será necessário.
— Por que não? Veja bem, a minha participação como isca, nesse plano, só lhe traria benefícios.
“Primeiramente, a morte de qualquer membro da equipe, ainda mais a sua, o cabeça que organiza e planeja tudo, seria prejudicial à investigação. O mesmo vale a expôr seu rosto para o inimigo.
“Quanto menos informação ele possuir, melhor. Então um bom candidato para esse papel seria alguém que não esteja vinculado ao grupo.
“O dono da emissora não poderia ser, o Falso Mártir conhece seu rosto, logo desconfiaria dele se o visse como apresentador.
“No fim, resta apenas eu. Sou o melhor candidato, pois, como Vossa Excelência Reverendíssima acha que sou o Mártir, se eu for morto, o verdadeiro também seria.
“Ou então, caso eu não seja, coisa que eu realmente não sou, um grande obstáculo seria removido para o progresso da investigação. Não concorda?”
Os cavalheiros assentiram quase que de imediato. Era uma argumentação sólida. Porém o bispo se viu relutante.
Ele pensou, pensou, pensou… mas no fim foi forçado pelas circunstâncias a aceitar a colaboração de Frederico no plano.
— Não se preocupe, Vossa Excelência Reverendíssima. Não acho que eu esteja pondo minha vida em risco. Confio em ti e na sua brilhante capacidade de bolar ótimos planos. Por isso sempre me voluntario a eles!
Agostinho pareceu aliviado com os elogios de Frederico. Mas não se deixem enganar pelas falas do nosso protagonista!
As intenções por trás delas eram malignas. Tinham o intuito de deixá-lo mais tenso, preocupado, nervoso! E conhecendo o bispo, não duvidava que no fundo ele realmente havia ficado.
***
Dias se passaram desde o início da execução do plano. Frederico havia se tornado apresentador de um programa religioso, extremamente crítico ao Mártir.
Por motivos óbvios, nosso protagonista há muito havia parado de punir criminosos, deixando que apenas o Falso Mártir fizesse isso por ele.
Porém, a cada vítima que essa pessoa misteriosa ceifava, um novo ataque a ela era realizado em seu programa ao vivo.
Suas opiniões polêmicas e seus comentários sinceros, bem como sua beleza e seu carisma, cativavam o público, fazendo com que o programa acabasse se tornando bastante popular na região.
Certo dia, Frederico chegou no estúdio da emissora para realizar mais uma transmissão ao vivo.
Subiu ao palco onde gravava, e uma equipe veio arrumá-lo, enquanto outra preparava seu microfone e outros aparelhos de captação de áudio.
Diante de si, havia câmeras e mais pessoas, sendo algumas delas o dono da emissora, Agostinho e sua equipe.
Eles, desde o início, ficavam nos bastidores para auxiliar Frederico e para ver, através de uma máquina, os números de telefone que ligavam para o programa, na esperança de achar o Falso Mártir. Mas, para suas infelicidades, até agora não haviam conseguido.
Quem parecia estar se beneficiando disso, porém, era o dono da emissora. Nunca havia conseguido uma audiência tão grande quanto a que estava ganhando com aquele plano.
Havia boatos que, mesmo após o término, gostaria de continuar com o programa, com Frederico ainda como apresentador.
O salário seria generoso, mas duvidava que nosso protagonista fosse aceitar, uma vez que sua posição na hierarquia social só iria aumentar, e ele não queria isso, kikiki.
— Entramos em cinco segundos!
Com o anúncio do diretor, as equipes abandonaram o apresentador no palco, e a transmissão começou.
O programa seguiu normal, como qualquer outro. Agostinho até suspirou por trás das câmeras, achando que aquele seria mais um dia sem sucesso.
Porém, quando chegou o bloco de chamadas com os telespectadores, um número privado havia aparecido naquela máquina que o bispo e sua equipe acompanhavam.
— Alô! Quem fala?
Em retorno à pergunta do apresentador, podia-se ouvir nada além de um silêncio avassalador.
— Alô…? Não estou te escutando…
De repente, uma respiração pesada, arfando.
— Poderia… diminuir o som da televisão e falar pelo telefone, por gentileza?
— O… dono da emissora… está por aí? — Abruptamente, do mais completo nada, uma característica voz mecânica perguntou algo.
Todos devem ter ficado de orelha em pé. Frederico, por outro lado, engoliu em seco. — E… quem gostaria de saber?
— Res… ponda a minha… pergunta. Está… ou não?
Frederico olhou para o velho, e ele o olhou de volta, negando com a cabeça, com uma expressão horrorizada em seu rosto.
— Olha, eu não sei quem você é, mas peço um pouco mais de respeito. Ou então pedirei para a equipe te desconectar da chamada.
— Hmpf… que seja. Hora ou outra vocês… vão acabar descobrindo… — Logo, ouviu-se um gemido abafado.
Não muito tempo depois o dono da emissora começou a corar. E então, um estalo audível, e ele caiu duro no chão. Morto.
Nessa hora, a equipe da televisão entrou em pânico. Alguns gritaram, outros abandonaram seus postos e houve aqueles que tentaram desligar a chamada e sair do ar. Mas estes foram impedidos por Agostinho e seus cavalheiros.
Frederico começou a suar frio quando aquela voz voltou a falar. — Você queria saber quem eu era, né? Pois saiba então que diante de ti está o Mártir!
Sob ordens do bispo, Dimitri, Soryu e Alonso saíram do estúdio para ligar para a polícia e para a ambulância.
Os demais cavalheiros cuidavam do dono da emissora, da máquina de número de telefone e auxiliavam os membros da equipe de televisão para fora do estúdio.
Com isso, Agostinho pegou um bloco de notas e uma caneta — que estavam avulsos nos bastidores — e começou a escrever algo.
Percebendo a agitação incomum por trás das câmeras, o Falso Mártir concluiu: — Ora, que enfim obtive minha resposta. Parece que ele realmente estava aí, não é mesmo? Hiahiahia!
Apesar da afronta, nosso protagonista rangeu os dentes e permaneceu firme. — Certo… Por que devo contar com sua presença aqui hoje?
— Simples: venho testar sua valentia. Soube que anda falando mal de mim pelas minhas costas. Gostaria de ver se tem coragem de fazer isso na minha frente.
Frederico não conseguiu deixar de achar um tanto irônico a fala do Falso Mártir. “Hm… que curioso. No fim, foi o que imaginei, o palpite do bispo aconteceu mesmo.”
Pensando em Agostinho, o próprio apareceu. Discretamente, chamou a sua atenção e levantou o bloco de notas que antes usava. Nele, estava escrito um pedido para Frederico.
Converse mais com o Falso Mártir. Enrole bastante, vai que solte alguma informação que o comprometa. Não se preocupe, não acho que ele irá te matar. MAS NÃO SE PRECIPITE!!!
“‘Não irá me matar’? Por que o bispo acha isso até mesmo ao ponto em que chegamos?... Bom, seja como for, acho que posso confiar nisso também…”
— Ora, o que foi? O gato comeu a sua língua? — zombou o Falso Mártir perante o silêncio de nosso protagonista. — Padres como você são todos iguais. Cães que ladram, mas não mordem…
Frederico sentiu uma pontada em seu ego. Ele cerrou o punho. Estava determinado a acabar com a arrogância desse impostor.
— Peço desculpas se te fiz esperar, mas devo dizer que você me abordou de uma forma meio covarde.
— Como é?
— Normalmente, preparo meus textos horas após o anúncio de morte de uma vítima sua. Mas agora, como deve ter percebido, acabei de presenciar um assassinato seu. Nesse meio tempo, estive correndo, pensando na melhor forma de te atacar…
Com um sorriso provocativo, Frederico iniciou uma discussão fervorosa com o Falso Mártir.
Foi uma verdadeira batalha onde o caçador perseguia a caça. Mas, no calor do momento, os papéis se inverteram.
O impostor, irritado e encurralado, perguntou o nome completo de nosso protagonista.
Os poucos cavalheiros que restavam nos bastidores veementemente aconselharam Frederico a recusar-se a dar ou a fornecer um falso. Porém ele os ignorou.
Logo, um silêncio súbito. E então uma risada estridente do Falso Mártir o rompendo.
— Frederico de Melo, é? — provocou. — Que nome belo… como você é lindo… Acho que… enfim consegui o que queria.
De súbito, o telefone foi desligado, deixando Frederico a sós com medos e incertezas.
“O que foi que eu fiz…? Por que eu fiz isso?! O plano deu certo, mas… a que custo? Será que realmente conseguimos algo?”
As câmeras, que transmitiam para o público o espetáculo de nosso protagonista, pararam de filmar. O programa enfim havia chego ao fim.
Gostaria de ler os próximos capítulos sem ter que esperar 1 semana para tal???
Então contribua com a minha campanha do Apoia-se!
Por 45 reais mensais, tenha acesso a um capítulo adiantado (máximo de 1 capítulo no momento). No entanto, por a partir de 5 reais mensais, desfrute das diversas recompensas que a minha campanha tem a oferecer.
Siga-me no Instagram para ficar por dentro dos lançamentos e também para poder interagir comigo~
Apoie a Novel Mania
Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.
Novas traduções
Novels originais
Experiência sem anúncios