Hant! Os Piores Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 44: Como contar todas as folhas de uma floresta

— Isso não é uma brincadeira, é treinamento — disse a Selena.

— Então por que está rindo tanto enquanto acerta ele? — perguntou Voyro. — Meu instrutor de esgrima, o com uma grande cicatriz perto do olho, sempre me da uma bronca quando me divirto demais, falando que se agisse assim em uma situação real, morreria.

— No seu caso pode ser verdade e você sempre deve ouvir seu instrutor. Mas a partir de certo nível, é sim permitido se divertir. É só olhar para os registros do grande herói do Norte: Jarov, que fez seu nome quando lá ainda era habitável, se divertindo muito a cada batalha. Em certos casos, quando a diferença de nível era alta demais, é dito por um dos historiadores que ele colocava limitações em si mesmo, como usar a mão “fraca”, lutar de olhos fechados e completar um desenho nas costas do inimigo.

— As terras infernais do Norte, já foram habitadas?

— É por isso que você deve prestar mais atenção nas aulas. A partir de que evento que você acha que nosso calendário se inicia?

— Do ano da queda do meteoro.

— Exatamente. Antes disso, há registros de que até nevava em certas partes.

— Eu pensava que o clima sempre foi assim. Quente para cima, onde o Sol bate mais forte e frio para baixo, onde a luz se esconde. Além dos registros, existe outra forma de provar isso?

— Existe.

— Como?

— É complicado demais para alguém tão novo.

— Vocês têm quase a mesma idade, só admita que não sabe. — Vendo a Selena mentir na cara dura, decidi entrar na conversa.

— É mesmo! Aproveitando que temos um herói aqui, você também se diverte lutando? Ou isso também é mentira?

— Não disse que o fato de o clima ter mudado por culpa do meteoro é mentira, só que a Selena está fingindo que sabe outro jeito de provar.

— Mas é óbvio que eu sei!

— Então explique.

— É complicado demais para vocês entenderem... E longo demais para explicar, vamos voltar para os treinos!

— E sobre se divertir lutando?

— Tentou fugir da pergunta me culpando? Responda ele! — disse a Selena, ainda em um tom nervoso.

— Quando a minha vida está em risco, é difícil se divertir.

— E quando não está?

— Então prefiro evitar lutar.

— Outra mentira...

— Já disse que não é mentira!

— Olha, como eu queria ter aulas tão divertidas, todos os dias — disse Voyro, rindo. — Será que adultos são piores em ensinar?

— Pelo que parece, você que é o problema.

— Selena! Não diga isso nem de brincadeira.

— Nem se for verdade?

— Ele pode interpretar isso de outra maneira...

— A sucessora da família Glance tem razão. Eu me esqueço com facilidade e sou incompetente. Como você disse antes, temos a mesma idade, mas eu não alcancei nada de notável. Já que só sirvo para dormir e me divertir, podem recomeçar o que estavam fazendo?

— Ela tem uma língua afiada com todos e age antes de pensar, não leve para o coração.

— Quer saber — disse Selena. — Se aqueça um pouco. Pode se juntar.

O Voyro abaixou a cabeça para se alongar, mas foi acertado por uma adaga.

— Ainda não estava pronto!

— Eu sei. Assassinos são seres maldosos, raramente você estará na condição ideal quando se deparar com um. Essa é a primeira lição para você. Agora que você sabe isso, pode se preparar.

Ele se abaixou, mas foi atingido novamente.

— Segunda lição, sempre desconfie das palavras de um assassino e nunca perca um de vista.

Hehe... Agora entendi, pode vir com tudo!

Antes de terminar a frase, uma adaga voou em sua direção e o acertou em cheio.

— De novo!

Novamente, falhou em se mover a tempo.

— Dessa vez, eu sei o que...

Na terceira vez, ele foi acertado na testa, mas na quarta, que veio logo em seguida, ele desviou.

— Está pegando leve com ele?

No quinto e no sexto lançamento, ele também se esquivou perfeitamente.

— Parece que o verdadeiro incompetente, é nosso herói aqui.

— Você deve ter se cansado após tantos lançamentos, deixa eu ir de novo...

E senti uma batida na minha barriga, que me fez cair de joelhos.

— Com esses reflexos, como falhou no teste de esgrima? — perguntou Selena.

— Na hora do teste, esqueci a ordem das técnicas que deveria mostrar. E no combate com o instrutor, fiz um golpe ilegal, sem querer, por confundir a lista que o professor me entregou.

— Qual o seu segredo? Como aprendeu tão rápido?

— Talento natural — respondeu Selena.

— Fico feliz em receber esse grande elogio, mas o único talento que ganhei nessa vida, é o meu sangue nobre — disse Voyro. — Consegui essa pequena habilidade em um passatempo meu, por meio de um esforço de alguns bons anos.

— Poderia compartilhar esse passatempo?

— Não é nada demais, posso explicar sem problemas. — Com uma pequena pausa, para planejar como contaria, ele disse: — Começou como uma forma de pegar no sono, enquanto escapava de uma aula de exatas. Até então, eu tentava contar carneiros saltando por uma cerca, mas minha imaginação é tão fraca, que só conseguia ver os números, o que me lembrava da aula, o que tirava meu sono.

Então, decidi começar a contar as casas distantes, algo que não requeria minha imaginação e que não me lembraria da aula. Mas antes que conseguisse cair no sono, terminei de contar todas.

— Quantas eram?

— 2872 casas.

— Que visão boa — disse Selena. — Daqui, só consigo ver umas cem.

— É que eu estava em cima de uma árvore alta.

— Como não perdeu a conta?

— Talvez tenha pulado algumas e repetido outras, mas isso não importa, porque meu objetivo era outro.

— Se não era o objetivo, podia ter continuado usando as mesmas casas, infinitamente, fingindo que eram casas diferentes.

— Impossível, me entediaria.

— E cumpriria o objetivo de dormir?

— O tédio distrai o sono.

— Para mim é o oposto.

— Porque você é um herói.

— Bom ponto.

— Terminando de contar todas as casas, decidi começar a contar as árvores do nosso jardim.

— Teve sucesso?

— Falhei terrivelmente, só haviam 39473.

— Agora você definitivamente errou na conta. Mesmo contando as árvores dos vizinhos, o total não deve passar de quatro dígitos — disse Selena.

— Isso é porque eu comecei a contar plantas também.

— Que sono difícil. Convertendo isso em segundos, passou quantas horas contando?

— Depois da contagem das casas, fiquei melhor nisso. No fim desse novo passatempo, o Sol ainda não havia se movido mais que alguns centímetros.

— Isso é impossível. Por acaso começou a contar de cem em cem?

— Continuei um por um.

— E depois? — perguntou Selena.

— Por fim, contei as folhas.

— Não diga que terminou de contar todas elas.

— Meu total foi 20.347.865.

— Isso era para ser uma piada?

— Estou falando com total sinceridade e seriedade.

— Mesmo que seja, como isso ajudou a desviar das adagas da Selena?

— Para esse pequeno feito, encontrei uma forma de acelerar meu pensamento. Aqui que vem o meu segredo: Para contar todas as folhas de uma floresta, você só precisa imaginar que está correto. Quanto mais detalhes, melhor. Ao invés de passar rapidamente por milhares de folhas iguais, foque em uma, decore seus detalhes, como sua coloração, suas pequenas ramificações, seu formato e seu caule. Então terá confiança em afirmar que conhece todas as outras. Assim como os pequenos números do grande milhão, adicionam credibilidade na precisão.

— Ainda não entendi completamente.

— Você pega o jeito depois de contar muito e olhar com atenção. Para a brincadeira de desviar das adagas, por exemplo, fingi ser um especialista em desviar, um homem que desviou por toda vida. Pensando em toda sua história e experiência, fingindo ser e acreditando completamente, consegui a confiança para desviar. Mas observar por tanto tempo, também deve ter treinado meus olhos, para acompanhar objetos com precisão. Contar é útil, resumindo.

— Tentarei aplicar seu ensinamento, obrigado por me contar isso.

— Não seria mais divertido ouvir as aulas, que ficar contando eternamente?

— Concordo. Mas o que contei, era só uma consequência de quando falhava em fugir, que começou no dia em que o meu pai fortificou os muros, ao ponto de não conseguir escapar para me divertir na cidade. Assim que ele baixou a guarda, voltei a passear pela cidade e parei de contar, até que ele colocou ainda mais guardas. Se bem que, até nesses dias, o mestre espadachim vinha me entreter e quando ele vinha, eu parava de contar.

— Mestre espadachim?

Ah, podem fingir que não ouviram essa última parte? Ele pediu para manter suas vindas em segredo.

Olhando para a Selena, percebi que tive a mesma preocupação: “Será que esse homem tem alguma relação com os assassinos?”

— Ele provavelmente disse isso para não sofrer uma retaliação do Visconde. Prometemos que não contaremos. Mas agora estou curiosa, quem é esse mestre espadachim?

— Prometem de mindinho?

— Um herói não mentiria, pode confiar em mim! — Escondido atrás de minhas costas, eu cruzava meus dedos, o que de acordo com as regras intergaláticas, anularia a promessa de mindinho.

— Tudo bem, eu conto. Mas lembrem-se que dessa vez é segredo mesmo!

— Fique tranquilo, fui treinada para fechar o bico, até sobre tortura.

— Enquanto entregava uma sacola de brinquedos para alguns amigos que fiz no bairro mais longe daqui, um homem me segurou, questionando a origem da sacola, pensando que eu havia roubado. Mas antes de tomar qualquer ação precipitada, ele me reconheceu e se desculpou com diversos truques de espada brilhantes e chamativos.

— Como ele se parecia?

— Era um velho que mesmo com seu manto marrom, não conseguia esconder seus enormes músculos. Tirando seu dente de ouro, de resto, parecia igual todos os outros velhos.

— Os cavaleiros do Visconde também conseguem fazer golpes brilhantes. Se impressionou pela idade dele?

— Fui convencido a me tornar seu discípulo, quando ele fez uma flor germinar com um corte, que deveria é arrancar a grama do chão.

— Não parece ser uma técnica da sua família, será que eles se aliaram a alguma escola marcial próxima para enganar o filho do Visconde? — cochichei para a Selena. — Ele é o tal do reforço de fora?

— Tem mais algum detalhe que chamou sua atenção?

— Desculpe, mas até para vocês, só posso contar até aqui.

Meu radar de perigo apitou em níveis alarmantes, quase nunca antes visto. De longe, ele ganhou o primeiro lugar na lista de “fuja imediatamente”, acompanhado por pessoas cambaleando, com sinais de mordida no pescoço, e sapos bombados.

Nessa atualização interna, uma solução, duplamente útil, me veio à cabeça.

Pegando um caderno que usei para anotar os pontos principais do livro que li na biblioteca, escrevi o endereço da futura escola do monge, arranquei a folha e entreguei para o Voyro.

"Com o próprio filho do Barão como discípulo, isso deve dar um impulso na escola dele."

— Esse homem pode fazer o mesmo e muito mais. De hoje em diante, vá primeiro a ele quando quiser se divertir ou treinar, dizendo que o Lucca, o herói, te recomendou.

— Muito obrigado. — Recebendo o papel e guardando com cuidado, ele perguntou: — Agora que compartilhei um segredo meu, posso fazer uma pergunta?

— Claro.

— Que feito heroico você já fez?

Em meu silêncio, refletindo todas as partes que teria que censurar, a Selena pareceu mais curiosa que ele.

Suspirei e pedi para ambos manterem em segredo o que eu iria contar. Então dando um resumo de tudo que aconteceu na ilha, comecei a narrar minha luta final, contra o rei dos sapos:

— Finalmente aceitando que a espada ancestral não possuía função secreta nenhuma e que funcionaria melhor como um veneno, por se esfarelar toda e causar todos os tipos de efeitos negativos. E conseguindo uma oportunidade para dar uma olhada nas grandes caixas de madeira que chegavam toda semana de navio, defendidas por um batalhão considerável de guardas, me decepcionando por descobrir que se tratava só água.

Juntei a coragem necessária para meu confronto final e tracei um plano.

Descobrindo que o rei possuía uma cara feia de sapo e corpo de humano, percebendo que ele sempre andava com um cálice de ouro na mão e juntando todas essas informações com os carregamentos de água, cheguei a uma conclusão óbvia:

Para vencer, eu deveria conseguir alguma brecha para derramar os farelos da espada ancestral na bebida dele.

O dia de agir chegou e eu fingi ser pego, para ser levado a presença do rei e condenado por ele, que atuava como juiz temporário, já que todos com capacidade de se formarem e ascenderem a essa posição, arranjavam uma forma de fugir para um dos continentes vizinhos.

A forma que consegui levar todas as minhas armas secretas foi bem simples: por algum motivo, os outros não conseguiam enxergar minha bolsa dimensional.

Então enchendo anteriormente essa bolsa com um detergente de cozinha que encontrei em uma das casas que repousei, enquanto a busca estava mais leve; a deixando meia aberta e me inclinando um pouco, consegui me livrar das algemas e dos guardas,

— Como não sentiram o cheiro? — perguntou Voyro. — Todos os detergentes que conheço, são cheios de fragrâncias chamativas.

— Apesar da aparência humana, ainda eram marcados. Muitos dos seus hábitos e características físicas eram mais de sapos, que de humanos.

— Não sabia que sapos não sentiam cheiro.

— Eles sentem. Por isso, experimentei antes, com uma série de misturas, até encontrar alguma que passasse batido. Então eu corri e os guardas escorregaram e caíram, tentando me pegar.

— Como você mesmo não deslizou?

— Graças a meus sapatos caseiros, feitos com o casco hidrofóbico de uma barata gigante.

— Você ainda tem esses sapatos?

— Infelizmente, eu perdi. Foram comidos pelo rei sapo.

"Na verdade, a bolsa tinha uma função de recolher um material, desde que parte ainda estivesse armazenada nela. Mas isso só me faria parecer um incompetente que se escorou em um artefato roubado, mesmo que contasse os dias de experimentação e prática."

— Comidos?

— Nesse curto período de hesitação dos outros guardas, eu saquei a espada ancestral e desferi um golpe, bloqueado pelo rei. A espada se desmanchou, mas consegui derrubar alguns grãos de poeira no cálice do rei.

Daí foi questão de tempo até ele ser forçado a tomar, já que o dia em que me entreguei, era o mesmo dia em que um novo carregamento chegava, portanto, eles não tinham mais reservas sobrando, para substituir a porção do cálice.

Como o herói competente que sou, em um corte, enquanto estavam distraídos, me livrei de todos os guardas, preocupados com as tosses e espasmos do rei.

E nesse momento, o rei sapo lançou sua língua e capturou meus sapatos.

Seu estilo de luta dependia da agilidade.

Com saltos incessantes, ele pulava do chão para o teto, para as paredes, até minhas costas.

— Como venceu, então? — disse Voyro, animadamente.

— Segurei minha mochila, peguei um punhado de sal e atirei nele, que ficou com ainda mais sede, correu para tomar mais do cálice e no último gole, caiu duro no chão.

— Que herói covarde... — disse Selena.

— Diante de um homem sapo de quatro metros de altura, capaz de se inflar como um balão e se rebater a dezenas de quilômetros, me esmagando no chão, não parece tão injusto.

— Então você recuperou o reino e se tornou um rei?

— Quase isso. A diferença é que fui mandado para a prisão, depois de ser acusado falsamente por um guarda apoiador de um nobre revolucionário, que queria derrubar Fortuna, e por um triz não me tornei alvo de uma certa assassina, sobrecarregada de trabalho.

— E depois de tudo isso, se tornou rei?

— Essa história ainda está em progresso. Quem sabe o que pode acontecer.

— Por que não jogou os farelos da espada quando conseguiu abrir e ver o interior das caixas? — perguntou Selena.

Eu sorri e respondi:

— É segredo.

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